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As causas da drenagem do ar frio nas vertentes.

2. O clima urbano: Estado da arte.

2.3. Ilha de calor.

2.3.1. A ilha de calor atmosférica.

2.3.1.2. As causas da drenagem do ar frio nas vertentes.

Os sítios convergentes, em forma de vales, apresentam uma estrutura morfológica capaz de condicionar a drenagem do ar frio, que tende a ser drenado durante à noite em condições de tempo com ausência de ventos e de baixa nebulosidade, dinamizando uma circulação terciária (local) denominada de brisa de montanha (noite) e ao alvorecer a brisa de vale (dia), pode ser visto na Figura 17.

A teoria de formação da piscina de ar frio nos vales e bacias (GEIGER, 1961) enfatiza o papel da perda de radiação de ondas longas e o fluxo descendente de calor sensível da atmosfera. Isto produz uma camada de ar frio em cima dos declives que subseqüentemente escoam ao longo da vertente na piscina de ar frio. A drenagem do ar frio produz a acumulação nos fundos de vale e depressões, o que acaba ocasionando a formação de nevoeiros nas noites de forte resfriamento radiativo (calmas e sem nebulosidade), que segundo Yoshino (1984, p. 239) pode ocasionar os efeitos prejudiciais para a agricultura.

Figura 17. Mecanismo de circulação terciária em fundo de vale Fonte: Brown e Dekay (2004, p. 42. Adaptado.)

Em Portugal alguns pesquisadores têm estudado este fenômeno climático, em vales da região de Lisboa e da Arrábia, como Alcoforado et. al. (1993) procuraram identificar a acumulação de ar frio no fundo do vale da Ribeira da Ajuda, e determinar o risco de geada e nevoeiro de irradiação nessa área.

Durante o dia, as principais trocas radiativas entre a atmosfera e a superfícies terrestre fazem-se essencialmente à custa da radiação solar direta e difusa. Esta radiação, de pequeno comprimento de onda é absorvida pela superfície e depois é reemitida sob a forma de radiação terrestre (onda longa). Esse balanço de entrada e saída de ondas curtas e longas, respectivamente, determina os horários de maior e menor temperatura ao longo do dia, conforme pode ser visto na Figura 18.

Se a atmosfera contiver grande quantidade de gases absorventes (vapor d´agua, gás carbônico, metano, monóxido de carbono, dentre outros), e/ou nuvens, nevoeiro e brumas, a perda de energia irradiada não será tão significativa para a atmosfera, tanto para o dia, quanto à noite. Mas, se a atmosfera estiver mais seca, as perdas energéticas da superfície são elevadas, principalmente, à noite quando a irradiação terrestre é responsável pela diminuição das temperaturas junto ao solo, constituindo o motor do resfriamento radiativo noturno.

Figura 18. Ciclo diário da temperatura do ar e o ao balanço de radiação da superfície terrestre.

Fonte: Cuadrat e Pita (2000, p. 84. Adaptado.)

Em noites que apresentam condições de tempo determinadas por sistemas sinóticos anticiclonais, a característica predominante será a calmaria e baixa

nebulosidade. Situação favorável a formação de inversão térmica radiativa na camada de ar junto ao solo e, nas vertentes, ocorre à movimentação do ar no sentido descendente, induzida pela gravidade. Esse movimento do ar é denominado brisa de montanha ou ventos catabáticos.

Se a irradiação terrestre e as conseqüentes inversões térmicas que se formam nas noites anticiclonais, conforme demonstra a Figura 19 para o bairro de Silvestre, localizado na calha do rio Turvo Sujo, na cidade de Viçosa, é a causa do resfriamento radiativo noturno junto ao solo, a gravidade é o principal motor da drenagem do ar frio ao longo da encosta.

Figura 19. Nevoeiro de resfriamento noturno, localizado no bairro de silvestre, visto a partir da rua Tiradentes. 67 do bairro do João Brás, no município de Viçosa-MG. Foto: Edson Soares Fialho, obtida em 8 de maio de 2008.

O ar frio começa lentamente a escoar pelas vertentes, pouco depois do pôr– do–sol, período em que, geralmente, se começa a definir a inversão térmica e o nevoeiro na base das vertentes, que foi se desenvolvendo durante a noite. A sua dissipação ocorre, primeiramente, nas vertentes expostas, para pouco depois da alvorada. De acordo com Yoshino (apud LOPES, 1995, p. 152), dependendo das condições de tempo e da topografia, o escoamento do ar frio ocorre freqüentemente uma ou duas vezes entre o pôr–do–sol e a meia a noite e duas ou três vezes entre meia-noite e o amanhecer, coincidindo a última com a temperatura mínima.

A intermitência da drenagem do ar frio pode ser explicada pelo aumento da velocidade do ar ao descer à vertente, que sofre um aquecimento adiabático, retardando o fluxo, em razão da fricção criada pelos obstáculos, como a vegetação,

que reduz a velocidade do ar. Uma vez vencido o atrito, o resfriamento radiativo incrementa a pressão e o ciclo se repete.

Segundo Nakamura (1989), a velocidade da drenagem do ar frio depende da velocidade e direção do vento regional, da intensidade da inversão térmica junto ao solo, do efeito de fricção da superfície e do declive da vertente. A direção do vento de gravidade junto superfície, nunca se desvia mais de 22,5º da linha de maior declive do terreno.

