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Foto 15 Manifestações no Festival da Água e do PACUCA

2.4 O ESPAÇO URBANO E O PLANO DIRETOR

2.4.1 A Gestão Pública no Brasil

Muitas discussões têm emergido em meio aos estudos organizacionais, acerca do papel do aparelho do Estado, ou melhor, do Estado em sua totalidade. Acompanha-se, hoje, no Brasil, uma conjuntura embebida de inúmeros problemas sociais referentes a: desemprego, educação, saúde, práticas de corrupção em várias esferas políticas, dentre outros. Tais incidências se contrapõem àquilo que é tido como direito ontológico, natural e, que está respaldado pelo Art. 5º da Constituição Federal Brasileira (CFB).

Dito isso, acredita-se ser interessante estabelecer uma contextualização da Gestão Pública, em especial da brasileira, bem como abordar certos questionamentos sobre o posicionamento epistemológico de gestores nos dias atuais, uma vez que estes são importantes agentes promotores do espaço urbano.

Em se tratando da contextualização da área pública de atuação na Ciência da Administração, cabe comentar que Getúlio Vargas, em seu período de gestão, inseriu no país a lógica burocrática, que, conforme delineada por Weber (1947), preza pela: impessoalidade das relações; pela formalização dos procedimentos, métodos e rotinas de trabalho; assim como pelo profissionalismo, com reconhecimento do mérito. Tais iniciativas tinham como propósito contribuir para o funcionamento da máquina do Estado, em função de evitar privilégios, padronizar e socializar os processos, e favorecer o desenvolvimento de uma perspectiva de carreira pública, por parte de servidores, já que esta por ser linear, segundo Dutra (2002), tenderia a deixar claro aos funcionários o percurso e as necessidades de habilidades, que o habilitariam a um cargo superior, em termos de transposição dentro do organograma organizacional.

O tipo de racionalidade racional-legal, instigada por Getúlio Vargas, pautava-se em um poder utilitarista, em que normas e regras deveriam reger de modo translúcido o andamento das atividades realizadas pelo Estado. (KALBERG, 1980).

No entanto, ao longo dos anos, constatou-se que muitas dessas premissas não vigoraram, segundo o que havia sido concebido. Nepotismo, desvios de dinheiro público, atos voltados à satisfação e interesses pessoais, e a obstrução do fluxo de trabalho foram constantes disfunções burocráticas, já mencionadas por Merton (1940) e Perrow (1981), e que comprometeram o “organizar” estatal.

Na história do Brasil, muitos esforços em favor do crescimento econômico, vieram a comprometer o seu desenvolvimento social. Passou-se pela era Juscelino Kubitschek, em que as fronteiras do Brasil foram abertas ao capital estrangeiro, e muitas obras públicas foram realizadas, como a construção de estradas, usinas hidrelétricas etc.; contudo, a dívida externa e as novas exigências de know-how tecnológico e administrativo diante da mão de obra que se mostrava desqualificada para tal e a consequente inflação foram heranças deixadas aos brasileiros. Em 1964, houve o Golpe Militar e de 1968 a 1973, ocorreu o que se convencionou a chamar de “milagre econômico” ou “milagre brasileiro”, que foi uma época em que se geria o país em prol de investimentos e criação de grandes corporações.

Ainda assim, o povo brasileiro se deparava com o aumento da dicotomia social, a degradação do trabalho e os significativos déficits advindos da inflação. Neste sentido, tornava-se evidente que a Gestão Pública carecia de uma renovação. A sociedade civil organizada, por meio de movimentos sociais, ONGs, dentre outras, inspiradas na concepção da Teologia da Libertação da Igreja Católica, começou a manifestar seus apelos em favor das mais diversas demandas, tais como: reforma agrária, negros, homoafetivos, deficientes físicos, trabalhadores rurais, dentre outras. Posto isso, pode-se dizer que a Constituição Federal promulgada em 1988 foi fruto, dentre tantos fatores, da mobilização popular, que tinha como significante vazio a participação política. (LACLAU; MOUFFE, 1985).

O tempo foi passando e o que se percebeu foi uma passagem do pensamento da Gestão Pública de tradicional para o que se convencionou a chamar de “consumerismo” em que o brasileiro passou a ser considerado um cliente, um consumidor dos serviços do Estado. (OSBORNE; GAEBLER, 1994).

Tal linha de pensamento teve sua inspiração no governo de Margareth Tatcher e Tony Blair, que entendia a relação entre cidadão e Estado como uma relação advinda de uma instituição privada. No Reino Unido e na Inglaterra, o que norteava a concepção dos governos era a gerencial, baseada no batimento de metas, na competitividade, enfim no caráter teleológico, conforme Séguin e Chanlat (1992).

