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Foto 15 Manifestações no Festival da Água e do PACUCA

2.3 OS MOVIMENTOS SOCIAIS E OS ESTUDOS

2.3.4 Um breve comentário sobre os movimentos sociais no Brasil

interpretados pelo enfoque teórico oriundo do marxismo clássico, vinculados tanto ao espaço urbano como rural. Neste sentido, privilegiavam estudos sobre os movimentos sindicais, operários, ou nacional-populares.

De acordo com Souza (2004), ao se remeter ao espaço urbano, os movimentos sociais envolviam uma gama de temáticas como, por exemplo, as lutas por creches, por escola pública, por moradia, transporte, saúde, saneamento básico etc. Já no que tange ao espaço rural, esta diversidade se manifestou nos movimentos de bóias-frias, de posseiros, sem-terra, arrendatários e pequenos proprietários. Cada um desses movimentos, embora tivesse reivindicações específicas, colocavam-se contrários às contradições econômicas e sociais presentes na sociedade brasileira.

Os movimentos ligados ao rural e os que lutavam por poder político eram os mais frequentes no começo do século passado. Nos anos 1950, os movimentos nos espaços rural e urbano adquiriram visibilidade por meio de articulações viabilizadas em manifestações em espaços públicos. Os movimentos populares urbanos, nesta época, tiveram o apoio das Sociedades Amigos de Bairro (SABs) e das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs). Nos anos sessenta e setenta, a despeito de um cenário de repressão policial, muitos movimentos reivindicavam educação, moradia e voto direto. (SOUZA, 2004).

A partir dos anos setenta, a despeito de um cenário de repressão policial, muitos movimentos reivindicavam educação, moradia e voto direto. Surgiram novos estudos baseados na redemocratização do estado e visando a

[...] desenvolver um novo quadro paradigmático que pudesse interpretar com maior especificidade os movimentos sociais urbanos emergentes na sociedade brasileira e que permitissem um entendimento ampliado do ‘novo sindicalismo’ nascente. (SCHERER-WARREN; LÜCHMANN, 2004, p.13).

Frente a um projeto de redemocratização do Estado e da sociedade, a questão da autonomia dos atores coletivos na sua relação com governos ainda autoritários e a multiplicidade de identidades coletivas de organizações emergentes tornaram-se focos de atenção privilegiada dos estudiosos dos movimentos sociais.

Para melhor entender tais processos, muitos estudos de caso foram realizados aumentando os dados empíricos, no entanto, nem sempre eram realizadas análises sociológicas, uma vez que eles muitas vezes se limitavam à auto identificação e à autorreflexão do sujeito. (SCHERER-WARREN; LÜCHMANN, 2004).

Desta forma, como alternativa ao marxismo buscaram-se contribuições dos teóricos dos movimentos sociais urbanos, para ampliar o entendimento sobre a inserção do sujeito no sistema e o seu papel na reprodução social. Mas análises generalizadas destes casos, geralmente, levando em considerações questões como fatores urbanos e de trabalho, acabam demonstrando resultados hegemônicos.

Mediante o reconhecimento da “pluralidade de sujeitos” com “múltiplas identidades”, optou-se por teóricos não pragmáticos para iniciar “as teorias dos ‘novos movimentos sociais”.

Isso propiciou o aprofundamento da dimensão sociocultural em torno dos eixos: práticas políticas tradicionais x cultura política emergente; autoritarismo x democracia de base; racionalidade x subjetividade; formação de identidades socioculturais; cidadania e direitos de terceira e quarta gerações – e temas correlatados. (SCHERER-WARREN; LÜCHMANN, 2004, p.15).

A partir da redemocratização, as análises no âmbito político- institucional dos movimentos sociais foram tomando relevância, demonstrando ser necessário entender o sentido e a dinâmica das

revoltas de massa.

