• Nenhum resultado encontrado

BASES CARTOGRÁFICAS NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM GEOGRAFIA: reflexos na prática docente

SABER CIENTÍFICO

2.4 Cartografia escolar: reflexos da formação e prática docente

sala de aula da escola básica e principalmente, compreender qual o nível de interferência da formação do professor e da sua prática docente nesse processo, permeiam a discussão que passamos a apresentar.

De acordo com Passini (2011, p. 41):

Pode-se aprender de várias formas e em diversos lugares. No caso da escola, esta tem incumbência de, ao trabalhar com os conteúdos, realizar a sua tarefa de transmitir o que a humanidade produziu ao longo do tempo.

Com base no exposto, é possível pensar que o processo de ensino- aprendizagem realmente pode se dá em qualquer espaço, mas é no ambiente escolar que este adquire um viés científico, ou seja, passa a ser sistematizado, adquirindo assim um valor mais significativo do ponto de vista teórico-metodológico.

A Cartografia escolar se desenvolve nos mais diversos níveis de ensino da educação básica, sendo considerada uma ferramenta indispensável no processo de leitura e compreensão dos fenômenos espaciais, funcionando com grande maestria na tarefa de auxiliar, complementar e contribuir para o desenvolvimento do campo de conhecimento da ciência geográfica. Num primeiro momento traremos à tona algumas discussões acerca de qual seria a definição mais aceita para o termo “Cartografia escolar” e como a mesma está inserida nessa interface entre Geografia, Cartografia e educação.

Segundo Castellar (2017, p. 130):

[...] a Cartografia escolar é uma opção metodológica, podendo ser utilizada em todos os conteúdos da Geografia, não somente para identificar a localização dos países, mas também para entender a relação entre eles, os conflitos e a ocupação do espaço, a partir da interpretação e leitura de códigos específicos da Cartografia.

Percebe-se que a Cartografia escolar tem por propósito possibilitar uma leitura e compreensão dos mais diversos fenômenos espaciais, a partir das representações desse espaço, utilizando-se para isso de uma linguagem e de um conjunto de códigos oriundos da Cartografia. Aliás, sobre esse objetivo inerente a Cartografia escolar, Fonseca; Oliva (2013, p. 63), fazem o seguinte alerta:

Vale lembrar que cabe à escola não só ensinar e representar as realidades apresentadas pelos mapas, mas ensinar o mapa, e discuti-lo criticamente de modo a que ele não se enrijeça enquanto linguagem. Definir a localização dos objetos como a função exclusiva do mapa ‘engessa’ o trabalho do professor e o olhar do aluno.

Sob essa ótica, fica claro a ideia de que o trabalho com mapas em sala de aula não pode se restringir apenas a identificar elementos presentes no mesmo. Desse modo, é função explícita da Cartografia escolar, criar condições para que esse trabalho siga na direção de promover não apenas uma identificação visual e espacial, mas que busque sobretudo compreender criticamente a importância dos fenômenos representados, suas características e a forma como se relacionam com outros elementos dispostos no espaço.

Geografia e Cartografia são ciências autônomas, mas que se inter-relacionam num processo de colaboração mútua para o ensino-aprendizagem. No que diz respeito à abordagem dos saberes cartográficos no ensino de Geografia (Cartografia escolar), é preciso compreender onde os mesmos se encontram, ou seja, em que patamar estão perante a ciência geográfica e a prática educativa de modo geral.

De acordo com Almeida (2010), a Cartografia escolar se estabelece numa interface entre Cartografia, Geografia e Educação. Dessa forma, os conceitos e teorias cartográficas assumem um posicionamento dentro do currículo das disciplinas voltadas para a formação de professores. Assim, consideramos ser esse um ponto crucial, tendo em vista que a Cartografia escolar desenvolvida na educação básica, tem sua fundamentação teórico-metodológica no saber científico proveniente da universidade. Para explicar tal interface, proposta por Almeida (2010), apresentamos o esquema elaborado pela autora (Figura 6):

Figura 6. Cartografia escolar.

Fonte: Adaptado de Almeida (2010).

