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3. INTERNACIONALIZAÇÃO E AS NOVAS CONFIGURAÇÕES

3.3. A internacionalização no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba: os grupos

3.3.2. A Bunge

A Bunge é uma empresa global integrada de agronegócio, alimentos e bioenergia, que opera em toda a cadeia produtiva. Fundada na Holanda por Johann Peter G. Bunge em 1818 para comercializar produtos importados das colônias e grãos. Em 1876, Ernest Bunge – neto do fundador, expande a empresa para a América Latina, estabelecendo-se primeiramente na Argentina em 1876. Sua chegada ao Brasil se dá em 1905, em Santos, associando-se à Sociedade Anônima Moinho Santista. Desde então, a empresa vem operando no agronegócio e nos alimentos, na produção de grãos e processamento de soja e trigo. No setor sucroenergético, a empresa iniciou suas atividades em 2006 e atualmente possui participação em 8 usinas no país, além de possuir mais de 100 instalações no Brasil, entre fábricas, usinas, moinhos, portos, centros de distribuição, silos e instalações portuárias.

Com uma visão global, a Bunge transfere sua sede para os Estados Unidos, a fim de ficar mais próxima dos centros financeiros mundiais. A Bunge Brasil pertence à

holding Bunge Limited, fundada em 1818, com sede em White Plains, Nova York, EUA.

Com a união da Santista e da Ceval, adquiridas pela Bunge, a empresa passa a operar com o nome Bunge Alimentos. Cria-se também a Bunge Fertilizantes através da junção da Manah, Iap e Ouro Verde, ambas no ano 2000. O quadro 11 apresenta as unidades da Bunge nos ramos de grãos, açúcar, oleaginosas, portos, refinarias, embalagens de óleo e escritórios.

No Brasil, a Bunge é considerada umas das maiores exportadoras no ramo agroalimentar do país, onde comercializa e processa grãos/commodities, tais como milho, soja e trigo, produzindo alimentos (arroz, atomatados, azeite, farinha, maionese, margarinas, mistura para bolos e óleos). Também atua em serviços portuários e de logística, produz açúcar e bioenergia.

Ainda possui fábrica de atomatados, temperos e molhos prontos no estado de São Paulo, processamento de algodão no Mato Grosso, produção de gorduras em Goiás, Pernambuco, Santa Catarina e São Paulo, produção de maionese em Santa Catarina, produção de margarina em Pernambuco, Santa Catarina e São Paulo e transbordo em Mato Grosso e São Paulo.

Quadro 11: Unidades da Bunge por categorias e localização

Moinho de

Grãos Açúcar Oleaginosas Portos Refinarias

Embalagem de Óleo Escritórios Suape - PE Usina Pedro Afonso (Pedro Afonso-TO) Uruçuí - PI Barcarena - PA Suape - PE Suape - PE São Paulo - SP Brasília - DF Usina Santa Juliana (Santa Juliana-MG) LEM - BA Miritituba - PA LEM - BA Luziânia - GO Santa Luzia - MG Usina Frutal (Frutal-MG) Nova

Mutum - MT Santos - SP Luziânia - GO Jaguaré – SP Contagem - MG Usina Itapagipe (Itapagipe- MG) Rondonópoli s - MT São Francisco - SC Rondonópolis - MT Gaspar - SC Tatuí - SP Usina Ouroeste (Ouroeste-SP) Luziânia - GO Paranagua - PR Jaguaré – SP Santos - SP Usina Guariroba (Pontes Gestal- SP) Dourados – MS Rio Grande - RS Gaspar - SC Rio Fluminense - RJ Usina Moema (Orindiúva-SP) Ponta Grossa - PR Ponta Grossa - PR Usina Monte Verde (Ponta Porã – MS) Rio Grande - RS Joinville - SC Fonte: Bunge, 2018.

Disponível em: <http://www.bunge.com.br/Default.aspx> Org.: CAMPOS, N. L., 2018.

A empresa está ramificada pelo país, facilitando seu alcance nacional. A criação da Bunge Brasil é mais uma estratégia da multinacional em nacionalizar-se, buscando uma maior proximidade e identificação com o país em que está atuando.

A participação da Bunge no setor sucroenergético teve início no ano de 2006 com a comercialização de açúcar. Em 2007 a empresa comprou a primeira usina de cana-de- açúcar no Brasil localizada em Santa Juliana (MG), que pertencia ao grupo alagoano João Tenório. O grupo não chegou a processar cana na unidade, que pouco tempo depois de sua inauguração foi vendida para a Bunge. Além desta, outras duas usinas foram adquiridas pela Bunge no estado, uma em Frutal e outra em Itapagipe. Essas usinas pertenciam ao grupo paulista Moema, que descapitalizado diante a crise de 2008, vendeu suas unidades à multinacional. Segundo dados, a Bunge adquiriu cinco usinas do grupo Moema em 2010, por US$ 1,5 bi. O negócio foi feito a partir de trocas de ações da Bunge na Bolsa de Nova Iorque pelas do grupo brasileiro. Com o acordo, os acionistas da Moema teriam cerca de 9% de participação mundial na empresa do agronegócio (EXAME, 2010).

