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Problematização de um curso de formação : rastros de práticas pedagógicas da matemática escolar

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

PAULA MASSI REIS PIRES

PROBLEMATIZAÇÃO DE UM CURSO DE FORMAÇÃO:

rastros de práticas pedagógicas da matemática escolar

CAMPINAS 2015

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Dedico este trabalho ao meu esposo Marcelino, in memoriam e às minhas filhas Larissa e Camila que me apoiaram

incondicionalmente em todos os

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AGRADECIMENTOS

Este texto é constituído por lembranças, espectros de todos os lugares e pessoas que por mim passaram ao longo dessa existência.

Agradeço ao meu esposo (in memoriam) e filhas pelo apoio incondicional não só nessa empreitada acadêmica, mas no decorrer de nossa caminhada juntos.

Agradeço aos meus familiares por fazerem-me existir e constituir-me. Por compartilharem comigo suas histórias que se fundem com as minhas.

Agradeço a todos os amigos e amigas de trabalho que me apoiaram e que não mediram esforços em auxiliar-me a realizar este texto. Serei eternamente grata a esse apoio afetivo e efetivo de todos e todas.

Agradeço a todos os envolvidos nessa pesquisa, desde o seu início com o trabalho de campo até a sua finalização textual/estrutural.

Meus sinceros agradecimentos ao grupo Phala pelos diálogos, narrativas, discussões, seminários, defesas que me auxiliaram a contemplar outra forma de realizar a pesquisa acadêmica e a formação continuada de professores.

Agradeço especialmente à minha orientadora Anna Regina Lanner de Moura que acreditou em minha capacidade de realizar essa pesquisa acadêmica. É uma honra ser orientada pela autora de vários textos, livros e artigos que compõem minha prática profissional.

Agradeço aos sabores e dissabores que me constituem como pessoa e permitem-me escrever a própria narrativa através dos espectros de todos e todas aos quais reverencio acima. Sou muito grata em poder contar com vocês.

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RESUMO

A pesquisa teve início a partir de uma inquietação da pesquisadora relacionada com a formação continuada de matemática nomeada, por decreto de lei municipal, como Programa de Aperfeiçoamento na Linguagem Matemática que acontece numa cidade do interior do estado de São Paulo, desde 2006, aos professores do Ensino Fundamental I. O Programa se justifica pela intenção de dar ao educador oportunidade de refletir sobre sua prática, ampliar o conhecimento sobre as abordagens pedagógicas no ensino de matemática e adquirir, nesse sentido, possibilidades de intervenções no processo educativo. A pretensão deste trabalho foi investigar os usos/significados que o Programa faz das práticas escolares de mobilização de matemática e os usos que fazem, em suas práticas, professores que participaram do curso de formação no contexto do Programa. O corpus da pesquisa se constituiu de entrevistas com professores que participaram da formação do Programa em diferentes épocas, de entrevistas com as coordenadoras pedagógicas desses professores, de registros de observação das suas aulas de matemática, do material pedagógico usado por eles nas aulas, do material documental do Programa e da literatura que se refere às práticas escolares de mobilização de matemática. O modo de conduzir as análises se constituiu na terapia gramatical desconstrutiva, que faz aproximações entre a perspectiva desconstrutiva derridiana e a terapia filosófica wittgensteiniana da linguagem. Neste estudo, esta atitude de pesquisa consistiu em percorrer as práticas escolares de mobilização de matemática do campo educativo, sendo um deles o contexto de formação no âmbito do Programa, para desconstruir/colocar em terapia/horizontalizar os significados que lhe são atribuídos nessa prática de formação. Tratou-se de uma investigação de caráter descritivo/desconstrutivo de práticas escolares de mobilização de matemática privilegiadas no contexto de formação do Programa acima citado.

Palavras-chave: Wittgenstein, Ludwig 1889-1951. Formação de Professores. Práticas Pedagógicas. Matemática Escolar. Ensino Fundamental I.

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ABSTRACT

The research started when the researcher became uneasy with the continuing education of mathematics, appointed by decree of municipal law, named  Programa de Aperfeiçoamento na Linguagem Matemática (Improvement Program in Mathematics Language), which has been happening in a city in the interior of the State of São Paulo since 2006 for Elementary I level teachers. The Program's pretense is to give teachers an opportunity to reflect on their practice, expand knowledge about pedagogical approaches in mathematics teaching and acquire, in this sense, intervention opportunities in the educational process. The intention of this project was to investigate the uses/meanings the Program defines in academic practices of mathematics mobilization and the uses, in practice, teachers who participated in the training course in the program context employ. The corpus of the research consisted of interviews with teachers who participated in the development of the program at different times, interviews with pedagogical coordinators of these teachers, their mathematics classes observation records, the pedagogic materials used by them in class, the Program´s documents and literature that refers to uses of pedagogical approaches to teaching mathematics. The analysis was conducted by using the deconstructive grammatical therapy that links Derrida´s deconstructive perspective and Wittgenstein’s philosophical therapy of language. In this research, the research approach consisted of running pedagogical approaches of mathematics mobilization in the educational field, one being the training context in the Program's scope, to deconstruct/place in therapy/level the meanings assigned in this formation practice. It turned out to be a descriptive/deconstructive research of privileged academic mathematics mobilization practices in the context of the Program´s formation mentioned above.

Keywords: Wittgenstein, Ludwig 1889-1951. Teacher Education. Pedagogical Practices.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 Les Demoiselles d'Avignon (1906-1907), óleo sobre tela de Pablo Picasso. Dimensões: 2,43m X 2,33m. Museu de Arte Moderna, Nova York. ... 21 Figura 2 As Grandes banhistas (1898-1905) de Cézzane. Fonte: Becks-Malorny,

2001... 31 Figura 3 Bacanal (entre 1631 e 1633) de Poussin... 32 Figura 4 Bacanal com tocadora de alaúde (1626-1628) de Poussin. Museu do

Louvre, Paris... 33 Figura 5 Bacanal (1957) de Picasso... 34 Figura 6 Violino e Uvas (1912), Pablo Picasso. Nova York, Museum of Modern

Art... 35 Figura 7 Estrutura didático-pedagógica do PALMA ... 49 Figura 8 Atividade da professora Iara... 127

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LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS

AM – Atividades Matemáticas.

CD – Compact Disc (disco compacto).

CENP – Coordenadoria de Ensino e Normas Pedagógicas. COLE – Congresso de Leitura no Brasil.

DEPRAC – Departamento de Ensino e Práticas Culturais. DVD – Digital Versatile Disc (Disco Digital Versátil). EJA – Educação para Jovens e Adultos.

FE – Faculdade de Educação.

GEPCPós – Grupo de Estudos e Pesquisas em Currículo e Pós-modernidade. HIFEM – História, Filosofia e Educação Matemática.

LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394/94.

LEM/IMECC – Laboratório de Ensino de Matemática/Instituto de Matemática Estatística e Computação Científica - Unicamp.

PALMA – Programa de Aperfeiçoamento na Linguagem Matemática. PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais.

PECIM – Programa de Pós-Graduação Multiunidades em Ensino de Ciências e Matemática/Unicamp.

PHALA - Grupo de Pesquisa em Educação, Linguagem e Práticas Culturais – Faculdade de Educação – Unicamp.

UNESCO – United Nation Educational, Scientific and Cultural Organization (Organização

para a Educação, a Ciência e a Cultura das Nações Unidas).

UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas.

NCTM – National Council of Teachers of Mathematics (Conselho Nacional de Professores de Matemática).

