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ASPECTOS PROCESSUAIS DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA DOUTORADO EM DIREITO

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ASPECTOS PROCESSUAIS DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA

DOUTORADO EM DIREITO

(2)

ASPECTOS PROCESSUAIS DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA

Tese apresentada à Banca Examinadora

da Pontifícia Universidade Católica de

São Paulo, como exigência parcial para

obtenção do título de DOUTOR em

Direito Processual Civil, sob a orientação

da Professora Doutora TERESA

ARRUDA ALVIM WAMBIER.

(3)

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(4)

Ao NOSSO SENHOR e SALVADOR JESUS CRISTO, luz espiritual e

salvação de toda a humanidade, que me concedeu bênçãos para a elaboração

deste trabalho.

À memória de meus pais, MANUEL MARIA PINTO RAMALHO e

BENITA GARCIA VAQUERO, como demonstração de amor e gratidão.

Ao meu esposo, MARTIN LINO LEYSER e à minha filha MARIA

CAROLINA VAQUERO RAMALHO LEYSER, como reconhecimento do

meu amor e carinho.

À professora e orientadora TERESA ARRUDA ALVIM WAMBIER, pela

paciência, incentivo e apoio na conclusão deste curso.

Aos mestres JOSÉ MANOEL DE ARRUDA ALVIM NETTO e THEREZA

(5)

RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo o estudo da tutela jurisdicional

coletiva. Em primeiro lugar, procurou-se conceituar as categorias de

interesses transindividuais, destacando a ação civil pública como tutela

diferenciada. Em seguida, procurou-se apontar os antecedentes da lei da

ação civil pública e a legislação posterior. Delimitou-se o objeto da

ação civil pública e, finalmente, foram apontados aspectos processuais

da tutela coletiva.

Os interesses coletivos lato sensu sempre existiram, todavia,

anteriormente estavam a cargo da Administração Pública e hoje

ganharam importância, a ponto de se tornar necessária sua tutela, por

parte da jurisdição. O processo é um instrumento e, como tal, tem valor

se for apto a atender seus fins, permitindo a adequada aplicação do

direito subjetivo, de modo a promover a pacificação social com justiça.

Nesse ponto, a demanda coletiva proporciona a efetiva tutela

jurisdicional dos interesses metaindividuais. A evolução do processo

coletivo brasileiro fica patenteada no exame da legislação vigente, que

vem buscando, a cada dia, o reconhecimento, proteção e implantação

instrumental da tutela judicial coletiva.

No exame das questões processuais do processo coletivo, procurou-se

destacar que as premissas válidas para as ações individuais são

insuficientes para viabilizar a adequada dimensão e operatividade das

(6)

This work aims at the study of judicial protection collective. Firstly, tried to define the categories of overindividual interests, highlighting the action as a civil public guardianship differently. Then tried to pinpoint the history of the law of civil public action to subsequent legislation. The object of the action civil public was limited itself and, finally, have been identified procedural aspects of collective authority.

The collective interests “lato sensu” always existed, however, were previously in charge of Public Administration and today gained importance, to the point of becoming their supervision required by the court. The process is a tool and as such, has value if it is able to fulfill its purpose, allowing the proper application of the law subjective, so as to promote peace with social justice. At this point, demand collective provides the effective judicial protection of the overindividual interests. The evolution of the process is patented in the Brazilian collective examination of the existing legislation, which is seeking, every day, the recognition, protection and deployment of instrumental collective judicial supervision.

(7)

S U M Á R I O

I – CATEGORIAS DE INTERESSES ... 11

1 – Interesse e interesse jurídico ... 11

2 – Interesse público ... 13

3 – Interesses metaindividuais ou transindividuais ... 15

3.1 – Interesses difusos ... 20

3.2 – Interesses coletivos ... 22

3.3 – Interesses individuais homogêneos ... 23

II – A AÇÃO CIVIL PÚBLICA COMO TUTELA CIADA ... 27

1 – Conceito de tutela jurisdicional ... 27

2 – A efetividade da tutela jurisdicional ... 29

2.1 – As tutelas diferenciadas ... 32

2.2 – A cognição em tema de tutelas diferenciadas ... 35

2.3 – Tipos de tutelas diferenciadas no direito processual civil brasileiro ... 37

III – ANTECEDENTES DA LEI DA AÇÃO CIVIL CA E LEGISLAÇÃO POSTERIOR ... 40

1 – Ação popular ...40

2 – Ação civil pública ... 51

3 – Constituição Federal de 1988 e legislação posterior ... 55

4 – Mandado de segurança coletivo ... 56

IV – OBJETO DA LEI DA AÇÃO CIVL PÚBLICA – LEI Nº 7.347/85 ... 70

1 – Campo de incidência ... 70

1.1 – Meio ambiente ... 71

1.2 – Consumidor ... 76

1.3 – Bens e direitos de valor artístico,estético, histórico, turístico e paisagístico ... 78

(8)

1.4.1 – Defesa das pessoas portadoras de

cia ... 84

1.4.2 – Defesa dos investidores do mercado de lores mobiliários ... 86

1.4.3 – Defesa da criança e do adolescente ... 87

1.4.4 – Código de Defesa do Consumidor ... 90

1.4.5 – Lei de Improbidade Administrativa ... 94

1.4.5.1 – Conceito de improbidade trativa ... 94

1.4.5.2 – Legitimação para agir ... 97

1.4.5.3 – Competência: a questão do foro privilegiado ... 101

1.4.5.4 – Notificação prévia do demandado 109

1.4.5.5 – Medidas acautelatórias na ação de improbidade administrativa ... 110

1.4.5.6 – Sanções do art.12 da Lei de bidade administrativa ... 114

1.4.5.7 – Prescrição ... 117

1.4.6 – Defesa do idoso ... 120

1.4.7 – Defesa das mulheres ... 123

1.5 – Defesa da ordem econômica e da livre concorrência 124 1.6 – Ordem urbanística ... 126

2 – Causa de pedir e pedido ... 130

V – COMPETÊNCIA ... 135

1 – Jurisdição e competência ... 135

1.1 – Distribuição da competência ... 137

1.2 – Critérios determinantes da competência ... 138

1.3 – Competência da Justiça Federal ... 138

1.4 – Competência absoluta e relativa ... 139

2 – Foro competente para a propositura da ação civil ca e ações coletivas do Código de Defesa do Consumidor 140

2.1 – Competência objetiva em razão da matéria ... 140

2.2 – A determinação do foro competente:dano de âmbito local ... 141

2.3 – A determinação do foro competente:dano de âmbito regional ou nacional ... 142

(9)

2.5 – Interesses individuais homogêneos ... 145

3 – Competência das ações civis públicas envolvendo tões de meio ambiente do trabalho ... 146

VI – LEGITIMAÇÃO PARA AGIR ... 148

1 – Generalidades ... 148

2 – Espécies de legitimação: ordinária e extraordinária ... 149

3 – Legitimação ativa na Lei da Ação Civil Pública ... 150

4 – Natureza jurídica da legitimidade ativa ... 152

5 – Legitimados ativos ... 157

5.1 – Ministério Público ... 158

5.2 – Defensoria Pública ... 168

5.3 – Entes políticos: União, Estados, Municípios, Distrito Federal e seus órgãos ... 169

5.4 – Associação, sociedade, fundação e sindicatos ... 171

6 – Legitimidade passiva nas ações coletivas ... 177

VII – INQUÉRITO CIVIL ... 184

1 – Generalidades ... 184

2 – Instauração, competência e objeto ... 186

3 – Instrução e sigilo ... 187

4 – Conclusão ... 189

5 – Arquivamento e seu controle ... 189

6 – Recursos no inquérito civil ... 191

7 – Compromisso de ajustamento de conduta ... 193

VIII – TUTELA CAUTELAR, ANTECIPAÇÃO DA TUTELA PROVIMENTOS CAUTELARES ... 199

1 – Considerações sobre o processo cautelar ... 199

1.1 – A liminar na medida cautelar ... 204

1.2 – Natureza jurídica da liminar ... 206

1.3 – Pressupostos da concessão ... 207

1.4 – Ação cautelar e ação civil pública ... 210

2 – Tutela antecipada e específica ... . 213

2.1 – Requisitos para concessão ... 214

(10)