Na ocasião, a Moemapar (holding dos empresários Maurílio Biagi Filho, Eduardo Diniz Junqueira e ainda filhos de Armando Junqueira) obteria cerca de dois terços de participação total no grupo de usinas e controlaria 100% da unidade Moema, em Orindiúva-SP; na usina de Frutal (MG), o controle é de 56% e em Itapagipe (MG), de 43,75%. A estratégia da empresa foi manter aquisições e, até 2011, passou a controlar oito usinas em operação e uma em etapa de finalização.

Figura 8: Localização das usinas de cana-de-açúcar da Bunge no Brasil

Fonte: Bunge, 2018. Org.: CAMPOS, N. L., 2018.

As usinas de cana-de-açúcar da Bunge no Brasil estão localizadas nos seguintes estados: Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Tocantins, conforme figura 8. Em Minas Gerais estão as usinas Frutal, Itapagipe e Santa Juliana, em São Paulo as usinas Ouroeste, Guariroba e Moema, em Tocantins a usina Pedro Afonso e em Mato Grosso do Sul a usina Monteverde.

Segundo Souza (2012), foi em decorrência da crise de 2008 que o Grupo Moema se viu descapitalizado e pressionado pelos seus credores no pagamento das dívidas. Esses fatores contribuíram para as negociações de venda das usinas do Grupo Moema para a multinacional Bunge.

A crise de 2008 desestabilizou o Grupo Moema que havia adquirido financiamento também pelo Banco Mundial. Em virtude deste

compromisso, a instituição realizava auditorias ambientais na esfera da segurança do trabalho e recursos humanos para verificação do cumprimento ou negligência das exigências impostas ao grupo Moema, estabelecidas como pré-requisito para grandes empréstimos. Com a probabilidade do grupo não honrar o pagamento do empréstimo, o Banco Mundial exigiu que a cobertura dessa dívida fosse realizada à vista, eliminando o prazo acordado que se estendia entre cinco a dez anos. (SOUZA, 2012, p. 90).

A internacionalização que vem ocorrendo no setor sucroenergético é considerada por diversos pesquisadores como uma forma de garantir a sobrevivência dessas usinas que não conseguiram superar as sucessivas crises. O Grupo Moema foi um desses que pressionado para quitar suas dívidas, não encontrou outra saída que não fosse abrir o capital aos investimentos estrangeiros. Segundo Souza (2012), houve um “arrocho financeiro” que fez com que as instituições financeiras diminuíssem os empréstimos e fossem mais efetivas na cobrança do pagamento das dívidas, sobretudo de grupos e empresários já comprometidos com empréstimos.

Se muitos esperavam que o preço da cana-de-açúcar fosse deslanchar face à projeção expansionista, a crise trouxe o sabor amargo da frustração e o endividamento para alguns. Com a incumbência de solucionar esses entraves e como consequência das condições anteriores, a alternativa tomada pelo grupo Moema foi negociar a venda das agroindústrias canavieiras para a transnacional norte-americana Bunge Ltda. (SOUZA, 2012, p. 91).

Desde 2010, quando a Bunge adquire cinco usinas do Grupo Moema, vêm se consolidando no segmento de açúcar e bioenergia e ainda expandido suas operações nas áreas de fertilizantes, agronegócio e logística, alimentos e ingredientes, açúcar e bioenergia, formando a Bunge Brasil no mesmo ano. Ainda no segmento de açúcar e bioenergia, a multinacional inaugura em 2011 a primeira usina de cana-de-açúcar construída por ela, a usina de Pedro Afonso, no estado do Tocantins.

Desde a instalação da Usina Santa Juliana em 2006 e a aquisição pela Bunge em 2007, a produção de cana-de-açúcar teve um ligeiro avanço nos municípios no entorno da unidade, impulsionado pela presença da multinacional. Em Santa Juliana, por exemplo, a produção saltou de 300 toneladas no início da década de 2000 para 500 mil toneladas em 2007. A plantação de cana para a unidade de Santa Juliana atinge os municípios mineiros de Uberaba, Sacramento, Araxá, Perdizes, Santa Juliana, Pedrinópolis e Nova Ponte (Pesquisa de campo, setembro/2018). Esses municípios são visualizados no mapa 4.

Mapa 4: Municípios produtores de cana de açúcar pela Bunge - Unidade Santa Juliana e produção de cana (2000-2017)

Fonte: MAPA, UDOP, SIAMIG (2018); PAM-IBGE (2000-2017). Elaboração: CAMPOS, N. L., 2018.

A multinacional tem preferência por arrendamentos. Assim, 70% da produção da unidade de Santa Juliana é proveniente de contratos de arrendamento feitos diretamente na usina e lavrados em cartório. Os contratos são estabelecidos por um prazo de 8 anos e ficam sob responsabilidade da usina a preparação da terra, o plantio e a colheita23. Isso demonstra a monopolização do território pela empresa, controlando a produção por meio de arrendamentos. De acordo com informações do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santa Juliana, a empresa faz o pagamento à vista e geralmente o valor é superior ao dos produtores de outros cultivos, o que leva alguns proprietários a optar por arrendar suas terras para o cultivo da cana. Contudo, há uma parcela de proprietários resistente a essa prática, pois há uma degradação das terras após a inserção da cana.

