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Desenvolvimento Organizacional da Escola – Influências, Dinâmicas e Lógicas de Acção

1.1.2. A intervenção das forças liberais no desenvolvimento do sistema escolar

Com a Revolução Liberal de 1820, a Comissão de Instrução Pública das Cortes Constituintes assumiu os poderes executivos, a par das funções legislativas que lhes eram inerentes. Os seus elementos recrutavam-se entre os liberais mais conservadores. Ainda assim, esta Comissão criou um número razoável de escolas masculinas e femininas, melhorou a situação salarial dos professores e as suas condições de carreira e instituiu o ensino da Constituição nas escolas elementares.

A constituição de 22 evitou um compromisso explícito em relação à generalização do ensino elementar. A convicção de que o Estado não dispunha de meios financeiros que lhe permitissem suportar a generalização do ensino

43 público, levou a que a aristocracia e a burguesia liberais concordassem com a criação de redes escolares paralelas às do ensino oficial.

Entretanto, o poder político, agora personificado em D. João VI, efectuou uma alteração estrutural do sistema público. Trata-se da criação e financiamento, em 1823, do Instituto para surdos-mudos e cegos, primeira instituição de ensino especial, cujo sucesso pedagógico se revelou muito significativo, tendo sido mais tarde, em 1834, incorporado na Casa Pia.

A Sociedade das Casas de Asilo da Infância Desvalida criou a primeira dessas instituições em Lisboa e, em seguida, no Funchal.

As reformas levadas a cabo por Passos Manuel no âmbito da Revolução de Setembro de 1836, empreendidas no quadro de um programa ideológico- político que tinha por alvo o arranque industrial, tinham um carácter global, ambicionando intervir em todos os graus e ramos de ensino, inclusivamente mediante a criação de sectores escolares inéditos:

a) Instrução Primária

- Reforma da instrução primária masculina e feminina, com a inclusão da Gramática Portuguesa, da História, da Geografia e ensino da Constituição, do Desenho Linear e dos Exercícios Ginásticos no currículo da escola elementar;

- Termo (doutrinal) da escola excludente: afirmação da obrigatoriedade escolar, embora a divisão do território em círculos de instrução primária estipulasse um mínimo de 60 alunos como critério para a abertura da escola;

- Criação de Escolas Normais pelo Método do Ensino Mútuo nas capitais do distrito administrativo;

- Aulas nocturnas para adultos;

-Previsão de uma escola feminina em cada capital de distrito administrativo;

- Previsão de edifícios próprios para o ensino primário;

- Descentralização administrativa nas “Províncias Insulares” mediante a instituição dos Conselhos Provinciais de Instrução Pública, dotados de largos poderes;

44 b) Instrução Secundária

Foi neste nível de ensino que o Estado concentrou a sua atenção. Até então, o país continuava a dispor apenas do sistema herdado do Pombalismo: Aula do Comércio, Escola de Náutica (Porto), Colégio dos Nobres, de Mafra e das Artes (reformado em finais do século XVIII), rede de cadeiras de Gramática Latina, Grega, Retórica e Filosofia, às quais tinham sido adicionados, os cursos de Aritmética, Geometria, Geografia e História, e Real Escola de S. Vicente de Fora, criada nos começos do século XIX.

A Revolução de 1836 permitiu a instituição dos liceus nacionais, cuja finalidade era proporcionar uma sólida cultura geral.

O plano de estudos dos liceus era constituído pela cultura literária tradicional: Gramática Portuguesa e Latina, Clássicos Portugueses e Latinos, Oratória e Poesia e Literatura Clássicas. Incluía, ainda, Línguas vivas introduzidas no currículo de certas escolas. Ainda no plano literário, integrava as seguintes disciplinas: Ideologia, Gramática Geral e Lógica.

No plano físico-matemático, o currículo incluía as disciplinas de Aritmética, Álgebra, Trigonometria e Desenho, Geografia, Cronologia e História, além de matérias de orientação científico-tecnológicas, tais como: Princípios de Física, de Química e de Mecânica aplicada às Artes e Ofícios, e os Princípios de História Natural dos Três Reinos da Natureza.

No âmbito das Ciências Sociais, o plano de estudos dos liceus incluía entre as suas cadeiras, a de Princípios de Economia Política, de Administração Pública e de Comércio.

À semelhança do que tinha sido estabelecido para a instrução primária, defendia-se que os liceus fossem instalados em edifícios públicos, bem situados.

Previa-se a existência de equipamentos escolares especiais com a intenção de assegurar novas qualificações:

- biblioteca para alunos e professores; - jardim experimental de Botânica; - laboratório químico;

- gabinete dividido em três secções, destinado às aplicações da Física e da Mecânica, da Zoologia e da Mineralogia.

45 O processo de transformação do ensino secundário decorreu a um ritmo lento, prolongando-se até aos anos sessenta do século XIX.

Neste sentido, Fernandes (1998, p. 36) afirma aquilo que poderia ser aplicado à actualidade educativa, quando refere que “é visível que a retórica da reforma nem sempre coincida com o discurso dos factos e que não basta a vontade política, se existe, para que os efeitos sejam realmente alcançados.”

Relativamente ao ensino superior, sublinhe-se a criação da Escola Politécnica, em Lisboa, a Academia Politécnica do Porto e das Escolas Médico- Cirúrgicas do Porto, Lisboa e Funchal.

Poder-se-á concluir, que as reformas de Passos Manuel tiveram em linha de conta, conforme defende Fernandes (Idem, p.37), a “articulação com a cultura e as aspirações da burguesia industrial das principais cidades do país.” O autor adianta, ainda, que “a intervenção reestruturadora de mais amplo alcance, situa-se ao nível do ensino secundário, isto é, de um sector de ensino destinado às classes dirigentes” (Ibidem).

1.1.3. A Regeneração: o novo quadro político-social e as realidades