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À GUISA DE CONCLUSÃO

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Percorrido o caminho investigativo delineado para este estudo, assumo uma visão de ensino das ciências que se evidencia distante de características dogmáticas tais como conteúdos verdadeiros e inquestionáveis, atemporais ou ahistóricos, mas, inversamente, conteúdos contextualizados historicamente, provisórios, porque sujeitos à contestação quando os sujeitos que os (re)constroem encontram formas alternativas de ver e pensar...

Os resultados dessa investigação expressam algumas idéias concernentes ao que pode se configurar para o século XXI, nos termos postos tanto pelo quadro teórico esboçado sobre a ciência e o ensino das ciências, quanto pelas projeções e proposições dos meus sujeitos doutores constitutivos desta pesquisa, ao descartarem a “verdade única”. Nesse sentido, vale assumir o que diz Morin (2003:148b):

A ciência faz surgir incessantemente dados novos que contradizem e tornam obsoleta a teoria estabelecida. O aparecimento de dados novos necessita de teorias mais amplas ou diferentes. Esses novos dados surgem de forma non-stop, porque o movimento da ciência moderna é, ao mesmo tempo, um movimento de aperfeiçoamento dos instrumentos de observação e de experimentação [...] como ficou evidente na exploração de Saturno: as observações feitas anteriormente não eram falsas; eram, entretanto, totalmente insuficientes e, assim, induziam teorias errôneas.

Porém, não só os dados mudam as teorias, mas elas mesmas mudam

per se, com o tempo, em função do contexto histórico no qual se situam.

Conforme a afirmação de Popper posto que ‘não é por ser verdadeira que uma teoria é válida’, mas por resistir às tentativas de demonstração de sua falsidade. Seguindo uma idéia correspondente, Kuhn demonstra que a evolução científica se dá no nível dos paradigmas, pois não é só a visão do mundo que se alarga mais e mais, é a própria estrutura da visão do mundo que se transforma (Morin, 2003:149 b).

Tal visão contemporânea sobre a ciência se faz ecoar na formação dos professores das ciências resultando na consideração da ciência como atividade

de investigação e pesquisa, conforme as seguintes manifestações de um dos meus sujeitos [Doutor em Educação Química]:

...Não é mais admissível uma abordagem da Ciência ingênua, como uma construção de verdades que não admitem contestação, estabelecidas por “homens” especiais (os cientistas), em momento de grande intuição. Necessita-se, isso sim, de sempre mais pessoas trabalhando em contextos de produção da Ciência, equipes de pessoas atuando com vistas a metas e fins, como acontece em qualquer organização contemporânea de produção de bens ou sua distribuição.

Assim,

O professor será alguém mais experiente que vai mediar a produção dos conhecimentos, introduzindo novas possibilidades a partir das avaliações feitas em cada momento.

Ainda o que expressa um outro dos sujeitos [Pesquisador Doutor na área de Ciências Naturais]:

A Ciência passou a ser preocupação constante para mim à medida que eu fui descobrindo que – de modo geral – os egressos de cursos universitários (de qualquer curso) e quaisquer alunos universitários no curso de sua formação jamais manifestavam/tinham idéia clara de ‘ciência’; quando se pronunciavam sobre fatos ou eventos científicos o faziam como “leigos”, isto é, como qualquer pessoa que jamais tivesse confrontado concepções científicas, com crendices se superpondo e anulando as teorias estudadas. Assim, eu confrontava uma visão de ‘ciência’ mutilada, distorcida ou... Inexistente.

Essas contribuições são fundamentais para a reflexão sobre a construção dos saberes necessários aos professores das ciências deste século, pois, segundo Gil-Pérez et al. (1999:317):

Por todo ello, la estratégia de enseñanza que nos parece más coherente con la orientación del aprendizaje como cosntrucción de conocimientos científicos es la que asocia el aprendizaje al

tratamiento de situaciones problemáticas abiertas [...] que puedan generar el interés de los estudiantes.

