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2.1 CARACTERIZAÇÃO DA PAISAGEM

2.1.4 A chancela da paisagem segundo o IPHAN

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) foi criado em 1937 com o objetivo de proteger e valorizar o patrimônio cultural brasileiro e atua em conjunto com a sociedade para preservar realizações materiais e imateriais representativas da criatividade, diversidade, expressividade e excepcionalidade produzidas em todas as épocas e em todas as regiões do Brasil (WEISSHEIMER, 2009).

A partir das leituras realizadas é possível observar que as discussões fundamentais visando à proteção e valorização do patrimônio cultural, com debates relacionados à paisagem cultural se intensifica principalmente nos últimos anos, resultando em estudos e trabalhos que contribuíram para o desenvolvimento científico do tema, os quais identificaram na paisagem cultural o viés para a preservação do patrimônio cultural. Conforme a portaria do IPHAN 127/2009, que regulamenta o instrumento de proteção das paisagens culturais brasileiras a “Paisagem Cultural Brasileira é uma porção peculiar do território nacional, representativa do

processo de interação do homem com o meio natural, à qual a vida e a ciência humana imprimiram marcas ou atribuíram valores”.

No Brasil, dentre as ações e políticas desenvolvidas pelo IPHAN, se destaca um novo instrumento de preservação patrimonial e de gestão territorial, denominado chancela da Paisagem Cultural. Segundo Weissheimer (2010), a chancela da Paisagem Cultural é dos principais avanços no campo da preservação do patrimônio cultural brasileiro dos últimos tempos.

Segundo o IPHAN (2009), a paisagem é dotada de valores culturais e naturais, cuja valoração permite identificar quais as paisagens que devem ser reconhecidas como de suma importância e, portanto, devem ser preservadas e protegidas pelo poder público, com o auxílio de uma legislação apropriada para tal tarefa.

O conceito de paisagem cultural vem a inaugurar um novo capítulo no campo da preservação patrimonial, pondo fim à bipolaridade existente, até então, na proteção do patrimônio mundial, que desde sua origem esteve segregado em duas categorias: cultural e natural. Com base nele, as relações entre o construído e o natural passaram a ser vistas como uma unidade indissociável dotada de valor cultural (VASCONCELOS, 2011/2012, p. 52).

Com o uso do conceito de paisagem cultural, a ideia de um elemento isolado dá lugar a um conjunto de elementos que fazem parte do contexto local. Um bom exemplo seria considerar uma igreja que é um monumento tombado, mas que encontra-se inserida em uma determinada área em que outros elementos culturais próximos a ela são de suma importância e também necessitam ser preservados.

Ao considerar a paisagem cultural como a inter-relação das características naturais com as transformações resultantes da ação do homem sobre ela, é possível afirmar que a utilização da chancela da paisagem cultural é uma excelente opção, pois o seu uso em uma determinada área pode apresentar ao mesmo tempo um valor cultural e ambiental, contribuindo para a preservação da biodiversidade e dos modos tradicionais de vida da população local que reside nas áreas de interesse de preservação.

A portaria do IPHAN 127/2009 complementa os instrumentos de proteção patrimonial até então utilizados, uma vez que a proposta de chancela da paisagem pode ser considerada como uma ferramenta que apresenta um grande potencial para o planejamento ambiental e cultural, considerando as áreas que requerem preservação do patrimônio cultural e ambiental existentes.

Para compreender a paisagem cultural é necessário compreender a conjuntura das variáveis que a compõe, sendo que as inter-relações entre as mesmas é o que dá um caráter

específico. As alterações do meio ambiente provenientes dos fatores endógenos e exógenos, destacando o intemperismo e a ação antrópica, os quais resultam nas transformações na paisagem ao longo do tempo, tornam o estudo da paisagem dinâmico. O homem é o elemento que mais se destaca no processo de transformação da paisagem natural, sendo que o avanço tecnológico acelerou o processo de transformação nas últimas décadas.

