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Ações do estado de São Paulo: implantação da educação escolar das prisões, contratação e formação dos professores para atuar no sistema penitenciário

CAPÍTULO 2: EDUCAÇÃO ESCOLAR NAS PRISÕES NO ESTADO DE SÃO PAULO

2.4. Ações do estado de São Paulo: implantação da educação escolar das prisões, contratação e formação dos professores para atuar no sistema penitenciário

Neste item, será apresentada a análise documental com o objetivo de compreender como se deu o processo de implementação da política em que a SEE/SP passou a assumir a responsabilidade pela oferta de educação nas prisões. A análise dos documentos que organizam o funcionamento das escolas nas unidades prisionais no estado de São Paulo tem por objeto apresentar a organização da educação escolar das prisões paulistas, bem como discorrer sobre as formas de contratação e a formação de professores em serviço para atuar nesse contexto. Além de buscar entender aspectos dos valores e disposições para a ação que envolvem à prática da docência na prisão. Busca-se também evidenciar relações e distanciamento com a voz dos professores, por meio do cotejamento dos documentos com as entrevistas semiestruturadas que foram realizadas.

Para tanto, é essencial uma percepção histórica do processo das mudanças educacionais que se deu por meio da implantação de uma nova política no estado de São Paulo, que diz respeito a responsabilização da SEE/SP pela educação nas prisões. O documento escrito possibilita a reconstrução de dada compreensão do social e a investigação do contexto de

elaboração de tal texto permite o entendimento de como se deu sua constituição e sua lógica interna (CELLARD, 2008). Torna-se relevante extrair informações dos documentos para que se evidencie aspectos sobre como se deu o processo histórico em uma situação determinada.

Como mencionado anteriormente, o estudo se iniciou durante a minha graduação, por meio da realização de Iniciação Científica. O projeto intitulado “Implantação das Diretrizes Nacionais para a oferta de educação para jovens e adultos em situação de privação de liberdade nos estabelecimentos penais: o caso de São Paulo” teve como finalidade principal mapear as ações de implantação das Diretrizes para a educação prisional no estado de São Paulo a fim de verificar as estratégias adotadas pelo poder público para atingir os objetivos nela propostos.

O percurso realizado teve como base a cronologia histórica, correspondendo às publicações feitas no estado de São Paulo após a aprovação das Diretrizes Nacionais (BRASIL, 2010). O período de abrangência foi de março de 2010 a abril de 2013. Procuraram-se os documentos oficiais, como pareceres, decretos e resoluções produzidas pelos órgãos oficiais, aos quais tivemos acesso por meio das publicações oficiais. Após, entrou-se em contato com a FUNAP, que forneceu alguns documentos de circulação interna da instituição como comunicados internos, relatórios, informativos e termos de cooperação.

A análise dos documentos durante a pesquisa de Iniciação Científica revelou evidências da dificuldade de diálogo entre a SEE/SP e a SAP, ou seja, nesse processo a SEE/SP não estava considerando a experiência acumulada da FUNAP, instituição que à época possuía experiência com a educação nas prisões paulistas.

O processo de construção deste estudo decorre de tal experiência anterior, quando foi possível averiguar, a partir de análise documental, o processo truncado de implantação das Diretrizes, com idas e vindas nas proposições. Dando continuidade ao trabalho de investigação já realizado, nesta pesquisa foram localizados especificamente os documentos que normatizam a contratação e a atuação do professor nas escolas prisionais desde que a SEE/SP assumiu essa responsabilidade.

Cellard (2008), ao discorrer acerca da importância do documento escrito para o pesquisador nas ciências sociais, aplica cinco dimensões para uma percepção total dos fatos. A primeira refere-se ao contexto social global, buscando abranger a conjuntura política, econômica, social e cultural na qual ocorreu a produção de um documento específico. Nesse sentido, “tal conhecimento possibilita apreender os esquemas conceituais de seu ou seus atores, compreender sua reação, identificar as pessoas, grupos sociais, locais aos quais se faz alusão, etc.” (CELLARD, 2008, p. 299).