2.3 – Revogação e modificação ... 218

2.4 – Tutela antecipada e específica nas ações coletivas. 219 3 – A liminar na ação civil pública ... 220

IX – INTERVENÇÃO DE TERCEIROS NAS AÇÕES TIVAS ... 227

1 – Introdução ... 227

2 – Oposição e nomeação à autoria ... 229

3 – Denunciação da lide ... 231

4 – Chamamento ao processo ... 232

5 – Assistência e litisconsórcio ... 233

X – SENTENÇA, COISA JULGADA E LITISPENDÊNCIA NAS AÇÕES COLETIVAS ... 238

1 – Sentença... 238

1.1 – Classificação das sentenças ... 239

1.2 – Sentenças nas ações coletivas ... 239

1.3 – Sentença condenatória na ação de improbidade nistrativa ... 241

1.4 – A sucumbência nas ações coletivas ... 241

2 – Coisa julgada ... 244

2.1 – A legislação brasileira para as ações voltadas à sa de interesses e direitos difusos e coletivos ... 245

2.2 – A coisa julgada no sistema do Código de Defesa do Consumidor ... 247

2.2.1 – Coisa julgada erga omnes e coisa julgada ultra partes ... 253

2.2.2 – Transposição in utilibus da coisa julgada da Lei nº 7.347/85 e das ações penais para as ações de indenização por danos te sofridos ... 257

2.3 – Litispendência nas ações coletivas ... 259

2.4 – Class Action do Direito Norte-Americano ... 264

(11)

XI – LIQUIDAÇÃO E CUMPRIMENTO DAS SENTENÇAS

NAS AÇÕES COLETIVAS ... 270

1 – Liquidação de sentença ...270

1.1 – Formas de liquidação de sentença ... 271

1.1.1 – Liquidação por cálculo ... 271

1.1.2 – Liquidação por arbitramento ... 272

1.1.3 – Liquidação por artigos ... 272

1.2 – Liquidação de sentença nas ações coletivas ... 273

2 – Cumprimento de sentença ... 275

3 – Fundo para reparação dos interesses difusos lesados ... 281

XII – CONCLUSÕES ... 285

(12)

CAPÍTULO I CATEGORIAS DE INTERESSES

SUMÁRIO: 1. Interesse e interesse jurídico – 2. Interesse público – 3. Interesses metaindividuais ou transindividuais: 3.1. Interesses difusos – 3.2. Interesses coletivos – 3.3.. Interesses individuais homogêneos

1. Interesse e interesse jurídico

A doutrina não estabeleceu um conceito

preciso de interesse. A propósito, pontifica EMÍLIO BETTI: “Le

nozione correnti di interessi sono approssimative e imprecise: difetti,

questi, che in generale hanno radice nella erronea impostazione del

concetto in termine psicologici, anziche in termine normative”1.

Acompanhando CARNELUTTI2, podemos dizer como interesse “a posição favorável à satisfação de uma

necessidade”.

Considerando o interesse sob o ponto de

vista do seu sujeito, podemos entendê-lo como uma necessidade, ao

passo que, visto sob o ângulo de seu objeto, ele representa uma

utilidade.

1Emílio BETTI, “Interesse (Teoria Generale)” in Novíssimo Digesto Italiano, Utut, Milão, 1962.

2Francesco CARNELUTTI, Sistema de Diritto Processuale Civile, Pádua, 1936, p. 7

(13)

Nesse diapasão, os interesses se apresentam

numa variedade muito grande. Todavia, vamos examinar a acepção

jurídica que se emprega à palavra interesse3.

No caso, vamos considerar o conceito de

JOSÉ CRETELLA JÚNIOR4, o qual preleciona que interesse “é a vontade do homem dirigida a atingir uma finalidade. Se o interesse é

protegido pela norma jurídica estamos diante de direito”.

Para PÉRICLES PRADE5, “interesse

jurídico significa a relevância de ordem material ou também

instrumental, subjetivada ou não subjetivada, conferida pelo direito

positivo a determinadas situações respeitantes ao indivíduo isolado, ao

grupo ou à coletividade maior”.

O interesse jurídico é aquele que possui

valor material ou processual, outorgado pelas normas do direito

3“O interesse há de ser entendido como a íntima relação entre a necessidade do ser humano e o

bem da vida apto a satisfazê-la, que pode consistir em um objeto individualizado, uma coisa, ou em um serviço. Cabe ao direito, como inegável técnica de disciplina da convivência social, definir, num primeiro momento, quais os interesses que serão privilegiados, no sentido de merecerem a proteção legal e quais os que serão deixados de fora dessa proteção, tendo em vista que, embora os bens da vida sejam limitados, as necessidades humanas são ilimitadas, de modo que sempre restarão desprotegidos certos interesses....Os interesses que recebem a tutela do direito, em detrimento de outros e que, por isso, são interesses protegidos, constituem os chamados direitos subjetivos, cuja concepção, embora não aceita por grandes juristas, constitui o principal fundamento de todo o sistema do direito positivo do mundo moderno, com natureza marcadamente individual” (Francisco Wildo Lacerda DANTAS, “A execução específica e os interesses metaindividuais” in Revista dos Tribunais volume 712, fev., 1995, p. 25).

4Introdução ao Estudo do Direito, Rio de Janeiro, Editora Forense, 1984, p.162.

(14)

positivo, pertinentes tanto a indivíduos isoladamente considerados

como à coletividade, definida ou não.

2. Interesse público

A antiga definição de interesse público

identifica-o, exclusivamente, como o interesse dos órgãos da

Administração, ou seja, o interesse do Estado enquanto pessoa jurídica

de direito público.

Com o passar do tempo, esse conceito foi

ampliado, de modo que passou a significar também o interesse da

coletividade como um todo, isto é, o interesse do bem comum.

Nessa linha de entendimento, na precisa

lição de HÉLIO TORNAGHI6, o interesse público é conceituado como “aquele que afeta diretamente o bem comum, identificando-se como

interesse da coletividade como um todo, opondo-se ao interesse

particular, que concerne apenas a determinado indivíduo, embora possa

ser útil a todos”.

Desse modo, o interesse público não só

coincide com o interesse do Estado, como pessoa jurídica, como se

confunde com os interesses difusos, como, por exemplo, o meio

ambiente ecologicamente equilibrado. “Hoje a expressão interesse

6Comentários ao Código de Processo Civil, volume I, 2ª edição, São Paulo, Editora Revista dos

(15)

público tornou-se equívoca, quando passou a ser utilizado para alcançar

também os chamados interesses sociais, os interesses indisponíveis do

indivíduo e da coletividade, e até os interesses coletivos ou os

interesses difusos etc. O próprio legislador não raro abandona o

conceito de interesse público como interesse do Estado e passa a

identificá-lo com o bem geral, ou seja, o interesse geral da sociedade ou

o interesse da coletividade como um todo. Em segundo lugar, porque,

nos últimos anos, tem-se reconhecido que existe uma categoria

intermediária de interesses que, embora não sejam propriamente

estatais, são mais que meramente individuais, porque são

compartilhados por grupos, classes ou categorias de pessoas, como os

moradores de uma região quanto a questões ambientais comuns, ou os

consumidores de um produto quanto à qualidade ou ao preço dessa

mercadoria”7.

O conceito abrangente de interesse público

alcança o interesse público primário e o interesse público secundário, os

quais, nem sempre, coincidem ou são uma só coisa. O interesse público

primário é o interesse do bem geral, isto é, o interesse da sociedade ou

da coletividade como um todo. Já, o interesse público secundário é o

interesse público visto pelos órgãos da Administração, o qual, nem

sempre, coincide com o efetivo interesse da comunidade.

