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A reação da maioria dos familiares entrevistados (mães) foi extremamente elogiosa quanto à ACOLHIDA que receberam e ao tratamento que os serviços têm dispensado aos seus filhos e a si. O enredo dessa narrativa geralmente aponta os primeiros conta-tos com os profissionais, indicando, por exemplo, o sentimento de profunda dor pela revelação de um abuso sexual sofrido por uma filha ou a intensa desconfiança quando encaminhados pelo Conselho Tutelar.

A atenção e o “amparo” nesse momento foram apontados como muito importantes pelos familiares.

Eu me senti... quando eu saí daqui, um pouco mais aliviada, porque eu cheguei aqui chorando muito, sabe, cheguei atordoada mesmo, aí saí daqui mais calma, mais tranqüila (fam/OG 4)

Todas os familiares entrevistados citaram os profissionais pelos nomes e contavam em detalhe como foi o atendimento e o que foi feito nas fases iniciais, indicando que as abordagens não foram impessoais. Em linhas gerais relatam que nesses serviços receberam apoio para suas dores e angústias.

Uma mãe relatou o desgaste sofrido por ela, sua filha e mari-do em busca de serviços para atendimento inicial da criança, vio-lentada por um estranho. Peregrinações pelo Instituto Médico Le-gal (IML) e Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) e abordagens ríspidas dos profissionais que lá trabalham contribuíram para aumentar o sofrimento dessa família e fazer crescer a desconfiança em qualquer outro serviço público. Como a menina e a mãe precisavam de atendimento psicológico, o pai, buscando evitar novas situações desagregadoras, foi sozinho co-nhecer primeiro o serviço e sua dinâmica. A comparação feita por essa mãe quanto à acolhida recebida foi inevitável:

Eu fui primeiro no hospital (...) o médico disse “ Infelizmente aqui não podemos atender. Vou indicar o DPCA (...) eu fiquei nervosa. Eu nun-ca imaginei ir no IML. Cheguei lá, o atendimento não foi de qualidade, eles ficavam com grosseria (...) eu estava desorientada (...) “é crian-ça, então vai para o DPCA”. O atendimento lá demorou muito. E você já fica ansioso querendo que chegue logo, ela nervosa. Aí depois pas-sou para a psicóloga (...) Eu achei ela um pouco grossa. Não teve aquele carinho para saber conversar com criança. Ela agia como se fosse com um adulto ali. Depois chegou um escrivão. Não foi o delega-do que atendeu foi o escrivão. (...) mas aqui não. Elas escutaram, estão orientando até hoje, eu cheguei mesmo aqui, e foi aqui que eu vi uma luz. (fam/OG 1)

Muitas entrevistadas afirmaram que graças ao trabalho de-senvolvido e o apoio recebido nos serviços conseguiram redimensionar a experiência traumática, atribuindo menos intensi-dade e sofrimento, tendo em vista que embora penosa, outras pessoas passaram por tal situação e conseguiram superá-la, dan-do outra significação ao ocorridan-do. Outras mães afirmam que as conversas e orientações com as assistentes sociais e psicólogas têm sido importante para mudança de comportamento e da ma-neira de ver seus filhos, conseguindo visualizar suas qualidades e seus direitos.

Entrevistadora - E com você, mãe, eles fizeram algum tipo de acompanha-mento?

Mãe - Fizeram. Fizeram porque eu também estava, apesar de tudo eu tam-bém fiquei muito transtornada. Então elas foram me acalmando de uma forma, me mostrando que certas coisas que estavam acontecendo comigo era tudo imaginação..., já estava tendo medo até de sair no meio da rua, de ter amizade com as pessoas, de trabalhar. Aí eu fui maneirando e agora eu consigo até olhar esse caso como um caso menos grave, porque realmente para mim foi grave pelo ato que aconteceu, mas existem casos piores do que o meu. Então eu não posso me colocar como uma única do mundo, eu tenho que ver que existem pessoas com mais problemas e mais graves do que o meu, e o meu pode ser resolvido de uma forma, de uma conversa, de um ato, de alguma coisa. Eu acho que ele pode ser resolvido. E assim que elas me ensinaram a resolver, a correr atrás também dos meus problemas, não ficar parada esperando, tudo isso elas me ensinaram. (fam/OG 3)

Os familiares que participam de dinâmicas de grupos de pais também teceram comentários muito positivos sobre essa experiência. Alguns entrevistados vão a essas reuniões, graças à oferta de horários mais flexíveis (geralmente de noite), e par-ticipam há anos. Consideram como muito importante a preocu-pação dos profissionais em estarem atentos ao problema de cada família, de mostrarem que lembram dos detalhes de cada história, de estarem abertos para conversas individuais, de con-sultarem os familiares sobre as suas necessidades atuais. Os familiares disseram que tais encontros os fazem se sentir alivi-ados e apoialivi-ados.

