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2.3 OS CONTRATOS DE TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA

2.3.2 A Legislação aplicável aos Contratos Internacionais

Normalmente, há grandes dificuldades jurídicas ao tratar-se de relações envolvendo elementos de internacionalidade, especialmente quanto à definição do ordenamento jurídico aplicável. A esse respeito, convém lembrar três conceitos importantes: Princípio da Autonomia da Vontade, Competência internacional e Direito Internacional Privado.

O princípio da autonomia da vontade é um dos mais importantes nas relações contratuais, visto que garante a liberdade em contratar. A jurista Marçal Bresciani conceitua tal princípio como:

O poder das partes de estipular livremente, como melhor lhes convier, mediante acordo de vontades, a disciplina de seus interesses, suscitando efeitos tutelados pela ordem jurídica. O princípio envolve, além da liberdade de criação do contrato, a liberdade de contratar ou não contratar, de escolher o outro contraente e de fixar o

arquivos/monografias_2008/Categoria_Profissionais/T1/3L/PREMIO_SEAE_MONOGRAFIA .pdf> Acesso em: 23 de setembro de 2011.

57 AREAS, Patrícia de Oliveira. Contratos internacionais de pesquisa e desenvolvimento de

Software no direito internacional privado brasileiro e a política nacional de desenvolvimento a partir da inovação. Florianópolis, 2010. 407 p. Tese (Doutorado em

Direito). Centro de Ciências Jurídicas, Universidade Federal de Santa Catarina. p. 276. 58 AREAS, 2010. p.279.

conteúdo do contrato, limitado pelas normas de ordem pública, pelos bons costumes e pela revisão judicial dos contratos59.

Por seu lado, Irineu Strenger defende que:

a autonomia da vontade como princípio deve ser sustentada não só como um elemento da liberdade em geral, mas como suporte também da liberdade jurídica, que é esse poder insuprimível no homem de criar por um ato de vontade uma situação jurídica, desde que esse ato tenha objeto lícito60.

Cabe ressaltar, que no âmbito do Direito Internacional Privado este princípio tende a tornar-se menos amplo, uma vez que as partes devem escolher o ordenamento jurídico ao qual desejam submeter sua convenção, observando a ordem pública. Bresciani resume que:

a autonomia da vontade das partes, no direito internacional privado, significa que as próprias partes podem escolher o direito aplicável. O elemento de conexão aqui é a própria vontade manifestada pelas partes, vinculada a um negócio jurídico de direito privado com conexão internacional.61

Assafim destaca que na prática internacional é comum as partes determinarem por meio de uma cláusula contratual a legislação aplicável ao mesmo, e sendo assim, esta eleição prevaleceria sobre o critério normativo. Como se viu, porém, tal determinação encontra limite nas disposições de ordem pública, de modo que a escolha da lei aplicável,

(...) na maioria das situações encontradas, (...) oscila entre a lei do juiz (lex fori), LICC [a Lei de

59 BRESCIANI, Marçal Garay. O princípio da autonomia da vontade na escolha do direito

material aplicável aos contratos internacionais. Disponível em:

<http://www.bresciani.com.br/index.php?codwebsite=&codpagina=00008739&codnoticia=000 0003079> Acesso em: 25 de maio de 2011.

60 STRENGER, Irineu. Da autonomia da vontade: direito interno e internacional. 2a ed., São Paulo: LTr, 2000, p. 66.

61 BRESCIANI, Marçal Garay. O princípio da autonomia da vontade na escolha do direito

material aplicável aos contratos internacionais. Disponível em:

<http://www.bresciani.com.br/index.php?codwebsite=&codpagina=00008739&codnoticia=000 0003079> Acesso em: 25 de maio de 2011.

