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1.1 O MÉTODO DA ECONOMIA POLÍTICA E AS CATEGORIAS DO OBJETO

1.2.2 A categoria inclusão no modo de produção capitalista

O termo inclusão aparece no cenário educacional na década de 1990 com as ações dos organismos internacionais e movimentos sociais. Essa categoria vem para substituir a categoria integração, que já não era suficiente para uma sociedade que se quer inclusiva, solidária e justa.

Com as políticas neoliberais, impõe-se sobre a sociedade as responsabilidades do Estado e de não se deixar excluir. Mesmo o público que antes era compreendido como estudantes da educação especial se modifica, compreende- se como excluídos uma lista quase interminável de sujeitos: deficientes, pobres, sem-teto e outros.

A pesquisa MEC/INEP/DEED, que trata da inclusão, mostra que nos anos de 2008 a 2014, com as políticas de inclusão, houve aumento significativo nas matrículas de pessoas com deficiência nas escolas comuns. No portal MEC (2015), encontramos dados que demonstram que o número de pessoas com deficiência nas escolas cresceu 381% nesses doze anos, e o Portal Brasil (2015) aponta que, de 2003 a 2014, a inclusão na educação básica no Brasil subiu de 29% para 79%.

Constatamos que no ano de 2008 havia 319.924 matrículas na educação especial e 188.047 em 2014, enquanto nas escolas de ensino regular havia 375.775 matrículas de estudantes incluídos em 2008, passando para 698.768 em 2014. Na tabela, a educação inclusiva é apresentada separada do ensino regular, mostra 53.232.868 estudantes na educação básica em 2008 e em 2014 um total de 49.771.371 alunos10.

Os dados evidenciam aumento significativo nas matrículas de estudantes inclusos no ensino regular. Podemos, no entanto, questionar os motivos que levam o sistema a apontar uma inclusão sem diferenças e apresentar modalidades separadas de quem são os in(ex)cluídos11. Isso nos faz refletir sobre o tipo de

inclusão educacional que temos.

Como categoria de “estudantes de inclusão”, as políticas apresentam a população que não se adequa à homogeneidade a que escola do sistema capitalista serve. A inclusão está presente na legislação, no entanto é necessário compreender que a política não se constitui apenas por leis, a legislação é uma expressão da política, pois qualquer projeto que não esteja ligado a um projeto político maior de país e Estado é contraditório.

Para alguns autores, a categoria que é considerada como símbolo de desenvolvimento de uma sociedade, não é mais que um desvio da realidade

10 Ver ANEXO 1. TABELA II- EVOLUÇÃO DO NÚMERO DE MATRÍCULAS NA EDUCAÇÃO BÁSICA

POR MODALIDADE E ETAPA DE ENSINO – BRASIL – 2008-2014.

11 Ver ANEXO 1. TABELA VI- TABELA DAS PESSOAS COM 5 OU MAIS ANOS DE IDADE, POR

TIPO DE DEFICIÊNCIA – NÚMERO DE ALFABETIZADOS GERAL- Disponível em: https://sidra.ibge.gov.br/tabela/3433#resultado – último acesso em 9 de julho de 2017.

presente nas lutas e nas diferenças sociais inegáveis, como se apresenta em Fontes (1996) e Oliveira (2004).

Inclusão é o mote da década de 1990 e não podemos deixar de considera-lo criticamente (como é), pois está inserido nas políticas públicas e educacionais, imposto em todas as áreas e para toda a sociedade como algo efetivo, natural e comum. O conceito foi desenvolvido num período de intensa produção de desigualdades e como oposição à exclusão.

Ao ser apropriado para o campo político, o termo é usado com sentido revolucionário. Garcia (s/d, p.22) nos diz que suas raízes estão nas relações sociais, apresentado em alguns momentos como superação da ordem social e em outros, como solução para a exclusão e desigualdades sociais.

