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2.2 A delimitação de expressão idiomática

2.2.3 A expressividade

Os falantes têm uma necessidade natural de buscar a expressividade, com o objetivo de se fazerem entendidos da melhor forma possível. É em busca da expressividade que os indivíduos manifestam suas emoções. Essa capacidade inata dos indivíduos é que permite que um falante se referira ao outro como sendo, por exemplo, “ser portador de um coração de ouro” (avere un cuore d’oro), ao invés de, simplesmente, atribuir-lhe as qualidades “bom” e/ou “generoso”.

Desse modo, diríamos que as expressões idiomáticas funcionam como instrumentos pelos quais os falantes transmitem ou demonstram raiva, amor, susto, coragem, frustração, sinceridade, sacrifício, insensatez, distração, entre outros. Ainda tomando o exemplo

apresentado, em vez de utilizarmos o termo “qualidades”, poderíamos substituí-lo por “valores expressivos”, pois são os conceitos emocionais “bom” e “generoso” que a EI pretende evocar.

É nesse caminho que a expressividade é típica dos fraseologismos, especificamente das expressões idiomáticas. Vilela (2002, p. 161), ao se referir às características dos fraseologismos, afirma que

[...] as fraseologias redescobrem novas propriedades que lexicalizam, apontando, nessa descoberta, sobretudo, para a esfera da expressividade. O que preferencialmente os fraseologismos lexicalizam são, no chamado léxico mental, as emoções, as atitudes, as interpretações subjetivas, os comportamentos, frequentemente com pendor negativo. Isto equivale a dizer, a nomeação por meio das fraseologias traz sempre uma marca: mesmo que já haja uma nomeação por meio de signos primários, o fraseologismo ou nomeia de forma mais expressiva, ou reforça a expressividade se ela já existir lexicalizada de outra forma. Por isso mesmo se explica a presença abundante em textos predominantemente comunicativos e onde a oralidade predomina.

Avaliamos que as características a que esse linguista português faz menção se aplicam perfeitamente às EIs. Destacamos também a referência que Vilela (2002) faz quanto à natureza dos textos em que as expressões idiomáticas podem ser encontradas. Enquanto esse autor prefere dizer que as EIs são abundantes em “textos onde predomina a oralidade”, preferimos nos referir a “textos de natureza mais informal”.

No início deste tópico, afirmamos que os falantes se valem da expressividade com o intuito de se fazerem entendidos, e essa é uma das finalidades da comunicação: comunicar aos outros os nossos pensamentos, as nossas ideias e obter uma resposta. Dada essa finalidade e a exemplo de Guiraud (1972), concebemos que dizer “eu te amo”, por exemplo, pode ser pouco expressivo para declarar o amor. Em contraposição a isso, os falantes utilizam outros meios de exprimir essa emoção de forma mais intensa, valendo-se, por exemplo, das combinatórias “perdi a cabeça por você” (correspondente a ho perso la testa per te em italiano) e “virou a minha cabeça” (correspondente a mi ha fato girare la testa). Cabe dizer também que as expressões idiomáticas das duas línguas carregam a metáfora geral “amor é loucura” (LAKOFF; JOHNSON, 2002), dado que, conforme essa visão, o amor subtrai a lucidez.

Nessa direção, Roncolatto (2001, p. 63) salienta que “[...] os valores expressivos das expressões idiomáticas estão intimamente ligados às imagens mentais que geram as metáforas.” Na mesma linha, Pamies Bertrán (2012, p. 80) destaca que “a linguagem idiomática confere à língua um carácter mais metafórico, logo mais rico, mais expressivo,

menos literalizante e denotativo. Uma língua mais metafórica é mais viva, criativa e original [...]”. Diante de tal caráter da língua, percebemos a capacidade de que o ser humano dispõe de estar sempre se ressignificando e ressignificando o mundo e tudo aquilo que está a sua volta, por meio das imagens que cria, utilizando-se da linguagem, a exemplo da sua potencialidade para construir novas unidades fraseológicas.

Assim, pelo fato de as expressões idiomáticas apresentarem motivação metafórica e serem instrumentos altamente expressivos, ocupam lugar de destaque nos estudos fraseológicos.

A partir de um breve panorama dos estudos fraseológicos, discorremos sobre o tratamento que vários teóricos dão às UFs, em que pomos em relevo a preocupação que tiveram em definir essas unidades e em diferenciar um fenômeno fraseológico de outro tipo. Destacamos também definições de expressões idiomáticas propostas por alguns estudiosos a fim de delinear melhor como concebemos a categoria fraseológica “expressão idiomática”. Tecemos ainda características acerca das EIs, especialmente a fixação, a idiomaticidade e a expressividade.

Nessa direção, a proposta deste capítulo foi de direcionar o olhar sobre os fraseologismos, em particular, sobre as expressões idiomáticas que serão analisadas, no sentido de depreender essas unidades como idiomáticas e fixas, características essas que estão atreladas à noção de continuum, além de serem expressões que se cristalizam na língua pela tradição cultural.

Além dessa maneira de conceber o material fraseológico a ser investigado, que fornecerá algumas bases para a análise, o próximo capítulo trará os posicionamentos teóricos que conduzirão a abordagem de como as emoções de nosso corpus são conceituadas nas culturas italiana e brasileira. Com isso, a nossa proposta é enfocar características relacionadas à Semântica Cognitiva, aos processos cognitivos (a metáfora e a metonímia) e a categoria da emoção.

3 A ABORDAGEM DA SEMÂNTICA COGNITIVA E DA EMOÇÃO

Como a metaforicidade é um traço característico das EIs, este capítulo coloca em foco algumas considerações acerca da Semântica Cognitiva, em que a atividade de conceptualização metafórica representa uma de suas frentes de estudo. Com esse objetivo, partiremos da origem dos estudos em torno da Semântica Cognitiva, procurando esclarecer o conceito de Semântica Cognitiva. Focalizaremos também conceitos referentes a essa abordagem mentalista, os quais englobam: prototipicidade (ou Teoria dos Protótipos), modelos cognitivos, esquemas de imagens, metáfora e emoção. São conceitos que serão utilizados na análise das expressões estudadas, e, além de definirem o posicionamento teórico assumido, determinam também uma postura de como o nosso material fraseológico será tratado, especialmente no que se refere aos conceitos de emoção, tal como são adotados aqui.