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A Identidade Nacional Brasileira – Pasta 11

No documento Auto-organização e nação em Michel Debrun (páginas 193-200)

A IDENTIDADE NACIONAL BRASILEIRA I PARTE: DEFINIÇÕES E QUESTÕES TEÓRICAS

CAPÍTULO 1: Entre o caráter nacional e o nacionalismo: a identidade nacional

[16/09/1989]

1. Distinguir 3 níveis em qualquer Identidade Nacional (IN) (de baixo para cima): a) O nível Identidade “entre” numerosos indivíduos. Semelhanças físicas,

psíquicas, etc. Tudo isso permite falar, ainda com cautela, de um Caráter Nacional Brasileiro (CNB).

{Possibilidade ainda de incluir nesse nível as “micro-interações” (sociais, culturais, “políticas”) entre os indivíduos que compõem a coletividade nacional (ou que, por isso, constituem a coletividade nacional). Há “micro-interações” quando se tem “face a face”, ou quando o face a face é predominante (G. Freyre, Roberto da Matta).

b) O nível Identidade que resulta das “macro-interações” quando estas são “privilegiadas” – isto é, envolvem os indivíduos de corpo e alma ou, pelo menos, são prioritárias em relação a outras interações, as quais conectam uns indivíduos (ou grupos ou classes) com outros indivíduos, grupos, classes pertencendo a outras coletividades (e que são “outras” justamente porque esses indivíduos, etc... não mantêm com eles relações “prioritárias”).

As “macro-interações”:

- são mais “abstratas” do que as “micro-interações”. Não repousam no “face a face”, embora se desdobrem em ações “face a face”.

- podem ser conflitivas [conflituosas]. O que conta, neste nível, para definir a IN(B) de um agente não é o fato de que ele têm tal ou qual atitude no conflito, mas o fato de que participa (às vezes intensamente) do conflito, e que este conflito é, para ele, muito importante. A briga entre clericalismo e anticlericalismo, num longo período da história francesa, definia seus pólos antagônicos como igualmente – embora diferentemente – [ILEGÍVEL, sentido de “faces”, “traços”] da Identidade Nacional francesa. Observações parecidas poderiam ser feitas a propósito dos conflitos de classes: esses conflitos, na França, eram prioritários tanto para os operários como para os patrões – e os dois pólos estavam a tal ponto “engolfados” neles que não davam ênfase decisiva às eventuais ligações que um e outro mantinham com movimentos internacionais (socialistas, sindicalistas, labours, etc.) – como demonstraram as atitudes que tomaram face a I Guerra Mundial. Os próprios conflitos, portanto, eram “nacionais”, não apenas porque se desenrolavam num quadro nacional, mas porque sua “substância” era nacional – senão patriótica e ‘nacionalística’.

Positivas ou conflituosas, são essas macro-interações que dão ensejo à “realimentação” de uma história nacional (ao passo que as micro-interações dão ensejo, no máximo, a histórias locais). Ter uma Identidade Nacional significa, então, para cada agente, memorizar e internalizar o passado coletivo – mesmo quando essa memorização é silenciosa, inconsciente (nós veremos que o Estado Nacional tende constantemente a reatualizá-la – e também, é claro, “escolhê- la”). [MARGEM: Ou melhor: “somos nosso passado”. “O passado é nós mesmos”, tanto ao nível coletivo como ao individual. Ou seja: se ‘renascêssemos’ e ‘desaparecêssemos” a cada instante, nenhum dos nossos atos, sentimentos, etc... seria “nosso”, uma vez que, por definição qualquer atitude valeria tanto como qualquer outra. No limite, qualquer ato, etc., que surgisse no instante seguinte seria igualmente nosso. O “nosso” seria totalmente indeterminado. Ou seja: a própria noção de “nosso” se ‘esfumaria’. Não se poderia falar em IN (ou em qualquer identidade)].

Fixemos bem claramente a questão da memória (= passado acumulado, antes do que “lembrança”) na constituição da Identidade Nacional (ou de qualquer identidade):

- quando um ser individual ou coletivo está sem memória, não só ele pode fazer qualquer coisa (não tem o [ILEGÍVEL: talvez “uso”], o determinismo do passado) como qualquer coisa o define igual a qualquer outra. Logo, nada o define. Como um ato, um sentimento, etc... poderia nos exprimir melhor (ou pior) do que outro, uma vez que não existiria um referencial em relação ao qual essa superioridade ou inferioridade poderia ser medida?

- não havendo nada que nos exprima de modo específico, preferencial, também não há nada que nos exprima de modo qualquer (isto é, nada com que possamos nos identificar), que seja nosso. Logo não temos identidade, não somos nada.