O segundo aspecto relaciona-se ao reconhecimento dos autores que produziram determinado texto, destacando a identidade da pessoa ou instituição que escreveu o documento. Para o autor, é fundamental ler nas entrelinhas as fontes documentais para que se possa interpretar a tomada de posição dos acontecimentos e as razões de produção de determinado texto.

O terceiro ponto diz respeito à autenticidade e confiabilidade do texto. Trata-se de investigar a procedência do documento e a qualidade da informação transmitida.

A quarta dimensão abarca os conceitos-chave e a lógica interna do documento, avaliando os conceitos e os sentidos empregados.

Por fim, o último aspecto corresponde à análise, que deve ocorrer levando-se em consideração o questionamento inicial da pesquisa. Essa correlação entre o problema de pesquisa e as dimensões extraídas dos documentos que torna possível a interpretação e reconstrução de determinado fato e suas lógicas internas de produção.

A partir das considerações realizadas por Cellard (2008) e com base nos fundamentos da pesquisa qualitativa, o objetivo de se trabalhar com documentos foi extrair as principais informações neles contidas com a finalidade de um aprofundamento na compreensão do espaço social.

Para o desenvolvimento desta pesquisa foi fundamental a compreensão dos valores e das lógicas presentes dentro do espaço social, pois entende-se que tais aspectos movem os agentes em suas práticas.

Nessa análise o conceito de campo (BOURDIEU, 2004; 2008) é essencial, pois permite o entendimento da constituição do espaço social pelos agentes nos diferentes campos de atuação – no caso deste estudo, o campo educacional e prisional.

Para entender o conceito de campo, é interessante a ideia do jogo, que expressa as estratégias adotadas pelos agentes e/ou instituições em suas ações para preservar ou acumular os diferentes tipos de capital, mantendo ou melhorando sua posição social. Em cada campo os agentes e as instituições disputam seguindo regras específicas, que são estabelecidas dentro desse espaço social com diferentes forças e com distintas possibilidades de apropriação do que se está buscando. O campo é um lugar de relações de poder e lutas. É, portanto, um espaço social de disputas e reconhecimentos.

Para Bourdieu (2008), as lutas em um campo de poder, especialmente as que envolvem um poder em relação ao Estado, que dizem respeito aos recursos econômicos e políticos, exercem ainda mais força nas regras que determinam o jogo.

Diante do exposto, a teoria dos campos formulada por Bourdieu (2004) possibilita a compreensão das disputas e dos jogos de poder presentes no microcampo, que é a escola da prisão, que aqui será exposto por meio da análise dos documentos.

Como consequência do exposto, foi elaborado um protocolo de análise26 para cada documento27, elegendo alguns tópicos para direcionar a leitura: autores, tipo de documento, lugar de publicação, data, assinaturas, assunto/ título, decisões/ deliberações sobre educação nas prisões em São Paulo, conceitos-chave e comentários da pesquisadora.

No total, nesta pesquisa, foram analisados oito documentos28, que foram agrupados em dois eixos, a saber, eixo 1: organização da educação escolar no estado de São Paulo; e eixo 2: contratação e formação dos professores para lecionar nas unidades prisionais paulistas.

Buscando organizar a análise dos documentos, optou-se por classificar o que é central em cada eixo, por meio de cada documento investigado. O quadro 2 a seguir apresenta uma síntese dos indicadores que permeiam cada eixo.

26 O modelo do protocolo de análise dos documentos encontra-se em Apêndice D, p. 203. 27 O quadro com a descrição dos documentos analisados encontra-se em Apêndice E, p. 204. 28 A lista das fontes documentais utilizada para análise encontra em Apêndice F, p. 205.

Quadro 2: eixos análise de documentos

EIXO 1: ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO ESCOLAR NO ESTADO DE SÃO