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2.3 USOS DAS GEOTECNOLOGIAS PARA O PLANEJAMENTO E GESTÃO MUNICIPAL

2.3.3 As técnicas de geoprocessamento e a análise de multicritérios

As técnicas de avaliação por multicritérios surgiram nas décadas de 70 e 80, em substituição aos modelos ortodoxos de pesquisa operacional, que surgiram na década de 50. A utilização da metodologia multicritério é favorável para problemas complexos, com diversos tipos de decisões e pontos de vista diversificados, considerados fundamentais no processo decisório, induzindo a situações conflitantes e de difícil mensuração (FREITAS et al., 2006).

A análise de multicritérios surgiu como uma metodologia formal para integrar as informações técnicas disponíveis, atribuindo valores a elas e considerando as partes interessadas, sendo especialmente valiosa nas tomadas decisões que envolvem as questões ambientais (HUANG et al., 2011).

A análise de multicritérios se destina ao desenvolvimento de estudos caracterizadores da realidade vigente e preditivos de situações futuras. A primeira etapa, cujo objetivo é caracterizar a realidade, promove espacialização das informações, cálculo de suas extensões territoriais de ocorrências, identifica as alterações espaciais ao longo do tempo e verifica as combinações de variáveis que caracterizam determinado fenômeno espacial (MOURA, 2007, p. 2905).

O objetivo geral da análise de multicritérios é ajudar o tomador de decisão na seleção da “melhor” alternativa, passando pela identificação de todas as alternativas de escolha possíveis, com base na utilização de critérios de escolha múltipla e prioridades dos critérios diversos. A análise de multicritérios auxilia na escolha da alternativa a ser utilizada na tomada de decisões, realidade essa comumente vivenciada por indivíduos, empresas públicas e privadas (JANKOWSKI, 1995).

O procedimento de análise de multicritérios é muito utilizado em geoprocessamento, pois se baseia justamente na lógica básica da construção de um SIG: seleção das principais variáveis que caracterizam um fenômeno, já realizando um recorte metodológico de simplificação da complexidade espacial; representação da realidade segundo diferentes variáveis, organizadas em camadas de informação; discretização dos planos de análise em resoluções espaciais adequadas tanto para as fontes dos dados como para os objetivos a serem alcançados; promoção da combinação das camadas de variáveis, integradas na forma de um sistema, que traduza a complexidade da realidade; finalmente, possibilidade de validação e calibração do sistema, mediante identificação e correção das relações construídas entre as variáveis mapeadas. (MOURA, 2007b, p 2900).

A análise de multicritérios permite integrar as informações de diversas variáveis, considerando as relações entre elas para a compreensão do todo, sem que haja uma sobreposição das informações. É geralmente definida como uma ferramenta matemática que ajuda no processo de decisão, permitindo a comparação entre diferentes cenários de acordo com vários critérios, muitas vezes conflitantes, a fim de guiar a decisão por intermédio de uma escolha criteriosa. Os usos de técnicas automatizadas permitem uma análise rápida e os resultados apresentam uma descrição integrada do território, sendo amplamente utilizados para o planejamento e gestão territorial. (PABLO; PINEDA, 1985)

A Análise de multicritérios é um procedimento metodológico de cruzamento de variáveis amplamente aceito nas análises espaciais. A estrutura que representa os procedimentos nela empregados é conhecida como Árvore de Decisões ou como Análise Hierárquica de Pesos. O procedimento baseia-se no mapeamento de variáveis por plano de informação e na definição do grau de pertinência de cada plano de informação e de cada um de seus componentes de legenda para a construção do resultado final. A matemática empregada é a simples Média Ponderada e há pesquisadores que utilizam a lógica Fuzzy para atribuir os pesos e notas (MOURA, 2009, p. 3-4).

As primeiras alocações de uso e cobertura da terra eram realizadas utilizando sobreposições de mapas manuais como parte da análise, considerando critérios que representam os aspectos físicos, econômicos e sociais. Todas as camadas eram feitas em transparências, as áreas mais claras apresentavam alternativas de decisão mais desejáveis, enquanto que as escuras indicavam áreas impróprias (MC HARG, 1967). Atualmente, os SIGs são muito utilizados na sobreposição ou combinação dos referidos critérios, contribuindo de forma rápida e eficaz com a busca da melhor alternativa.