IREM – Instituts de recherche sur l’enseignement dês mathématiques (Instituto de Investigação acerca do Ensino das Matemáticas)

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SUMÁRIO

1. UM MODO TRANSGRESSIVO/DESCONSTRUTIVO DE ENCARAR A

PESQUISA ... 21

2. PERSPECTIVAS WITTGENSTEINIANA E DERRIDIANA DE PESQUISAR .... 37

3. JOGOS DE LINGUAGEM NO PROGRAMA DE FORMAÇÃO ... 47

3.1 Linguagem matemática ... 51

3.2 Metodologia do Programa de Formação ... 54

3.3 Abordagens pedagógicas do Programa de Formação ... 56

4. DIÁLOGO FICCIONAL/JOGOS DE CENAS SOBRE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DA MATEMÁTICA ESCOLAR ... 62

4.1 Ensino significativo no PALMA ... 67

4.2 Abordagens pedagógicas em questão ... 71

4.3 Programa de Aperfeiçoamento na Linguagem Matemática? ... 78

4.4 Problematizando os usos da história do número nas práticas escolares ... 83

4.5 Problematizando práticas escolares de ensino do número natural ... 100

4.6 O número em cena na sala de aula ... 121

5. SEGUINDO NOS RASTROS DOS RASTROS, A TERAPIA CONTINUA ... 140

REFERÊNCIAS ... 142

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1. MODO TRANSGRESSIVO/DESCONSTRUTIVO DE ENCARAR A PESQUISA

Figura 1 - Les Demoiselles d'Avignon (1906-1907), óleo sobre tela de Pablo Picasso. Dimensões: 2,43m X 2,33m. Museu de Arte Moderna, Nova York1.

O quadro Les Demoiselles d’Avignon é um clássico da pintura da primeira metade do século XX que me inspira transgressão, desconstrução de um outro padrão clássico de beleza.

Mas que clássico é este que transgride outro clássico? Refiro-me àquele padrão estético da cultura greco-romana, revivido pelo movimento renascentista na península itálica, com auge no século XIV. A exemplo do Homem Vitruviano, modelo ideal de corpo humano com proporções perfeitas, criado de

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acordo com um determinado raciocínio matemático a partir da proporção áurea2 e que passou a ser o ideal de beleza clássica. Mas, fazendo remissão a Wittgenstein, privilegiar uma única forma estética como ideal na arte impossibilita outras representações do real. Picasso, embora com formação clássica, é o artista que, ao desconstruir na pintura o padrão clássico de beleza renascentista, inicia outra forma de expressá-la, o cubismo.

Espere, e qual a relação dessas considerações sobre a arte e sua pesquisa?

TragoLes Demoiselles d’Avignon como uma obra que representa, como já disse, a transgressão de uma concepção de beleza existente na arte3. Minha pesquisa tinha como intenção primeira, investigar os usos que os professores4 do Ensino Fundamental I têm feito das práticas escolares de mobilização de matemática, após o curso de formação continuada denominado Programa de Aperfeiçoamento na Linguagem Matemática, que acontece em determinado município do interior do estado de São Paulo. Inquietava-me perceber que após o término do curso, os professores/cursistas não se reportavam em suas práticas habituais às abordagens didático-metodológicas da formação recebida no referido curso. Ao ingressar no programa de Pós-graduação5 tive oportunidade de conhecer outra forma de olhar para a pesquisa, que não a visão positivista verificacionista que fez parte de minha formação

2

A proporção áurea, número de ouro, número áureo ou proporção de ouro é uma constante real algébrica denotada pela letra grega φ (PHI), em homenagem ao escultor Phideas (Fídias), que a teria utilizado para conceber o Parthenon, e com o valor arredondado a três casas decimais de 1,618. Também é chamada de seção áurea (do latim sectio aurea), razão áurea, razão de ouro, média e extrema razão (Euclides), divina proporção, divina seção (do latim sectio divina), proporção em extrema razão, divina de extrema razão ou áurea excelência. O número de ouro é ainda frequentemente chamado razão de Phidias. Desde a Antiguidade, a proporção áurea é usada na arte. É frequente a sua utilização em pinturas renascentistas. Este número está envolvido com a natureza do crescimento. Phi (não confundir com o número Pi π), como é chamado o número de ouro, pode ser encontrado na proporção dos seres humanos (o tamanho das falanges, ossos, dos dedos, por exemplo) e nas colmeias, entre inúmeros outros exemplos que envolvem a ordem do crescimento. Justamente por estar envolvido no crescimento, este número se torna tão frequente. E justamente por haver essa frequência, o número de ouro ganhou um status de "quase mágico", sendo alvo de pesquisadores, artistas e escritores. Apesar desse status, o número de ouro é apenas o que é devido aos contextos em que está inserido: está envolvido em crescimentos biológicos, por exemplo. O fato de ser encontrado através de desenvolvimento matemático é que o torna fascinante. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Propor%C3%A7%C3%A3o_%C3%A1urea>. Acesso em: 04 fev. 2014.

3Refiro-me aqui a uma das concepções de beleza na arte, a Greco-romana, pois cada época histórica e cada

civilização, povoado teve e tem outras concepções de beleza que não esta citada nesta pesquisa de acordo com fatos históricos publicados sobre o artista Pablo Picasso.

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A virada linguística não se preocupa com a etimologia da palavra professor, ou mesmo em diferenciá-la da palavra educador, pois entende que seus significados oscilam de acordo com o jogo ao qual se relacionam. Esta pesquisa não tem por objetivo traçar a origem, ou o sentido original, destas duas palavras. Professor/educador serão utilizadas no decorrer da pesquisa no sentido amplo do profissional da educação que desenvolve sua atividade humana e profissional no contexto escolar.

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acadêmica e que guardava como única e verdadeira. Desconstruir esta visão passa a ser um jogo de cena que deve suportar todos os outros que compõem o cenário desta pesquisa.

Qual foi, então, a sua primeira “virada” neste processo? Imbuída da ideia de que a pesquisa pudesse ajudar-me a encontrar os porquês do fato de os professores abandonarem as propostas do curso em suas práticas, apresentei um projeto para a seleção de mestrado. Estava crente de que, ao observar as aulas e entrevistar os professores, iria encontrar indícios que me levariam a estabelecer uma relação de causa que pudesse esclarecer-me os motivos que levavam os professores a não alinharem suas práticas ao curso. Porém, os estudos no grupo de Pesquisa PHALA6, no grupo de Orientação Coletiva7, levaram-me a ver que essa relação causal poderia não conduzir à compreensão que buscava e para construir um esclarecimento do curso e das práticas dos professores seria apropriado perguntar não o “por quê?”, “o que é?”, “de onde vem?”, “quais as relações?”, mas como acontecem as práticas pedagógicas de formação no curso? Como acontecem as práticas pedagógicas dos professores que o frequentaram? Entendi que esse modo de problematizar poderia conduzir-me a esclarecer as ações, os significados, os usos que são mobilizados no contexto de formação do Curso PALMA ao qual se direciona o olhar desta investigação. Passei, então, a apontar minha pesquisa aos usos das práticas escolares de mobilização de matemática do programa de aperfeiçoamento e nas práticas pedagógicas dos professores que o frequentaram, com o objetivo de problematizar, de esclarecer, os diversos usos no contexto do programa e na prática dos professores em sala de aula, dialogando com usos que possivelmente encontraria na literatura. No intuito de gerar esta compreensão, fiz a escolha de assumir uma atitude terapêutica desconstrucionista de pesquisa.

Essa mudança em sua questão de pesquisa, que outros desafios lhe trouxe, que não estavam postos com a questão anterior?

Ao buscar esclarecer as práticas escolares de mobilização de matemática no contexto de formação e nas práticas pedagógicas de matemática dos professores, encontro-me diante do desafio de desconstruir a minha própria visão privilegiada desses usos e mais propriamente dos usos do termo matemática8 feito nesses contextos. Falo de uma visão eurocêntrica9, que

6

PHALA - Grupo de Pesquisa em Educação, Linguagem e Práticas Culturais – Faculdade de Educação – Unicamp.

7 O grupo de orientação coletiva é um subgrupo do PHALA constituído de mestrandos, doutorandos e seus

orientadores: Antonio Miguel e Anna Regina Lanner de Moura.

8

Vilela (2013) utiliza a expressão matemáticas ao se referir aos diversos usos (adjetivações) do termo matemática na literatura da Educação matemática.

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me remete a toda minha formação escolar. Se considerar, por exemplo, a geometria, toda essa formação foi baseada numa abordagem euclidiana. Abordagem esta que continua dominante na formação atual.