Garcia (idem) destaca que a exclusão, se tomada como categoria para explicar a realidade, parte de um cenário desprovido de sujeitos históricos, trata apenas de seres que não se adaptaram à realidade reduzida ao capital. Entre conflitos políticos, as ideologias ganham força. A inclusão, por desconsiderar a desigualdade de posse dos meios de produção, sugere que todos podem ser incluídos.

Historicamente, inclusão e exclusão se fazem presentes no discurso direcionado às desigualdades sociais, com objetivo de justificação, categorização, classificação, mas não como resolução dos problemas socialmente criados. Esses termos adentram o cenário geral no século XX para substituir outros conceitos e são deslocados da luta social para o polo do poder com políticas públicas compensatórias.

Quando tratamos de inclusão, a exclusão fica em evidência. Oliveira (2016) alerta que não são termos novos, mas o uso generalizado nos diferentes campos das ciências sociais é recente e é trazido associado aos movimentos sociais no âmbito da cultura no início do século XXI.

Em 1996, na França, o uso do termo era rotineiro, no entanto, Oliveira diz que exclusão é um “conceito indefinido, generalizado e equivocado como categoria do pensamento científico”. (OLIVEIRA, 2016, p.14 e 15)

Se tratamos de inclusão, há que refletir-se onde e a quem se excluiu. Exclusão, segundo o mesmo autor (2016 e 2004), remete à expressão material de conceitos diferentes, que necessitam passar por um processo de determinação conceitual que lhe confira maior acuidade, a fim de poder ser usada

inequivocamente como categoria do pensamento científico, pois não se trata de um novo paradigma, mas de uma adequação ao capitalismo.

É preciso questionar os interesses que tem a sociedade, que quer incluir pessoas, quando o modo de produção, e portanto a lógica, é de exclusão. É preciso primeiro transformar o Estado e as relações sociais.

Marx trata da questão da exclusão, mas não a tematiza nos Grundisse e em toda a extensão da obra marxiana. A concepção de exclusão de Marx, num primeiro momento, apresenta-se presa a Hegel e à liberdade, tendo como horizonte a busca de reconhecimento jurídico.

Atualmente, as crises nas políticas e na educação evidenciam dados referentes à exclusão social e deixam visível o aumento da pobreza mundial, do desemprego e, na contramão, do aumento do capital global.

Na educação, inclusão e exclusão se ocultam e ocultam as razões da desigualdade social na lógica do capital. Segundo Bordin e Oliveira (2016, p.70), no passado, essa mesma lógica sustentava as sociedades em sua estruturação classista e com seus excluídos, mesmo sem usar esse termo.

Esses conceitos (inclusão e exclusão) ocultam o real, o conceito de classe oprimida, subalterna, colonizada, e por esse motivo requerem maior esclarecimento, tendem a camuflar relações se não tratadas na totalidade das relações de produção:

O conceito exclusão pretende abarcar em si mesmo as contradições, próprias do sistema do capital, torna-se uma teoria abrangente, para camuflar essas contradições, por meio de determinada compreensão que explique e organize a totalidade das relações sociais. Dessa forma estando a serviço da ideologia dominante, age a partir do ponto de vista da sociedade. (BORDIN e OLIVEIRA 2016, p.74)

Neste modo de produção, incluir é entendido como responsabilidade de todos para a manutenção da ordem. Se a perspectiva de Marx era um modelo vertical, nessa compreensão, inclusão e exclusão sugerem um modelo horizontal, onde uns ocupam o centro e outros a periferia. É preciso ver além das aparências para que não se torne um discurso político de mera adequação à ordem vigente.

Nas políticas, destacar a inclusão conduz à compreensão de que a educação condizente já está posta para todas as classes e representa os interesses dos surdos pela introdução da Libras nas escolas e na formação dos professores, sem considerar se na materialidade o bilinguismo se manifesta em educação bilíngue como direito e princípio constitucional de qualidade.

No modo de produção capitalista, essas categorias expressam o limite e o dilema da existência: inclui-se para excluir, exclui-se para incluir. A superação do dilema implica a transcendência da ordem do capital. Inclusão e exclusão são entendidas como constituintes.