A partir de década de 1990, a integração da análise de multicritério com os SIGs para resolver problemas de ordenamento do território, recebeu atenção considerável entre os planejadores urbanos, destacando-se na solução de problemas que se destacam pelos conflitos, como o uso e ocupação da terra (PHUA; MINOWA, 2005).

Os SIGs propiciaram a realização de análises espaciais, permitindo traçar cenários e simulações, e gerar sínteses a partir de um banco de dados sobre a realidade em questão. Permitem selecionar, ponderar e relacionar as variáveis desejáveis, representando em ambiente computacional a realidade de forma simplificada, cujos resultados podem ser expressos na forma de mapas, na caracterização da área, na identificação da falta de infraestrutura básica, do crescimento urbano desordenado e das áreas de risco, bem como a elaboração de estudos preditivos, sínteses, propostas de intervenção, entre outros (SILVA, 2012).

A abordagem, considerando as diversas variáveis presentes na área de estudo, requer o uso de novas técnicas para a obtenção, processamento e exibição das informações espaciais. Os Sistemas de Informações Geográficas (SIGs) são excelentes ferramentas para tal abordagem, pois permite atualizar ou recuperar informações espaciais, bem como gerar modelos cartográficos por combinação de diferentes maneiras, cujas camadas de informações são inseridas na base de dados (CHUVIECO; CONGALTON 1989).

A capacidade dos SIGs na manipulação de aspectos espaciais contribuiu para o aumento da utilização dessa ferramenta na análise dos critérios voltados para a avaliação e identificação de áreas prioritárias para a preservação, devido ao fato de que a maioria dos critérios importantes para o processo de planejamento é constituída por dados espaciais (PHUA; MINOWA, 2005).

Ao utilizar os SIGs é possível trabalhar uma gama de dados contendo as mais diversas informações sobre a realidade de uma determinada área em estudo. Após a identificação e caracterização da realidade, é possível identificar os problemas e as possibilidades de atuação, gerando as alternativas. Ao analisar todas as questões relevantes para o processo de decisão, faz-se a identificação de cada variável que compõe a realidade, analisando a referida importância destas, para, posteriormente, atribuir pesos as variáveis. A interação entre essas variáveis (considerando-se os pesos atribuídos a elas) resulta na identificação de restrições e indicações, cuja combinação permite a geração das alternativas e a escolha da melhor decisão (SILVA; 2012).

A realidade é extremamente complexa, apresentando inúmeros interesses. É comum a existência de conflitos de interesses. A tomada de decisão é um processo que envolve uma sequência de atividades, iniciando com o reconhecimento de um problema de decisão e termina com uma recomendação de decisão. A qualidade da decisão depende da sequência e da qualidade das atividades que foram realizadas (SHARIFI et al., 2006).

Existem duas formas para se chegar a tomadas de decisões: a primeira inicia-se com o desenvolvimento das alternativas para posteriormente avaliá-las, especificando valores e

critérios e, em seguida, com a avaliação e recomendação de uma opção; a segunda inicia-se com a valorização pré-definida e estruturação dos critérios para posteriormente “gerar” as melhores alternativas, alcançando um melhor resultado (KEENEY, 1992).

A análise de multicritérios auxilia o administrador público no processo de tomada de decisões por meio da combinação das diferentes variáveis, atribuindo os pesos desejados a cada uma delas. Posteriormente, gera-se um mapa síntese resultante da união dessas variáveis, obtendo como resultado a identificação das prioridades e os possíveis conflitos, permitindo assim a formulação das recomendações (OLIVEIRA; MOURA, 2007).

O SIG baseado na avaliação de procedimentos de multicritérios envolve um conjunto de alternativas geograficamente definidas e um conjunto de critérios de avaliação representado como camadas de mapas. A maior dificuldade é combinar os critérios de acordo com os valores de atributos conforme as preferências do analista, usando uma regra de combinação (MOKARRAM; AMINZADEH, 2010).

Ao atribuir os valores (notas e pesos) para cada um dos critérios a ser utilizado, a relação entre eles permite uma configuração baseada: na preferência, em que uma determinada variável apresenta uma importância maior com relação as demais variáveis; logo terá um peso maior; na indiferença, em que as variáveis apresentam a mesma importância, logo terão o mesmo peso; no trivial, quando um determinado tema é mais importante para uma determinada síntese a ser elaborada; e na Incomparabilidade, quando as variáveis apresentam dificuldades de comparação entre elas (PICTET; BOLLINGER,1999).