Introdução ao Código Civil Brasileiro], e a lei aplicável segundo os critérios normativos (por exemplo, LPI).62

Com base no disposto anteriormente, cabe então conceituar Direito Internacional Privado, que Correia define como:

O ramo da ciência jurídica onde se procuram formular os princípios e regras conducentes à determinação da lei ou das leis aplicáveis às questões emergentes das relações jurídico- privadas de caráter internacional e, bem assim, assegurar o reconhecimento no Estado do foro das situações jurídicas puramente internas de questões situadas na órbita de um único sistema de Direito estrangeiro”.63

O Professor Luciano Timm complementa, ao lecionar que:

(...) para resolver o conflito de normas jurídicas, promulgadas nos diferentes países, de sujeitos de direito privado envolvidos em uma relação jurídica internacional, cada Estado soberano desenvolveu um direito de natureza interna, seguindo critérios de política legislativa doméstica. Este ramo é denominado de direito internacional privado (DIPr) ou de direito conflitual (conflict of laws). Exemplificativamente, o Brasil tem uma lei (Lei de Introdução ao Código Civil) para determinar a escolha de um sistema jurídico aplicável a uma relação jurídica internacional (...)64.

Com base nestes conceitos, Patrícia Areas define que “Competência internacional é a determinação da jurisdição competente para decidir a respeito de eventual demanda proveniente de conflitos internacionais, os quais envolvem mais de um ordenamento jurídico.65”

62 Id.

63 CORREIA, A. Ferrer. Lições de Direito Internacional Privado. 1ª ed. Coimbra: Alamedina, 2000. p.63.

64 ESTRELLA, Angela T. G.; RIBEIRO, Rafael P.; TIMM, Luciano B. Direito do Comércio

Internacional. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2009. p.15-16.

O autor João Marcelo Assafim enfatiza a solução mais praticada quando se fala em legislação aplicável a contratos internacionais:

O conflito de legislações em matéria de contratos, tem resposta, fundamentalmente, nos critérios de nacionalidade (lex personae) e do lugar (lex loci). Quando ambas as contratantes têm a mesma nacionalidade, o contrato é regulado por sua própria legislação nacional. Em outras situações, terá aplicabilidade a legislação do lugar de conclusão e perfectividade do contrato.66

Em matéria de solução de conflitos envolvendo contratos internacionais, a doutrina lembra também de outras duas alternativas possíveis: a eleição da arbitragem e a aplicação de convenções internacionais. No caso da arbitragem, há que se estudar a validade destas cláusulas perante o direito interno. No Brasil, a Lei n° 9.307, de 23 de setembro de 199667, rege especificamente esta matéria, e permite a revisão jurisdicional das decisões arbitrais.

No caso de conflitos envolvendo partes de países membros de um mesmo bloco econômico, como a União Europeia e o Mercosul68, na qualidade de signatários de determinadas convenções internacionais, pode haver a uniformização de leis em matérias específicas, como a circulação de mercadorias, podendo assim reger contratos dessa natureza69.

Neste âmbito, importa destacar a Convenção Interamericana sobre Direito Aplicável aos Contratos Internacionais, aprovada na CIDIP-V e organizada pela OEA no ano de 1994, que previu em seu artigo 7º que as partes têm autonomia para a escolha do direito material aplicável a um contrato internacional, e esta autonomia da vontade poderia ser expressa ou tácita.

Os países do Mercosul, entretanto, ainda não adotaram tal convenção, embora ela tenha trazido uma importante inovação ao

66 ASSAFIM, 2005. p. 117.

67 REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Lei n° 9.307, de 23 de setembro de 1996. Dispõe sobre a arbitragem. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília. 68 O MERCOSUL, Mercado Comum do Sul, foi instituído pelo Tratado de Assunção de 26 de março de 1999, assinado pela República Argentina, República Federativa do Brasil, República do Paraguai e República Oriental do Uruguai.

permitir ao juiz a aplicação das regras da Lex Mercatoria nos contratos internacionais, qual fosse o direito material aplicável ao contrato70.

Finalmente, estudados esses conceitos importantes para a definição da legislação aplicável aos contratos, convém na sequência estudar com mais detalhes os próprios instrumentos jurídicos referidos.