Outro ponto: certamente o Estado e as grandes ideologias desempenham um papel importante na definição de certas macro-orientações como prioritárias, isto é, como nacionais. O Estado, em particular, ao enclausurar um certo espaço, faz com que as interações (macro e micro) intervindo nesse espaço sejam, para os participantes, as principais – senão as únicas – possíveis. Voltaremos a esse ponto importante.

c) O nível Identidade que resulta do consenso de parte substancial da sociedade em torno de certos valores e/ou objetivos. Essa terceira faceta da identidade se ergue, em princípio (veremos que, de fato, pode haver exceções – o Brasil é uma delas), sobre a base constituída pelos dois primeiros níveis de identidade (e também a partir de problemas “técnicos” interessando ao conjunto da sociedade). [MARGEM: Novo terceiro nível: ter Identidade Nacional é participar de um consenso nacional]. O consenso a que se liga essa identidade “dá forma”, em particular, às interações do segundo nível. Seja resolvendo os conflitos que caracterizam algumas delas seja dando “acabamento”, “aperfeiçoamento” às outras. Por sua vez, o consenso é impulsionado pelo Estado e pelas grandes ideologias (embora essas contribuam, simultaneamente

para a exacerbação das interações conflituosas). E essas ideologias lutam entre elas e contra o Estado para definir o conteúdo do consenso.

[CONTINUAR 16/09/89, PÁG 4]

[CONTINUAÇÃO 16/09/89 P.4] Temos, então:

Observações:

- O “consenso” e a nova dimensão identitária que dele resulta são quase sempre problemáticos (fugazes, cambiáveis, deslocáveis, imperfeitos, etc.). A solidez da sociedade nacional só em parte repousa sobre eles. As “macro-interações”, mesmo quando conflituosas, são tão ou mais fundamentais para a consistência social.

- É a partir do “consenso” que aparece uma esfera pública no sentido forte, no sentido de “Questão judaica” ou de Habermas [PROCURAR]. Todavia um embrião de esfera pública já é discernível ao nível das macro-interações, mesmo que conflituosas.

[FIM 16/06/89]

[17/03/90]

A INB

Identidades individuais e identidades grupais

Vários traços permitem distinguir uma identidade grupal (a identidade nacional em particular) de uma identidade individual (minha identidade, por exemplo, enquanto sou Beltrano ou Fulano): I m p u l s ã o d o Estado e das Ideologias “Problemas” (técnic os de várias esferas [???] + os colocados p e l a s “ m a c r o - interações” Busca e criação de consensos amplos 3º Andar da I d e n t i d a d e Nacional

1. A identidade grupal – raciocinemos sempre tendo em vista a identidade nacional – comporta dois pólos:

a) identidade do grupo enquanto grupo, no sentido em que Braudel fala da identidade da França [PROCURAR]. A nação enquanto tal tem uma identidade. Ou, se quisermos, ela é essa própria identidade coletiva.

b) identidade de cada um dos membros ou participantes do grupo, que não lhes pertence como uma propriedade que seria rigorosamente individual, mas que o caracteriza, ao contrário, como membro de determinado grupo;

2. Chamaremos esse 2º pólo de identidade “grupal individual”. Ele comporta por sua vez 2 dimensões. Em se tratando da Nação, teremos, para seus participantes:

a) a identidade de cada um deles com os outros;

b) a identidade deles todos com todos de certos valores, projetos, etc.

c) ! vv [b’ ou c) Relações, estreitas, entre os dois aspectos da identidade grupal “Identidade com” e “Identidade em torno”, embora concirnam ao aspecto “grupal individual”, precisam ser importantes para que o aspecto grupal mesmo (a identidade do grupo enquanto grupo) seja consistente. Ou seja: muitos indivíduos têm de ser “idênticos com” muitos outros, em torno de valores e objetivos percebidos como muito fortes. Quando isso não ocorre, diremos que a identidade grupal – a Identidade Nacional, no caso – não existe, ou existe “mais ou menos” (toda uma gama de situações é possível. Exemplo: A Identidade Nacional / grupal brasileira, em 1889, era fraca).

Outro ponto: quando “poucas pessoas têm identidade nacional com poucos” (caso de Rui, dos positivistas e dos Florianistas no fim do século passado [XIX]), a própria identidade nacional “individual” deles se torna frágil. Com efeito: mesmo que os objetivos nacionais sejam vividos e cultuados intensamente por esses indivíduos, o simples fato de que eles sejam os únicos a “servir o universal” faz dessa dedicação uma maneira de “hobby”. Algo gratuito, que poderia não existir. E, havendo uma contingência, esses indivíduos podem também renunciar, a qualquer momento, a tais valores e objetivos. Não é algo sério, já que não está “encravado” na personalidade de cada um. Ou, se está encravado, isso se dá em termos puramente temperamentais ou caracteriais. [REPENSAR estes termos relativos a temperamento e caráter]. Não há nisso nenhuma universalidade ética].