3. Interesses metaindividuais ou transindividuais

7Hugo Nigro MAZZILLI, A defesa dos interesses difusos em juízo, 20ª edição, São Paulo, Editora

(16)

A partir de 1974, com os trabalhos de

MAURO CAPPELLETTI8, sofreu dura crítica a tradicional divisão de interesse, que reunia, como únicas modalidades, o interesse privado,

entendido como o interesse individual (surgido nas relações entre as

pessoas) e o interesse público secundário (titularizado pelo Estado

enquanto Administração Pública).

Em uma obra ímpar, em que discutem os

problemas do acesso à justiça, MAURO CAPPELLETTI e BRYANT

GARTH9 propugnavam a existência de uma zona intermediária de interesses, em que o titular não seria o cidadão, individualmente

considerado, nem o Estado, enquanto pessoa jurídica de direito público.

Eles começaram a enfatizar a existência dos interesses coletivos, ou

seja, “aqueles referentes a uma categoria de pessoas (como os

condôminos de um edifício de apartamentos, os sócios de uma empresa,

os membros de uma equipe esportiva, os empregados do mesmo

patrão)”. Esses interesses, porque atingem grupos de pessoas que têm

8“Formazione sociali e interessi di gruppo davanti alla giustizia civile” in Revista di Diritto

Processuale volume 30, 1975, p. 367.

9“Interesses difusos são interesses fragmentados ou coletivos, tais como o direito ao ambiente

(17)

algo em comum e não o sujeito isoladamente, são chamados de

metaindividuais.

O liame que une os titulares de tais

interesses consiste em estarem todos na mesma situação de fato ou na

circunstância de compartilharem a mesma relação jurídica.

Um interesse é metaindividual quando,

além de ultrapassar o círculo individual, corresponde aos anseios de

todo um segmento ou categoria social. Dentro desses interesses

metaindividuais é possível estabelecer uma distinção entre aqueles que

atingem uma categoria determinada (ou determinável) de pessoas e os

que atingem um grupo indeterminado (ou de difícil determinação) de

indivíduos.

A expressão interesses difusos já era

conhecida dos romanos e encontra-se referida por VITTORIO

SCIALOJA10: “direitos públicos que chamávamos difusos, que não se concentram no povo considerado como entidade, mas que têm por

próprio titular realmente cada um dos participantes da comunidade”.

Esses direitos difusos representavam o culto

à divindade, o direito à liberdade, ao meio ambiente etc.

10Procedimiento civil romano, trad. Santiago Sentis Melendo e Marino Ayerra Reden, Buenos

(18)

Cumpre lembrar, após a contribuição do

direito romano para a tutela dos direitos difusos, a criação da figura do

ombudsman no direito escandinavo.

Os antecedentes do ombudsman se deram

na Suécia, no século XVI, com o surgimento do Grande Senecal

(drotsen), a quem incumbia velar, sob a autoridade do Rei, o bom

funcionamento e administração da justiça11.

O ombudsman nasceu com a finalidade de

exercer o controle da administração pública. Com o passar do tempo,

coube ao ombudsman o atendimento dos mais variados interesses

coletivos (consumidor, saúde pública etc.).

Após a iniciativa da Suécia, foi implantada

a figura do ombudsman na Finlândia (1919), na Dinamarca (1954), na

Noruega (1950), Inglaterra (1958), Nova Zelândia (1962), Irlanda do

Norte e Canadá (1967).

Na Alemanha e nos Estados Unidos há

instituições semelhantes ao ombudsman em pleno funcionamento.

Embora com outra denominação, temos as figuras do “Defensor Del

Pueblo” e “Provedor de Justiça” instituídas, respectivamente, na

Espanha12 e Portugal13, a nível constitucional.

11André LEGRAND, L’Ombudsman scandinave, Paris, LGDJ, 1970, pp. 22/23 . 12Conforme artigo 54 da Constituição de 27 de dezembro de 1978.

(19)

O ombudsman ou o organismo revestido de

outra denominação, conforme o país, somente defende os interesses

dito difusos no âmbito administrativo, cabendo ao Ministério Público,

tradicionalmente e, em regra, a tutela jurisdicional dos interesses

indisponíveis da sociedade.

Às vezes, o termo difuso parece a qualificar

o coletivo, como em HENRY SOLUS e ROGER PERROT14:

“l’extreme diversité des situations parti culières qui s’amalgament et se

juxtaposint au sien des groupements fait que l’intérêt allégué n’est pas

toujours un intérêt direct et persomel, mais un simple intérêt collectit

beaucoup plus diffus”.

Alguns autores entendem que os termos

interesse “difuso”, “coletivo”, “de grupo”, “meta” ou

“supra-individual” são sinônimos15, embora admitam haver tentativas de distinção desses conceitos16.

14Droit Judiciaire Privé, t. 1, Paris, ed. Sirey, 1966, p. 218.

15Ana De VITA diz: “la precisazione aprioristica è inevitabilmente o troppo astratta o troppo

generica. Tali concetti si intendono spesso con valore sinonimo e indubbiamente si riferis cono a situazioni per molti aspectti analoghe” (“La tutela degli interessi collettivi” in La tutela degli interessi diffusi nel diritto comparato, Milão, Giaffrè, 1976, p. 350).

16Celso BASTOS afirma: “os interesses coletivos dizem respeito ao homem socialmente

(20)

3.1 – Interesses difusos

Partindo-se do próprio texto do art. 81,

parágrafo único, inciso I do Código de Defesa do Consumidor extrai-se

o seguinte conceito: “interesses ou direitos difusos, assim entendidos,

móveis, esbatidos, a tornar impossível, ou quando menos superlativamente difícil, a individualização exata de todos os componentes, hipótese esta do interesse difuso” (“A ação popular do direito brasileiro como instrumento de tutela jurisdicional dos chamados interesses difusos” in Temas de Direito Processual, São Paulo, Saraiva, 1977, p. 112). Ada Pellegrini GRINOVER aduz: “embora se trate sempre de interesses meta-individuais, a doutrina reserva a denominação “coletivos” para os comuns a categorias de pessoas, unidas entre si por uma relação-base: a sociedade comercial, o condomínio, a família, os entes profissionais, o próprio sindicato. E esse vínculo jurídico, ou relação base, permite a identificação dos componentes do grupo. Ao contrário, entendem-se por interesses difusos aqueles que, não se fundando em um vínculo jurídico, repousam sobre dados de fato freqüentemente genéricos e contingentes, acidentais e mutáveis: morar na mesma região; consumir o mesmo produto, viver sob determinadas circunstâncias sócio-econômicas, submeter-se a particulares empreendimentos. Seus titulares são, portanto, uma pluralidade de pessoas, em número indeterminado e indeterminável” (“As garantias constitucionais do processo nas ações coletivas” in Revista de Processo volume 43, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1986. p. 22). Rodolfo de Camargo MANCUSO assevera: “conquanto os interesses coletivos e os difusos sejam espécies do gênero “interesses meta (ou super) individuais”, tudo indica que entre eles existem pelo menos duas diferenças básicas, uma de ordem quantitativa, outra de ordem qualitativa: sob o primeiro enfoque, verifica-se que o interesverifica-se difuso concerne a um universo maior do que o interesverifica-se coletivo, visto que enquanto aquele pode mesmo concernir até à toda humanidade, este apresenta menor amplitude, já pelo fato de estar adstrito a uma “relação-base”, a um “vínculo jurídico”, o que o leva a se aglutinar junto a grupos sociais definidos; sob o segundo critério, vê-se que o interesse coletivo resulta do homem em sua projeção corporativa, ao passo que no interesse difuso, o homem é considerado simplesmente enquanto ser humano” (Interesses difusos: conceito e legitimação para agir, 3ª edição, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1994, pp. 67/68). Acrescenta, ainda, Rodolfo de Camargo MANCUSO: “interesses difusos são interesses meta-individuais que, não tendo atingido o grau de agregação e organização necessário à sua afetação institucional junto a certas entidades ou órgãos representativos dos interesses já socialmente definidos, restam em estado fluído, dispersos pela sociedade civil como um todo (v.g., o interesse à pureza do ar atmosférico), podendo, por vezes, concernir a certas coletividades de conteúdo numérico indefinido (v.g., os consumidores). Caracterizam-se pela indeterminação dos sujeitos, pela indivisibilidade do objeto, por sua tendência à transição ou mutação no tempo e no espaço” (Op. cit., pp. 114/115). Também, o mesmo autor, preceitua: “quanto às notas caracterizadoras dos interesses coletivos temos: a) um mínimo de organização, a fim de que os interesses ganhem a coesão e a identificação necessárias; b) a afetação desses interesses a grupos determinados (ou ao menos determináveis) que serão os seus portadores (enti esponenziali); c) um vínculo jurídico básico, comum a todos os participantes, conferindo-lhes situação jurídica diferenciada” (Rodolfo

de Camargo MANCUSO, Comentários ao Código de Proteção ao Consumidor, coordenador

(21)

os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares

pessoas indeterminadas ou ligadas por circunstâncias de fato”.