No entanto, se considerarmos como diz Miguel, Vilela e Moura (2010), que Euclides, nos Elementos “disse quase tudo que suas definições, seus postulados, axiomas e regras de inferência da lógica aristotélica lhe permitiram dizer. O que disse – dessa forma e com essa forma – não era tudo o que poderia ser dito das práticas e/ou sobre as práticas humanas mobilizadoras de quantidades, formas e medições”10, podemos concluir que privilegiar na formação hoje, única e exclusivamente a abordagem euclidiana do espaço é excluir outras abordagens tanto quanto importantes para se compreender o espaço. Posso dizer que essa visão privilegiada tem rastros na minha condução do curso de formação de professores.

Retomando o movimento transgressivo na pintura de Picasso, que outros aspectos de uma atitude transgressiva pode estar presente no quadro Les Demoiselles d’Avignon, além da transgressão estética11, que teria semelhança de família com a atitude terapêutica de sua pesquisa?

Outro exemplo desse padrão estético12 do Renascimento é o uso da perspectiva, que conduziu ao recurso do claro/escuro para enfatizar o volume das figuras e que contribuiu para o maior realismo das pinturas. Segundo Gombrich (1979b)

9

Matemática com raízes na tradição científica europeia. Desde Euclides e do estabelecimento de uma ligação estreita, estrita e restrita entre a matemática e a lógica “O discurso euclidiano desloca as práticas às quais toma implicitamente como referência dos contextos de atividade humana em que vinham sendo realizadas - tais como os da agrimensura, da astronomia e da navegação - e as conforma, de um modo estático e permanente, em um modelo dedutivo que, a partir do advento da ciência moderna na Europa, passou a ser visto e eleito como superior em relação a outros modos de exposição do conhecimento.” Miguel, Vilela e Moura (2010, p. 135).

10 Miguel, Vilela e Moura (2010, p. 134).

11

Segundo o Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa de José Pedro Machado (4ª ed. v. II, Lisboa, Livros Horizonte, 1987), nome/substantivo estética deriva do francês esthétique, que por sua vez, vem do grego

aisthêtiké, forma do adjetivo aisthêtikós, que significa “que tem a faculdade de sentir ou de compreender; que

pode ser compreendido pelos sentidos”. Por sua vez, o Grande Dicionário Etimológico Prosódico da Língua Portuguesa, de Silveira Bueno (3º vol., São Paulo, Edição Saraiva, 1965), remete a origem deste substantivo feminino que designa “filosofia da arte” e “filosofia do belo” para o grego aisthétikos, em forma feminina. Acrescenta ainda que esse termo foi introduzido por Baumgarten (Aesthetica, 1750). A atestação mais antiga da palavra é de 1833, segundo o Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa (ob. cit.), que a atribui a Alexandre Herculano, na obra Monge de Cister, cap. 21: “para cujo consolo vieram à terra as bruxas, a therapeutica, os fundos públicos... a esthetica, a peta e o palavreado.” Disponível em < htttp://www.ciberduvidas.com/pergunta.php?id=27326 >, acesso em 14 fev. 2015.

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Quero esclarecer que me reporto reiteradamente a analogias com o movimento artístico da pintura, pois minha primeira graduação possibilita-me mais familiaridade com essa área.

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As mesmas características das construções renascentistas são transferidas às pinturas e outras manifestações culturais como a de criar espaços compreensíveis a partir de todos os ângulos visuais, resultado de uma justa proporção entre todas as partes; a busca de uma ordem e de uma disciplina13 na ocupação do espaço com base em relações matemáticas, estabelecidas de modo que seja visível, por todos, a lei que as organiza, de qualquer ponto que o observe.

Por que somente as obras que seguem o padrão estético e métrico foram mais merecedoras de apreciação? Do status de mais notáveis obras clássicas, como Monalisa14 e A última Ceia15? Por que se levou à ilusão de nelas poder apreciar cenas que estariam representando de modo preciso16 fatos reais17 da época? Seria isso que as consagra imortais?

Para os pintores renascentistas, “a perspectiva científica fora inventada para ajudar os pintores a criarem a ilusão de espaço”18

.

Mas já podemos ver em Cézzane19, anterior a Picasso, a transgressão da regra da ilusão. Em suas obras não usava técnicas ilusionistas. O que ele queria era transmitir a sensação de solidez e profundidade e concluiu que podia fazê-lo sem recorrer ao desenho convencional20.

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Disciplina aqui entendida como o respeito às regras de estética da beleza ideal na composição de uma obra de arte. “Em oposição ao movimento que foge ao controle, a exemplo dos movimentos mercurianos - alusão a Mercúrio, romano ou Hermes em referência grega, a quem era atribuída a criação de todas as artes, nomeado mensageiro de seu pai, a saber, Júpiter. Como mensageiro, os atributos de Mercúrio são referenciados àquilo que é errático, instável, volátil, inconstante.” (JESUS, 2012, p. 40).

14 Monalisa (iniciada em 1503), de Leonardo da Vinci, representa o padrão de beleza da mulher na época. Sua

composição é edificada sobre a proporção áurea: o retângulo áureo e o número de ouro.

15 Mural no refeitório do mosteiro de Santa Maria delle Grazie, Milão (1495-1498), de Leonardo da Vinci, com

sua forma sensível e luminosidade vibrante que evidencia o volume e dá solidez às figuras. Os detalhes são retratados com um realismo e fidelidade à vida real que impressionam. Nesta obra Leonardo se esforça também em visualizar como teria sido a cena em que Cristo disse: ‘Em verdade vos digo que um dentre vós me trairá.’ E encena todo o drama e excitação existente neste trecho das Escrituras Sagradas (GOMBRICH,1979b, p. 224).

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O modo matemático preciso de compor as obras se relaciona à geometria projetiva ou perspectiva -“regras pela quais os objetos parecem diminuir de tamanho quando se afastam de nós” Gombrich (1979a, p. 171), que representa cenas tridimensionalmente concebidas em substrato bidimensional e no jogo de claro/escuro para auxiliar em tal ilusão de profundidade. “Foi Brunelleschi quem proporcionou aos artistas os meios matemáticos para solução do problema da profundidade; e a sensação que isso causou entre os pintores deve ter sido imensa.” Gombrich (1979a, p. 171).

17 Fato tem aqui o sentido de acontecimento e reais (do latim realitas isto é, "coisa"), significa “tudo o que

existe”. O real é tido como aquilo que existe fora da mente ou dentro dela também. A ilusão, a imaginação, embora não esteja expressa na realidade tangível extra-mentis, existe intra-mentis. E é portanto real, embora possa ser ou não ser ilusória. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Realidade>. Acesso em: 17 fev. 2014.

Fatos reais é mobilizado aqui como representação realista do ideal renascentista de beleza. É um real ilusório

(intra-mentis) no sentido de que nem todas as pessoas e ambientes levam em si a divina proporção do retângulo áureo e do número áureo.

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Analogamente, se pensarmos em outras áreas do conhecimento, teríamos que nos perguntar também sobre os usos privilegiados que são feitos a respeito de seus status, como no caso da matemática. Por que somente a matemática eurocêntrica merece o status de ciência matemática? E, ainda, no campo da pesquisa, por que somente a pesquisa positivista teria o status de validade científica no âmbito acadêmico?

Suas questões são muito pertinentes e levam-me a retomar a sua questão anterior sobre a semelhança de família entre a transgressão estética de Picasso em sua obra e a minha atitude terapêutica de pesquisa. Nessa forma de encaminhar a pesquisa visualizo a possibilidade de problematizar o uso privilegiado da matemática eurocêntrica na escola e, ao mesmo tempo, o uso privilegiado que a academia confere ao modo positivista e verificacionista de ser da pesquisa no campo da educação. Pretendo afastar-me desses padrões e oferecer outras possíveis ações diante da pesquisa acadêmica e diante da matemática escolar.