Não é possível reduzir qualquer um desses 2 aspectos apenas a uma simples decorrência do outro. E, também, um pode ser (em determinado momento e para determinada pessoa) mais importante que o outro.

3. O “conflito das interpretações” – presente em qualquer identidade na medida em que ela tem, sempre, várias maneiras de interpretar seu próprio passado (o passado que ela é) para “lançá-lo” rumo ao futuro [ou para “traçar” um projeto que seja consoante com esse passado] – se torna mais agudo no caso de uma identidade grupal . Com efeito: 203

Tomada no sentido de “identidade do grupo enquanto grupo”.

- as diferentes interpretações não exprimem (à diferença do que ocorre com uma identidade meramente individual) diferentes tendências de um mesmo indivíduo, mas diferenças (no caso de uma Nação) de etnias, de classes, de regiões. Cada ator (coletivo) luta para “universalizar” um interesse ou ponto de vista particular. Não há nenhum ponto de vista “holístico” capaz de impor-se ao particular; nada, a não ser a exigência de universalidade, à qual deve atender/satisfazer cada ator. - nessas condições, no caso de uma nação, a Identidade Nacional há de conviver

com conflitos, atuais ou potenciais, de etnias, classes, etc... Melhor: a Nação é “inventada” para “sublimar” ou disciplinar tais conflitos, sem poder eliminá-los de todo.

[FIM 17/03/90]

[10/05/90]

A INB

Capítulo 1: “Entre o caráter nacional e o nacionalismo” 1. A Identidade Nacional para os conservadores:

a) É algo que sedimenta ao longo do tempo.

b) Nome título, é um manancial de valores e orientações, que permite aos grupos e indivíduos [ILEGÍVEL, parece “atuem”] com nitidez e força (que dirime as dúvidas, as fraquezas, etc.)

c) Sem dúvida, a Identidade Nacional não é feita “para” ajudar / impulsionar a segurança, o desenvolvimento, etc. da coletividade ou dos membros. Mesmo porque esses valores (segurança, desenvolvimento ou outros) não preexistem à Identidade Nacional: só adquirem / fazem sentido – pelo menos um sentido preciso – uma vez a coletividade “já” em órbita. Mas, uma vez realizada essa colocação em órbita (ou a medida que ela se realiza), vêm também impulsos no sentido da segurança, do desenvolvimento, etc. A Nação e a Identidade Nacional não constituem nem meios nem fins, mas o solo-sempre-já-presente da ação individual, setorial, coletiva, classista, etc... Nessas condições, Identidade Nacional e Nação devem ser consideradas como um “Absoluto Histórico”. 2. Se Identidade Nacional é isso mesmo (que dizem os conservadores), torna-se logo

duvidoso que ela possa ser encontrada na história brasileira. Ou melhor: não sabemos se ela poderá / vai ser encontrada na história brasileira. Pois o que nos desperta a atenção, ao examinar essa história, são os esforços repetidos de “construir” a Identidade Nacional. Não se tratou, para gente tão diversa como o Barão do Rio Branco, A. Torres, O. Vianna, o pessoal do ISEB, O. S. Ferreira ou o pessoal dos CCP, de constituir uma sedimentação histórica e de se deliciar com ela, mas, ao contrário, de partir do zero – ou de bem pouco – para elaborar e executar o “projeto” de fazer o Brasil e a Identidade Nacional Brasileira.

3. Mas, dirão alguns, por que não seria assim mesmo? Porque a Identidade Nacional – pelo menos a Brasileira, se não toda e qualquer identidade – não poderia ou não

deveria ser construída, em vez de constatada? Por que haveríamos de nos reger pelos cânones teóricos dos conservadores, no tocante à Nação e à Identidade Nacional? 4. Ora, veremos que é assim mesmo: a Nação e a Identidade Nacional poder ser

“construídas” – e, acrescentemos, mesmo as velhas Nações (França, Inglaterra, ...), objeto privilegiado das análises e saudades conservadoras, foram, em alguma medida / até certo ponto construídas. [! +] Só que há uma importante ressalva: um “projeto” de Identidade Nacional – e isso, aliás, vale para qualquer outra modalidade de identidade – só pode se concretizar se ele se “encaixar” numa realidade prévia, que lhe serve ao mesmo tempo de impulso, de matéria prima e de limite. No fundo é esse tipo de “solo”, à Merleau-Ponty, que sempre visaram os autores conservadores, quando falavam da Identidade Nacional. E tinham razão ao afirmar a necessidade de um tal solo, que embase uma identidade qualquer. Seu erro maior foi tê-lo confundido com o todo da Identidade Nacional, esquecendo que esta inclui estratégias, “projetos”, etc. – ou melhor, no caso de uma identidade coletiva, um embate entre projetos conflitantes.