Portanto, dentre as novas possibilidades que os professores podem introduzir no ensino das ciências está a associação teoria-prática-resolução de problemas de modo a privilegiar as situações abertas, pois é justamente

esse sentido do problema que caracteriza o verdadeiro espírito científico (Bachelard, 1996:18). Deste ponto de vista, o conhecimento é construído pelos sujeitos que questionam ou desejam compreender seu mundo.

Isso vem ao encontro do que projeta o sujeito pesquisador doutor em Educação Matemática no sentido do que permanece nos termos de formação de professores para este século:

A perspectiva protagonista do aluno e do professor, baseada no princípio de que ambos são sujeitos (e construtores) de conhecimentos e de si mesmos.

Nessa perspectiva, destaco a importância da linguagem e sua adequação no contexto de (re)construção do conhecimento, mesmo porque consiste no instrumento criado e produzido no contexto social e na relação dialógica que expressa a significação.

É nesse cenário que a presente pesquisa evidencia uma tendência claramente posta nas manifestações dos sujeitos no tocante à preocupação com o que se configura em termos de educação científica no século XXI: a melhor compreensão do significado de ensinar ciência, bem como da construção de conhecimentos práticos que considerem a:

a. Dimensão social do conhecimento científico no sentido da relação ciência-tecnologia-sociedade;

b. Associação ensino-pesquisa;

c. Apropriação de uma linguagem adequada ao ensino no sentido de permitir que os alunos se identifiquem com o contexto de aprendizagem;

d. Integração dos professores formadores e futuros professores nas salas de aulas;

e. Construção identitária do ‘professor’;

f. Imbricação entre a formação didático-pedagógica e a formação específica das ciências.

As aulas de Ciências se constituem no espaço privilegiado de interação entre professor-aluno e entre alunos, em função de conexão deliberada e estabelecimento de relações compreensivas entre diversos contextos. Isto, certamente se põe a partir de uma visão plural do processo de ensino e de aprendizagem da ciência, considerando a complexidade do fenômeno aula.

Nesse sentido considero contundentes os aspectos contemplados no modo de considerar a Educação pela Ciência do sujeito pesquisador em Educação em Biologia, uma vez que se trata de outra/nova via de reflexão sobre o significado da ciência para os professores e, como são trabalhados junto aos alunos:

...A ciência entra para fornecer subsídios, para ampliar o repertório interpretativo dos sujeitos, para analisar situações que afetem a vida em nível individual e coletivo, no que se refere aos aspectos sociais, ambientais e macro cósmicos. ...Isso significa que o conhecimento científico deve ser acionado como mais uma forma de compreensão cultural dos fenômenos que afetam a vida e tudo que a sustenta, daí ter usado a expressão ampliar e não outra que demarque a superioridade da ciência sobre outras formas de compreensão do mundo.

E, ainda,

Em termos de educação no geral e Educação pela Ciência em particular [o que não pode mais ser admissível neste século XXI] é o desperdício de tempo ensinando curiosidades da e sobre a ciência enquanto explodem guerras, problemas sócio-ambientais gerados pelo egoísmo, pela ganância, pelo desrespeito do homem com o homem, com a vida, com tudo que nela pulsa e a sustenta. Situações que também são frutos de uma ciência que na sua trajetória histórica optou por priorizar a dimensão econômica em detrimento da social. Trilhar esta investigação por um ensino aprendente ressaltou possibilidades de (re)fazer ou (re)pensar concepções e práticas sobre a formação dos professores das ciências, a partir do questionamento sobre o sentido de ensinar e aprender Ciências Naturais, Biologia, Física, Química e Matemática.

Ao final, vale asseverar que tais transformações são progressivas porque processuais, não ocorrem imediatamente, tampouco podem ser simplesmente oportunizadas a licenciandos e licenciandas atuais, futuros professores e futuras professoras. No entanto, é possível já transitar por um espaço de distinções, de relações e de interações e não de dissociações, separações, pois um dos desafios da educação científica implica a admissão, a apropriação ou assunção da complexidade presente no mundo, a qual incita a dar conta dos caracteres multidimensionais de toda a realidade estudada.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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