Interesses difusos são aqueles em que os

titulares não são previamente determinados ou determináveis e se

encontram ligados por circunstâncias de fato. São interesses indivisíveis

e, embora comuns a uma categoria mais ou menos abrangente de

pessoas, não se pode afirmar com precisão a quem pertencem, nem em

que medida quantitativa são por elas compartilhados.

Para PÉRICLES PRADE17, “interesses difusos são interesses que pertencem de maneira idêntica a uma

pluralidade de sujeitos mais ou menos vasta e mais ou menos

determinada, a qual pode ser ou não unificada, e unificada mais ou

menos estreitamente, em uma coletividade”.

Em outras palavras, são interesses cujos

titulares não se pode determinar. A ligação entre eles se dá por

circunstâncias. O objeto é indivisível, de modo a não permitir cisão. É

difuso, por exemplo, o direito de respirar ar puro.

A indivisibilidade diz respeito ao objeto de

interesse. O interesse na boa qualidade do ar atmosférico ou a pretensão

ou pelo menos determinável, de pessoas unidas pela mesma relação jurídica básica, como grupos unidos por uma relação fática comum” (Op. cit., 6ª edição, pp. 21/22).

17O autor enumera as principais características: a) ausência de vínculo associativo; b) alcance de

(22)

ao meio ambiente sadio é compartilhado por um número indeterminado

de pessoas, embora não pertença individualmente a nenhuma delas, por

ser indivisível. Do mesmo modo, uma propaganda enganosa, veiculada

na televisão, atinge pessoas indeterminadas, tendo como fator de

ligação unicamente o fato de que tiveram acesso a ela. Não é

quantificável ou divisível o direito de cada integrante da sociedade para

que a propaganda seja coibida ou corrigida ou para que o meio

ambiente seja protegido.

Sobre a questão da indivisibilidade convém

trazer à colação a precisa lição de BARBOSA MOREIRA18, no sentido de que “os interesses coletivos ou difusos referem-se a um bem

(latíssimo senso) indivisível, no sentido de insuscetível de divisão

(mesmo ideal) em quotas atribuíveis individualmente a cada um dos

interessados. Estes se põem numa espécie de comunhão tipificada pelo

fato de que a satisfação de um só implica, por força, a satisfação de

todos, assim como a lesão de um só constitui, ipso facto, lesão da

coletividade”.

Assim, o direito difuso surge de uma

situação de fato, homogeneamente esparsa em um número indefinido de

indivíduos. São muitos os atores e contingências sociais que podem

relevar ou ensejar direitos difusos. De forma geral, isso sucede quando

os interesses envolvidos são de massa, implicando um número vasto e

lesões disseminadas (difusas) em massa; e) vínculos fáticos entre os titulares dos interesses” (Op. cit., 45 e 47-55).

18“A legitimação para a defesa dos ‘interesses difusos’ no direito brasileiro” in Revista Ajuris

(23)

indefinido de indivíduos, como ocorre em relação aos serviços

públicos, medicamentos, consumo em geral, controle ambiental,

qualidade de vida, direitos humanos, inflação, minorias raciais, política

econômica etc.

3.2 – Interesses coletivos

Ainda, partindo-se do próprio texto do art.

81, parágrafo único, inciso II do Código de Defesa do Consumidor

extrai-se o seguinte conceito: “interesses ou direitos coletivos, assim

entendidos, os transindividuais de natureza indivisível de que seja

titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a

parte contrária por uma relação jurídica base”.

São coletivos somente os interesses que

compreendem uma categoria determinada, ou pelo menos determinável,

de pessoas, dizendo respeito a um grupo, classe ou categoria de

indivíduos ligados pela mesma relação jurídica básica, entre eles (como

se dá num sindicato de classe) ou com a parte contrária (como por

exemplo, os pais de alunos de uma escola particular, onde todos estão

ligados por um vínculo jurídico – contrato – e titularizam, portanto, o

interesse coletivo de combater aumentos ilegais e abusivos da

mensalidade). Do mesmo modo que os difusos, os interesses coletivos

têm natureza indivisível, na medida em que não podem ser partilhados

individualmente entre os seus titulares. Admitido o interesse de um

(24)

3.3 –Interesses individuais homogêneos

Da mesma forma, o Código de Defesa do

Consumidor, no art. 81, parágrafo único, inciso III prescreve que “os

interesses ou direitos individuais homogêneos assim entendidos os

decorrentes de origem comum”19.

São os direitos individuais cujo titular é

perfeitamente identificável e cujo objeto é divisível e cindível.

Diferenciam-se, pois, dos interesses coletivos, em virtude da

divisibilidade do direito titularizado pelos vários sujeitos. O que

caracteriza um direito individual como homogêneo é a natureza

comum, similar, semelhante entre os interesses de cada um dos vários

titulares.

Esta foi a grande novidade do Código de

Defesa do Consumidor: permitir que esses direitos individuais

pudessem ser defendidos coletivamente em juízo. Não se trata de

pluralidade subjetiva de demandas (litisconsórcio), mas de uma única

demanda, coletiva, objetivando a tutela dos titulares dos direitos

19“Pensamos que o legislador teve em mira certas situações amiúde ocorrentes em nossa

(25)

individuais homogêneos, ainda que de conteúdo genérico a eventual

condenação daquele que tenha infringido tal modalidade de interesses

transindividuais (art. 95 da Lei nº 8.078/90).

Com relação aos interesses difusos, os

interesses individuais homogêneos têm um ponto de contato: ambos se

originam de circunstâncias de fato comuns. Diferenciam-se, contudo,

porque, enquanto, nos interesses difusos, os titulares são

indeterminados e o objeto é indivisível, nos interesses individuais

homogêneos, os titulares são determináveis e o dano ou a

responsabilidade se caracteriza pela divisibilidade, isto é, pela

possibilidade de mensurar individualmente a extensão do prejuízo e da

respectiva reparação.

Em relação aos interesses coletivos, os

interesses individuais homogêneos também têm um ponto de contato:

reúnem um grupo, uma categoria ou uma classe de pessoas. A diferença

está em que os interesses individuais homogêneos são divisíveis e

assentam-se em situações de fato comuns, já os interesses coletivos são

indivisíveis e fundados na mesma relação jurídica base.

A distinção entre interesses difusos,

coletivos e individuais homogêneos torna-se mais fácil, a partir do

exemplo do consumidor. Dessa forma, se numa série de bens de

consumo vendidos ao consumidor final, um deles foi fabricado com

(26)

defeito. O consumidor tem interesse individual na indenização

correspondente. Ainda, assim, será o interesse coletivo, quando toda a

série saía da fábrica com o mesmo defeito, embora vendida a vários

consumidores finais (hipótese que o Código de Defesa do Consumidor

denomina de interesses individuais homogêneos, prevendo-os no inciso

III do artigo 81) ou, também, quando se verificar um aumento indevido

das prestações de um consórcio (nesta situação, o Código de Defesa do

Consumidor denomina de interesse coletivo, previsto no inciso II do

artigo 81). O interesse do consumidor só será considerado difuso, se

houver impossibilidade de se identificarem as pessoas ligadas pelo

mesmo fato jurídico, derivado da relação de consumo, v.g., os

destinatários de uma propaganda enganosa veiculada pela televisão ou

pelo rádio)20.