5. Mas será que, no Brasil, existiu – ou existe, ou poderia existir – um “solo” onde possam se enraizar as estratégias que viriam a constituir a Nação e a Identidade Nacional? A noção de “solo” é ambígua – ela comporta duas vertentes. De um lado, temos fatos objetivos: dados da geografia, da demografia, da economia, da estrutura social e política (e também a “pertinência” de múltiplos atores), etc., com que os atores se defrontam em sua busca – ou recusa – da Identidade Nacional. De outro lado , toda identidade comporta um passado, ela “é” esse passado. Passado 204

coletivo no caso da Identidade Nacional. O que tem uma implicação, uma 205

conseqüência imediata: para viajar, todo projeto, toda decisão há de ser “aceita” pelo passado, de se “coadunar” com ele. Do contrário, ele perde ao mesmo tempo força e sentido, como bem perceberam os conservadores: com que força poderíamos sustentar um projeto que nos é alheio (uma vez que somos nosso passado)? E que sentido poderia ele ter para nós, se nos é alheio? A partir disso, podemos vislumbrar vários problemas : 206

- Um indivíduo ou um grupo (por exemplo, a coletividade nacional) pode querer revogar parte ou a totalidade do seu passado. Essa eliminação é evidentemente impossível (já que somos nosso passado). Logo, a vontade de obliterar o passado – ou de sublimá-lo – pode gerar neuroses individuais ou coletivas.

- Um indivíduo tem sempre, por definição, um passado, bom ou ruim. Isso já não é sempre verdade quando se trata de um grupo. Pode não haver passado,

O texto original dizia: “De outro lado temos a interação entre esses grupos e indivíduos, e a

204

sedimentação / memorização dessa interação ao longo do tempo. É, veremos, essa ‘memorização da interação’, ou essa interação memorizada, que é o elemento mais importante na constituição da Identidade Nacional. Ora, poderemos constatar que tal elemento esteve ausente na história brasileira, pelo menos no que diz respeito à história social e política. O caso da história cultural é um pouco diferente”.

É isso que acabamos de chamar de “memorização da interação”, ou “interação memorizada”, no

205

parágrafo anterior [NOTA: o parágrafo citado foi retirado]

Algumas dessas dificuldades podem se apresentar também – mas num grau menor – no caso de uma

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interação memorizada, etc., e, nesse caso, os projetos, estratégias, etc. se colocam/põem em contato direto com a base puramente “objetiva” (geografia, economia, demografia – podemos incluir, nesse elemento “objetivo”, até o próprio caráter nacional, como ethos nacional mais ou menos solidificado). O que é desastroso: na impossibilidade de alicerçar-se numa base “interacional” os projetos vão “patinar” na superfície da base puramente objetiva. A ação coletiva vai se tornar incoerente e/ou precária.

[FIM 10/05/90]

[13/07/90]

Introdução ou Capítulo 1: “Entre o caráter nacional e o nacionalismo”

1. Não podemos confundir a questão da identidade nacional e a questão do nacionalismo. A presença deste, no passado ou no presente, não implica forçosamente que houve ou há uma identidade nacional entre os brasileiros. Quando muito, o nacionalismo nos permite remontar/alcançar indiretamente para a Identidade Nacional; a sua eventual exacerbação, em determinado momento, pode significar, por exemplo, que não há ainda Identidade Nacional, e que os nacionalistas se esforçam justamente – e talvez em vão – para suscitá-la (e veremos que foi freqüentemente o caso no Brasil). O nacionalismo é da ordem do projeto, da vontade explícita, da “tensão surda”. A Identidade Nacional – como, aliás, qualquer identidade – pode comportar também esse aspecto, mas, por outra parte, ela significa permanência, regularidade e “sedimentação” no seio de determinado espaço social. E aqui daremos razão aos conservadores (ver... [ACIMA])

Reformulemos tudo isso:

a) A presença de nacionalismo só concerne, em geral, a uma parte (restrita) da população; ou então concerne a muitos – mas de modo efêmero (levante,

pogrom, meeting, etc.). Ao passo que a Identidade Nacional – como qualquer

identidade de grupo – só é concebível/possível quando concerne, de modo contínuo, a maioria da população que ela pretende abranger (ou que se pretende, através dela, abranger).