Nessa busca em transgredir a pesquisa acadêmica verificacionista em educação são referenciados, ao longo dessa pesquisa, Wittgenstein21 e Derrida22, filósofos pós-estruturalistas. Compreender os diferentes usos e diferentes significados das práticas escolares mobilizadas pelos participantes dessa pesquisa e no programa de formação contínua em educação matemática tem referência no estudo feito por Vilela (2013, p. 21-22) no qual a autora explica que

Inspirada, desde o início, pela filosofia de Wittgenstein, passamos a observar os usos que têm sido feitos da expressão matemática nas publicações e pesquisas recentes em Educação Matemática. Diante de perguntas filosóficas tais como “quais as concepções de matemática que permeiam as pesquisas na área de Educação Matemática? Ou o que é a matemática nesse âmbito?”, 19 Paul Cézzane (1839 – 1906), “iniciou sua carreira ligada ao movimento impressionista. Mas não tardou para

que sua pintura tomasse outros rumos. Ele não se preocupava em registrar o aspecto passageiro de um movimento provocado pela constante mudança da luz solar, como defendiam os impressionistas. Ao contrário, o que Cézzane buscava era o permanente, a estrutura íntima da natureza.” Proença (2007, p. 243).

20 Desenho convencional aqui relacionado ao ideal renascentista de beleza, à proporção áurea que trazem a

perspectiva e o claro/escuro como artifícios para a representação perfeita da realidade.

21

Wittgenstein (1979; 1992). O austríaco Ludwig Wittgenstein (1889-1951) é considerado um dos mais importantes filósofos do século XX.

22 Derrida (1986; 1993; 1994; 2004; 2005). Filósofo francês (1930-2004), que iniciou na década de 60 a

desconstrução no campo filosófico, no sentido de “desmontagem” de certas engrenagens existentes no mundo.

Disponível em: <http://oglobo.oglobo.com/cultura/livros/o-legado-jacques-derrida-para-filosofia-no-brasil-onde-fez-sua-ultima-conferencia-em-2004-14128990> . Acesso em: 08 abr. 2015.

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optamos, em consonância com a perspectiva filosófica aqui adotada, por perguntar: “Como o termo matemática vem sendo usado na literatura acadêmica da Educação Matemática?”.

A pesquisa de Vilela (2013) mostra/esclarece diferentes usos que se fazem do termo matemática, desconstruindo uma visão privilegiada da matemática como uma ciência una, única e essencialista.

Nesta pesquisa, ao tentar esclarecer os usos de práticas escolares de mobilização de matemática no programa de formação que ajudei a elaborar, busco desconstruir uma visão privilegiada da matemática nele presente que acaba por estagná-lo. Não no sentido de privilegiar outros usos das práticas escolares no ensino de matemática, mas de tentar trazer os usos e as abordagens para além deles mesmos. De colocar à vista, sob um único substrato, as suas várias faces. Como fizeram os cubistas que, ao recorrerem a outra forma de representação das coisas do mundo23, que não a perspectiva linear24, trouxeram à tona faces ocultas de seus personagens.

Picasso25, por exemplo, pintor acadêmico desde a infância, no ímpeto de romper com a ilusão da perspectiva ou da representação na arte clássica das três dimensões dos seres, passa a representar os objetos com todas as suas partes no mesmo plano. Transgressivamente, o pintor cria outro modo de ver/representar a realidade na pintura, um modo não alinhado à precisão da projetiva, à linguagem matemática privilegiada na arte de sua época. Um modo de dar ênfase e destaque às expressões, diferente daquele usado na obra Monalisa, mas não menos belo e expressivo. Rompeu com a estética dos contornos precisos dos corpos, tirando-os da imobilidade da Última Ceia, conferindo movimenttirando-os expressivtirando-os a cada novo olhar para o quadro, como é o caso da obra Les Demoiselles d'Avignon.

Neste movimento de Picasso vejo semelhanças com a perspectiva desconstrucionista de Derrida que, num primeiro momento, inverte a polarização para posteriormente praticar - mediante o deslocamento por múltiplos espectros - a

23

Cada povo, cada cultura visual, em cada época, apoiado em ideias determinadas, criou sua maneira particular de transpor para uma superfície plana o mundo visível. Segundo Debray (1994, p. 230, apud FLORES, 2002, p. 82), os egípcios utilizavam a perspectiva horizontal, os hindus a perspectiva irradiante, os chineses e os japoneses a perspectiva do voo do pássaro, os próprios bizantinos a perspectiva invertida.

24

Para Olmep (1943, p. 2, apud FLORES, 2002, p. 82), a perspectiva linear é chamada assim porque ela faz uso exclusivamente do traço (linhas retas ou curvas) para representar retas, curvas, planos, volumes e seus contornos. Flores acrescenta que uma imagem representada mediante esta perspectiva mostra um universo relacional onde todos os objetos estão representados no espaço a partir de razões e proporções que podem ser traduzidas em medidas.

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horizontalização dos opostos. Também nessa perspectiva inspiro-me com referência em Miguel (no prelo) apud Marim (2014), que aproxima a prática desconstrucionista derridiana da perspectiva terapêutica de Wittgenstein ao se referir a uma prática desconstrucionista terapêutica gramatical espectral. O caminho da desconstrução nos rastros dos rastros espectrais coloca em minha frente uma abordagem pós-virada linguística que envolve a performatividade da linguagem ao lidar com o corpus da pesquisa. O que para mim é um desafio diante da herança de espectros metafísicos que me assombram neste percurso terapêutico, embora reconheça que eles sempre me assombrarão.

Para Miguel26, a descrição do funcionamento da máquina de guerra pós-metafísica como um modus operandi de uma atitude terapêutico-gramatical desconstrucionista, tencionando os [e além dos] limites gramaticais de Wittgenstein e Derrida e remetendo aos campos de domínios da investigação e fora deles, não consistiria em “um método genérico que operaria de modo idêntico em todas as situações e a todos os tipos de problemas, mas de uma atitude ético-política - sempre situada e diferenciada - de resistência e luta, e não de acomodação ou resignação”. Ainda, para o mesmo autor27

, embora a máquina wittgensteiniana-derridiana reconheça que essa luta contra a metafísica seja improdutiva e inglória, tal funcionamento, em modos diferentes e idiossincráticos, resulta em combates de “todos os tipos de atitudes metódicas cientificistas, de caráter empírico e/ou verificacionista no âmbito da pesquisa [em particular da educação matemática] e da ação educativa”.

Pelo que estou entendendo você quer realizar com a sua pesquisa um processo transgressivo/desconstrucionista análogo ao que foi feito pelos pintores que você vem discutindo? Isso não seria muito ousado de sua parte?

Sem dúvida é ousadia. Esses pintores quebraram paradigmas na Arte, enquanto essa pesquisa apenas lança um novo olhar para um curso de formação que para mim tornou-se verdade.

Neste trabalho, pretendo lançar um olhar diferente também para o modo de conduzir uma pesquisa qualitativa. Por exemplo, a pesquisa qualitativa tenta destituir-se de aspectos da pesquisa positivista como a afirmação de que existe uma realidade “lá fora” para ser estudada, captada e compreendida, mantendo porém, de alguma forma, a visão metafísica-essencialista, defendendo a ideia de que a realidade nunca pode ser plenamente apreendida.

26

Apud Marim (2014, p. 17).

(19)

Além disso, continua enfatizando os critérios da fidedignidade dos resultados, de enunciação rigorosa de categorias de análise, de não tendenciosidade individual, não subjetividade, aspectos esses preservados tanto numa abordagem quanto noutra em nome de preservar a qualidade científica da pesquisa. Esses critérios privilegiam apenas um tipo de ciência que em suas pesquisas silencia muitas outras vozes.

Os pintores que aqui discuto inspiram-me uma atitude de pesquisa apoiada, não na concepção de uma realidade objetiva, existente em si, externa ao ser que pesquisa como se este pudesse distanciar-se dela e olhá-la tal qual é, mas na atitude da terapia/gramatical/espectral fundada na concepção de que a linguagem é constitutiva da realidade28, isto é, dos fatos como estes ocorrem e que esta é condição de “objetividade da pesquisa”. Sob essa condição o “objeto” de pesquisa constitui e é constituído pelas ações de pesquisar. Sua compreensão constitui-se nos usos, significados nos jogos de linguagem/jogos de cena jogados no tempo/espaço da pesquisa. Por isto, na presente pesquisa, não se trata de estabelecer categorias, validar resultados, mas esclarecer/compreender terapeuticamente os diferentes usos das práticas escolares de mobilização de matemática na formação e feitas por professores e coordenadores de escola.