Para NELSON NERY JÚNIOR21, “a pedra de toque do método classificatório é o tipo de tutela jurisdicional que

se pretende quando se propõe a competente ação judicial”.

20

“Assim, são difusos os interesses dos consumidores que pretendem a proibição de circulação de determinado produto reputado nocivo à saúde, tanto que são indetermináveis estes consumidores, unidos apenas pela circunstância fática de estarem mais ou menos sujeitos a consumir o produto prejudicial à saúde. São igualmente difusos os interesses dos consumidores que se insurgem contra uma propaganda enganosa, como ainda são difusos os interesses dos habitantes de determinada região que almejam a interdição de um estabelecimento que produz poluição nociva à saúde. Todavia, já seriam qualificados como coletivos, por exemplo, se a pretensão fosse para proibir a circulação de um produto ou a propaganda enganosa em detrimento, especificamente, da classe dos diabéticos (porque o produto ao contrário da propaganda não era dietético). Os interesses individuais homogêneos não se situam propriamente como um tertium genus de interesses meta-individuais, a par dos interesses difusos e coletivos. Parecem se situar, isto sim, como uma modalidade de interesses difusos ou coletivos. O que se pretende é uma condenação genérica, uma utilidade processual indivisível, em favor de todas as vítimas ou seus sucessores, em virtude de danos que tem origem comum” (Alcides A. Munhoz da CUNHA, “Evolução das Ações Coletivas no Brasil” in Revista de Processo volume 77, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1995, pp. 232/233).

21“Da ocorrência de um mesmo fato podem originar-se pretensões difusas, coletivas e individuais.

(27)

É importante lembrar a lição de HUGO

NIGRO MAZZILLI22, no sentido de que “para identificar corretamente a natureza de interesses transindividuais ou de grupos, devemos, pois,

responder a estas questões: a) o dano provocou lesões divisíveis,

individualmente variáveis e quantificáveis? Se sim, estaremos diante de

interesses individuais homogêneos; b) o grupo lesado é indeterminável

e o proveito reparatório, em decorrência das lesões, é indivisível? Se

sim, estaremos diante de interesses difusos; c) o proveito pretendido em

decorrência das lesões é indivisível, mas o grupo é determinável, e o

que une o grupo é apenas uma relação jurídica básica comum, que deve

ser resolvida de maneira uniforme para todo o grupo? Se sim, então

estaremos diante de interesses coletivos”.

CAPÍTULO II A AÇÃO CIVIL PÚBLICA COMO TUTELA DIFERENCIADA

SUMÁRIO: 1. Conceito de tutela jurisdicional - 2. A efetividade da tutela jurisdicional: 2.1. As tutelas diferenciadas - 2.2. A cognição em tema de tutelas diferenciadas - 2.3. Tipos de tutelas diferenciadas no direito processual civil brasileiro.

(direito individual), ação de obrigação de fazer movida por associação das empresas de turismo que têm interesse na manutenção da boa imagem desse setor da economia (direito coletivo), bem como ação ajuizada pelo Ministério Público, em favor da vida e segurança das pessoas, para que seja interditada a embarcação a fim de se evitarem novos acidentes (direito difuso)” (“O processo civil no Código de Defesa do Consumidor”, cit., p. 25).

(28)

1. Conceito de tutela jurisdicional

O Estado proibiu a autotutela privada e

assumiu o encargo de solucionar os conflitos23. Preleciona o mestre DONALDO ARMELIN24 que a “tutela jurisdicional se apresenta como a contrapartida do direito, ou melhor, poder de provocar a atuação da

jurisdição, se enfocada pelo ângulo de quem a requer. Se, ao revés, vier

a ser apreciada pela ótica do seu prestador, será obviamente a atividade

do Poder Judiciário desenvolvida, em esfera que lhe é normalmente

adstrita com exclusividade, a partir, geralmente, de provocação da parte

ou interessado. Assim, na medida em que o exercício desse poder

subjetivo se dá, necessariamente adimplidos determinados requisitos,

tal prestação ocorre de forma total ou parcial, consoante haja ou não

apreciação do próprio pedido veiculado através de tal exercício. Não se

exclui, por outro lado, em casos excepcionais, uma prestação

espontânea de tal tutela, à mingua de correspondente provocação”.

A tutela jurisdicional deve ser entendida

como aquela apta a tornar efetivo o direito, em casos concretos, trazidos

ao Judiciário, para apreciação25.

23

José Carlos BARBOSA MOREIRA, “Tutela Sancionatória e Tutela Preventiva” in Temas de DireitoProcessual, 2ª série, São Paulo, Editora Saraiva, 1980, p. 21.

24

“A tutela jurisdicional cautelar” in Revista da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo volume 23, São Paulo, 1985, p. 111.

25Explica, ainda, Donaldo ARMELIN que “essa prestação pode corresponder a uma simples

(29)

Em outras palavras, a tutela jurisdicional

preocupa-se com “o resultado jurídico-substancial do processo,

conduzindo a uma relativização do fenômeno direito-processo”26-27.

2. A efetividade da tutela jurisdicional

A respeito desse tema, BARBOSA

MOREIRA28 ensina que “o mecanismo criado para prover a essa necessidade precisa corresponder a uma lógica, mas terrível exigência:

atuar de tal maneira que, em toda a extensão da possibilidade prática,

venham as coisas a passar, de acordo com os preceitos do ordenamento.

Que significa isso ao ângulo do jurisdicionado? Recorrendo à Justiça,

ele há de poder esperar, ao menos em princípio, que se o seu direito se

vê reconhecido, o processo lhe proporcione cabal proteção, pondo-o em

condições de fruir, de maneira tão completa quanto possível, da

denominam tutela jurisdicional diferenciada, fruto de sumarização do procedimento ou da cognição, seja mediante a antecipação da tutela considerando-se o seu ‘iter’ procedimental,. seja através de atuação de outras técnicas processuais” (“Tutela jurisdicional do meio ambiente” in Revista do Advogado nº 37, São Paulo, AASP, 1992, p. 49).

26Luiz Guilherme MARINONI, A antecipação da tutela na reforma do Código de Processo Civil,

São Paulo, Malheiros Editores, 1995, p. 20.

27José Roberto dos Santos BEDAQUE explica bem este fenômeno: “a tipicidade não é da ação,

mas da tutela pleiteada. Existe um nexo entre o direito de agir em juízo e a tutela a um direito substancial, o que não significa, todavia, sejam a ação, a demanda e a defesa passíveis de classificações e distinções de conteúdo, relacionadas, na verdade, ao tipo de provimento e de tutela. O elemento variável da demanda é exatamente o tipo de tutela, que leva em conta o resultado do processo e que pode ser objeto de classificação. Na verdade, todos os institutos fundamentais do direito processual recebem reflexos significativos da relação jurídica material (jurisdição, ação, defesa e processo). O mesmo se diga das condições da ação, das nulidades processuais (especialmente quanto ao princípio da instrumentalidade das formas), coisa julgada, prova. Isso revela o nítido caráter instrumental do direito processual e reforça a necessidade de relativizar o binômio direito processo” (Direito e processo: influência do direito material sobre o processo, 2ª edição, São Paulo, Malheiros Editores, 1997, p. 28).

(30)

vantagem prometida pela norma. Em outras palavras, o processo

avizinha-se do optimum na proporção em que tende a fazer coincidir a

situação concreta com a situação abstrata prevista na regra jurídica

material; e afasta-se progressiva e perigosamente desse ideal na medida

em que o resultado na verdade obtido difere daquele que se obteria caso

os preceitos legais fossem observados de modo espontâneo e perfeito

pelos membros da comunidade”.

Nesse passo, a tutela jurisdicional se revela

efetiva ou eficaz, “quanto menor for, dentro dos limites do praticamente

possível, a diferença entre o resultado que ela proporciona à parte

vitoriosa e o resultado que esta última obteria, em face do ordenamento

jurídico, se não tivesse recorrido ao processo para obter esse mesmo

resultado”29.