b) O nacionalismo é da ordem da vontade, do desejo, da adesão explícita. A Identidade Nacional é da ordem dos hábitos. É coisa sedimentada, ou que sedimenta, se diversifica, etc., aos poucos – e cuja profusão ou mudança se faz, em geral, à revelia da consciência dos agentes sociais. Je sais que je suis et veux

ête nationaliste (ou “entreguista”), alors que je n’ai pas forcément conscience de [mon] identité [nitisade] et maior encore de as nature.

c) Nessas condições o nacionalismo só pode ter 2 tipos de conexão com a Identidade Nacional:

- lá onde a Identidade nacional já está forte, ele pode constituir o 3o. andar, o andar “reflexivo” dessa Identidade Nacional. Ou melhor, ele pode ser parte desse 3o. andar, ao lado de outras ideologias (em geral, opostas a ele), volúveis como ele e que procuram desenvolver, redirecionar, etc., a IN (

- lá onde IN está ausente (ou frágil), o nacionalismo pode querer constituí-la. Já sabemos/vislumbramos que isso foi forte no caso no Brasil. !VBis

Observemos ainda, no concernente às relações entre nacionalismo e identidade nacional (IN):

d) Negando o que foi dito acima (1,b), podemos admitir que há um elemento de querer, de vontade na IN, no seguinte sentido: a identidade – qualquer identidade – há de ser “querida” por seu ou seus portador(es). Não sou apenas isso ou aquilo, quero ser isso ou aquilo, “aderimos a nós mesmos”. É a razão, aliás, pela qual a identidade é sempre algo positivo, ou melhor, a afirmação, a posição de algo positivo (ou que julgamos positivo). À diferença do que ocorre com o CN: deste , embora também seja meu, eu posso me distanciar, considerá-lo com objetividade (“nós brasileiros, infelizmente, somos seres sem memória, mergulhados no presente, etc...”). Ele é meu (ou nosso), mas, todavia, não é plenamente meu: não só não “coincido” com ele (e também não coincido com IN), mas nem há vontade de coincidir com ele (à diferença do que se dá com IN)*. Apenas o combato, muitas vezes de modo pejorativo. A não ser – é claro – que decidimos eleger nosso CN (ou tal ou qual elemento dentro dele) em forma ou conteúdo da IN. Nesse caso, vamos tentar coincidir com CN. Mas não será mais CN puro, e sim CN transformado em conteúdo de IN, ou, pelo menos, “ensaiado” como conteúdo de IN.

e) No entanto, o “querer” imanente à IN permanece diferente da vontade nacionalista. É que o nacionalismo é sempre, em algum grau, um empreendimento individual ou coletivo: nós nos “fazemos” nacionalistas – seja porque gostamos da Nação em si mesma, seja para atingir tal ou qual objetivo/ fim (desenvolvimento, por exemplo). E, precisamente em virtude desse voluntarismo, podemos de repente “cansar de ser nacionalistas”/”abrandar o nacionalismo”. Ao passo que, no caso da IN, nós nos descobrimos como querendo ser isso ou aquilo ter tal ou qual identidade – isto é, descobrimos que queremos ser isso ou aquilo: “[ILEGÍVEL]”. Não há mais voluntarismo, mas apenas vontade querer. Ou melhor: quando o voluntarismo predomina, isso significa que ainda não temos (ou já deixamos de ter) uma IN; temos, então, apenas a “vontade nacionalista de ter uma IN”.

Resumindo: a IN não é da ordem do projeto (como é o nacionalismo) nem da projeção; não projetamos nossa IN (ou qualquer outra identidade), mas nos projetamos dentro dela. Nós nos “jogamos” dentro dela, em vez de tê-la a nossa frente como um “objeto inteligível” a conquistar ou a realizar. Naturalmente, essa distinção, essencialmente analítica, não exclui inúmeras situações de fato, em que se começa pelo nacionalismo e se termina pela IN (ou inversamente). Mas, em todas as situações, sempre se passa – de repente ou aos poucos – de um estado para outro, profundamente diferente.

f) A oposição tem ainda o seguinte significado (ou a seguinte conseqüência): ao passo que me é fácil “entrar” no nacionalismo ou “sair” dele (essas duas operações sendo voluntárias), não posso agir do mesmo modo em relação à IN. Se estamos “dentro” da IN, não podemos abandoná-la à vontade, embora ela

No documento Auto-organização e nação em Michel Debrun (páginas 193-200)