Nesta tese, as políticas de inclusão são relacionadas à totalidade do modo de existência, isto implica que se considere o colonialismo e a defesa do bilinguismo. Para tanto, buscamos compreender suas presenças na formação de professores.

Em síntese, apresentamos a categoria de inclusão considerando as reflexões a respeito dos seguintes autores: Oliveira, que explicita de que se trata a inclusão, tendo a exclusão como eixo principal, para denunciar a omissão das lutas de classe; Kuenzer (2005), que aborda criticamente o tema, destaca que a inclusão refere-se aos interesses de mercado e que requer que se considere o modo de existência e sua característica excludente da posse da riqueza para muitos e includente para poucos; Fontes (1996), que nos diz que essa imposição trata-se de uma inclusão forçada. E autores como Garcia (2006, 2013, 2014 e s/d), Garcia e Michels (2014), Kassar (2011), Mendes (2006) e outros, que nos auxiliam a entender os limites das políticas de inclusão, na perspectiva crítica, apontando suas limitações de explicação do real.

Compreendemos que a inclusão somente adquire sentido no interior de uma totalidade complexa orientada na perspectiva da sociedade de classes. É possível entender que a inclusão e a exclusão são percebidas como processos inerentes ao sistema do capital, duas faces da mesma moeda, quando interesses universais são subordinados aos particulares.

Compreendidos os limites da categoria inclusão, há que se apontar ao final desta tese as possibilidades e os alcances das políticas inclusivas para surdos. Em relação à inclusão, destacamos o posicionamento dos surdos por uma educação bilíngue, em salas ou escolas próprias, o que tem sido apontado na sociedade e para formulação de políticas como guetização12 ou segregação. Esse debate é

contestado no relatório Feneis (2011), o qual nos diz que os documentos já

12 O um ideário classista de que a inclusão de surdos em classes ou escolas específicas para surdos

trata-se de um processo excludente e segregado, de formação de guetos, ou seja; guetização. Nessa visão aceita pelos formuladores de políticas, os interesses e considerações dos surdos não são levados em conta no processo. Há várias denúncias e manifestações dos movimentos sociais dos surdos e expressos na mídia, como o exemplo do link: https://oglobo.globo.com/rio/leia-artigo-da- pedagoga-patricia-rezende-sobre-politica-de-inclusao-2804129d onde a doutora Patrícia Rezende aponta a desconsideração do MEC com a inclusão de surdos.

garantem essa perspectiva educacional para os surdos, como ideal e como aquela que atende às especificidades dos sujeitos, e como tal não pode ser pensada como organização em guetos.

Faz-se necessário superar dialeticamente as antinomias como exclusão/inclusão, dentro/fora, normal/anormal e instaurar práxis histórico-sociais de negação da negação. Entendemos como caminho necessário a luta pelo reconhecimento e não por mera inclusão, o que só é possível como contraposição à lógica interna do sistema do capital, pela revolução, a resistência e as lutas por meio dos movimentos sociais.

Destacamos que embora o conceito de inclusão seja apresentado como omissão das lutas de classe é necessário tratá-lo na perspectiva crítica, pois é ele que encontramos nas políticas, portanto haveremos de analisá-lo.

Com os debates sobre incluir e excluir, relacionamos ainda aos surdos um conceito pouco lembrado, mas que se ajusta à realidade dos sujeitos: o colonialismo.

O conjunto de categorias de conteúdo conta também com bilinguismo e a educação bilíngue como pressupostos para a educação de surdos e a Libras enquanto língua materna dos surdos brasileiros, que estão vinculados às políticas de inclusão.

Ao considerar a tese de que a Libras enquanto língua materna ou língua de referência é essencial para que a inclusão dos surdos aconteça, torna-se premente compreendermos a educação dos surdos para além da educação especial, portanto ressaltamos que a inclusão pode fortalecer o capital, mas, omite e falseia as relações e as lutas de classe.

Para desvelar as condições em que os surdos estão sendo incluídos e as lutas travadas, passamos à próxima subseção, que trata das categorias colonialismo e bilinguismo.