A síntese desse pensamento traduz-se pela

célebre expressão de CHIOVENDA, ou seja, o processo deve dar a

quem tem um direito tudo aquilo e precisamente aquilo que ele tem o

direito de obter30.

A exigência de prestação efetiva da tutela

jurisdicional decorre da idéia de Estado de Direito, de onde se extrai os

29Marcelo Lima GUERRA, Estudos sobre o processo cautelar, São Paulo, Malheiros Editores,

1995, p. 11.

30Aduz Cândido Rangel DINAMARCO que “é preciso romper preconceitos e encarar o processo

(31)

princípios do monopólio da jurisdição (proibição de autotutela)31 e a garantia de proteção jurisdicional de qualquer lesão ou ameaça de lesão

a direito32 (rectius, afirmação de direito).

O papel do processo e do procedimento na

efetividade da tutela jurisdicional refere-se à questão da duração do

processo33.

As normas processuais devem sempre

seguir pelo caminho da efetividade do processo. De outro modo, o

processo definido por LIEBMAN, como “l’attivitá con cui si svolge in

concreto la funzione giurisdicionale...con una serie coordinata di atti

che si svolgano nel tempo e che tendono alla funzione di un atto

finalle”34 deve ser analisado em função do tempo. E isto porque, no contexto social, político e jurídico, o fator tempo assumiu papel de

relevo e decisivo na solução das lides (=pretensões de direito).

instrumental e as potencialidades de que dispõe, e não o homem a serviço da sua técnica” (A instrumentalidade do processo, 4ª edição, São Paulo, Malheiros Editores, 1994, p. 297).

31“Vislumbra-se uma correlação (ou, mais precisamente, uma decorrência) entre a proibição da

justiça privada e a assunção, pelo Estado, da outorga de proteção plena às solicitações de tutela jurídica, através dos magistrados, inclusive contra os seus próprios órgãos, independentemente mesmo de verificação aprofundada e a priori de estar ou não fundada a situação, em face do direito material” (José Manoel de ARRUDA ALVIM NETTO, Tratado de Direito Processual Civil, volume 1, 2ª edição, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1990, p. 21).

32Como observa Luiz Guilherme MARINONI, “tal direito é garantido por princípio

constitucional, pois a Constituição da República de 1988, em seu art. 5º, XXXV, estabelece que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário, lesão, como também ameaça a direito, com o visível intuito de propiciar ao cidadão o asseguramento constitucional de seu direito à “adequada tutela jurisdicional” (Efetividade do Processo e Tutela de Urgência, Porto Alegre, Sérgio Antônio Fabris Editor, 1994,p. 67).

33“O processo é um sistema onde mais deve ser acentuado o seu caráter entrópico de tal sorte que

(32)

Em resumo, a tendência do direito

processual civil moderno é no sentido de conferir maior utilidade aos

provimentos jurisdicionais35, isto é, propiciar ao processo os meios para realizar os fins ou produzir os efeitos a que se ordene36.

Como salienta LUIZ GUILHERME

MARINONI37, “uma das questões que emerge quando tratamos da efetividade do processo, e que é o ponto fundamental a inspirar a razão

de ser deste trabalho, é a da equação do problema rapidez-segurança”38

-39

.

34Manuale di Diritto Processuale Civile, Milano, Giuffrè, 1992, p. 31.

35Cândido Rangel DINAMARCO, A instrumentalidadedo processo, cit., p. 320.

36Como aduz BARBOSA MOREIRA, “toma-se consciência cada vez mais clara da função

instrumental do processo e da necessidade de fazê-lo desempenhar de maneira efetiva o papel que lhe toca. Pois a melancólica verdade é que o extraordinário progresso científico de tantas décadas não pôde impedir que se fosse dramaticamente avolumando, a ponto de atingir níveis alarmantes, a insatisfação, por assim dizer, universal, com o rendimento do mecanismo da justiça civil” (“Tendências contemporâneas do direito processual civil” in Revista de Processo volume 31, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1983, p. 199).

37Tutela cautelar e tutela antecipatória, 1ª edição, 2ª tiragem, São Paulo, Editora Revista dos

Tribunais, 1994, p. 15.

38Donaldo ARMELIN refere-se, também, à questão da efetividade do processo, salientando que

“se o processo não é o mal social, mas o remédio para esse mal que é o conflito de interesses -será ele tanto mais eficaz quanto mais rápido for seu resultado” (Vide: “A tutela jurisdicional cautelar” in Revista da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo 23:115).

39A questão do acesso à justiça e da efetividade do processo foi amplamente estudada por Mauro

(33)

2.1 – As tutelas diferenciadas

Cumpre reconhecer a existência das

chamadas tutelas diferenciadas e, como enfatiza ANDREA PROTO

PISANI40, elas são necessárias para assegurar o exercício do direito à adequada tutela jurisdicional, que representa a concretização do

princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, consagrado no

artigo 5º, inciso XXXV da Constituição Federal.

As tutelas jurídicas diferenciadas

caracterizam-se como formas alternativas de tutela sumária, para

atender a situações urgentes41.

Como revela DONALDO ARMELIN42, a

tutela jurisdicional diferenciada “prende-se talvez mais remotamente à

própria questão da indispensável adaptabilidade da prestação

40

“o processo civil deve ser visto como uma espécie de contrapartida que o Estado oferece aos cidadãos diante da proibição da autotutela; contrapartida esta que se deve traduzir na predisposição de meios de tutela jurisdicional adequados às necessidades de tutela das particulares situações de direito substancial” (“I rapporti fra diritto sostanziale e processo” in Appunti sulla giustizia civile, Bari, Cacucci, 1982, p. 42).

41Para que seja “assicurata la tutela giurisdizionale di una determinata situazione di vantaggio,

non basta, non è sufficiente, che a livello di diritto processuale sia predisposto un procedimento quale che sia, ma è necessario che il titolare della situazione di vantaggio violata (o di cui si minàccia la violazione) possa utilizzare un procedimento strutturato in modo tale da potergli fornire una tutela effetiva e non meramente formale o astatta del suo diritto” (Andrea PROTO PISANI, “Breve premessa a un corso sulla giustizia civile” in Appunti sulla giustizia civile, Bari, Cacucci, 1982, p. 11).

42Explica o autor que “realmente, presentes diferenciados objetivos a serem alcançados por uma

(34)

jurisdicional e dos instrumentos que a propiciam à finalidade dessa

mesma tutela”.

Ainda, como mostra KAZUO

WATANABE43, para visualizarmos tutelas próprias à concretização da efetividade do processo, precisamos ter em mente que “se de um lado

há exigências próprias do direito material por uma adequada tutela, há

de outro as técnicas e soluções específicas do direito processual, não

somente quanto à natureza do provimento, como também no tocante à

duração do processo, à eventual antecipação da tutela, à intensidade e

amplitude da cognição, e a muitos outros aspectos”.

Finalmente, como salienta DONALDO

ARMELIN44 “dois posicionamentos, pelo menos, podem ser adotados a respeito da conceituação de “tutela diferenciada”. Um, adotando como

referencial da tutela jurisdicional diferenciada a própria tutela, em si

mesma, ou seja, o provimento jurisdicional que atende a pretensão da

parte, segundo o tipo da necessidade de tutela ali veiculado. Outro,

qualificando a tutela jurisdicional diferenciada pelo prisma de sua

cronologia no iter procedimental em que se insere, bem assim como a

antecipação de seus efeitos, de sorte a escapar das técnicas

tradicionalmente adotadas nesse particular”.

Com a introdução da antecipação da tutela

pretendida, total ou parcialmente, no bojo do processo de

43Da cognição no processo civil, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1987, p. 19.

(35)

conhecimento, nos termos do artigo 273 da lei processual civil, bem

como da tutela específica prevista para as ações que tenham por objeto

o cumprimento de obrigações de fazer ou não fazer, segundo o artigo

461 do referido diploma legal, ambos com a redação dada pela Lei nº

8.952/94, procurou-se minimizar a complexa questão da efetividade do

processo ou, em outros termos, objetivou-se a realização in natura do

bem jurídico discutido, deixando-se, para segundo plano, a conversão

em seu sucedâneo patrimonial.

