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A evolução recente da vertente político-institucional face a um passado

No documento Tese_Doutoramento 27dez.pdf (páginas 62-66)

CAPÍTULO 2 – O GOLFO DA GUINÉ E O PETRÓLEO

2.1. Caracterização e enquadramento dos principais países produtores de petróleo

2.1.2. A evolução recente da vertente político-institucional face a um passado

realidade, questão que pode ser vista quer a partir de uma perspetiva exógena, da geopolítica, quer na ótica do próprio golfo da Guiné, onde são evidentes alguns efeitos daí decorrentes.

2.1.2. A evolução recente da vertente político-institucional face a um passado comum

À área geográfica considerada correspondem povos de diferentes etnias (bantoues, sahéliennes,…), com crenças distintas (cristãs, muçulmanas e animistas),

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tendo um passado comum de longa sujeição à colonização europeia, sendo de salientar a existência de esferas de influência francófona (Costa do Marfim/ Benim/ Camarões/ Gabão/ República do Congo e R.D.C.), portuguesa (Angola e São Tomé e Príncipe), anglófona (Nigéria, Gana, tendo o Togo correspondido a uma solução híbrida), e castelhana (Guiné Equatorial).

No que respeita à reflexão política no período pós-colonial, um conjunto alargado de autores concluiu que o conceito de Estado em África é muito diferente do que vigora noutras regiões posição que é suportada por diversas taxinomias, tendo como referencial a democracia liberal (vide, p. e., J. R. Santos, 2010. p. 4). No sentido de ilustrar esta posição recorremos á tabela classificativa elaborada por L. Diamond, que compreende, por ordem das formas sucessivamente mais afastadas daquele padrão, as democracias eleitorais, os regimes ambíguos, os autoritários concorrenciais, os eleitorais autoritários hegemónicos, e os autoritários fechados (cf. 2002, pp. 29-33). A destrinça entre as diversas tipologias compreendidas no quadro que o autor designou por regimes híbridos, assentou em três critérios (as percentagens dos lugares legislativos assegurados pelo partido no poder, e dos votos obtidos pelo candidato apresentado às eleições presidenciais por este mesmo partido, e o número de anos que o governante incumbente ocupa o poder de forma continuada (vide., idem, p. 23). Assim, os países que integram o golfo da Guiné surgem maioritariamente classificados como regimes autoritários concorrenciais, ou eleitorais autoritários hegemónicos, surgindo como exceções a Nigéria e a República Democrática do Congo tomadas, respetivamente, como regimes ambíguo e autoritário fechado (cf., tabelas das pp. 30-31).

Fazendo apelo, por outro lado, a enfoques de vários estudiosos que extravasam o âmbito estrito do quadro de análise que se acabou de considerar, J. R. Santos relaciona as desordens continuadas e a manifesta ineficácia da ação política vigente em muitos Estados africanos, com o desrespeito pelas regras políticas e a predominância de

soluções individualizadas para problemas sociais complexos, através do recurso a várias redes de patronage (política), controlas pela elite reinante (cf., 2010, p. 4). Esta última perspetiva, mais descritiva e que remete para outros níveis de determinantes do panorama político vigente, constituirá o elemento adicional que ajudará a enquadrar os desenvolvimentos apresentados na breve súmula de casos selecionados sendo que de momento nos circunscreveremos ao domínio essencialmente compreensivo da vertente política.

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A Nigéria ocupa uma área de 932 800 km2. Em 2010, contava com uma população de cerca de 158.4 milhões de habitantes (UNDESDA/PD), tendo como credos predominantes, o católico e o muçulmano, Independente desde 1960, o poder político está estruturado nos níveis federal, estadual e local, a que correspondem, 36 Estados, um território federal onde se localiza a capital (Abuja), e 774 governos locais (cf. A. Gboyega

et al., 2011, p. 11). O quadro referido está porém longe de ter sido constante ao longo da história do país. Com efeito, o alargamento do número de Estados constituiu um expediente político que remonta a 1967, aplicado nos períodos de dominação civil e naqueles em que prevaleceu o poder dos militares (como em 1966-1979 e, em 1983-1999) (cf., M. Thurber et al., 2010, p. 9, A. Gboyega et al., 2011, p. 12, e D. M. Metumara, 2010, p. 93).

Um dos seus problemas assenta na sua extensa pluralidade étnica (389 grupos), sendo de destacar os Hausa-Fulani, os Igbo, os Yoruba e os Kanuri (cf., A. Gboyega et

al., 2011, p. 11), sendo este fator agravado pelo enxertar da disparidade de credos, mormente pela clivagem entre o Norte muçulmano e o Sul mais animista ou católico. Para D. M. Metumara, o problema étnico, ou, nas palavras deste autor, o desafio do etnonacionalismo à democracia (que, em parte, foi contido, ainda que de forma aparente nos períodos de dominação militar), viu-se agudizado na fase atual de retorno ao poder civil após 1999, com a 4ª República (cf. 2010, pp. 94-95). Segundo afirma, a identidade étnica é manipulada pelas elites, que visam alcançar vantagens políticas e económicas num contexto em que o Estado tem autonomia limitada e é incapaz de arbitrar os grupos étnicos rivais, tornando-se o terreno central das contestações na ótica do controle de vastos recursos, situação que culminou com a emergência de organizações como o MEND, o MASSOB e a OPC, e na proliferação de práticas ilícitas, coroadas por episódios de violência extrema que conduziram à afetação permanente de uma unidade militar à região do delta do Níger (cf., idem., pp. 98-102). Nesta mesma ótica explicativa importa precisar, sem prejuízo de ulterior retoma mais aprofundada, que o poder político se tornou instrumento de patronage (vide, a relação que p. e., A. Gboyega et al, op. cit., p. 14, estabelecem entre esta e as fraquezas do regime democrático), sendo de acrescentar que, nesse âmbito específico, a empresa petrolífera nacional desempenha funções muito alargadas (cf., M. Thurber et al., 2010, em especial, p. 7).