O quadro explicativo proposto por Almeida (2010), apresenta uma interface que relaciona a Cartografia, a Geografia e a Educação e que evidenciando as entrelinhas dessa relação é que se insere a Cartografia escolar. Desse modo, a Cartografia seria responsável pela disseminação e abordagem dos conceitos, linguagens, materiais e outros elementos cartográficos; já a Geografia deve estar alinhada com a ciência cartográfica no intuito de fazer uso desse conhecimento para promover o debate sobre conceitos socioespaciais, interação homem e meio e representação do espaço. Por fim, devemos entender que na visão de Almeida (2010), essas duas ciências estão integradas em um processo de formação (educação), onde ao constituírem o currículo da licenciatura, acabam por subsidiarem métodos e conteúdos de ensino- aprendizagem.

A interconexão existente entre Cartografia, Geografia e educação, que por sua vez caracterizam a Cartografia escolar, tem fundamento não só no processo de

CARTOGRAFIA EDUCAÇÃO GEOGRAFIA

Conceitos Cartográficos Currículo Formação Docente Conceitos Socioespaciais Linguagem Gráfica Suporte e Materiais Aprendizagem Métodos de Ensino Relações sociedade e espaço Representações Espaciais CARTOGRAFIA ESCOLAR

formação de professores nos cursos de licenciatura, mas também encontra arrimo na educação básica. Isso porque as aulas de Geografia, ao abordarem conteúdos cartográficos ou fazerem uso desse conhecimento como metodologia para a compreensão de outros temas, contribuem para o processo formativo do discente, no sentido de desenvolver uma visão de mundo, uma leitura espacial.

Sobre essa questão dos reflexos que a formação do professor possui no trabalho desenvolvido com a Cartografia escolar, faz-se necessário destacar as palavras de Oliveira (2010, p. 18-19):

Os mapas constituem, sem dúvida, um dos mais valiosos recursos do professor de Geografia. Eles ocupam um lugar definido na educação geográfica de crianças e de adolescentes, integrando as atividades, áreas de estudos ou disciplinas, porque atendem a uma variedade de propósitos e são usados em quase todas as disciplinas escolares. Mas é somente o professor de Geografia que tem formação básica para propiciar as condições didáticas para o aluno manipular o mapa.

Torna-se evidente, portanto, a importância da formação do professor de Geografia no tocante aos saberes cartográficos. Nesta seara, é forçoso reconhecer que a Cartografia escolar para se desenvolver em sua plenitude, criando condições para a leitura de mapas, mas também para incentivar a capacidade crítica do discente de interpretar e correlacionar o conteúdo desses mapas com a realidade, perpassa pela adequada qualificação do professor de Geografia para tal fim, pois é esse profissional que irá mediar o trabalho em sala de aula.

O que parece ser uma questão simples e até óbvia, na verdade trata-se de um grande entrave no ensino de Geografia. Para explicar essa afirmação, transcrevemos a fala de Souza; Katuta (2001, p. 74):

A prática docente, no ensino fundamental, médio e até superior, tem revelado, em geral, que o ‘discurso’ assumido por muitos tem suplantado alguns saberes que, para a Geografia, são fundamentais. Na palavra de alguns professores, quando não apresentam domínio sobre determinados conteúdos geográficos: ‘A gente pula’. Existem saberes fundamentais a nossos alunos para que eles possam entender melhor o mundo que os cerca. Ao deixarmos de perceber tal ponto, ou a necessidade de dominarmos tais conceitos, informações e técnicas de instrumentalização específicos da Geografia, corremos o risco de propor para nossos alunos uma escola cujo discurso é ineficiente do ponto de vista da inserção dos diferentes sujeitos sociais no local em que vivem [...]

Um desses conteúdos geográficos de relevância, são os conhecimentos cartográficos. Se no caso em tela, como referenciado pelos autores, muitos professores ao não dominarem ou não se sentirem aptos a trabalhar esses conteúdos, acabam “pulando” os mesmos, significa dizer que o processo de ensino-aprendizagem fica comprometido de forma considerável.

E na sala de aula, como a Cartografia é propriamente trabalhada, quais conteúdos, que recursos são utilizados durante as aulas de Geografia? Em relação aos recursos que podem vir a ser utilizados no trabalho com a Cartografia escolar, estes podem ser dos mais variados, desde o livro didático (que por sua vez é um material com grande riqueza cartográfica, na maior parte dos casos), passando por jogos, videoaulas, investigações em campo, dentre outros. Importante lembrar que, independente dos recursos utilizados, o domínio do professor sobre os temas trabalhados é fator determinado nesse processo.

