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Torta da Responsabilidade

A ACOMODAÇÃO FAMILIAR

O TOC é um transtorno cujos sintomas, em geral, têm forte impacto sobre a família e sobre as pessoas mais próximas: cônjuge, namorado (a), colegas de trabalho e até amigos. Interfere nas rotinas da casa, nos compromissos sociais nos momentos de lazer ou nas férias da família. Como regra, para evitar conflitos, os demais membros acabam se adaptando aos sintomas e às exigências do paciente e, até mesmo, apoiando a realização dos rituais e os comportamentos evitativos. Esse fenômeno é chamado de acomodação familiar. Tal acomodação, em geral, é feita com raiva, ressentimento e frustração, que freqüentemente são exteriorizadas sob a forma de discussões irritadas, brigas e até agressões físicas. Conflitos conjugais que podem evoluir para separação são muito comuns. Uma pesquisa verificou que mais de 40% dos familiares de portadores de TOC havia modificado suas rotinas. A pesquisa

mostrou ainda que caso o paciente fosse o marido, 88,2% das esposas tinham se acomodado aos sintomas. O grau de acomodação é maior especialmente no caso de sintomas graves e diante de outros conflitos entre os membros da família. Por todos esses motivos, o TOC pode ser considerado uma doença familiar, tal o impacto que na maioria das vezes exerce sobre os demais membros, particularmente quando o portador ocupa uma posição de liderança no grupo: é o pai ou a mãe.

Interferência dos sintomas no funcionamento familiar

Certos sintomas, em particular, interferem de forma mais acentuada no funcionamento da família: colecionismo, obsessões e compulsões por limpeza, obsessões e compulsões por ordem e simetria. Por exemplo, os colecionistas geralmente se sentem bem ao lado das coisas que juntam, mesmo que a casa esteja atravancada de objetos sem utilidade. Sentem extremo desconforto ou raiva, como se fosse violação da sua privacidade, caso algum dos seus objetos tenha sido tocado ou trocado de lugar por terceiros. Além disso, existem peças completamente ocupadas por objetos inúteis e os corredores eventualmente ficam intransitáveis. Muitas vezes existem dificuldades até para convidar outras pessoas a visitar a casa e são comuns os conflitos se alguém põe algo no lixo sem o seu consentimento. Eles têm grande necessidade de ter o controle dos seus objetos, protegendo-os de eventuais danos ou do uso indevido e, principalmente, do extravio. Da mesma forma, os que apresentam obsessões de contaminação e rituais de lavagem com muita freqüência impõem aos de- mais seus rituais como os mencionados no exemplo anterior, isolam peças, não permitem abrir janelas, pois temem a entrada do ar da rua. São exigências muitas vezes absurdas às quais a família se submete como forma de evitar conflitos eventualmente sérios, e até separações. No entanto, a maioria dos familiares não acredita que essas acomodações contribuam para a melhora do paciente.

Um estudo verificou que 82% das esposas se acomodavam ao paciente. A acomodação dos familiares correlacionava-se com um funcionamento familiar pobre, com um comprometimento global do funcionamento família, com atitudes de rejeição em relação ao paciente e com vários tipos de estresse familiar. Um outro estudo verificou que 58% dos pacientes envolviam os familiares em seus rituais; 58% tinham problemas em lidar com dinheiro; 52% com desemprego; 45% com colecionismo; 42% dificuldades para se vestir e arrumar-se. A vida social da família ficou comprometida em 75% dos casos e as suas atividades de lazer em 64% dos casos; em 69% dos casos os familiares consideravam a presença do portador como responsável pelas discórdias conjugais. Uma das maiores preocupações era com a perda da capacidade de trabalho do paciente e pelo menos 45% deles temiam pelo que poderia acontecer com ele depois que falecessem.

Em geral, os familiares compartilham do sofrimento e da aflição do portador de TOC e acabam sofrendo da mesma forma. Referem que não podem aproveitar a vida enquanto vêem seu ente querido sofrendo, ou com sua vida pessoal e profissional comprometida. Por não tolerarem a impotência sentida ao assistir um ente querido se debatendo, prisioneiro de rituais exaustivos e intermináveis, apóiam sua realização, atendem suas demandas, uma vez que isso proporciona alívio imediato. Entretanto, não se dão conta de que, com esse procedimento reforçam o transtorno.

Um pequeno exemplo de interferência na vida da família e acomodação familiar Uma paciente de 24 anos levava de 3 a 4 horas no banho, e não conseguia encerrá-lo, pois ficava na dúvida se havia lavado adequadamente todas as partes do seu corpo, necessitando passar o sabonete e enxaguar-se inúmeras vezes, ao ponto de provocar lesões em sua pele. Exigia a presença de um dos familiares – o pai ou a mãe, para certificá-la de que o banho estava bem feito e que todas as partes do seu corpo estavam bem lavadas. Não iniciava o banho sem a presença do familiar e não conseguia encerrá-lo sem essa certificação o que estava tornando a vida em família “um verdadeiro inferno”, na expressão dos pais.

Dificuldades financeiras

Muitas vezes o TOC é incapacitante, impedindo a portador de ter uma atividade produtiva e de conseguir a sua independência econômica o que representa um peso a mais para a família. Em outras ocasiões o paciente tem dificuldades em se manter empregado em razão de sua baixa produtividade ou até mesmo de suas obsessões, rituais e evitações que podem se agravar no trabalho. São comuns os pedidos de demissão e as mudanças de emprego. Um estudo que entrevistou familiares de portadores do TOC mostrou que um grande número de pacientes adultos estava desempregado e morava com a família. Segundo 66% dos entrevistados esse era o provável fator responsável pelas dificuldades financeiras da família.

Formas de a família participar dos sintomas obsessivos

É muito comum os membros da família se envolverem nos rituais do TOC. Alguns exemplos:

• Tirando os sapatos, trocando de roupa ou lavando as mãos antes de entrar em casa.

• Lavando as roupas, bolsas, chaves, carteira, celular ou outros objetos “contaminados”, nos quais o paciente não toca e que seria desnecessário lavar.

• Oferecendo reasseguramentos: “Você não disse nada errado”; “Você não está contaminado com o vírus HIV ou da raiva (se não houve comportamento de risco)”; “Você fez a compra certa”; “As janelas estão todas fechadas”, “Suas roupas estão bem-combinadas”.

• Repetindo várias vezes: “Você não atropelou nenhum pedestre com o carro. Não precisa voltar para verificar”.

Não sentando no sofá ou na cama com as roupas que usou na rua. • Evitando os lugares que o paciente tem medo de freqüentar: cemitérios,

hospitais, funerárias.

Sintomas que mais interferem no funcionamento familiar

• Colecionismo

• Obsessões e compulsões por limpeza

Obsessões e compulsões por ordem e simetria Dúvidas, indecisão e lentificação motora