Picasso, especificamente na obra, Les Demoiselles d’Avignon, leva-me a pensar que não existe uma estética/métrica, uma perspectiva privilegiada para representar objetos tridimensionalmente concebidos em espaços bidimensionalmente representados. Para Flores (2002)29, os termos “perspectiva” e “espaço” resultam de uma escolha arbitrária de convenções, por exemplo: para ela, a perspectiva linear renascentista se baseia na matemática de Euclides, nas contribuições sobre ótica, na Antiguidade, na cartografia de Ptolomeu; a perspectiva intuitiva bizantina era chapada, sem movimento, pois se preocupava com o papel narrativo das imagens – com influências supostamente egípcias30, entre outras. Quanto ao espaço, essa mesma autora complementa que cada época, cada povo, teve sua maneira peculiar de concebê-lo e representá-lo, o que a leva a pensar junto com Francastel (1990, p. 24 apud FLORES, 2002, p. 87) que, na verdade, “o espaço não é uma realidade em si [...], é a própria experiência do homem”.

28 Vilela e Mendes (2011, p. 8). 29 Flores (2002, p. 86-87).

30 Ibid. (p. 87-92). A autora descreve neste artigo outras perspectivas que não discutiremos nesta dissertação, mas

ficam aqui registradas para futuras pesquisas: perspectiva com um sistema bifocal, perspectiva “De prospectiva pingendi”.

(20)

Isso me leva a confirmar que privilegiar uma única maneira de abordar a matemática na formação do professor e nas práticas escolares pode cegar a visão para outras possibilidades. Ver de outras formas pode levar a outras matemáticas, a outros belos, a inventar novos espaços.

Romper com um modo único de ver, olhar de outras formas, foi o que ocorreu na arte com os cubistas31, registrado no excerto abaixo de Elgar (1987, p. 236), em cuja tendência Picasso também se inicia32.

[...] em que os corpos femininos, as árvores, as nuvens, se encontram inextricavelmente unidas num espaço inventado. Todos os elementos desta obra prima se conjugam para imprimir à composição piramidal um ímpeto que se vai quebrar nitidamente na parte superior da tela, a fim de que os lados do triângulo formado pelos troncos das árvores possam unir-se apenas na imaginação do espectador. Admirem o jogo sutil das paralelas que o quadro oferece: paralelas oblíquas das banhistas e das árvores, contraparalelas dos braços, e, para estabelecer o equilíbrio, paralelas horizontais do rio e das suas margens. Reduzidas umas e outras ao mesmo esquema, árvores, banhistas parecem aspiradas por misteriosa força ascendente para alturas incomensuráveis. Embora os contornos sejam claramente marcados, os ramos, as folhas, o chão, o céu, não passam de ‘manchados’, esbatidos, camadas leves de tinta transparente, donde se derrama uma apaziguante luz azulada.

31 Cubismo, movimento artístico do início do século XX, aconteceu em meio à Primeira Guerra Mundial, à

Revolução Russa, ao fascismo na Itália, ao nazismo na Alemanha e à Segunda Guerra Mundial. Neste contexto turbulento é que surgem os movimentos “ismo”: cubismo, futurismo, surrealismo, abstracionismo, expressionismo, dadaísmo, realismo socialista, modernismo. São movimentos que expressam a perplexidade do homem nesse período das mais diversas formas. O Cubismo se dividiu em duas importantes tendências: Cubismo Sintético e Cubismo Analítico, ao qual me detenho neste texto e que foi desenvolvido e representado por Pablo Picasso (1881-1973) e por Georges Braque (1882-1963), principalmente na primeira década do século XX.

32

Os cubistas como são denominados os pintores que tratam as formas da natureza como se fossem cones, esferas e cilindros inspiraram-se em Cézzane, pintor que passou a vida a buscar uma ligação harmoniosa do ser humano com a paisagem, assim como Nicolas Poussin (1594 – 1665), um dos maiores representantes do classicismo do século XVII. Poussin se preocupava com a forma humana e sua harmonia com a natureza, mesmo fato que inspirou Cézzane em sua série de banhistas. Esta busca de Paul Cézzane se materializou na obra As

grandes Banhistas com suas figuras e formas geometrizadas na qual trabalhou por sete anos, de 1898 a 1905. As

banhistas foi um tema também explorado por Pierre Auguste Renoir (1841 – 1919) pintor impressionista que ganhou fama, popularidade e reconhecimento da crítica ainda em vida. Segundo Proença (2007, p. 214), Renoir tinha por objetivo uma arte agradável aos olhos, porém, apesar de sua técnica essencialmente impressionista, nunca deixou de se importar com a forma. Em seu período Ingres na arte, se volta para uma pintura mais figurativa expressa ao longo da série Banhistas, na qual os contornos das suas formas ficam mais precisos, evidentes, firmes e com cores mais frias. É uma fase em que deixa de pintar ao ar livre. Disponível em: <http://oglobo.globo.com/pais/noblat/posts/2008/10/03/pintura-as-grandes-banhistas-de-pierre-auguste-renoir-130284.asp>. Acesso em: 14 mar. 2014.

(21)

Figura 2 – As Grandes banhistas (1898-1905) de Cézzane, Fonte: Becks-Malorny, 200133.

Cézanne34, desde a juventude, sempre admirou dois mestres opostos ao seu modo de representar a natureza: Delacroix35 e Poussin36.

Eugène Delacroix pertenceu ao movimento denominado romantismo. Não tinha paciência para conversar sobre gregos e romanos, com a insistência no desenho correto e a constante imitação de estátuas clássicas de ambos os lados. Acreditava que, em pintura, a cor era muito mais importante do que o desenho, a imaginação mais do que o saber.

Já Nicolau Poussin, da escola clássica, estudioso das estátuas clássicas, preocupava-se com a forma humana e sua harmonia com a natureza, apresentando impecável beleza em suas obras, o oposto de Delacroix.

Cézzane se inspirou na obra Bacanal37, de Poussin, para compor As Grandes Banhistas. Admirava o equilíbrio e a perfeição nos quadros deste pintor clássico. O padrão

impecável, segundo Gombrich38, de beleza e harmonia, na qual uma forma parece responder à

33Disponível em:

<http://pt.wahooart.com/@@/5ZKDN7-Paul-Cezanne-Banhistas-grandes-(Filad%C3%A9lfia)> acesso em: 10 de fev. de 2014.

34

Elgar (1987, p. 236).

35 Eugène Delacroix(1798 – 1863). 36 Nicolas Poussin (1594-1665).

37 Bacanal é a denominação das festas oferecidas ao deus romano Baco. Várias obras de Poussin são

representações de tais festas.

(22)

outra. Em suas obras, cada elemento está em seu devido lugar, nada é casual. É possível visualizar cada corpo sólido e firme. Cézzane perseguia uma arte que possuísse tal grandeza e serenidade, mesmo que esses atributos não se encontrassem na natureza. “Queria pintar as formas e as cores que via, não aquelas que eram fruto de seus conhecimentos ou sobre as quais tinha aprendido.”39 A composição das ninfas de Poussin inspirou Cézzane, talvez, nos ritmos corporais e na composição piramidal das Grandes Banhistas. Mas a maneira de intensificar as cores foi inspirada em Delacroix (GOMBRICH, 1979a, p. 428).

Figura 3 - Bacanal (entre 1631 e 1633) de Poussin40.

39 Ibidem.

40 Disponível em: < http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Nicolas_Poussin_004.jpg>. Acesso em: 10 fev.

(23)

Figura 4 - Bacanal com tocadora de alaúde (1626-1628) de Poussin. Museu do Louvre, Paris41.

Poussin também foi relido por Picasso. E Picasso também releu Cézzane que conseguiu o equilíbrio e a harmonia perseguida de uma forma nada parecida com o equilíbrio mecânico aprendido por Poussin em seu ofício42. No sentido derridiano, a pintura de Cézzane se constitui de rastros, de remetimentos aos artistas que inspiraram suas obras.