2.2 – A cognição em tema de tutelas diferenciadas

Enfatiza DONALDO ARMELIN45 que se “situa no instrumento processual a sede da investigação da tutela

jurisdicional diferenciada, cuja diversidade resulta de técnicas relativas

ao procedimento de onde ela emerge e/ou do grau de cognição

indispensável a sua efetivação. Assim derivaria ela de uma antecipação

no iter procedimental de processo de cognição plena e exauriente,

efetiva ou eventual, ou de processo autônomo de cognição sumária, não

cautelar. Também poderia surgir no procedimento de execução

específica, ou seja, de certa forma, constituiria uma tutela prestada em

instrumento processual marcado pela cognição sumária, que não se

confunde com o procedimento sumário caracterizado pela simplificação

ou abreviação do seu iter. A cognição sumária corresponde àquela

superficial, embora sem limitação no plano horizontal, contrapondo-se,

destarte, à plena e exauriente, ainda que horizontalmente limitada”.

(36)

Somente através da combinação das

diferentes espécies de cognição é que se pode buscar os procedimentos

adequados46, para o fim de tornar eficaz o direito à adequada tutela jurisdicional47.

O processo deve propiciar a efetiva tutela

do direito da parte, isto é, “deve conduzir ao mesmo resultado que seria

obtido se espontaneamente cumprida a norma de direito substancial ou

realizada a ação de direito material”48.

46

“Os limites para a concepção destes procedimentos estão estabelecidos pelo princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional e pelos princípios que compõem a cláusula do “devido processo legal” (Kazuo WATANABE, Da cognição no processo civil, cit., p. 94).

47

“no direito à adequada tutela jurisdicional está ínsito o direito à cognição adequada da lide. Nesta perspectiva, pois, é de se anunciar a impossibilidade de uma ação de cognição sumária autônoma, tal como pretendem alguns eminentes processualistas. Efetivamente, ao lado do processo de cognição sumária sempre deve estar predisposto um processo onde a cognição possa ser exauriente. É que em nome do direito à tutela urgente, não podemos, evidentemente, admitir o sacrifício do direito à adequada cognição da lide, que também integra a cláusula do due process of law” (Luiz Guilherme MARINONI, Tutela Cautelar e Tutela Antecipatória, cit., pp. 29-30).

48Sobre o assunto manifestou-se com pertinência Luiz Guilherme MARINONI, no seguinte

(37)

A pretensão de direito material que deve ser

realizada de modo urgente, porque existente uma situação de perigo de

dano, requer provimento diferenciado, ou seja, provimento apto a

atender esta situação particular de direito material.

É cada vez maior a preocupação com a

efetiva tutela dos direitos, por essa razão houve a introdução no sistema

processual positivo, da antecipação dos efeitos da tutela de mérito, que

“representa, sem a menor sombra de dúvida, a construção, por via

legislativa, de regra com a mesma finalidade: estabelecer mecanismos

para obtenção de concordância prática, de formas de convivência

simultânea, entre o direito fundamental à efetividade do processo e o

direito fundamental à segurança jurídica, naquelas hipóteses em que tais

direitos fundamentais estiverem em rota de colisão”49.

2.3 – Tipos de tutelas diferenciadas no direito processual civil brasileiro

Para a efetividade da tutela jurisdicional é

necessária uma ação que permita a realização do direito com base em

cognição sumária50. Este tipo de cognição, inerente ao processo cautelar, ocorre, por exemplo, em formas não cautelares de antecipação

de tutela, como são as liminares das ações possessórias (artigo 928 do

CPC), da ação de nunciação de obra nova (artigo 937 do CPC), da ação

de busca e apreensão do Decreto-lei nº 911/69 e nos embargos de

49Teori Albino ZAVASKI, “Antecipação da tutela e colisão de direitos fundamentais” in

(38)

terceiro, dentre outras. Também pode ser observada nos procedimentos

das medidas provisionais do artigo 888 do Código de Processo Civil.

As tutelas jurídicas diferenciadas podem ser

concebidas com a criação de instrumentos mais efetivos à solução da

lide ou com mecanismos de agilização da prestação jurisdicional51. Exemplos da primeira hipótese são a Lei da Ação Popular (Lei nº

4.717, de 29.6.65, art. 5º, § 4º), Lei da Ação Civil Pública (Lei nº 7.347,

de 24.7.85, art. 12), Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078, de

11.9.90, art. 84, § 3º), Lei do Mandado de Segurança (Lei nº 1.533, de

31.12.51, art. 7º) e Lei da Ação de Desapropriação (Decreto-Lei nº

3.365/41, art. 15). Exemplos da segunda hipótese são os juizados

especiais cíveis e criminais (Lei nº 9.099/95) e a tutela antecipatória

instituída pelo CPC 273 e 461, § 3º, com a redação da Lei nº 8.952/94.

As reformas introduzidas no Código de

Processo Civil tiveram como objetivo completar o elenco do gênero

denominado “tutelas de urgência”52, de que são espécies o provimento antecipatório e o liminar, de modo a evitar ou reparar eventual lesão a

direito.

50

Luiz Guilherme MARINONI, Efetividade do processo e tutela de urgência, cit., p. 58.

51

Nelson NERY JÚNIOR, Atualidades sobre o Processo Civil - A reforma do Código de

Processo Civil brasileiro de 1994 e de 1995, 2ª edição, revista e ampliada, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1996, p. 60.

52Basicamente são três as tutelas sumárias urgentes: a) cautelar (próprias, típicas e atípicas ou

(39)

A tutela de urgência encontra-se prevista na

Constituição Federal. Observa-se essa norma diante da expressão

“ameaça de lesão a direito” contida no inciso XXXV do artigo 5º da

Carta Magna. Esse dispositivo “revela o propósito de o constituinte

garantir constitucionalmente a tutela de urgência, seja a cautelar, seja a

sumária antecipatória. Existe, pois, direito constitucional à tutela de

urgência”53.

A previsão de tutelas diferenciadas, a nível

constitucional, visa, precipuamente, a ampliação dos mecanismos de

acesso à justiça54.

Entre as hipóteses de tutelas diferenciadas

previstas na Carta Magna temos a ação popular, a ação civil pública, o

mandado de injunção, o habeas corpus e o mandado de segurança

(individual e coletivo).

53

Luiz Guilherme MARINONI, Efetividade do processo e tutela de urgência,cit., p. 31.

54

“O acesso à justiça, portanto, pode ser encarado como o requisito fundamental - o mais básico dos direitos humanos - de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não

apenas proclamar os direitos de todos” (Mauro CAPPELLETTI e Bryant GARTH, Acesso à

(40)

CAPÍTULO III ANTECEDENTES DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA E LEGISLAÇÃO POSTERIOR

SUMÁRIO: 1. Ação popular – 2. Ação civil pública – 3. Constituição Federal de 1988 e a legislação posterior – 4. Mandado de segurança coletivo.

1. Ação popular

A ação popular encontra-se regulada pela

Lei nº 4.717, de 29 de junho de 1965, permitindo aos cidadãos atuar em

juízo contra atos lesivos ou potencialmente lesivos da Administração

Pública55.

A ação popular, todavia, “a despeito de

representar a vanguarda da proteção dos interesses meta-individuais,

55

“Ação popular é o meio constitucional posto à disposição de qualquer cidadão para obter a invalidação de atos ou contratos administrativos - ou a estes equiparados - ilegais e lesivos do patrimônio federal, estadual e municipal, ou de suas autarquias, entidades paraestatais e pessoas

jurídicas subvencionadas com dinheiros públicos” (Hely Lopes MEIRELLES, Mandado de

(41)

hoje qualificados como difusos ou coletivos, em sentido estrito, não era

suficiente para assegurar uma efetiva tutela aos interesses

meta-individuais, diante da complexidade e multiplicidade cada vez mais

crescente das relações sociais. Objetivamente, a insuficiência da ação

popular se manifestava, porque tradicionalmente, através dela, somente

os interesses meta-individuais pertinentes à preservação do patrimônio

público seriam passíveis de tutela, pelo menos até o advento da

Constituição de 1988. Não ficavam abrangidos pela ação popular os

interesses meta-individuais de membros de grupos ou coletividades

pertinentes à proteção da infância e juventude, consumidores, classe de

trabalhadores etc., havendo surgido dúvidas se era possível incluir no

conceito de patrimônio público a defesa de interesses pertinentes à

saúde pública, segurança pública, meio ambiente etc.”56.

