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A criação do vínculo com a família é tema abordado por mui-tos trabalhos internacionais, sendo ponto fundamental para ga-rantir a aderência ao atendimento e reduzir o seu abandono. O texto de Dembo et al (1999) relatando as estratégias para envol-ver famílias de alto risco social (com familiares portadores de

do-enças mentais, com adolescentes dependentes e com jovens in-fratores) é um desses exemplos.

Os autores, a partir de revisão bibliográfica, mencionam que os fatores mais constantemente associados à não utilização de serviços de saúde são: pertencer a minorias étnicas; possuir renda familiar muito baixa; a mãe estar empregada, não dispondo de tempo; a mulher ser o chefe da família; a mãe ter baixa escolarida-de; ser mãe adolescente; e a família ser muito numerosa. Em contrapartida, fatores que propiciam adesão ao atendimento clíni-co são: ter clíni-contato fixo clíni-com o profissional de referência e ter incluído os pais e outros membros da família na entrevista inicial e no atendimento.

Dembo e colaboradores comentam que para estabelecer vín-culo é preciso que os membros da família envolvida concordem em participar e que o sucesso desse processo baseia-se na confi-ança estabelecida com o profissional e a clara explanação à famí-lia sobre quais são os potenciais benefícios em participar da inter-venção. Citam a experiência do “YOUTH SUPPORT PROJECT” na criação de vínculos com as famílias. Comentam que, quando a família está em crise, fica menos resistente à ajuda, e esse mo-mento deve ser aproveitado, mostrando à família os benefícios potenciais desse trabalho para cada familiar. Assim, como reve-lam os dados dos dez serviços nacionais analisados, a flexibilida-de para marcar horários das entrevistas foi apontada como fator positivo para aumentar a adesão. Ratificando a experiência menci-onada pelos familiares entrevistados nos serviços brasileiros, mui-tos membros desse grupo disseram que são tratados grosseira-mente por outras agências de proteção, o que gera resistência. Torna-se necessário, a partir daí, abrir uma escuta para os “desa-bafos” e críticas dos familiares para que a vinculação seja mais efetiva. Consideram que ouvir as opiniões da família com respeito é fundamental. Muito oportunamente, os autores comentam que o vínculo é essencial no início do contato, mas que este continua sendo construído ao longo de todo o processo de atendimento.

Outra forma de evitar o abandono do atendimento é relatada por Dore (1996), ao apresentar a experiência de serviços de

pre-servação familiar que são crescentemente empregados para dimi-nuir a colocação da criança/adolescente em instituições. O artigo discute as estratégias de aumentar a aliança estabelecida entre família e equipe, desde a abordagem inicial. Existe evidência subs-tancial que a aliança terapêutica que se forma entre cliente e pro-fissional está diretamente relacionada a resultados terapêuticos positivos. Conseqüentemente, compreender como influenciar o processo de formação dessa aliança é um importante fato para aumentar a eficiência terapêutica. Empatia do paciente com o terapeuta e a sensação de ser compreendido são considerados pontos principais para o estabelecimento dessa aliança.

Existem propostas para a melhoria da aliança entre clínicos e família (Kinney, Haapala and Booth, 1991): perceber as diferentes percepções dos problemas familiares segundo a ótica de cada mem-bro da família; diminuir a distância emocional e pessoal entre clien-te e clínico; acalmar os medos dos clienclien-tes de serem verbalmenclien-te atacados ou castigados; aumentar o nível de conforto dos clientes com seus clínicos, conversando sobre coisas positivas, comparti-lhando “informações neutras” sobre si próprios (mostrando que são humanos e também vivenciam problemas) e relacionando pes-soa a pespes-soa; estimular a esperança de que as coisas mudarão para melhor. Os clientes ganham sensação de poder numa situação na qual podem escolher onde a primeira entrevista ocorrerá, quais os membros da família que participarão, o que será discutido e recebendo assistência imediata para necessidades imediatas.

Pequenas metas que os clientes podem facilmente obter são indicadas, pois fortalecem a autoconfiança e a vontade de empre-ender mudanças mais ambiciosas. Também devem ser trabalha-das, ainda no primeiro contato, habilidades para reduzir conflitos. A atividade clínica da primeira sessão visa desenvolver e manter a aliança pela confiança construída, acalmando medos e suspei-tas, demonstrando aceitação e empatia, e afirmando a competên-cia dos clientes.

Na capacitação dos profissionais são discutidos métodos para gerar aceitação de crianças/adolescentes que têm

comportamen-tos inaceitáveis ou repugnantes, na visão dos profissionais. São treinados para: a) reconhecer suas próprias similaridades com os clientes; b) entender que as pessoas sob certas circunstâncias funcionam da melhor maneira que conhecem; c) acreditar que os motivos que os clientes possuem são geralmente positivos, em-bora lhes possam faltar habilidades ou conhecimento para expres-sar esses motivos de uma forma positiva; d) compreender que os membros da família desejam proximidade, oportunidades mútuas e alívio para os sofrimentos.

Os autores defendem que o profissional deve ser honesto e aberto com o cliente, informando os riscos envolvidos nas mu-danças propostas pelo tratamento, reconhecendo também que elas podem ser um desafio difícil de ser obtido. Também precisa estar preparado para lidar com as resistências do cliente, tanto quanto para lidar com as queixas apresentadas. Os profissionais dos Ser-viços de Preservação Familiar investigados por Dore & Alexander (1996) costumam ser flexíveis, permitindo que o atendimento seja tão extenso quanto necessário. Alguns tomam horas ou mesmo o dia inteiro. Essa flexibilidade da sessão reafirma para a família a importância de seus problemas e necessidades. Há também ênfa-se em deênfa-senvolver atividades do tratamento fora dos ênfa-serviços, nas casas ou comunidades.

Alguns sinais de alarme podem alertar que a aliança tera-pêutica tem problemas: críticas ao terapeuta e/ou ao serviço; questionamento das metas anteriormente acordadas; cancela-mento, atrasos ou falta aos encontros agendados; falha em executar as tarefas combinadas entre as sessões; complacên-cia exagerada ou concordâncomplacên-cia precipitada aos objetivos, me-tas ou tarefas.

Os profissionais devem acessar as capacidades relacionais dos pais e outros cuidadores desde muito cedo no processo de intervenção e formular planos de tratamento adequados a essas capacidades.

Embora a questão do estabelecimento do vínculo não te-nha gerado uma reflexão mais aprofundada pelos serviços

naci-onais analisados e nem mesmo na literatura brasileira sobre violência familiar, constatamos a preocupação e sensibilidade de vários profissionais com as questões apontadas acima. Con-tudo, por vezes só se percebe que houve problemas na vinculação dessa família quando ela abandona o serviço, de-monstrando a ausência de indicadores e de uma atenção mais apurada para a questão.