Portanto, a obra Les Demoiselles d'Avignon se constitui de rastros dos rastros de Cézzane. Para Derrida não há significado em si. Também não há significante. Cada palavra, cada termo, traz o rastro43 de todos os outros rastros. Do mesmo modo, cada obra aqui citada se concebeu a partir de rastros dos rastros do classicismo, do romantismo, da beleza grega, do impressionismo, e outros.

Mas afinal, o que tem a ver com sua pesquisa a trajetória de inspiração desses pintores dos quais você acaba de falar?

Novamente, você com essa pergunta? Mas acho que tem razão em fazê-la reiteradamente, pois me possibilita o exercício iterativo de autoconvencimento de minha formação para uma atitude de pesquisa terapêutica. Assim como na pintura a inspiração no rastro dos rastros de outros pintores não é cópia, repetição do modo artístico do artista/inspiração, mas um outro

41 Disponível em: <http://peneira-cultural.blogspot.com.br/2013/08/renato-brolezzi-desvenda-poussin-o.html>.

Acesso em: 10 fev. 2014.

42 Gombrich (1979b). 43

Utilizo a palavra “rastro” de acordo com o pensamento de Derrida acerca do processo de produção da

(24)

significado, ver de outra forma a pintura, a espectralização das abordagens relacionadas à matemática abre caminhos para outras direções, desestabiliza significados únicos com usos privilegiados.

Figura 5 – Bacanal (1957) de Picasso44.

Veja, ao buscar os rastros do cubismo expressos nas obras de Picasso, percebe-se a semelhança de família com objetos de fácil reconhecimento, mas representados de outra forma que não como são percebidos pelos olhos. O objetivo do cubismo é construir algo e não copiar algo. Gombrich45 ressalta em seu livro História da Arte que

Se pensarmos num objeto, digamos, o violino, ele não se apresenta ao olho da nossa mente tal como o vemos com os olhos do nosso corpo. Podemos pensar e, de fato, pensamos em seus vários aspectos ao mesmo tempo. Alguns deles destacam-se tão claramente que sentimos poder tocá-los e manipulá-los. E, no entanto, essa estranha mistura de imagens representa mais do violino ‘real’, do que qualquer instantâneo ou pintura meticulosa poderia jamais conter.

44 Figura disponível em: <http://www.flickr.com/photos/arquepoetica/8746886849/lightbox/>. Acesso em: 10

fev. 2014.

45

(25)

Figura 6 - Violino e Uvas (1912), Pablo Picasso. Nova York, Museum of Modern Art.46 Ao observar a obra da figura 6, encontramos semelhanças com os princípios egípcios47, no qual o objeto era desenhado no ângulo em que sua forma característica se destacava com mais evidência. O quadro Violino e Uvas evidencia cada detalhe que caracteriza o violino, colocando certa ordenação no que parecem, a princípio, formas desencontradas e confusas. Segundo Gombrich (1979a, p. 458), o artista compartilha esse

[...] jogo sofisticado de construção da ideia de um objeto sólido e tangível a partir de um punhado de fragmentos planos em sua tela. Sabemos que artistas de todos os períodos tentaram apresentar suas soluções pessoais para o paradoxo essencial da pintura: a representação da profundidade numa superfície plana. O cubismo foi uma tentativa, não de encobrir esse paradoxo, e sim, de explorá-lo para novos efeitos. Picasso nunca pretendeu que os métodos do cubismo pudessem substituir todos os outros modos de representar o mundo visível. Pelo contrário. Estava sempre disposto a modificar seus métodos e retornar, uma vez por outra, dos mais arrojados experimentos em criação de imagens, às várias formas tradicionais de arte. [...].

46 Figura disponível em <http://vanguardasufms.blogspot.com.br/2011/12/cubismo.html >. Acesso em: 10 fev.

2014.

47 Para Gombrich (1979a, p. 456), em alguns aspecto, Picasso “representa um retorno ao que chamamos

princípios egípcios, em que um objeto era desenhado do ângulo do qual a sua forma característica se destacava mais claramente”, como é possível observar em sua obra, Violino e Uvas.

(26)

Em vários momentos, Picasso buscou remeter-se a outras culturas, como por exemplo, a arte da pré-história, a arte africana, a arte egípcia.

Ao trazer a característica errante de Picasso, quanto a se dispor a mudar seus métodos, você estaria se referindo à atitude terapêutica de pesquisa, a qual citou anteriormente, que pretende assumir? E que mudança seria essa?

Na verdade, mais que me referir a método ou a metodologia de pesquisa, quero adotar uma atitude metodológica de pesquisa de caráter terapêutico desconstrucionista que se descomprometa com o caráter verificacionista, em estabelecer relações de causa e efeito, em apresentar resultados. Nem mesmo de estabelecer categorizações para enquadramento de tipos de usos de abordagens pedagógicas no ensino de matemática. Submeter os jogos de cena dos professores e coordenadores à espectralização, buscar semelhanças/aproximações, discordâncias e até oposições pode esclarecer modos essencialistas, privilegiados, nos usos da matemática escolar nas práticas pedagógicas em questão.

De acordo com Gombrich (1979a)48, muitos críticos consideraram um insulto à sua inteligência esperar que acreditassem que um violino “tem esse aspecto”. Mas, como salienta Oliveira (2005, p. 17), Picasso não queria insultar ninguém e muito menos imitar com sua pintura uma fotografia de um violino. Ele tinha outros propósitos, e propósitos justificados e interessantes. Assim como na arte parece não fazer sentido comparar modos tão diferentes de representar as coisas do mundo – o modo cubista, o modo fotográfico, o modo grego, o modo renascentista, o modo egípcio, etc. 49 – e questionar qual seria a melhor forma de fazê-lo, no ensino de matemática também não tem sentido buscar a melhor maneira de abordá-la na atividade humana escolar.

Cada uma das perspectivas artísticas teve seus propósitos distintos para suas representações de mundo visível, do mesmo modo, cada uma das perspectivas pedagógicas de abordagem da matemática no âmbito escolar tem suas particularidades e propósitos socioculturais para as aplicações pedagógicas que faz. Portanto, não haveria uma única forma ou um único critério que permitisse a avaliação, a comparação entre as diversas perspectivas que integram o campo da prática pedagógica no ensino de matemática para o Ensino Fundamental I, que é o foco desta pesquisa.

48

Ibid. (p. 458). Grifo do autor.

(27)

2. PERSPECTIVAS WITTGENSTEINIANA E DERRIDIANA DE PESQUISAR

Inspirada numa perspectiva derridiana de desconstrução, metaforicamente ao movimento cubista - que deixa ver as facetas ocultas dos personagens representadas num mesmo plano - busco rastros dos usos das práticas escolares de mobilização de matemática pelo Programa de Aperfeiçoamento na Linguagem Matemática - PALMA, pelos professores e coordenadores do Ensino Fundamental de uma cidade do interior do estado de São Paulo.

A abreviação PALMA percorrerá todo o texto, dada a remissão reiterada, ao longo dele, ao Programa de Aperfeiçoamento na Linguagem Matemática, pelo fato de que todos os envolvidos na pesquisa, em algum momento, estiveram ou estão inseridos neste programa de formação contínua em educação matemática para professores do Ensino Fundamental I. Nos rastros de meus próprios rastros, (re)significo um caminho já trilhado com a Arte, devido à minha primeira graduação ser licenciatura e bacharelado em Educação Artística pelo Instituto de Arte - Unicamp.

Envolta neste movimento de leituras, discussões e análises, ou seja, nos vários espectros que me acompanham desde que ingressei no programa de mestrado, proponho-me a realizar uma aproximação com a atitude metodológica de caráter terapêutico-desconstrucionista50, inspirada em Derrida51 e Wittgenstein52. Dessa forma, os jogos de cenas que acontecem neste texto espectralizam os conceitos fundantes desta pesquisa53.

A visão de uso da linguagem que trago aqui busca uma aproximação com fundamentos no segundo Wittgenstein54 que, como podemos ler em Peruzzo Júnior (2011, p.