Com o advento da Constituição Federal de

1988, o inciso LXXIII do artigo 5º57 foi claro ao dizer que podem figurar como objeto da ação popular a proteção do patrimônio público

ou de entidade que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao

meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, que contra si

tiverem sido praticados atos lesivos.

56

Alcides A. Munhoz da CUNHA, “Evolução das Ações Coletivas no Brasil”, cit., p. 227.

57Art. 5º, inciso LXXIII da CF/88: “Qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular

(42)

Com grande propriedade, RODOLFO DE

CAMARGO MANCUSO58, ensina que “a ação popular está, de

indústria, inserida no capítulo da Constituição Federal concernente aos

direitos e garantias fundamentais, e, se ela se apresenta coletiva em sua

finalidade, o seu exercício é assegurado ao indivíduo, embora de

maneira concorrente-disjuntiva com os demais cidadãos. Quando toma

tal iniciativa, o autor popular está exercendo, enquanto cidadão no gozo

de direitos políticos, a sua quota-parte no direito geral a uma

administração proba e eficaz, pautada pelos princípios assegurados nos

arts; 37, 170, 215 e outros da CF”.

Para ADA PELLEGRINI GRINOVER59 “a ação popular garante, em última análise, o direito democrático de

participação do cidadão na vida pública, baseando-se no princípio da

legalidade dos atos administrativos e no conceito de que a coisa pública

é patrimônio do povo. Já nesse ponto nota-se seu estreito parentesco

com as ações que visam à tutela jurisdicional dos interesses difusos,

vistas como expressão de participação política e como meio de

apropriação coletiva de bens comuns”.

A ação popular consiste, assim, em ação

coletiva em defesa de um direito difuso60. Dessa forma, aplica-se à ação popular o regime jurídico-processual coletivo do Código de Defesa do

58Ação popular, 4ª edição, revista, atualizada e ampliada, São Paulo, Editora Revista dos

Tribunais, 2001, p. 153.

59“A tutela jurisdicional dos interesses difusos” in Revista Forense 268, Rio de Janeiro, Editora

(43)

Consumidor e da Lei da Ação Civil Pública, no que for cabível61, especialmente, no que diz respeito à questão da coisa julgada62.

Um ato da Administração Pública, por

exemplo, pode violar um direito difuso (ato atentatório à moralidade

administrativa e ao erário) e um direito individual (perda de uma

empresa de licitação contra as disposições constantes do edital). Para a

defesa do direito difuso violado, qualquer cidadão tem legitimidade

para propor ação popular, objetivando anular uma licitação fraudulenta,

mediante ação coletiva. Já, para a tutela do direito individual

prejudicado, isto é, a do proponente preterido (pessoa física ou

jurídica), somente aquele poderá ajuizar ação própria individual.

A lesividade do ato ao patrimônio público é

um dos requisitos da ação popular.

Indaga-se se a lesividade deve ser efetiva

ou presumida.

A respeito do assunto, preleciona HELY

LOPES MEIRELLES63 que “na conceituação atual, lesivo é todo ato ou omissão administrativa que desfalca o erário ou prejudica a

60José Carlos BARBOSA MOREIRA, “A ação popular do direito brasileiro como instrumento de

tutela jurisdicional dos chamados “interesses difusos”, cit., p. 110-23.

61

Neste sentido, temos o entendimento de Rodolfo de Camargo MANCUSO, Ação popular, cit., p. 196.

62

(44)

Administração, assim como o que ofende bens ou valores artísticos,

cívicos, culturais, ambientais ou históricos da comunidade. E essa lesão

tanto pode ser efetiva quanto legalmente presumida, visto que a lei

regulamentar estabelece casos de presunção de lesividade (art. 4º), para

os quais basta a prova da prática do ato naquelas circunstâncias para

considerar-se lesivo e nulo de pleno direito. Nos demais casos impõe-se

a dupla demonstração da ilegalidade e da lesão efetiva ao patrimônio

protegível pela ação popular”.

A par da lesividade, é de rigor que o ato

impugnado seja ilegal/ilegítimo.

A grande maioria dos julgados, além de

sublinhar a lesividade, expressamente alude à ilegalidade64-65.

Lembra, RODOLFO DE CAMARGO

MANCUSO66, que “à vista da dicção da vigente Carta Constitucional, fica, como primeira impressão, que a causa de pedir na ação popular

continuaria a reclamar o binômio “ilegalidade-lesividade”; até porque

se bastasse a só alegação de lesividade, poderia dar-se muita vez que o

Judiciário acabasse colocado na incômoda posição de, a certos

respeitos, ter que avançar no mérito ou na discricionariedade

63Mandado de segurança, ação popular, ação civil pública, mandado de injunção, habeas data,

16ª edição, São Paulo, Malheiros Editores, 1995, pp. 90-91.

64

“Não pode vingar a ação popular se não demonstrada a ilegalidade e lesividade do ato impugnado” (RT 600:52).

65“Estão presentes os requisitos da ilegalidade e lesividade do patrimônio público a legitimar a

(45)

administrativa do ato sindicado, em busca da afirmada lesividade,

quando de correlata ilegalidade não se tivesse queixado o autor

popular”.

O Egrégio Tribunal de Justiça já teve

oportunidade de decidir que “são pressupostos da ação popular, sem os

quais a pretensão é inacolhível entre outros: a lesividade do ato ao

patrimônio público e que o ato lesivo seja contaminado de vício ou

defeito de nulidade ou anulabilidade. São, pois, duas as condições da

actio populares, de coexistência necessária e indeclinável, que

interessam ao debate. A falta de qualquer dessas condições afasta a

admissibilidade da ação”67.

Além disso, evidencia-se também a lesão à

moralidade administrativa.

O princípio da moralidade administrativa

está consagrado na Constituição Federal e constitui fundamento de

validade do ato administrativo.

A moralidade administrativa, diante da

ampliação do objeto da ação popular, pode representar uma causa

autônoma, independentemente do requisito da lesão, efetiva ou

presumida ao erário.

(46)

Nesse sentido, é o posicionamento de

CLÓVIS BEZNOS, referido por RODOLFO DE CAMARGO

MANCUSO68, o qual preleciona que “a ampliação do objeto da ação popular, introduzida pelo Texto Constitucional de 1988, sujeitando a

contraste judicial a lesão à moralidade administrativa, faculta o

ajuizamento da mesma independentemente do tradicional requisito da

lesão patrimonial, efetiva ou presumida, que desde a sua previsão

primeira no ordenamento, impunha-se como condição de sua

procedência”.

É certo que a moralidade, como requisito de

validade do ato administrativo, sujeita-se ao controle jurisdicional. A

moralidade administrativa integra o direito como elemento

indissociável na sua aplicação e finalidade, erigindo-se em fator de

legalidade69.

Cumpre lembrar que a legitimação ativa70 para a ação popular reside na condição do cidadão encontrar-se no gozo

de seus direitos políticos, estabelecendo a lei que a petição inicial

deverá estar instruída com o título eleitoral ou com documento que a ele

corresponda71. Daí, pode-se admitir, também, como legitimados ativos, o brasileiro eleitor menor de dezoito anos e o analfabeto, a quem a

68

Ação popular, cit., p. 89.

69“O controle jurisdicional se restringe ao exame da legalidade do ato administrativo; mas por

legalidade ou legitimidade se entende não só a conformação do ato com a lei, como também com a moral administrativa e com o interesse coletivo” (TJSP, RDA 89:134).

70 Súmula 365 do STF: “Pessoa jurídica não tem legitimidade para propor ação popular”. Esta

súmula é anterior à Lei nº 4.717/65, que manteve a mesma orientação.

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