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3 OBJETIVOS

4.5 AVALIAÇÃO DE CONHECIMENTOS, HABILIDADES E ATITUDES

4.5.2 Avaliação de habilidades clínicas

Considerando a complexidade inerente aos conteúdos selecionados para serem avaliados nos estudantes e a necessidade de extrapolar a dimensão meramente cognitiva, foi definido o passo seguinte do estudo, que compreendeu a avaliação de habilidades clínicas em saúde sexual e reprodutiva.

Com objetivo de mensurar o desempenho dos estudantes no que tange à comunicação, relação médico-paciente e outras habilidades necessárias à efetiva abordagem dos problemas relacionados com a saúde sexual e reprodutiva foi escolhido o método de avaliação chamado OSCE (Objective Structured Clinical Examination), que tem sido bastante utilizado para avaliação de competência clínica em estudantes de graduação e residentes57,64.

Essa metodologia de avaliação baseia-se na utilização de casos clínicos simulados com pacientes padronizados (pacientes-atores), característica que fortaleceu ainda mais a escolha pelo método, visto que muitas das situações- problema em saúde sexual e reprodutiva são de ocorrência relativamente rara na prática dos estudantes, assim como nem todos têm oportunidade de vivenciá-las diretamente ao longo da formação (como exemplos, podemos citar as habilidades para noticiar um óbito materno, atender uma mulher com gravidez resultante de estupro ou mesmo o aconselhamento pós-teste de HIV). Com isso, fundamentou-se a adequação do método OSCE para os objetivos do presente estudo, uma vez que utiliza situações simuladas e padronizadas, com desempenhos esperados definidos previamente pelos avaliadores.

A literatura na área da Educação Médica demonstra que o OSCE é um método válido e confiável, pois permite observar aspectos ou domínios diferenciados da competência clínica do estudante, quando comparado com testes de conhecimentos cognitivos64. Pacientes reais podem ser utilizados para avaliar competência clínica, enquanto pacientes simulados (atores) são melhores para avaliar habilidade de comunicação. Adicionalmente, pacientes simulados e/ou voluntários saudáveis poderão também simular sinais clínicos necessários ao desempenho das tarefas preconizadas.

Como etapa preliminar à utilização do método OSCE no presente projeto, de forma semelhante ao que foi feito em relação à prova cognitiva, desenvolveu-se uma estratégia de desenvolvimento docente, que incluiu a realização de quatro oficinas de capacitação em “avaliação baseada por competências”, contando com a participação de professores externos (Profs. Drs. Vera Therezinha Medeiros Borges e Joelcio Francisco Abbade, do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Botucatu/UNESP; Profa. Dra. Maria Viviane Lisboa Vasconcelos, da Universidade Federal de Alagoas (UFAL) – Alagoas – AL; e Profa. Elisabete Bemfato Dezan, pedagoga vinculada à Faculdade de Medicina de Botucatu/UNESP).

Nas oficinas de capacitação docente foram abordados conceitos básicos em avaliação educacional, princípios da avaliação de habilidades clínicas, aplicação de instrumentos de observação e registro do desempenho, além de análise crítica sobre métodos de avaliação e seus atributos.

Partindo da capacitação docente, passou-se para o processo de trabalho de construção das estações de OSCE, utilizando-se como referencial teórico as recomendações explicitadas por Boursicot e Roberts (2005)57.

De acordo com os autores citados, os passos para construção das estações de OSCE que integraram o presente trabalho foram:

Constituição do grupo de trabalho. Foram incluídos professores do curso

de Medicina da UFRN e membros externos vinculados à Faculdade de Medicina de Botucatu/UNESP (Profs. Drs. Vera Therezinha Medeiros Borges e Joelcio Francisco Abbade).

 Seleção dos conteúdos. Para se determinar o que deveria ser avaliado, foram consideradas as habilidades necessárias à formação do médico generalista. As tarefas clínicas foram escolhidas de forma a contemplar o

nível de aprendizagem do avaliando e abranger os objetivos do presente estudo em relação à anamnese, comunicação, educação do paciente, raciocínio clínico, tomada de decisões e habilidades na relação médico- paciente. No quadro 6 as estações utilizadas são apresentadas de forma resumida, possibilitando uma visão das situações selecionadas e tarefas avaliadas nos estudantes. Os seguintes tópicos foram incluídos: violência sexual, contracepção de emergência, infertilidade, aborto/interrupção legal da gestação, atenção pós-aborto, planejamento reprodutivo, gravidez com HIV, gravidez com malformação fetal, climatério, atenção ao puerpério e mortalidade materna. As estações são apresentadas detalhadas nos apêndices E a O.

Quadro 6 – Estações de avaliação de habilidades clínicas em Saúde Sexual e

Reprodutiva pelo método OSCE.

ESTAÇÕES SÍNTESE DO CASO TAREFAS / OBJETIVOS

Violência Sexual

Adolescente 19 anos, estuprada há 2 meses, com teste de gravidez positivo

Anamnese, orientação e informação sobre direitos

Contracepção de Emergência

Adolescente 18 anos, teve relação sexual desprotegida há 12 horas

Anamnese, tomada de decisão, orientação clínica sobre uso de anticoncepcional de emergência Anencefalia Primigesta 22 anos, traz

resultado de ultrassonografia com diagnóstico de anencefalia

Informação sobre o prognóstico da malformação fetal e da gravidez, orientação sobre direitos e tomada de decisão Gravidez com

HIV

Mulher 20 anos, com 34 semanas de gravidez, traz resultado de sorologia para HIV (positivo)

Comunicação do resultado, informação e orientação clínica sobre prevenção da transmissão vertical