50 Marim (2014, p. 15).

51 Derrida (1986; 1993;2004;2005). 52

Wittgenstein (1979; 1992).

53 O jogo de cenas traz os espectros de textos no quais busquei me referenciar, discussões sobre as atitudes

metodológicas de pesquisa do Grupo PHALA, entrevistas com professores e coordenadores do Ensino Fundamental I de Mogi Guaçu, documentos do PALMA - Programa de Aperfeiçoamento na Linguagem Matemática e rastros dos rastros de minha formação como pessoa e como profissional. Não é unicamente o

corpus da pesquisa que constitui este texto, mas também rastros dos rastros da pesquisadora, registrados numa

aproximação com a perspectiva derridiana e wittgensteiniana de se fazer pesquisa.

54

O austríaco Ludwig Wittgenstein (1889-1951) é considerado um dos mais importantes filósofos do século XX. Herdeiro da lógica moderna de Frege e Russell deu continuidade de forma original às indagações que buscavam elucidar a capacidade e os limites da linguagem natural em exprimir o pensamento (MORENO, 2005). É um filósofo da virada linguística, denominado também como sendo do movimento pós-virada linguística, que compreende a linguagem como constitutiva das e pelas práticas socioculturais e o sujeito como um lugar discursivo, ou seja, como um sujeito que se constitui e é constituído a partir de jogos compartilhados e normatizados. Nesse sentido, para Monteiro et al ( 2010), “os sujeitos envolvidos em diferentes práticas sociais, dentre elas a prática escolar (professores e alunos), constituem-se a partir dos lugares que ocupam e também da forma como ocupam esses lugares. Importa compreender as forças que permitem ou impedem os sujeitos a

(28)

88), “concebe a linguagem como uma forma de ação, [...] faz ver que o significado se dá no contexto de atividades humanas podendo, portanto, variar”.

A linguagem não tem essência e nem uma função referencial: a significação não é agregada à palavra e esta não substitui um objeto. Seu sentido se faz no jogo, quando jogado. “[...] é uma vasta coleção de diferentes práticas cada qual com sua própria lógica.” (GRAYLING, 2002, p. 90).

A partir dessa visão, não faz sentido verificar se significados mobilizados no curso são didaticamente transpostos para as práticas de sala de aula. Cada jogo de linguagem mobiliza significados diferentes de uma palavra, de uma enunciação. Contudo, Wittgenstein (1992, p. 14) não considera os jogos de linguagem como partes incompletas de uma linguagem, mas como linguagens completas em si mesmas, como sistemas completos da comunicação humana. Por outro lado, ao se referir aos processos denominamos “jogos”, de todos os tipos, é possível verificar que há semelhanças e parentescos comuns entre todos, não havendo assim, uma essência única entre eles, pois muitas coisas se perdem entre um e outro jogo. A estas características comuns entre os jogos de linguagem, como cita Pires e Moura (2013, p. 6), Wittgenstein atribui a expressão semelhanças de família.

Considere, por exemplo, os processos que chamamos de “jogos”. Refiro-me a jogos de tabuleiro, de cartas, de bola, torneios esportivos, etc. o que é comum a todos eles? Não diga: “algo deve ser comum a eles, senão não se chamariam ‘jogos’”, - mas veja se algo é comum a eles todos. - Pois, se você os contempla, não verá na verdade algo que fosse comum a todos, mas verá semelhanças, parentescos, e até toda uma série deles. Como disse: não pense, mas veja! - Considere, por exemplo, os jogos de tabuleiro, com seus múltiplos parentescos. Agora passe para os jogos de cartas: aqui você encontra muitas correspondências [...] traços comuns desaparecem e outros surgem. Se passarmos agora aos jogos de bola [...] São todos ‘recreativos’? Compare o xadrez com o jogo da amarelinha. Ou há em todos um ganhar e um perder, ou uma concorrência entre os jogadores? [...] Nos jogos de bola há um ganhar e um perder; mas se uma criança atira a bola na parede e a apanha outra vez, esse traço desapareceu [...] E assim podemos percorrer muitos, muitos outros grupos de jogos e ver semelhanças surgirem e desaparecerem. E tal é o resultado desta consideração: vemos uma rede complicada de semelhanças, que se envolvem e se cruzam mutuamente. Semelhanças de conjunto e de pormenor. Não posso caracterizar melhor essas semelhanças do que com a expressão “semelhanças de família”; pois assim se envolvem e se cruzam as diferentes semelhanças que existem entre os membros de uma família: estatura, traços fisionômicos, cor dos olhos, o

ocuparem certos lugares assim como os efeitos que esses lugares imprimem naqueles que os ocupam”. Portanto, busco inspiração na segunda fase de Wittgenstein, mais especificamente em sua obra intitulada Investigações

(29)

andar, o temperamento, etc., etc. - E digo: os “jogos” formam uma família. (WITTGENSTEIN, 1979, § 66-67).

Penso que essas semelhanças de família55 entre os jogos de linguagem situados no curso de formação, nas práticas de sala de aula e nas narrativas das entrevistas dos professores são possíveis de serem observadas nesse processo investigativo, dada a linguagem ser sempre uma vivência, uma experiência. No caso desta pesquisa, as práticas escolares de mobilização de matemática são problematizadas no contexto dos jogos de linguagem compostos a partir do

corpus da pesquisa. Segundo Grayling (2002, p. 96), Wittgenstein considera que para

entender os funcionamentos da linguagem devemos primeiro reconhecer sua variedade e multiplicidade.

A expressão linguagem matemática, contida no título do programa de formação de professores, foco desta pesquisa, é entendida nos usos didático-pedagógicos que mobilizam conceitos matemáticos escolares. Não se restringe, portanto, ao uso que dela faz a comunidade dos matemáticos, ou seja, daqueles que produzem e resolvem problemas da ciência matemática. Há diferentes usos dessa expressão, dependendo dos diferentes jogos de linguagem que a mobilizam. Ao pesquisar a expressão matemática, em publicações e pesquisas recentes no âmbito da Educação Matemática, Vilela (2013, p. 22) observou diversas adjetivações deste termo:

[...] matemática acadêmica, matemática escolar, matemática pura, matemática formal, matemática informal, matemática aplicada, matemática pura superior, matemática pedagógica, matemática não pedagógica, matemática universitária, matemática do cotidiano, matemática da vida cotidiana, matemática burguesa, matemática proletária, matemática da rua, matemática clássica, matemática intuicionista, matemática profissional, matemática dos profissionais do comércio, matemática dos ceramistas, matemática dos agricultores, matemática chinesa, matemática dos incas, matemática do cotidiano indígena, matemática indígena, matemática da criança de rua, matemática oral, matemática escrita, matemática institucional, matemática de classe dominante, matemática profissional, matemática dos oprimidos, matemática da criança antes da escolarização, matemática platonista, matemática anti-platonista, matemática subcientífica, matemática dogmática, matemática em uso, etc.

Cada uma das adjetivações acima descritas por Vilela (2013) remete a jogos distintos da linguagem matemática.

55 A expressão semelhanças de família (Familienänhlichkeiten) foi usada pela primeira vez por Niezstche em sua

obra, Para além de bem e do mal, mas foi adotada por Wittgenstein em seus ataques ao dogmatismo e ao essencialismo. (VEIGA-NETO e LOPES, 2007, P. 11).

(30)

A seguir, inspirada em Vilela (2013), relaciono alguns significados da expressão

linguagem matemática (aqui destacada em itálico, o que não ocorre nos textos originais), em

diferentes publicações voltadas aos usos didático-pedagógicos:

1. [...] forte relação entre a linguagem materna e a linguagem matemática. [...] atividades importantes para que a linguagem matemática não funcione como um código indecifrável para os alunos (BRASIL, 2001, p. 64).

2. Interpretar e produzir escritas numéricas, levantando hipóteses sobre elas, com base na observação de regularidades, utilizando-se da linguagem oral, de registros informais e da linguagem matemática (Ibid., p. 65).

