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A floresta que um dia existiu no sertão do rio Doce.

A B Figura 32 Localização do município de Viçosa-MG, na Zona da Mata Mineira

3.1. A floresta que um dia existiu no sertão do rio Doce.

A zona da mata mineira, por estar localizada no antigo sertão12 do rio Doce, teve preservada a floresta pluvial tropical até a década de 1950 do século XX, que ajudou a construir o mito da existência das riquezas minerais (ESPINOLA, 2005, p. 413).

A preservação desta área se deveu a tentativa do Governo Imperial evitar o contrabando de ouro das minas de Ouro Preto. Após o declínio desta atividade mineradora, o governo da época por interesses econômicos, programou uma política de ocupação do território, antes ocupado apenas por indígenas (botocudos, dentre outros), através da construção dos presídios13 (unidade militar composta por uma guarnição de soldados pedestres) eram pontos de povoamento isolado e forçado, no meio da floresta, na medida em que a população enviada era composta por degredados e criminosos, que cometiam delitos leves, como vadiagem até os mais graves. Porém, estes mesmos presídios, também, atuavam como pontos de atração de grupos indígenas isolados, em busca de alimento e metal (minério de ferro).

Posteriormente, com as divisões militares do rio Doce, localizadas estrategicamente nos entroncamentos dos rios principais, estas cumpriram o papel de intermediador entre os fazendeiros, posseiros, garimpeiros, aventureiros, negociantes, coletores das drogas do sertão. Ao mesmo tempo em que procuravam proteger os índios (botocudos) contra os seus algozes, que justificavam seu extermínio pelo fato de ser antropófagos (canibais), ou seja, devoradores de homens brancos. Porém, esta argumentação é desmentida por estudos de cunho histórico e antropológico (DUARTE, 2002; KOK, 2004 e AMANTINO, 2006), que demonstram que esta prática cada vez se tornara escassa, e quando praticada era utilizada entre os indígenas em conflito. A prática da antropofagia se justifica pelo fato do povo vencedor acreditar em adquirir a força do seu oponente, ou seja, um sinal de respeito e reconhecimento de sua força.

Além dos índios, considerados um obstáculo a ocupação, não se pode esquecer das doenças endêmicas tropicais. Para ambos os problemas, a brilhante solução aventada na época era a mesma, a derrubada da mata, ou melhor, a higienização do campo que se construía.

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Sertão é uma denominação que não expressa uma realidade objetiva. Mas serviu para contrapor paisagens consideradas ocupadas e civilizadas daquelas bravias, passíveis de serem ocupadas. (ESPINOLA, 2005, p. 75).

Apesar do trabalho do governo em promover a ocupação do território e criar uma condição de navegabilidade no rio Doce, a tentativa fracassou. Por conta disso, uma nova atividade econômica surgia: o cultivo do café. Este promoveu o desenvolvimento de núcleos urbanos, conforme pode ser visto na Tabela 9, isto porque a economia cafeeira possibilitou uma maior diversificação do mercado consumidor.

Tabela 9. Relação dos maiores produtores de café na Zona da Mata, com as respectivas datas de criação do município e de elevação a categoria de cidade.

Municípios Ano de criação do município Ano de elevação da sede à cidade

Ubá 1853 1861 Viçosa 1871 1876 Ponte Nova 1875 1876 Juiz de Fora 1850 1856 Muriaé 1855 1873 Além Paraíba 1880 1883 Cataguases 1878 1881 Leopoldina 1854 1861 Rio Casca 1911 1912

Observação: Os municípios listados na tabela no século XIX apresentavam uma maior dimensão territorial. Atualmente, caso levantarmos a produção de café, muitos destes não serão sequer lembrados, como por exemplo, Viçosa, que hoje está reduzida a metade dos seus 700 km2 de área que englobavam os atuais municípios de Araponga e Ervália (maiores produtor de café da Zona da mata mineira), Cannaã, São Miguel do Anta, Pedra do Anta, Coimbra e Teixeiras.

Fonte: Amorim (2004, p. 53).

Agora, cabe salientar que embora o cultivo do café tenha promovido a economia e o surgimento de cidades, também aumentou o desmatamento e desencadeou um processo de erosão intensa, na medida em que, segundo Warren (2004, p. 283):

“...o cultivo insistente e imprudente de encostas íngremes. Grande parte da região de “mar de morros” da serra do Mar não era de forma alguma arável. Trinta por centro do município de Viçosa, em Minas Gerais, por exemplo, apresentava declives entre 20,0 e 40,0%. Cultivar solos em tais declives, o que era feito universalmente ladeira acima e ladeira abaixo, e não em curva de nível, provocava deslizamentos de lama – arruinando campos nas terras baixas, assoreando córregos e, na estação das chuvas, provocando mortes. Os agricultores, pressionados a aumentar a produção, eliminavam as práticas de pousio longo, acelerando a erosão da camada de húmus...”

Junto à prática intensa do cultivo do café, outra razão para o desmatamento eram as ferrovias movidas a vapor e mais tarde o consumo de carvão pelas siderurgias. Em Viçosa, embora não existam usinas siderúrgicas, foi cenário de um episódio lamentável, com aval do poder público, que favoreceu a troca do patrimônio público pelo ganho de curto prazo dos interesses privados, segundo Dean (2004, p. 291):

“...Em 1956, a Universidade Rural do Estado de Minas – UREMG (hoje Universidade Federal de Viçosa), foi obrigada a trocar a faixa de mil hectares de floresta primária por uma área equivalente de pasto degradado e insignificante. A floresta foi vendida para a siderúrgica Belgo–mineira para a extração do carvão vegetal...”.