A abordagem dos novos movimentos sociais deu ênfase ao caráter formador dos atores coletivos; já a abordagem anteriormente citada, deu ênfase à reorganização das instituições devido ao processo de redemocratização. (JACOBI, 1987). A análise de ambas as perspectivas em conjunto possibilitou um novo olhar acerca das tensões entre inovações e institucionalização. Os estudos gerados a partir deste momento possibilitariam entender melhor relações entre sociedade e esfera pública.

Todas as reivindicações que afloraram nos anos sessenta e setenta repercutiram-se nas manifestações sociais conhecidas como "Diretas Já", na década de 1980, onde várias demandas sociais foram unidas, coesas em torno da expectativa de voto direto, pelos mais diversos motivos. (SOUZA, 2004).

Até este momento, ocorria uma separação total entre a “base geográfica de referência empírica das pesquisas e das reflexões para a teoria: o urbano e o rural.” (SCHERER-WARREN; LÜCHMANN, 2004, p. 16). Sendo raros os casos em que levavam estas duas bases em consideração – mesmo com o surgimento de novos movimentos sociais rurais de relevante expressividade, como os movimentos: sem-terra, o de barragens e o de mulheres agricultoras. Nem mesmo o movimento ecológico conseguiu fazer esta proximidade entre os dois campos relatados. Esta realidade levou, apesar do aumento da produção acadêmica, uma segmentação das especialidades temáticas. (NAVARRO, 1994).

Na década de 1990, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra e as Organizações não governamentais se destacaram ao lado de outros sujeitos coletivos, como os movimentos sindicais. (SOUZA, 2004). Ocorreram muitos encontros internacionais, que facilitaram o diálogo entre os movimentos sociais e estimularam parcerias entre a sociedade civil e o poder público; além disso, houve o empoderamento da esfera civil diante da possibilidade de se articular nacionalmente. Legitimou- se, assim,

[...] a interserção entre o voluntariado e comprometimento político, levando-se a repensar o embate entre assistência x ação para cidadania, entre autonomia organizacional x institucionalidade, entre prática institucional x prática movimentalista. (SCHERER-WARREN; LÜCHMANN, 2004, p.17).

A abordagem de redes passou a representar uma contribuição não só em temos de articulação do campo movimentalista, mas também pelo seu enfoque às novas formas de institucionalidade. (DOIMO, 1995). O conceito de redes, então, passou a ser utilizado para as análises devido a sua dimensão estratégica e solidarística. (SCHERER-WARREN, 1999).

A partir disso, foram tecidas críticas a respeito da ideia de solidariedade vinculada ao projeto de reforma do Estado, pautado em um corte neoliberal e este novo paradigma cede espaço a novas relações entre Estado e sociedade, alicerçadas na parceria público-privado, na ideia de “terceiro setor”, na responsabilidade social, na filantropia empresarial e na solidariedade. Neste cenário, as organizações não governamentais recebem realce na execução de ações e programas sociais debruçados na participação solidária, na focalização e no voluntariado. (TELLES, 1994).

As ONGs começam a ter visibilidades nas Conferências Globais, fóruns locais e nacionais, formando um campo de múltiplos referenciais de análise para a compreensão de trajetórias políticas a partir de mudanças conjunturais na sociedade brasileira e na latino-americana. (TEIXEIRA, 2003).

O surgimento de novas articulações entre Estado e sociedade, que teve um marco importante na Constituição de 1988, deslocou energias participativas para o interior dos novos espaços institucionais que, a exemplo dos Conselhos Gestores e dos Orçamentos Participativos (OP), resultaram, em grande medida, das lutas e reivindicações pela democratização do Estado. (SCHERER-WARREN; LÜCHMANN, 2004).

Posto isso, depreende-se que a nova configuração dos movimentos sociais tem requerido uma atenção especial às novas institucionalizações e a sua forma, a sua dinâmica de organização. Mediante a isso, é destinado na sequência um espaço ao tratamento da dimensão organizacional dos movimentos sociais, tomando por base os trabalhos apresentados em um periódico das Ciências Sociais.