3. [...] valorizar essa linguagem como forma de comunicação (Ibid., p. 81). 4. [...] Ao assumirmos que é responsabilidade do ensino de matemática que os alunos se comuniquem usando a linguagem específica da matemática em conjunto com todas as demais formas de linguagem, [...] (SMOLE, DINIZ e MILANI, 2007, p. 12).

5. [...] diferenças e semelhanças entre a linguagem natural e a linguagem

matemática bem como a utilização de metáforas no ensino e na

aprendizagem da Matemática (MATOS e SERRAZINA, 1996, p. 32). 6. [...] a pouco e pouco [os alunos] verão a necessidade da linguagem

matemática, habituar-se-ão a usá-la para comunicar entre si, e aprenderão a

ler e escrever Matemática. [...] Quanto a linguagem matemática, devemos entender que ela não é um fim do ensino da Matemática em si mesma, mas sim um meio de expressão das ideias e dos raciocínios matemáticos que os alunos vão adquirindo progressivamente.[...] (Ibid., p. 49).

7. Uma das principais funções da linguagem é o de transmitir significado. Parte da aprendizagem da Matemática consiste em adquirir domínio sobre os termos matemáticos de modo a ser capaz de os utilizar no discurso e tirar deles significado, mais propriamente fazer Matemática. Vamos analisar algumas diferenças entre a linguagem matemática, por exemplo, algumas palavras têm um significado ou função gramatical diferente. Na linguagem do dia-a-dia funcionam de modo semelhante a adjetivos (CUNHA e CINTRA, 1985): um livro, dois elefantes, vinte blocos. No discurso matemático são substantivos, constituindo um dos primeiros conjuntos de objetos matemáticos, os quais por sua vez têm propriedades como ser par ou ímpar, ou primo (Ibid., p. 49).

8. [...] Os humanistas muito raramente leem alguma coisa sobre as ciências, além daquilo que encontram nos jornais. Parte das razões para isso é que o assunto das humanidades diz respeito a sons, visão e à linguagem comum. A linguagem da ciência, com sua substancial sublinguagem matemática, é uma barreira formidável ao humanista (DAVIS e HERSH, 1985, p. 78).

9. Uma resposta muito popular tem sido a de que Deus é um matemático. Se, como Laplace, não pensarmos que a deidade é uma hipótese necessária, podemos formular isso da seguinte maneira: o universo se expressa naturalmente na linguagem da matemática (Ibid., p. 97).

10. Alguns aspectos da matemática não são muito mencionados nas histórias contemporâneas da mesma. Estamos falando do comércio e negócios, guerra, misticismo numérico, astrologia e religião. Em alguns casos, a informação básica ainda não foi reunida; em outros, os escritores, na esperança de atribuir à matemática uma linguagem nobre e uma existência científica pura, desviaram o olhar (Ibid., p. 118).

(31)

11. Em verdade, acredita-se que qualquer texto matemático pode ser formalizado no contexto de uma única linguagem formal. Esta linguagem é a linguagem da teoria formal dos conjuntos. [...] Qualquer texto da lógica

matemática explica as regras sintáticas desta linguagem (Ibid., p. 167).

12. [...] A matemática pode ser expressa em linguagem que emprega um número finito de símbolos encadeados em sentenças de comprimento finito (Ibid., p. 185).

13. O trabalho aconteceu com crianças que apresentavam uma característica interessante em relação à linguagem matemática: sabiam decompor os numerais em unidades, dezenas e centenas, porém não tinham a noção do “todo”, ou seja, de quantas unidades havia nas dezenas ou ao todo em um numeral. Isso me preocupava bastante, mas as crianças ainda tinham sete anos (crianças mais novas) e seria necessário explorar a linguagem

matemática no concreto, retomando alguns conceitos e construindo outros

(LOPES, 2003, p. 43).

14. Ao dar linguagem ao conceito (matemático) dá conteúdo e linguagem a sua experiência de enumerar, medir e calcular, desenvolvendo, desta forma, pensamento e linguagem de seu modo singular de ver o mundo o qual, sob a mediação do educador tende a se aproximar, por movimentos próprios de aprender daquele da ciência. (LOPES e MOURA, 2003, p. 8).

15. [...] Ainda não haviam elaborado uma linguagem matemática em que pudessem traduzir livremente este problema. (ao se referir ao paradoxo de Aquiles e da tartaruga) [...] Em sua linguagem matemática, nada havia para indicar que, quando a máquina diminui a velocidade, abaixo de um certo limite, enguiça (HOGBEN, 1950, p. 23).

16. Segundo o ponto de vista adotado neste livro a matemática será a

linguagem das grandezas, cuja compreensão é parte precípua do preparo

intelectual de todo cidadão inteligente. Se as regras da matemática são da natureza das gramaticais, não constitui vergonha o não perceber a evidência das verdades matemáticas. Precisamos aprendê-las (Ibid., p. 32).

17. A linguagem matemática difere da linguagem da vida cotidiana por ser, em essência, uma linguagem racionalmente planejada. Na linguagem das grandezas, não há lugar para os sentimentos particulares, quer individuais, quer nacionais (Ibid., p. 36).

18. Falar em matemática como linguagem das grandezas e em regras matemáticas, como regras gramaticais, é mais do que simples figura de retórica. Muito contribui, para a compreensão da matemática, [...] (Ibid., p. 76).

Dentre esses significados é possível observar que a linguagem matemática foi mobilizada em vários contextos didático-pedagógicos com semelhanças e diferenças entre si.

Para a filosofia de Derrida (1986; 1993), desconstruir não é uma operação reflexiva ou auto-referencial, mas uma operação que aciona forças heterogêneas presentes em um texto e que deslocam esse próprio texto, num processo de produção da identidade e da diferença. Um signo possui em si um rastro daquilo que ele substitui.

(32)

Afirmo que a desconstrução não é essencialmente filosófica, e que não se limita a um trabalho do filósofo profissional sobre um corpus filosófico. A desconstrução está em toda parte. Hoje se leva em consideração o fato de que a temática - inclusive a temática explícita da desconstrução sob este nome – está implantada em áreas que não têm nenhuma relação direta com a filosofia, não só em áreas artísticas, como a arquitetura ou pintura, como também em outros fora as belas artes ou a literatura56 (DERRIDA, 1986, p. 3).

Ao consultar uma palavra no dicionário, este fornece uma definição ou um sinônimo da palavra pretendida. A definição do dicionário remete a outras palavras, outros signos, como rastros de um significado que não se concretiza em si mesmo. “[...] sua existência é marcada unicamente pela diferença que sobrevive em cada signo como traço, como fantasma e assombração [...]” (SILVA, 2000, p. 78).

O significado das palavras faz sentido para os participantes do jogo de linguagem que as mobiliza. Para nos destituirmos de significados únicos e verdadeiros é preciso percorrer os diferentes usos em diferentes jogos. O deslocamento de significados se assemelha à desconstrução dos signos por seus rastros.

A identidade e a diferença não podem ser compreendidas fora do sistema de significação nos quais adquirem sentido. Isso não significa que são determinadas pelos sistemas discursivos e simbólicos que lhes definem. Para Silva (2000, p. 77) “ocorre que a linguagem, entendida aqui de forma mais geral como sistema de significação, é, ela própria, uma estrutura instável”.

O processo de construção de uma visão panorâmica dos múltiplos e diferentes usos de uma palavra ou de uma proposição é semelhante a um processo terapêutico onde, segundo Wittgenstein (1979), citado por Moreno (2005, p. 259), “as afirmações feitas pelo terapeuta, no decorrer do processo descritivo, revelam apenas os pontos de apoio no diálogo e as estratégias empregadas para a cura.” Para Wittgenstein (1979, § 122), a representação panorâmica permite a compreensão, que consiste justamente em “ver as conexões”. Daí a importância de encontrar e descrever articulações intermediárias nas práticas escolares de mobilização de matemática no âmbito escolar.

A “dieta unilateral”, segundo Wittgenstein (1979, § 593), consiste num uso exclusivista e privilegiado de determinados significados, o que pode gerar uma visão dogmática, por exemplo, da matemática escolar. A terapia, ao percorrer outros usos, pretende

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Referências

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