Ao longo desse processo, atualmente, Viçosa ainda apresenta a existência de resquícios de Floresta Tropical Atlântica subperenifólia (em estágio secundário), em sua maioria em topo de morro, como pode ser mais visualizado na Figura 34.

Como se observa, o período áureo do café, apesar de criar condições à manutenção do desenvolvimento da economia da Zona da Mata, durante um pequeno período (1880–1930). Com a crise do café deflagrada, as mesmas ferrovias se tornaram obstáculo ao desenvolvimento da região, pois não permitiu o avanço de outras atividades econômicas, em razão da inexistência de articulação entre os sistemas ferroviários implantados, que privilegiaram os produtores locais de importância econômica e não as localidades. Com isto, as pequenas aglomerações urbanas não tiveram a chance de criar novas alternativas econômicas. Agora, como entender, a região com a maior densidade de linhas férreas em Minas Gerais se apequenou?

A explicação para isso, segundo Amorim (2004, p. 52), se deve à lógica das concessões das estradas de ferro, que se pautava na idéia de que as ferrovias criadas deveriam passar em locais onde haviam riquezas para serem transportadas.

Segundo Carrara (1999, p. 27), esta idéia não era consensual, enquanto os fazendeiros e seus representantes do sul da Zona da Mata defendiam a ferrovia como meio de transporte para o café, os políticos da Zona da Mata central (Ubá) viam na estrada de ferro um meio a facilitar o transporte de gêneros, a aglomeração de população, a comunicação rápida de idéias, a civilização e, em última instância, o progresso. Na Figura 35 subentende-se que no jogo de forças venceu a mentalidade dos primeiros, dado que a expansão ferroviária privilegiou, quase que exclusivamente, os interesses particulares de fazendeiros influentes do café e suas localidades.

Figura 35. Rede Ferroviária da Leopoldina nos Estados de MG, RJ e ES. Fonte: Silva (apud CARNEIRO, 2008, p. 39).

As aglomerações urbanas menores, não contempladas pelos ramais, não experimentaram a chance de se desenvolver em função desse transporte. Como resultado, a integração regional não foi favorecida pela implantação da rede ferroviária.

Para materializar esta força política sobre os trilhos, a construção das linhas era financiada pelo Governo Federal via concessões vantajosas o uso dos serviços ferroviários por 30 até 90 anos, por parte dos investidores, além de ressarcir o gasto do empreendimento, garantindo juros de 7,0% ao ano sobre o capital investido e realizar a doação das terras laterais ao longo das ferrovias.

De maneira geral, embora o desenvolvimento da cafeicultura tenha promovido uma reorganização do espaço e da economia mineira, tendo também como desdobramento a intensificação do processo de industrialização, entre 1915 e 1920.

Essa industrialização ocorre nos setores têxtil, metalúrgico e, no ramo produção de bens de primeira necessidade (alimentação, calçados, móveis, construção, fumos, tipografia, dentre outras). Mas na década de 1920 ao surgir os sinais da desaceleração da cafeicultura. A estagnação da produção cafeeira se deu em virtude de um conjunto de fatores:

a) o revés econômico sofrido pela região em 1930;

b) A quebra da bolsa de Nova York e a conseqüente depressão econômica mundial, aliadas aos expressivos estoques e

c) Os baixos preços do café no mercado internacional fizeram com que o governo federal adotasse postura extrema, financiando a erradicação de boa parte dos cafezais, incluindo aqueles localizados na Zona da Mata.

Some-se a isso o fato de que a partir da década de 1950 inicia-se, no plano nacional, o processo de industrialização, do tipo substituição de importações, que fez com que a indústria ampliasse sua participação na composição do Produto Interno Bruto (PIB) nacional.

Porém, os principais investimentos passaram ao largo da Zona da Mata, fato que contribuiu ainda mais para a estagnação econômica da região. Tanto assim, que segundo o IPEA et. al. (2000) a mesoregião, que era a terceira mais importante economicamente em Minas Gerais fora em 1985, perdeu sua posição em 1995 e atualmente oscila entre a quinta e sexta.

O setor agropecuário reduziu sua participação no período caracterizado pela não–modernização e baixa produtividade na produção de café, cana–de–açúcar e arroz. O setor industrial, no conjunto da mesoregião, tem como atividades mais significativas o complexo têxtil/vestuário, calçados e produtos alimentícios, nenhum deles podendo ser considerado muito dinâmico.

Merece destaque, entretanto, a cidade de Juiz de Fora, que possui boa infra– estrutura urbana, centros de formação que poder ofertar mão–de–obra qualificada, disponibilidade de terrenos a baixo custo e um distrito industrial. Sem esquecer sua posição geográfica privilegiada próximo do Rio de Janeiro e Belo Horizonte.

Outra cidade de destaque é Ubá, considerado o primeiro pólo moveleiro do estado, exportando móveis para diversas partes do país. Além de estar crescendo o

ramo de indústria de sucos industrializados na microrregião de Ubá (Visconde do Rio Branco, Ubá e Tabuleiro).