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3. AS MODALIDADES DE CONTRATOS DE TRANSFERÊNCIA

3.2 A CESSÃO E A LICENÇA DE DIREITOS DE PROPRIEDADE

Quando a transferência de tecnologia envolve um direito de propriedade intelectual, como uma patente, a doutrina apresenta certa confusão para distinguir o direito de exploração, ou a licença para o uso,

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O INPI não considera a transferência de certificado de proteção de cultivar como um contrato de transferência de tecnologia. Em virtude da particularidade deste novo instituto e para efeitos de restrição de objeto, as cultivares não serão tratadas neste estudo, ainda que sejam bens protegidos por direitos da propriedade intelectual. No Brasil, existe uma lei específica que regula a proteção de cultivares: Lei n° 9.456, de 25 de abril de 1997. Nesta lei, define-se cultivar (art. 3°, IV) como “a variedade de qualquer gênero ou espécie vegetal superior que seja claramente distinguível de outras cultivares conhecidas por margem mínima de descritores, por sua denominação própria, que seja homogênea e estável quanto aos descritores através de gerações sucessivas e seja de espécie passível de uso pelo complexo agroflorestal, descrita em publicação especializada disponível e acessível ao público, bem como a linhagem componente de híbridos”. Fonte: REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Lei n° 9.456, de 25 de abril de 1997. Institui a Lei de Proteção de Cultivarese dá outras providências. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília.

da cessão ou mudança de titularidade do direito. De acordo com Luciano Timm, Ângela Estrella e Rafael Ribeiro,

a transferência de tecnologia é definida como mera permissão ou cessão de uso de direitos por um período de tempo, e não mudança de título de propriedade. Portanto, a celebração de um contrato de transferência de tecnologia não significa a transferência de propriedade da mesma.118

A respeito da diferenciação entre cessão e licença, utilizando o exemplo de uma patente, Denis Borges Barbosa esclarece que:

A licença é precisamente uma autorização, dada por quem tem o direito sobre a patente, para que uma pessoa faça uso do objeto do privilégio. Esta autorização tem um aspecto puramente negativo: o titular da patente promete não empregar os seus poderes legais para proibir a pessoa autorizada do uso do objeto da patente. Tem, porém, uma aspecto positivo, qual seja, o titular dá ao licenciado o direito de explorar o objeto da patente, com todos os poderes, instrumentos e meios que disto decorram.119

Por outro lado, a cessão, comparada ao instituto da doação, previsto no direito das coisas, é:

um acordo entre partes que tem como propósito a mudança do titular dos direitos sobre a patente, marca, programa de computador, etc. A transmissão pode ser global ou parcial, conforme compreenda ou não a totalidade dos direitos transmissíveis. Tem-se transmissão parcial quando o negócio jurídico estabelece limites quanto à área geográfica, quanto à extensão ou modalidade dos direitos.120 [grifo do autor]

118 ESTRELLA; RIBEIRO; TIMM, 2009, p. 87.

119 BARBOSA, Denis Borges. Contratos de Propriedade Intelectual. Disponível em: <http://www.denisbarbosa.addr.com/ibmec1.doc> Acesso em: 03 de fevereiro de 2012. 120 Id.

Com isso, tem-se que na cessão há uma transferência do direito de exclusividade, e não só seu exercício, como ocorre com a licença. Esta, portanto, é uma autorização para a exploração do direito, e poderá ser simples ou exclusiva, total ou parcial.121

A licença simples implica a autorização da exploração sem que o licenciante se exima de explorar aquele direito protegido, seja direta ou indiretamente. Desse modo, além de explorar a sua patente ou marca, por exemplo, poderá licenciá-la a outros sujeitos, que igualmente terão direito de exploração, nos termos e limites estipulados nos respectivos contratos de licença. Na licença exclusiva, contudo, o licenciante não poderá mais explorar aquele privilégio, embora continue como seu titular. Nesse caso, o licenciado será apenas uma pessoa ou entidade, que deterá o monopólio da exploração.