Esse novo cenário, embebido de influências de um novo rearranjo mundial, do Consenso de Washington (formulado em novembro de 1989); e do enfraquecimento do Estado instigou o Ministro da Administração da Reforma do Estado, Bresser Pereira, no período do governo Fernando Collor de Mello, a incentivar o surgimento da Nova Administração Pública (NAP), no contexto brasileiro. A NAP se pautava em princípios, que em vez de burocráticos passavam a ter um caráter gerencialista.

A abordagem gerencialista previa a participação de empresários na gestão do Estado, a privatização de atividades de apoio, como educação, saúde etc. A apropriação de premissas da gestão privada para a gestão pública foi bastante acolhida por muitos estudiosos da área que compõem o “mainstream”, conhecido como funcionalista. Mas Parker (2002), Clegg (1990) e em nível nacional Ana Paula Paes de Paula (2007), enfatizam, cada um de sua forma, que a cidadania transcende o um dito direito.

Na mesma linha de pensamento, Solé (2004) refere-se a este fenômeno como a ‘empresarização do mundo’. Alberto Guerreiro Ramos afirma que é a sociedade centrada no mercado e assim por diante.

Posto isso, a Ana Paula Paes de Paula (2005), que é uma adepta da teoria crítica, confronta a iniciativa de Bresser Pereira, em um artigo escrito na Revista de Administração de Empresa, onde compara a Gestão Pública Gerencial com a Gestão Pública Societal no âmbito público.

A abordagem societal surgiu, concomitantemente, à gerencial e se alicerçava no pensamento oriundo dos movimentos sociais que emergiram após o período ditatorial no Brasil. Segundo ela, esta abordagem estabelece uma parceria da sociedade civil com o Estado, a participação social é mais efetiva e o seu propósito maior não se funda apenas no desenvolvimento econômico, mas também envolve a gestão social.

Para Paes de Paula (2005), em vez de privatizações, o Estado deveria contar com a iniciativa da Sociedade Civil. Frente a isso, iniciativas como: Gestão Orçamentária, Planejamento Participativo, dentre outras, são fortes marcas destacadas nesta obra.

Este artigo foi rebatido pelo próprio Bresser Pereira, em uma réplica apresentada a esta mesma revista, a Revista de Administração de Empresas (RAE), também em 2005. Ele comenta que a autora estava comparando objetos distintos, o que em outras palavras, demostrou sua inconformação com a comparação estabelecida. Seu argumento foi de

que a participação também está prevista no que se chama de Nova Administração Pública e, em momento algum, ele ou o próprio Presidente da República à época, o Fernando Henrique Cardoso, colocaram-se contrários à popular.

E a história não parou por aí, pois Ana Paula Paes de Paula respondeu, por meio de um texto chamado de Tréplica, onde manifesta que o Ministro não comprometeu a essência, ou seja, a concepção de sua ideia. Segundo ela, a NAP no Brasil representou uma pseudoparticipação, que pautada na harmonia administrativa (TRAGTENBERG, 1974) e na ideia do “manager”, também mostra suas limitações.

Em suma, nota-se que a Gestão Pública brasileira se construiu sobre os alicerces do patricarcalismo, da divisão do trabalho, da hierarquia e da evidente segregação entre concepção e execução do trabalho, algo bastante taylorista. Com o passar dos anos, por meio de uma tentativa estrangeira e uma tentativa de adaptação, que Wood e Caldas (1998), designaram de Antropofagia Organizacional, houve a adoção de práticas gerencialistas. No entanto, nos dias de hoje, muito se tem questionado formas alternativas ao gerencialismo, acreditando-se que a prática do organizar pode-se desconstruir (DERRIDA, 1997) e se moldar à luz de uma peculiaridade local, levando em consideração a multidimensionalidade do indivíduo em uma sociedade, sendo que não é apenas uma sociedade de clientes. (BAUMAN, 2001).

O balanço que se faz dessas duas concepções epistemológicas: gerencial e societal é que ambas apresentam potencialidades e deficiências; e o reconhecimento real das necessidades de Gestão Pública, seja em nível nacional, estadual e ou municipal pode contribuir expressivamente para a escolha de instrumentos que gestão que possam abarcar avanços econômicos, sociais e ambientais, usando os pilares de sustentabilidade apresentados por Ignacy Sachs (2005).

O Estado, embora não seja o único agente produtor do espaço público, apresenta um papel fundamental neste estudo e para contextualizar melhor a constituição do espaço público, são abordados alguns conceitos e a origem dos estudos sobre a gestão do espaço