A natureza dos critérios pode tomar duas formas: fatores e condicionantes. Os fatores são por natureza contínuos (como o gradiente de declives ou a proximidade às estradas), indicando a aptidão relativa de certas áreas. Por outro lado, as condicionantes ou constrangimentos, são sempre de caráter booleano (como as áreas urbanas). Estas servem para excluir certas áreas de consideração, durante o processo de avaliação (FERREIRA et al., 2004:10).

O trabalho desenvolvido por Phua e Minowa (2005) utilizou um Sistema de Informação Geográfica (SIG) para realizar uma análise de multicritérios para o planejamento da conservação da paisagem. O uso dessa metodologia permitiu aos tomadores de decisão avaliar e identificar áreas prioritárias para a conservação na Malaysia, a partir de um conjunto de preferências, critérios e indicadores presentes na área estudada. Ao final, o estudo recomendou a inclusão de duas áreas, a primeira, referente a um polígono florestal com 359 ha, vizinha ao parque Kinabalu e, a segunda, a oeste do parque, com 4.361 ha, bem como a criação de um corredor ecológico ligando as potenciais áreas protegidas ao parque, visando facilitar a circulação de animais.

Mokarram e Aminzadeh (2010) avaliaram a análise de multicritérios e o uso da lógica fuzzy para estudos de aptidão das terras para usos específicos, identificando o potencial para determinadas culturas e para a agricultura irrigada, visando obter informações para o ordenamento e desenvolvimento do território, contribuindo para o planejamento segundo a melhor utilização dos recursos.

Sharifi et al. (2006) desenvolveram e avaliaram o uso da análise espacial de múltiplos critérios para o plano integrado voltado ao sistema de transporte público e desenvolvimento do uso da terra no Vale Klang, na Malásia. Buscaram projetar e recomendar a rede ferroviária mais adequada, que, juntamente com a infraestrutura de transporte e outras já existentes ou planejadas, devem suprir as demandas socioeconômicas, ambientais e técnicas.

No trabalho desenvolvido por Hokkanen et al. (1998), visando a utilização de um método baseado na análise de multicritérios para auxiliar nas tomadas de decisões junto ao plano geral do município, o processo de valorização das variáveis ocorreu a partir de uma avaliação realizada por um perito ou um grupo de especialistas, atribuindo valores para cada um dos critérios definidos. Ao avaliar as questões ambientais, estabeleceu-se uma escala de 1 a 5 pontos, em que o valor 1 representa significativas alterações dos ecossistemas e o valor 5 representa efeitos mínimos para os ecossistemas. Assim, as áreas que estiverem com os valores mais altos são propicias à ocupação, as quais não causarão mudança ou estresse adicional ao ecossistema.

O uso da análise de multicritérios, a avaliação de políticas públicas e a escolha dos investimentos públicos geralmente requerem uma harmonização entre os pontos conflitantes. Observar a realidade de forma sistemática, transparente e eficiente é fundamental nesse processo. Como exemplo pode-se citar uma política de transporte, em que os investimentos na construção de estradas em uma região metropolitana, trará significativos benefícios econômicos e sociais. Conflitos costumam surgir nessas situações, porque trazem consequências diferentes para as unidades políticas espaciais e para a sociedade que se encontram inseridas na realidade a ser alterada (Bana e Costa, 2001).

Os projetos podem apresentar diferentes impactos no nível local e regional, consequentemente, um projeto considerado importante para o benefício regional pode não trazer nenhum benefício para a população local e vice-versa. Isto pode resultar em dois tipos de conflitos: por um lado, entre a melhor escolha para a região e a melhor escolha para o local. Portanto, faz-se necessário a avaliação da análise do grau de conflito que podem criar, e se a área escolhida é a melhor opção para tal transformação (SILVA, 2009).

Além disso, o poder público conta com outros problemas, como recursos financeiros limitados, preocupações conflitantes, variabilidade espacial da política de impactos e diversos tipos de incerteza nos dados disponíveis para avaliação de políticas, o que torna esse processo problemático (Bana e Costa, 2001).

Com o conhecimento das possíveis alternativas, resultantes da análise de multicritérios, realiza-se uma indicação para uma futura ação. A análise de sensibilidade e a análise dos conflitos permitem propor as melhores alternativas, candidatas à implantação, ou realizar comparações com as propostas já existentes, verificando se elas são condizentes com a análise realizada.

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS