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2 REVISÃO DA LITERATURA

2.3 A AVALIAÇÃO DE CONHECIMENTOS, HABILIDADES E

O ensino médico tanto no Brasil quanto no mundo constitui um tema cadente de debate em diferentes campos, suscitando as mais diversas abordagens e avaliações, doutrinas e da prática da formação profissional, conectada à contemporaneidade de um mundo globalizado48. O aprender clínico têm se modificado, com a antecipação e diversificação de cenários, e com isso, os métodos de avaliação das competências clínicas precisam ser adaptados a essa nova realidade52.

A avaliação educacional de habilidades clínicas vem sendo reconhecida como uma das atividades mais importantes dentro do processo formativo dos profissionais da saúde e, em especial, do estudante de Medicina e do médico já graduado48,53. No caso específico do estudante de Medicina, a avaliação reveste-se de importância especial, visto que deve contemplar não só o conhecimento adquirido, mas também habilidades específicas e elementos de ordem afetiva, bem como as atitudes frente a inúmeros aspectos da prática profissional54.

As habilidades clínicas compreendem um conjunto de qualidades necessárias ao exercício da competência no atendimento à saúde (Quadro1).

Quadro 1 – Habilidades clínicas fundamentais.

 Comunicação e interação com o paciente e seus familiares e acompanhantes;  Entrevista médica – tomada da história clínica (anamnese);

 Exame clínico geral e especial;

 Raciocínio clínico e formulação de hipóteses;  Proposição de ações e tomada de decisões;

 Execução de medidas diagnósticas e terapêuticas;  Orientação e educação do paciente para a saúde;  Segurança do paciente.

A avaliação do estudante constitui uma das etapas de maior relevância em todo o processo educacional. Permite a obtenção de informações sobre o aprendizado e subsidia a tomada de decisões que, muitas vezes, são críticas para a vida do estudante. Além disso, a forma e o conteúdo das avaliações são altamente importantes, na medida em que constituem um poderoso determinante de como os alunos estudam e aprendem52,53.

Em 1990, George Miller propôs um modelo hierárquico de avaliação da competência clínica que diferenciava o nível da ação (fazer) dos outros níveis considerados complementares (saber, saber como e mostrar como). Avaliar a ação significa avaliar o que ocorre na prática. Embora nas últimas décadas inúmeros métodos tenham sido desenvolvidos e utilizados na avaliação dos alunos de Medicina, a maioria deles ainda tende a enfocar o “saber” ou “saber como”, habilidades da esfera cognitiva, essenciais, mas insuficientes para compor a competência clínica. Esses níveis podem ser avaliados por testes de múltipla escolha, exame oral, dissertações ou trabalhos escritos, estudos de caso, cenários clínicos simulados56.

Figura 1–“Pirâmide de Miller”, representando os diferentes componentes da aquisição do domínio das habilidades clínicas.

Fonte: Miller56 (1990).

Sobre os métodos de avaliação de habilidades clínicas, pode-se generalizar que têm como princípios básicos a observação do desempenho do educando em tarefas clínicas específicas, bem como o correspondente juízo de valor sobre a adequação daquele desempenho. A comparação dos comportamentos emitidos pelo

Fazer

Demonstrar

Saber como

educando com o padrão esperado de comportamentos, em cada situação ou contexto, permitirá a avaliação sobre o grau de domínio das habilidades clínicas envolvidas. Assim sendo, o processo de avaliação deve conter os seguintes componentes: 1) o avaliando; 2) o paciente em um contexto ou situação específica; 3) a(s) tarefa(s) clínica(s); 4) o observador; 5) o instrumento de registro dos comportamentos observados e 6) os padrões de comportamentos esperados, indicativos de domínio das habilidades avaliadas54.