Com a criação do Decreto-Lei nº 25/1937, a legislação brasileira confere valor de patrimônio para paisagens naturais e culturais. Assim, no art. 1º § 2 o Decreto-Lei nº 25/1937 afirma que:

Equiparam-se aos bens a que se refere o presente artigo e são também sujeitos a tombamento os monumentos naturais, bem como os sítios e paisagens que importe conservar e proteger pela feição notável com que tenham sido dotados pela Natureza ou agenciados pela indústria humana. (BRASIL, 1937).

A portaria do IPHAN 127/2009, em seu art. 1º afirma que: “A Paisagem Cultural Brasileira é uma porção peculiar do território nacional, representativa do processo de interação do homem com o meio natural, à qual a vida e a ciência humana imprimiram marcas ou atribuíram valores”.

A chancela funciona como um selo de reconhecimento e legitimação que atribui valor de patrimônio nacional a uma determinada paisagem cultural, estimulando com isso o turismo, a manifestação de culturas locais, o artesanato, o cultivo da terra de forma tradicional, entre outras atividades que preservem os valores culturais e ambientais chancelados (VASCONCELOS, 2011/2012, p. 62).

Considerando a portaria do IPHAN 127/2009, pode-se afirmar que a chancela da paisagem é um ato administrativo que pode envolver o poder público, a sociedade civil e a iniciativa privada, visando a gestão compartilhada da porção do território nacional assim reconhecida. A Chancela da Paisagem Cultural Brasileira se propõe a atrair recursos e contar com a sociedade civil, com a iniciativa privada e com as diferentes esferas governamentais para realizar ações que permitam salvaguardar a região chancelada.

A promulgação da chancela da paisagem como instrumento jurídico considerou a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, segundo a qual o patrimônio cultural é formado por bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem as formas de expressão, os modos de criar, fazer e viver, as criações científicas, artísticas e tecnológicas, as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais, os

conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.

Conforme o art. 3º da Portaria nº 127/2009:

A chancela da Paisagem Cultural Brasileira considera o caráter dinâmico da cultura e da ação humana sobre as porções do território a que se aplica, convive com as transformações inerentes ao desenvolvimento econômico e social sustentáveis e valoriza a motivação responsável pela preservação do patrimônio (BRASIL, 2009, p. 2).

De acordo com o artigo segundo, a chancela da Paisagem tem por finalidade atender ao interesse público e contribuir para a preservação do patrimônio cultural, complementando e integrando os instrumentos de promoção e proteção existentes. No artigo terceiro, da Eficácia, a chancela considera o caráter dinâmico da cultura e da ação humana sobre as porções do território a que se aplica, convive com as transformações inerentes ao desenvolvimento econômico e social sustentáveis e valoriza a motivação responsável pela preservação do patrimônio (BRASIL, 2009).

No dia 03 de junho de 2011, o Conselho Consultivo do IPHAN aprovou a Primeira Chancela da Paisagem Cultural Brasileira. As localidades de Testo Alto e Pomerode, que integram o Projeto Roteiros Nacionais de Imigração de Santa Catarina, receberam a Chancela. A partir de então, poderá ser observado na prática as diretrizes propostas na Portaria com suas limitações e abrangências (MAGALHÃES, 2011).

Segundo WEISSHEIMER (2010, p. 25).

A chancela apóia-se no arcabouço jurídico já existente e em formas e instrumentos de gestão compartilhada, dividindo entre cidadão e poder público a responsabilidade pela preservação de alguns dos nossos mais singulares contextos de vida. Além de possuir características peculiares de relação homem/ natureza, para que um lugar receba a chancela é preciso o estabelecimento de um pacto, entendido como ferramenta estratégica para sua preservação e gestão. O estabelecimento de pactuação prévia mínima, antecedendo a chancela, força os atores envolvidos a estabelecer um diálogo entre si e dar início a um processo de planejamento regional.

O uso da chancela da paisagem cultural apresenta um caráter agregador, permitindo o estudo e a análise de forma conjunta da paisagem, identificando as paisagens que apresentam os critérios necessários para se tornar patrimônio nacional, rompendo com a dicotomia entre o que é natural e o que é cultural, bem como, permitindo uma gestão conjunta a qual todos os interessados dialogam em busca de uma melhor gestão do patrimônio.