Como destaque nessa gama de recursos, faremos algumas considerações sobre o livro didático de Geografia, por entendermos que dentre as possibilidades citadas, é aquele que tem maior disponibilidade nas escolas da educação básica. Esse recurso, por sinal, é considerado uma importante ferramenta para a abordagem dos conteúdos geográficos como um todo e não apenas dos saberes cartográficos:

O livro didático é, sem dúvida, uma possibilidade para democratizar o acesso ao conhecimento, e como tal uma poderosa ferramenta para a construção da cidadania. Resta saber como o professor o usa e como os alunos recebem as informações apresentadas e os conteúdos nele organizados no dia-a-dia da sala de aula. Afinal, tradicionalmente, ensinar Geografia é uma tarefa que tem sido apoiada enormemente pelo uso do livro didático para disponibilizar os conteúdos (CALLAI, 2013, p. 42).

As palavras de Callai (2013) deixam explícita a importância do livro didático para as aulas de Geografia, mas pondera sobre a forma como esse recurso é utilizado pelos professores e recepcionado pelos discentes. Sob esse prisma, especificamente com relação a Cartografia, Cavalcanti (2013) alerta que os produtos cartográficos são muitas vezes trabalhados nos livros didáticos como meras ilustrações dos conteúdos, tendo por finalidade apenas identificar fenômenos estudados previamente.

Os conhecimentos cartográficos estão presentes em materiais didáticos desde meados do século XIX e passaram a vigorar nos livros de Geografia a partir da

segunda metade do século passado (BOLIGIAN; ALMEIDA, 2017). Dito isso, percebe- se que os saberes cartográficos estão presentes no ensino de Geografia e sobretudo nos livros e materiais didáticos geográficos a um tempo considerável e ao longo dos anos, a forma de distribuição e abordagem desses conteúdos foi bastante alterada. Para Sabota; Silva, (2017), os conteúdos cartográficos deixaram de ser algo pontual em um único volume ou série/ano da educação básica e passaram a ser trabalhados no percurso de todos os livros, gradativamente de acordo com o nível de cada série/ano.

Os saberes cartográficos presentes nos livros didáticos de Geografia também foram modificados ou acrescentados ao longo do tempo, mas de acordo com Boligian; Almeida (2017), os conhecimentos clássicos da Cartografia ainda hoje estão presentes nas escolas, por meio do que se pode chamar de “núcleo duro” de conteúdos da Cartografia. Os autores se referem a conceitos e noções cartográficas básicas como, direção e orientação; forma da Terra; paralelos e meridianos; latitude e longitude; leitura de mapas e do Globo terrestre, dentre outros. Nesse sentido, entendemos que, por mais que tenha ocorrido uma evolução na forma como esses conteúdos são trabalhados em sala de aula, implementando novas metodologias e desenvolvendo novos significados para essas abordagens, a apropriação desses conceitos e noções básicas constituem a essência da Cartografia escolar presente nos livros didáticos.

No tocante aos conteúdos cartográficos desenvolvidos na educação básica, notadamente no ensino fundamental em suas séries finais e contemplados nos livros didáticos, os mesmos são diversos: noções de orientação e localização espacial, coordenadas geográficas, fusos horários e estudo da escala cartográfica. De acordo com Sabota; Silva, (2017), os conhecimentos cartográficos deixaram de ser abordados de forma localizada, trabalhados em apenas uma série/ano escolar, mas passaram a fazer parte do currículo da disciplina de Geografia durante todo o percurso de ensino-aprendizagem.

Buscando apontar caminhos para o desenvolvimento da Cartografia escolar em sala de aula, Vieira; Sá (2011), advogam que o trabalho com mapas (entendidos como todo saber ou produto cartográfico) deve ser iniciado sempre a partir de realidades locais, pois o fato de o aluno já conhecer a sua localização, favorece a compreensão da educação cartográfica.

Infere-se que a Cartografia escolar, com todas as suas particularidades e características teóricas e metodológicas, constitui-se como um saber relevante e presente no ensino básico, notadamente no ensino de Geografia. Para Almeida (2011), a Cartografia escolar passou a estabelecer-se no currículo da educação básica e, desse modo, tem despertado também um largo interesse de pesquisas nos mais variados campos do saber, sobretudo na educação geográfica.

Destaca-se que a Cartografia escolar pode ser analisada e compreendida também a partir da formação e prática docente do profissional da Geografia que desenvolve suas atividades em sala de aula. Pois, o professor, enquanto sujeito mediador do conhecimento cartográfico deve apresentar domínio e prática didática para o trabalho com os conteúdos cartográficos.

CAPÍTULO 3

SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS PARA ABORDAGEM CARTOGRÁFICA