Atenção Pós- Aborto

Mulher 34 anos submetida à AMIU devido a abortamento incompleto

Informação e orientação clínica sobre o período de pós- abortamento

Atenção ao Puerpério

Puérpera 35 anos pariu feto morto de termo há 24 horas

Esclarecimento das dúvidas, orientação sobre o puerpério e cuidados futuros

Infertilidade Mulher 29 anos, casada há 3 anos, desejando engravidar

Anamnese e propedêutica do casal infértil

Morte Materna Mulher 23 anos teve hemorragia pós-parto volumosa com óbito no transoperatório

Comunicação do óbito ao marido, esclarecimento de dúvidas e procedimentos legais necessários Laqueadura Mulher 25 anos, casada, 3

filhos, em consulta de planejamento reprodutivo

Anamnese, aconselhamento reprodutivo, tomada de decisão e informação sobre direitos

DIU Mulher 23 anos, solteira, 1 filho, em consulta de planejamento reprodutivo

Anamnese, tomada de decisão, orientação clínica sobre uso do DIU

Climatério Mulher 47 anos, 3 filhos, com sintomas climatéricos

Anamnese e propedêutica do climatério

 Construção das estações. As estações foram construídas de forma coletiva, em termos dos seguintes aspectos: tempo da estação, descrição da estação e do material utilizado, instruções a serem fornecidas aos candidatos (comandos das tarefas), instruções para os examinadores, lista de materiais e/ou equipamentos necessários, script para o paciente padronizado, assim como definição de outros detalhes relacionados ao paciente padronizado, como idade, sexo, etnia e necessidade do paciente individual ou casal.

 Construção dos checklists. Envolveu a definição dos desempenhos esperados (padrão-ouro) para cada tarefa e comando, assim como da sistemática de registro e pontuação. Para cada estação foram elaborados de 10 a 15 itens de avaliação. Todos os checklists foram constituídos por um conjunto inicial de itens destinados a avaliar a dimensão “Comunicação” e seus diferentes domínios, e de uma segunda parte composta por itens com objetivo de avaliar a dimensão “Técnica”. A primeira parte do checklist foi comum para todas as estações, exceto para a estação “violência sexual”, na qual foram incluídos itens adicionais para avaliar se o estudante “promoveu privacidade” e “não desconfiou da veracidade das informações prestadas pela paciente”. Adicionalmente, acrescentou-se um item no final do checklist, destinado a avaliar o “Desempenho Global” do estudante em cada estação, utilizando uma escala de Likert com nove pontos (1 a 3, insatisfatório; 4 a 6, satisfatório; 7 a 9, acima do esperado).

 Simulação das estações e treinamento dos avaliadores. Essa etapa foi realizada com objetivo de avaliar a operacionalização das estações, assim como para detectar necessidades adicionais e o entendimento dos checklists pelos avaliadores. Com base nas observações registradas, foram realizados ajustes em algumas estações.

Em relação à operacionalização das estações com os estudantes, outras medidas foram necessárias, como a escolha do ambiente adequado par a avaliação. Foi escolhido o prédio de ambulatórios da Maternidade Escola Januário Cicco, por simular a ambientação necessária às situações avaliadas e também por ser um ambiente familiar aos estudantes, que lá já realizam atividades práticas

rotineiramente. De forma a garantir os requisitos no que tange à redução de ruídos, privacidade para estudantes e avaliadores e disponibilidade de salas, foi garantido junto à Direção da Maternidade Escola Januário Cicco que as sessões de OSCE seriam realizadas às sextas-feiras, período vespertino, ocasiões em que os ambulatórios ficariam fechados para pacientes externos e toda a estrutura ficaria à disposição do projeto.

Cada estação teve a duração de sete minutos e os alunos foram observados independentemente por dois avaliadores. Adicionalmente, em relação à dimensão “Comunicação” (primeira parte do checklist), os estudantes foram também avaliados pelos pacientes padronizados, com o objetivo de comparar a perspectiva do paciente acerca da comunicação estabelecida com o estudante e as impressões detectadas pelos dois avaliadores.

Para fins de análise dos resultados, as avaliações de desempenho foram calculadas a partir dos registros dos avaliadores e pacientes padronizados, tendo como base os 10 a 15 itens avaliados em cada estação. Para cada item foram utilizados escores binários, em que o comportamento realizado pelo aluno obteve pontuação de 1 (um) ou 0 (zero), caso tivesse obtido ou não o desempenho esperado, respectivamente. O número total de pontos e percentagens foram calculados para determinar o desempenho em cada estação, utilizando-se, para tal a pontuação média dos dois avaliadores em cada estação.

Cada sessão de OSCE foi constituída por seis estações, tendo sido realizadas quatro sessões de OSCE, no decorrer do ano de 2011, envolvendo a participação de um total de 121 estudantes do internato de medicina da UFRN, conforme abaixo discriminado:

 10 de junho de 2011: 29 alunos;  02 de setembro de 2011: 31 alunos;  14 de outubro de 2011: 31 alunos;  09 de dezembro de 2011: 30 alunos.

De forma a contemplar os critérios do OSCE como avaliação formativa, também foi previsto o feedback formativo para os estudantes participantes, ao final de cada sessão de OSCE. Como diretrizes para o feedback foram utilizadas as recomendações formuladas por Bienstock et al65(2007), que incluem: deve ser abordado sem julgamentos, com respeito mútuo e de uma forma interativa entre o

professor e o aluno, em ambiente seguro e com qualidade. Adicionalmente, deve ser oportuno, construtivo e específico para as diversas situações, propiciando o reforço, a melhoria das habilidades e/ou correção decomportamentos observados durante a avaliação.