Muita gente não quer nem saber, eu não quero usina nas minhas terras porque acaba com tudo, e geralmente acaba mesmo. O que a gente vê de sede abandonada aqui, que tinha vida naquilo ali, aquilo ali acabou. Geralmente acaba. Onde a usina chega acaba. (Entrevista – Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santa Juliana, setembro de 2018).

O restante da produção é proveniente de fornecedores. Segundo informações do Sindicato dos Produtores Rurais em Santa Juliana, são poucos fornecedores e muito poucos são associados ao sindicato. A contratação dos trabalhadores da parte agrícola é feita diretamente na usina e a produção de cana é toda mecanizada (corte, preparo da terra e plantio). Os fornecedores contratam as máquinas da usina para o cultivo da cana, que rende uma produção de 15 a 18 toneladas por hectare.

Observando os gráficos que apresentam a produção canavieira a partir de 2000, nota-se um crescimento significativo nesses municípios a partir do período em que a Bunge começou a operar em Santa Juliana. Nesses municípios, a agricultura está voltada para a produção de hortifrúti, sobretudo em Santa Juliana, com predominância da produção de batatas. Municípios como Nova Ponte, Sacramento, Pedrinópolis e Perdizes praticamente não registram produção de cana até meados de 2006, anterior a presença da Bunge.

23 Segundo dados de Pesquisa de campo realizada no Sindicato dos Produtores Rurais e Sindicato dos

Mapa 5: Municípios produtores de cana de açúcar pela Bunge - Unidade Itapagipe e produção de cana (2000-2017)

Fonte: MAPA, UDOP, SIAMIG (2018); PAM-IBGE (2000-2017). Elaboração: CAMPOS, N. L., 2018.

Em 2010 foi o ano que a multinacional adquiriu as empresas do grupo paulista Moema, incluindo as usinas em Frutal e Itapagipe, no estado de Minas Gerais. A usina de Itapagipe iniciou sua operação com a primeira colheita em 2006. Sua capacidade de moagem atual de cana é de 2 milhões de toneladas por safra. Os principais produtos dessa usina são o etanol hidratado, o VHP e o açúcar cristal (BUNGE, 2018). Nesta unidade não há cogeração de energia elétrica através do bagaço da cana.

O município de Itapagipe possuía uma produção canavieira modesta em relação aos outros municípios, pois a cana-de-açúcar não era uma atividade expressiva em suas lavouras até a chegada da usina e da multinacional. Essa produção se elevou com a presença da Bunge em meados de 2010/11, alcançando a produção de quase 1.500.000 toneladas em 2014. Além de Itapagipe, a cana produzida para essa unidade é cultivada em Frutal, Comendador Gomes, Prata, Campina Verde e São Francisco de Sales. O mapa 5 mostra a localização desses municípios e o crescimento das lavouras desde 2006.

Em Frutal, a usina foi instalada em 2007, ano que ocorreu sua primeira colheita. O município também conta com a usina Cerradão, controlado pela JP Andrade Agropecuária Ltda. e pela holding Queiroz de Queiroz Ltda., que iniciou suas operações no município em 2009 (SOUZA, 2012, p. 82). Antes de adentrar no agronegócio canavieiro, as principais atividades do município eram voltadas a agricultura e pecuária. Atualmente, com duas usinas localizadas, a produção de cana em Frutal alcançou 5.001.040 toneladas em 2015.

A usina Bunge – Unidade Frutal tem uma capacidade de moagem de cana-de- açúcar de 2,5 milhões de toneladas por safra. Em 2016, a unidade passou por sua mais recente modernização. Os principais produtos da usina são o etanol hidratado e o etanol anidro, o VHP e a eletricidade. Suas lavouras são localizadas em Frutal, Itapagipe, Comendador Gomes, Pirajuba, Planura e Fronteira (Mapa 6).

Mapa 6: Municípios produtores de cana de açúcar pela Bunge - Unidade Frutal e produção de cana (2000-2017)

Fonte: MAPA, UDOP, SIAMIG (2018); PAM-IBGE (2000-2017). Elaboração: CAMPOS, N. L., 2018.

Também é possível notar o aumento da produção de cana nos municípios fornecedores, principalmente após a chegada da multinacional. As unidades da Bunge de Frutal e Itapagipe estão localizadas próximas, cerca de até 100 Km, o que faz com que elas compartilhem alguns municípios na produção canavieira, como os de suas localizações em Comendador Gomes que faz divisa com os dois municípios. Lembrando que há outras usinas muito próximas que também são abastecidas por esses municípios, como o caso da Cerradão em Frutal e a usina Santo Ângelo em Pirajuba.

Analisando os mapas de atuação da Bunge no Triângulo Mineiro, o que chama a atenção é o tamanho do território controlado por ela. São acionados aproximadamente 16 municípios da região, abastecendo suas três usinas em uma monopolização do território e especialização dessas áreas na atividade sucroenergética.