Nós desabafamos sobre o comportamento dos nossos filhos e recebe-mos ajuda em todas as áreas. Como deverecebe-mos suportar aquela situação, como devemos atender. E todas elas de imediato já demonstram um amor, um interesse pela situação. Às vezes o grupo é de cinco, de dez mães mas ela atende cada uma como se fosse aquele um todo. Para cada uma ela sabe averiguar o problema e dar aquela palavra, aquela orientação que nós precisamos. E o mais importante de tudo é a confiança que ela nos faz... que elas nos transmitem. A [cita o nome da profissional] por exemplo, no primeiro dia mesmo que a gente já está conversando com ela, a gente já sente aquela vontade que ela tem para se doar, para atender, para servir. Porque nunca saímos de uma sala sem... sem ter aquele apoio, sem ter aquele alívio do assunto que nós trouxemos para ela.(fam/ONG 4)

A CONFIANÇA nos profissionais dos serviços mostrou ser um ponto forte do atendimento, segundo a análise dos familiares entrevistados. A absoluta maioria dos entrevistados relatou se sentir à vontade para falar de todos os seus problemas e procurar os profissionais quando precisasse de ajuda.

Foram recorrentes os relatos das mães entrevistadas que afirmam poder conversar sobre todos os assuntos familiares, pedir conselhos ou simplesmente “desabafar”. A liberdade de poder ligar e receber por telefone um conforto do profissional que as atende, facilitando a marcação de uma entrevista, tam-bém foram pontos importantes para alicerçar esse sentido de confiança.

(...) Toda vez que eu estou precisando de uma conversa, de alguma coisa, eu ligo para elas, aí elas vão e marcam uma hora ou então conversam comigo mesmo pelo telefone, elas mesmas ligam lá para casa para saber (fam/OG 3).

A sensibilidade dos profissionais em lidar com o sofrimento gera-do pela vivência da violência, de não forçar os limites de cada um, a atitude de prover um olhar e uma escuta baseados no sentido da promoção do “cuidado” também foram elogiados pelos familiares.

Mãe: Ele [o pai] ... eu não sei se se sente à vontade, mas no dia que ele veio eu acho que ele se sentiu à vontade porque ele falou. (...) ele chorou muito, que ele não tinha chorado, ele chorou que parecia um menino. Aí ela [profissional] ligou para mim e perguntou se eu ia estar em casa que ele ia chegar muito arrasado. Ela mandou ele lavar muito o rosto, deu água a ele. Ele viu o lado fraterno que ela tratou ele e ele chegou em casa mais tranqüilo, falando “Lá o atendimento é bom, ela [a filha] vai gostar do atendimento.” Só que ela não gostou no começo não. Ela disse: “mãe, vai começar tudo de novo” e come-çava a chorar e ficava nervosa (...) Ela começou a trabalhar com pinturas, com flores. E começou a pintar e não ficava mais nervosa. (...) “Quais cores você quer usar?” (...) motivada. Ela pensava que ia ter que falar do assunto e ela não queria falar do assunto. Na segunda vez ela foi pintando paisagens. Na terceira vez ela trabalhou com bonequinhos. Aí ela começou a gostar. Entrevistadora: A senhora acha que hoje ela se sente à vontade para con-versar com a psicóloga, para concon-versar sobre isso tudo?

Mãe: Não sei. Esta uma surpresa, eu não sei ainda. Eu acho que até agora ela está negando (...) e todo dia ela tem uma reação diferente (fam/OG 1)

Uma única entrevistada demonstrou desconfiança em parti-lhar seus problemas e pedir ajuda ao serviço. Sintomaticamente essa entrevistada participa de um serviço que apenas chama os familiares para uma entrevista inicial, quando há problemas com as adolescentes atendidas ou para eventos culturais promovidos pelas meninas.

Nem todo caso a gente também pode conversar. Tem muitos casos que dá para conversar mas tem outros casos que não dá (fam/ONG 1).

Além do acolhimento e sentimento de empatia, vários outros fatores foram apontados pelos familiares como positivos à

vinculação com os serviços: a maneira como são recebidos no primeiro contato com o serviço; a flexibilidade do serviço em aten-der a criança ou o familiar mesmo sem hora marcada quando há uma situação de necessidade; a inclusão no atendimento de um irmão que também precisa de uma avaliação.