Depois de cada fase de drenagem de ar frio, caracterizado por um decréscimo de temperatura, surgem localmente alguns núcleos de ar mais quente sobre o ar arrefecido, que possuem um movimento contrário ao escoamento do ar frio junto ao solo. Geiger (1961) havia notado que se formam circulações isoladas de ares nas encostas, que constituíam pequenos redemoinhos sobre o ar que escoa pelas vertentes. Segundo Yoshino et. al. (1981, p. 13), as características da drenagem do ar frio em cada um dos setores das vertentes e no vale, retratado na Figura 20, podem ser sumarizadas como se segue:

1. Os setores mais elevados da vertente são áreas onde gera o ar frio e se inicia a sua drenagem.

2. No meio da vertente, a drenagem de ar frio é caracterizada pelas mudanças de temperatura, direção e velocidade do vento ao longo da noite. Depois da passagem do ar mais arrefecido, a temperatura aumenta ligeiramente.

3. Na base da vertente gera-se uma contracorrente contrária à drenagem do ar frio. O ar que sobe encontra-se menos frio que o ar junto à superfície, que é resfriada pela irradiação.

4. No fundo dos vales e superfícies topograficamente deprimidas origina-se um lago de ar frio, caracterizado por uma forte inversão de temperatura.

Figura 20 – Modelo de drenagem do ar frio Fonte: Nakamura (1989).

A forma de alimentação do fundo do vale com ar frio é um dos aspectos mais interessantes no conjunto do sistema. Uma das questões que se levanta é a de saber se ele se forma exclusivamente pelo resfriamento radiativo do fundo do vale, ou se também é alimentado pela drenagem do ar que escoa por gravidade. Outra é a de determinar qual a relação entre a intermitência da drenagem e a periodicidade da acumulação do ar frio no fundo dos vales e depressões, que irá ao longo da noite produzir uma concentração maior de ar frio no fundo do vale, favorecendo a localização das temperaturas mínimas, conforme a Figura 21.

Figura 21. Localização de temperaturas mínimas no fundo do vale em decorrência do mecanismo de brisa de montanha ao longo da noite.

Fonte: Lopes (1995, p. 161).

Para Yoshino (op. cit), o resfriamento irradiativo noturno somente irá alimentar o fundo do vale se a temperatura que se encontra nos divisores for superior em relação ao fundo do vale.

A altura do lago de ar frio atinge, freqüentemente, cerca de um terço da altura das vertentes, correspondendo a sua parte superior ao limite da camada de inversão térmica junto ao solo. O lago assim poderá ter, em certos casos, um grande desenvolvimento vertical.

Através de vários estudos efetuados em áreas urbanas e suburbanas, tem-se procurado identificar algumas limitações climáticas que afetam os indivíduos e que o planejamento urbano e o ordenamento biofísico do território não devem ignorar.

Em primeiro lugar, o resfriamento nas noites anticiclonais de inverno pode ocasionar episódios de frio, nas áreas topograficamente deprimidas, que levam ao desconforto térmico dos indivíduos ou um excesso de consumo de energia para o aquecimento. Segundo, como os nevoeiros tendem a se formar da noite (entre 21:00 e 23:00 horas) e início da manhã (5:00 às 8:00 horas). Troppmair (2004, p. 34–35) chama a atenção para o número de acidentes provocados por este fenômeno nas estradas brasileiras, principalmente, na região Sudeste.

Por outro lado, as noites anticiclonicas, calmas, sem nebulosidade e com uma forte estabilidade atmosférica, são propícias ao aparecimento de ventos fracos (inferiores a 3 m.s-1), que podem estagnar a atmosfera e favorecer a concentração de poluentes na atmosfera, no caso de uma grande cidade.

No entanto, quando se observa que as condições de tempo ideal para a formação de um nevoeiro8, as mesmas também responsáveis pelo desenvolvimento do processo de formação de uma ilha de calor. Porém, como observaram Sachweh e Koepke (1997) em Munich, Alemanha, nos últimos 30 anos, ambos os processos são excludentes, pois se verificou a redução do número de dias de formação de nevoeiro, na medida em que, o processo de urbanização possibilitou o crescimento da mancha urbana. Tal constatação é conforme a afirmativa de Landsberg (1970, p. 1269).

Como as cidades registram grandes fluxos de veículos automotores, capazes de incrementar a quantidade de núcleos higroscópicos (núcleos de condensação) e uma densidade urbana, responsável por um aquecimento da superfície e da atmosfera mais lento do que nas áreas adjacentes.

Estas condições, por sua vez, não impedem a impedem a formação de nevoeiros (fogs), conforme Sachweh e Koepke (op. cit.) identificaram para Munich, mas diminui a intensidade dos mesmos, na medida em que, o campo de visão não é reduzido a menos de 1km, mas a cerca de 11km, segundo Suckling e Mitchell (1988) verificaram em Sacramento, EUA, ou seja, os nevoeiros ainda persistem em ocorrer nas cidades, mesmo que grandes, porém a redução da visibilidade não é tão grande.

8

O nevoeiro ou névoa é uma nuvem stratus cuja base está no solo ou perto dele e reduz a visibilidade até 1 quilômetro (com visiblilidade maior a 1km, ocorre uma neblina).