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BASES CARTOGRÁFICAS NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM GEOGRAFIA: reflexos na prática docente

PARA QUEM ENSINA

2.2 A Cartografia na licenciatura em Geografia

Como afirmado anteriormente, e como constituinte do conhecimento comum, os conhecimentos cartográficos estão intrinsecamente relacionados com a ciência geográfica. No que diz respeito à formação de professores de Geografia, a ampla

maioria dos cursos de licenciatura no Brasil, contemplam a abordagem de disciplinas específicas de Cartografia em suas matrizes curriculares.

De acordo com Garcia (2008), são os cursos de formação em nível superior, que devem dar conta de uma construção do conhecimento que esteja embasada em conceitos e metodologias estruturantes, adquiridas a partir do incremento das inúmeras disciplinas que compõem seus currículos. Como base nesse argumento, depreende-se que as licenciaturas em Geografia devem ser o alicerce para uma formação sólida, inclusive no que diz respeito ao saber cartográfico.

Obviamente a formação inicial do professor não é o único caminho ou meio para que o mesmo alcance uma preparação adequada e suficiente para o exercício da docência, apesar de ser essa a forma de se obter a habilitação formal para tanto. Outros fatores, como as formações continuadas, a construção diária de conhecimentos, a inter-relação teoria e prática, também devem ser considerados. Porém, a graduação, é sim o alicerce de todo esse processo, fornecendo as bases teórico-metodológicas para o desenvolvimento de sua prática de ensino.

Nessa perspectiva, é possível vislumbrar dois tipos de conhecimentos ou saberes na formação e no trabalho docente, são eles: um saber disciplinar e um saber curricular, como bem explica Garcia (2008, p. 160-161):

Conceitualmente, o saber disciplinar corresponde às diversas áreas do conhecimento, interligadas nos currículos das universidades sob forma das disciplinas. Diz respeito àquelas habilidades cujo desempenho pode ser observado pelo domínio dos conceitos fundamentais necessários ao ensino de determinada matéria.

Tratando-se do saber curricular, este relaciona-se ao conhecimento que o professor deve ter do programa da disciplina trabalhada na sala de aula. É um tipo de saber composto pelo reservatório de conhecimentos que este professor possui, o qual serve de guia para que ele planeje suas aulas e avalie todo o processo ensino-aprendizagem no qual está envolvido.

Garcia (2008) distingue os dois tipos de saberes para tentar explicar que o conhecimento disseminado nos bancos acadêmicos visa construir uma base teórica acerca dos diversos temas inseridos nas inúmeras disciplinas que compõem as matrizes dos cursos de graduação. Porém, esse conhecimento absorvido na universidade termina por se adaptar, ou seja, acaba moldando-se ao espaço escolar,

exigindo um nível de absorção ainda maior por parte do professor, determinando, decretando até, que o mesmo possua profundo domínio daquele objeto de ensino.

Ao analisarmos especificamente as licenciaturas em Geografia, exaltando, sobretudo, o saber cartográfico, não parece ser diferente. Com base em pesquisas já realizadas (SILVA, 2004; FERREIRA, 2012), percebe-se que a Cartografia é um dos entraves presentes no processo de ensino-aprendizagem, seja na formação docente, seja na prática de ensino na escola básica. Em outras palavras, um aprendizado insuficiente, gera um ensino insatisfatório.

Para Costa; Azevedo (2014, p. 87), é importante lembrar que:

Entre as disciplinas trabalhadas na licenciatura, a Cartografia configura-se como uma das mais importantes da ciência geográfica, por oferecer recursos necessários para o estudo das representações espaciais dos alunos sobre alguns temas trabalhados no ensino de Geografia. Dessa forma, esse recurso apresenta-se significativo para mediar o processo de ensino-aprendizagem em Geografia escolar, por fornecer possíveis caminhos para se conseguir a apreensão dos conceitos geográficos.

Importante destacar na fala de Costa; Azevedo (2014) que, assim como já posto em um outro momento desse trabalho, a Cartografia auxilia a Geografia na compreensão dos diversos temas relacionados a dinâmica espacial, por meio da representação dos fenômenos geográficos. Denota-se, portanto que, uma correta formação cartográfica no curso de licenciatura, irá propiciar bases teórico- metodológicas consistentes para tal fim.

Costa; Azevedo (2014) ressaltam ainda que, a forma como os conhecimentos cartográficos veem sendo trabalhados na licenciatura em Geografia, muitas vezes não condiz com a sua importância enquanto ciência, seja pela má qualificação de professores, seja pela falta de interesse dos próprios acadêmicos, ou ainda devido a outros fatores como inexistência de materiais ou laboratórios adequados para atividades práticas. Pode-se afirmar então que, tais condições existentes na licenciatura irão refletir na prática de ensino dos futuros profissionais.