Angola ocupa uma área de 1 246 700 km2 e de acordo com os resultados preliminares do recenseamento realizado em 2014, a sua população ascendia a 24383.3

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mil habitantes (cf. Resultados Preliminares do Recenseamento Geral da População e da Habitação de angola 2014, quadro 0.1, p. 27, in http://censo.ine.gov.ao/. Tem como etnias predominantes os ovimbundos, os ambundos e os bakongos, que representavam respetivamente 35, 25 e 13% do total, enquanto as populações mestiça e branca são minoritárias (cf., www.angoladigital/ e K. Alexander et al., 2010, p. 21). Angola tornou- se-independente em Novembro de 1975, assentando a sua organização administrativa em 18 províncias, subdivididas em concelhos, tendo o país sido assolado por longos períodos de guerra durante as quatro últimas décadas do século passado. Com efeito, à luta pela independência, seguiu-se um conflito fratricida entre o MPLA, a UNITA e a FNLA e, após um interregno, a disputa pela hegemonia, tendo como protagonistas os dois primeiros partidos mencionados, cujo desfecho, em 2002, veio precisar e alargar a todo o território, a marca do domínio do MPLA, consolidando, em simultâneo, a figura do seu líder carismático, J. Eduardo dos Santos, sobrando da fase anterior, as pretensões autonomistas da FLEC, confinadas à província de Cabinda, alvo continuado do interesse das potências colonizadoras vizinhas e dotada com riquezas energéticas consideráveis.

A complexidade da história política recente, em que avultam, com interregnos, o recurso ao escrutínio popular e a praxis do partido no poder, conduziram a que os analistas políticos tivessem dificuldade na catalogação precisa sobre a natureza do regime reinante em Luanda, considerando J. R. Santos, que se trata de um Estado que está entre uma democracia multipartidária e um regime político autoritário, sem transparência e incapaz de construir as estruturas institucionais de um Estado moderno (vide J. R. Santos, 2010, pp. 12-15). Na realidade, deixando de lado a figura controversa do líder, cujo enorme parcela de poder foi recentemente majorada pela imposição da revisão constitucional de 2010, que terá constituído o lastro da transição de um regime semipresidencial para o presidencialismo, (idem), será de privilegiar, sobretudo, o papel do MPLA. A este propósito, é de frisar, segundo C. Messiant, que o objetivo último deste partido, é o de criar um regime hegemónico autoritário adaptado à política multipartidária eleitoral (cf., 2007), ou no dizer de Péclard (2008), este ator político, aprofundou a confusão entre

partido, estado e administração, quer na aceção simbólica quer material (cf. R. S., Oliveira, 2011, p. 293). A evolução recente tem evidenciado a afirmação externa de Angola, um aspeto de que R. S. Oliveira discrimina os vetores de apoio, enquanto A. Malaquias segmenta as distintas posturas face aos grandes atores nacionais presentes na cena internacional. Conclui-se que o claro upgrade em termos externos tem uma relação

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muito parcial com os progressos internos, nomeadamente em termos de capacidade de inclusão, o que não obsta a que o primeiro daqueles académicos tenha revisto a sua catalogação de 2007, deste país como um Estado falhado de sucesso (vide, 2011, em especial, pp. 305-306 e A. Malaquias, 2011, pp. 16-17).

Por sua vez, a Guiné Equatorial, ocupa uma área de 28 051 km2. Em 2010 contava com cerca de 700 mil de habitantes (UNDESDA/PD), apresentando a particularidade da sua população quase corresponder a uma etnia (quatro dos cinco grupos existentes são bantos, sendo de referir que apenas os fang, representam cerca de 85% da do total nacional) (cf. J. Rieucau, 2004, p. 2). O país, cuja organização administrativa assenta em 7 províncias, tornou-se-independente em Outubro de 1968, sendo de salientar, no contexto de um marcado desinteresse histórico dos ocupantes europeus, que a potência colonizadora, a Espanha, não criou nem um mercado nacional unificado nem estruturas públicas eficientes, tendo deixado as massas populares empobrecidas (vide respetivamente, J. Rieucau, pp. 3-4 e B. Mcsherry, 2006, p. 24). O novo poder instituído (M. Nguema), veio a corresponder a uma mistura de caudilhismo sul-americano e do Big

Man africano, tendo a situação piorado com o novo presidente (M. Obiang), reproduzindo todas as características agravadas dos estados frágeis (instituições particularmente enfraquecidas, dimensão residual dos programas sociais), avivadas por uma gestão inadequada dos recursos públicos (vide, B. Mcsherry, 2006). A situação histórica agrou- se a partir de 1995, com o início da exploração de petróleo e a entrada em 1995, de um grande operador norte-americano (Mobil). Conquanto os EUA tenham procurado influenciar o poder no sentido reformista, a verdade é que se assistiu à afirmação de um estado rentista e patrimonialista dos mais primários à escala global (idem, pp. 24-26).

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