Um método de avaliação bastante utilizado nos últimos anos é o OSCE, sigla proveniente do termo em inglês “Objective Structured Clinical Examination”, que avalia o desempenho do aprendiz em situações delimitadas, baseadas em um roteiro predefinido, em que há interação com paciente simulado ou com recursos didáticos por meio de estações de avaliação em rodízio55. Em cada uma dessas estações, o desempenho do educando é cuidadosamente observado, permitindo que o domínio de habilidades clínicas possa ser avaliado. As estações podem envolver a execução de tarefas clínicas relativamente simples, como a obtenção de partes da história clínica ou a realização do exame físico focalizado de um órgão ou aparelho, ou podem ser estruturadas de modo a requerer a abordagem “completa” de um(a) paciente, com a realização da anamnese e do exame físico, seguidos pela orientação do paciente ao diagnóstico. Questões ou tarefas escritas podem ser acrescentadas, de modo a permitir a avaliação dos aspectos cognitivos inerentes ao raciocínio clínico57.

Para garantir que o exame preencha os requisitos de validade, a estruturação de cada estação é previamente elaborada de modo que contenha situações ou contextos clínicos habituais, em grau apropriado de dificuldade, bem como envolva habilidades clínicas relevantes, ao nível adequado de complexidade. A fidedignidade é garantida pela composição de um número mínimo de estações, pelo preparo ou treinamento prévio dos pacientes e dos próprios avaliadores, bem como pela elaboração minuciosa dos protocolos de observação, que devem conter descrições detalhadas dos comportamentos esperados, indicativos do domínio das habilidades que estão sendo avaliadas58.

Em cada estação o estudante permanece um tempo predeterminado, realizando a tarefa solicitada, sob a observação de um avaliador que emprega um instrumento de registro pré-elaborado (checklist). Este consta de um protocolo de observação, contendo os comportamentos esperados do aluno, cuja ocorrência irá

demonstrar o domínio das habilidades em exame. As notas são dadas pelos observadores ou pelos pacientes, por meio de checklists isolados ou combinados com conceito57.

Outro método utilizado para avaliação de habilidades clínicas é o Mini-CEX, termo também derivado do inglês “Mini Clinical Examination”. Esse método foi idealizado para ser um instrumento de avaliação formativa, no qual o residente ou interno realiza uma consulta objetiva num paciente, sendo observado pelo professor. A consulta deve ser focada na necessidade atual do paciente e de rápida duração, pode acontecer em vários ambientes, podendo ser uma primeira consulta ou uma consulta de seguimento. Durante o encontro do aluno com o paciente, o examinador observa e faz anotações na ficha padronizada, oferecendo logo após o exercício avaliativo um feedback ao estudante, apontando-lhe as áreas em que foi bem avaliado e aquelas em que há necessidade de aperfeiçoamento. Finalmente, a competência geral é avaliada, não como uma média aritmética dos demais escores, mas como síntese da avaliação. Pelo fato de os encontros serem relativamente curtos e objetivos, e ocorrerem no ambiente de treinamento, cada estudante tem a oportunidade de ser avaliado várias vezes e por diferentes professores, e que torna a medida válida e confiável do desempenho daqueles que estão sendo avaliados59,60.

O OSCE e Mini-CEX, constituem métodos de avaliação prática de habilidades clínicas, que podem avaliar o “mostrar como faz” e o “fazer” da pirâmide de Miller (Figura 1), tendo cada um deles suas peculiaridades. No OSCE, simulando uma situação problema nem sempre frequente na prática formativa; no Mini-CEX, avaliando o aluno do internato e/ou médico residente no ambiente e rotina do serviço, sendo que, ambos os métodos propiciam a identificação e correção das deficiências de desempenho do avaliando através da realização do feedback53.

Em se tratando de avaliação de estudantes de graduação nas temáticas relacionadas à Saúde Sexual e Reprodutiva e considerando-se a natureza problematizadora desses agravos, que quase sempre envolvem questões ético- legais e valores individuais, configura-se ainda mais a necessidade da incorporação de métodos que propiciem a avaliação do conjunto de conhecimentos, mas também as habilidades técnicas, de comunicação e empatia focada na orientação em saúde sexual e reprodutiva, bem como as atitudes dos estudantes frente às situações vivenciadas na prática médica.