Especificamente no caso de licenças exclusivas de direitos protegidos pela propriedade intelectual, faz-se necessária uma ressalva quando a licenciante for uma instituição pública de ciência e tecnologia (ICT) no Brasil. Conforme se verá quando do estudo da modalidade dos acordos de parceria para pesquisa, desenvolvimento e inovação, neste caso a ICT estará obrigada a lançar edital, nos termos do artigo 6º, §1º da Lei de Inovação Federal, Lei n° 10.973, de 02 de dezembro de 2004.

Já a licença total é aquela que não impõe restrições ao licenciado, ao passo que a licença parcial estabelece limitações para exploração do direito, especialmente quanto ao:

a) prazo: pelo período de 5 anos, por exemplo;

b) alcance: como a produção de até 5.000 peças por ano; ou c) lugar: apenas no Brasil, ou no estado de São Paulo, por exemplo.122

Distingue-se também a licença voluntária da compulsória. O ordenamento nacional traz as duas previsões na Lei da Propriedade Industrial. A licença voluntária, que aqui nos interessa, é aquela em que o detentor do título de exclusividade decide, por interesse e livre iniciativa, negociar o seu licenciamento, de acordo com o art. 61 da referida lei: “O titular de patente ou o depositante poderá celebrar contrato de licença para exploração”. A licença compulsória, ao contrário, decorre de uma imposição legal caso sejam configurados alguns requisitos estabelecidos na lei:

121 Id. 122 Id.

Art. 68. O titular ficará sujeito a ter a patente licenciada compulsoriamente se exercer os direitos dela decorrentes de forma abusiva, ou por meio dela praticar abuso de poder econômico, comprovado nos termos da lei, por decisão administrativa ou judicial.

§ 1º Ensejam, igualmente, licença compulsória: I - a não exploração do objeto da patente no território brasileiro por falta de fabricação ou fabricação incompleta do produto, ou, ainda, a falta de uso integral do processo patenteado, ressalvados os casos de inviabilidade econômica, quando será admitida a importação; ou

II - a comercialização que não satisfizer às necessidades do mercado.

Os artigos 70, 71 e 72 continuam a tratar da matéria, elencando outras possibilidades de concessão de licença compulsória, como no caso de patentes dependentes umas das outras (art.70), e na situação de emergência nacional ou interesse público (art.71), quando as licenças serão concedidas de ofício, sem exclusividade, por prazo determinado e sem direito a sublicenciamento, sem prejuízo dos direitos do seu titular.

No que se refere à terminologia do objeto do contrato de transferência de tecnologia, o mais indicado é falar-se em transmissão, e não cessão ou licença, naqueles casos nos quais o objeto do contrato não compreende direitos de propriedade intelectual, como é o caso do contrato de fornecimento de tecnologia, ou da prestação de serviços de assistência técnica e científica - quando estão envolvidos know-how, conhecimentos e técnicas.123

Portanto, embora possa ocorrer um contrato de cessão ou transferência de titularidade de um direito de propriedade intelectual, o contrato de transferência de tecnologia por excelência é aquele que envolve a transmissão de um conhecimento ou técnica confidenciais, e/ou a licença de exploração ou uso de um direito protegido pela propriedade intelectual, a título oneroso e por um período determinado de tempo. Obviamente, haverá casos excepcionais, como uma licença gratuita ou por tempo indeterminado124, porém cabe aqui destacar aqueles mais relevantes para o direito e a economia, tratados a seguir.

123 Id.

124 A legislação determina que o prazo de uma licença será, no máximo, o período de duração do direito de exclusividade ou monopólio de exploração, isto é, 20 anos no caso de patente de invenção, ou 15 anos para modelos de utilidade, por exemplo.

3.3 OS CONTRATOS DE LICENÇA DE DIREITOS DE