Durante a sua formação inicial, alicerce teórico-metodológico, o acadêmico da licenciatura em Geografia precisa saber ler um mapa, calcular uma escala e adquirir noções de projeções. Conforme assevera Castellar (2017), esses conteúdos precisam

ser abordados na graduação, pois para que o futuro professor de Geografia venha lecionar esses mesmos conteúdos na educação básica, é necessário ter se apropriado deles na licenciatura. Porém, a autora esclarece que muitas vezes essa formação é deficitária e os discentes terminam por concluir a graduação sem atingir um nível satisfatório de absorção e compreensão desses saberes cartográficos.

Com grande maestria, Bertin (2016), sustenta que para “ensinar” uma Cartografia que contribua para a formação do aluno, o professor precisa ter domínio sobre esse conteúdo e necessita de constante atualização acerca dessa temática. De outro modo, pode-se dizer que fazer uso da linguagem cartográfica, abordar conceitos e desenvolver um processo de leitura de mapas, constitui-se em necessidade fundamental para professores do ensino básico e tais objetivos só serão alcançados, se esse profissional possuir uma base cartográfica sólida em sua formação.

Nesse sentido, a literatura pertinente ao tema parece ser uníssona:

[...] é impossível um professor, que não seja leitor de mapas, ensinar seus alunos a ler mapas. Somente ensinamos e/ou auxiliamos a construir capacidades, noções, habilidades, atitudes e valores de que dispomos. Isso explica, em grande parte, o tipo de uso que se faz dos mapas nas escolas do ensino fundamental e médio e até mesmo no ensino superior (SOUSA; KATUTA, 2001, p. 120).

Com base nessa afirmação, pode-se dizer que os autores rechaçam completamente a possibilidade de se aplicar corretamente os saberes da Cartografia na prática docente, se previamente, esse profissional não tenha tido uma correta formação cartográfica em sua licenciatura. Souza; Katuta (2001), baseados em ideia formulada por Simielli, argumentam ainda que um professor precisa ter domínio sobre os conhecimentos cartográficos para assim conseguir transmiti-los aos seus alunos e esse domínio está atrelado a sua formação nos cursos de licenciatura.

Callai (2013, p. 76) nos ensina que: “[...] a partir das referências da Geografia acadêmica se estabelecem os referenciais para a Geografia escolar e esta é aquele conhecimento geográfico efetivamente trabalhado em sala de aula”. Analisando a proposição em tela, transpondo e ao mesmo tem especificando os conhecimentos geográficos para os saberes cartográficos, entendemos que a autora defende a ideia de que o aprendizado ocorrido na formação acadêmica é alicerce, mas também

servirá de norte para a prática docente do professor da educação básica. De outro modo, salientamos que o trabalho do profissional da Geografia em sala de aula do ensino básico, como não poderia deixar de ser, é norteado, é referenciado na sua graduação em nível de licenciatura.

Nas palavras de Boligian; Almeida (2017, p. 89), “[...] a Geografia escolar surge não como uma vulgarização ou uma adaptação de conhecimentos geográficos científicos, mas como uma forma de conhecimentos particular e original [...]”. Ora, partindo-se desse pressuposto, também podemos afirmar categoricamente que a Cartografia segue esse mesmo procedimento. Por mais que admitamos que a prática docente no ensino básico é em grande parte reflexo da formação do professor, este não é o único fator determinante e por mais que toda a sua base teórico-metodológica tenha sido adquirida no curso de uma licenciatura, espera-se que o profissional seja capaz de criar o seu próprio “estilo”, de adequar-se a realidades escolares das mais distintas. Em tese, pode-se dizer que os conhecimentos obtidos na academia podem ser vistos como uma mola mestra, mas é na prática docente da educação básica que o professor precisa aplicar esse conhecimento absorvido, fazendo com que o mesmo adquira uma originalidade, uma particularidade típica do universo escolar.

Corroborando com as opiniões expostas, concordamos que as bases teórico- metodológicas adquiridas durante a formação inicial do professor de Geografia, serão alicerces concretos para sua prática docente. No caso da Cartografia, especificamente, há de se considerar também que as dificuldades encontradas pelos acadêmicos durante a licenciatura, muitas vezes antecedem esse nível de formação. Em alguns casos, o que ocorre é um ciclo de aprendizagem deficitária no tocante aos saberes cartográficos, onde o aluno na educação básica também não teve uma base sólida e ao chegar no ensino superior, mormente na licenciatura em Geografia, as dificuldades de interpretação e compreensão dos temas relacionados a Cartografia passam a ser latentes. Sobre esse ciclo, denominado de “Ciclo do analfabetismo cartográfico”, trataremos no próximo tópico desse trabalho.