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A jornada especial e a incompatibilidade com a atualidade

57 RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE JORNALISTA REQUISITOS DISTINÇÕES COM RADIALISTAS É profissão regulamentada com conteúdo essencial diverso da de radialista Prevê o

4.2 A jornada especial e a incompatibilidade com a atualidade

Sob o fundamento de que o trabalho realizado por jornalistas e radialistas era por demais desgastante, estabeleceram-se jornadas especiais, inferiores àquela exigida dos trabalhadores em geral.

Ao profissional jornalista fixa, a Consolidação das Leis do Trabalho, jornada de cinco horas, prevendo a possibilidade de pré-contratação de duas horas extras diárias.

Em relação aos radialistas, entendeu por bem o legislador em estabelecer jornadas diferenciadas, de acordo com o setor a que está vinculada a função exercida pelo profissional. Em regra, a carga horária é de 6 horas diárias, porém identificam-se setores com jornadas de trabalho de 5 horas (autoria e locução), 7 horas (caracterização e cenografia) e 8 horas (administração e direção).

Não se pode negar que o trabalho de jornalistas e radialistas, face ao avanço da tecnologia, especialmente com a informatização deste setor, foi facilitado.

Vive-se, atualmente, outra fase, que em quase nada pode ser equiparada às condições de trabalho experimentadas quando da fixação da jornada especial antes assinalada para estas categorias.

As inovações tecnológicas implicam também na modernidade, na agilidade e na simplificação do exercício profissional, tanto que abandonaram as máquinas de escrever, por exemplo, e passaram a atuar junto a terminais de computador, telefonia móvel e equipamentos outros, nos quais o texto é digitado uma única vez, podendo sofrer quantas alterações se fizerem necessárias.

A exaustão, antes justificadora para a fixação de jornada de trabalho reduzida, foi minimizada e, atualmente, o desgaste da profissão não é maior do que o de outras tantas, cujo limite de carga horária é de oito horas diárias nos termos do art. 7º, inciso XIII, da Constituição Federal.

Entende-se que, atualmente, não existem razões para tratamento diferenciado de jornalistas e radialistas, no que diz com a limitação da jornada de trabalho. Demonstra-se, portanto, em mais um aspecto o distanciamento da legislação da realidade.

De mais a mais, em que pese à limitação horária estabelecida pela legislação específica, grande parte dos profissionais, especialmente jornalistas, permanece mais tempo vinculada a sua atividade profissional60, o que evidencia a

incoerência entre norma e fato.

Muitas são as características peculiares destas atividades. Isto porque a notícia e sua divulgação não têm prazo certo para sua cobertura e nem momento ideal para ocorrência, não sendo possível estabelecer um rígido limite de horários aos profissionais a ela vinculados.

A falta de flexibilização da legislação contribui, nestes casos, para o seu não cumprimento. Isto porque, além da reduzida carga horária fixada em lei, a estes profissionais, por força do artigo 2º, parágrafo 2º do Decreto-lei n.º 4.657/42 (Lei de Introdução ao Código Civil de 1916) e do art. 8º da CLT, aplicam-se as normas gerais do diploma consolidado no que diz com o elastecimento diário da jornada de trabalho. Assim, além do horário diminuto, nos moldes do artigo 59 da Consolidação das Leis do Trabalho, não poderão realizar horas extras em número superior a duas diárias.

Ora, desde sempre os profissionais jornalistas e radialistas foram tratados como categorias diferenciadas, com regulamentações próprias. Isto porque os

60 É difícil de conceber que o repórter, à busca de notícia da atualidade, possa ser submetido a um horário que não o de trens e aviões. E o que dizer do cronista político antes? Em que momento o apanhamos em plena atividade profissional? Na redação do jornal, aonde irá talvez escrever o seu artigo ou ditá-lo, talvez simplesmente entrar em contato com seus colegas, buscar as últimas notícias? No teatro, numa assembléia ou em sua casa lendo um livro de crítica ou um estudo histórico, ou mesmo durante as suas refeições, ou numa conversa entre amigos, quando brota uma idéia em sua mente, que envolvem outras idéias e lhe permitem esboçar no ato o esquema do seu próprio artigo?...Poderia ele próprio dizer os momentos precisos consagrados ao seu trabalho profissional e os que conservou ao descanso sem misturá-lo? Formuladas a mais de 50 anos, estas perguntas continuam atuais, e continua sendo igualmente difícil fazer a separação entre tempo que um jornalista dedica a suas atividades profissionais e o que, em outras profissões, se chamaria de tempo de descanso. (in Profissão jornalista: um estudo dos jornalistas como trabalhadores, p. 133).

preceitos gerais constantes do diploma consolidado em muito se afastavam da realidade destas profissões. Não há como, sob hipótese alguma, aplicar a atividades dinâmicas como estas os mesmos regramentos pensados para aqueles que atuam como operários, com exatos horários de entrada e saída e com precisão de produtividade.

Segundo dados retirados da obra Profissão Jornalista: um estudo dos jornalistas como trabalhadores61, na qual se encontram relacionadas as jornadas de

trabalho de jornalistas em 57 países, a carga horária atribuída aos brasileiros é a menor, ou seja, 30 horas semanais. Referida jornada de trabalho somente é adotada em outros três países do mundo: Espanha, Grécia e Guiana. Nos demais países, variam entre 36 horas (Argentina, Irlanda, Itália, Iraque, Índia, Uruguai) a 48 horas (Jordânia, Líbia, Hong Kong, Filipinas, Chile, Costa Rica). A maioria dos países conta com cargas horárias entre 40 a 48 horas semanais, são eles: Alemanha, Austrália, Áustria, Barbados, Bulgária, Camarões, Congo, Cuba, Tchecoslováquia, Dinamarca, Equador, Egito, Gana, Honduras, Hungria, Islândia, Japão, Malásia, Noruega, Nova Zelândia, Paquistão, Polônia, Reino Unido, Senegal, Serra Leoa, Sri Lanka, Suécia, Tunísia, Turquia e Rússia. No Canadá e Estados Unidos, em média, a carga horária semanal é de 37,5 horas. Refere, ainda, o estudioso, identificando a variação das jornadas de trabalho nos diversos países, que “as duas organizações internacionais de jornalistas inscreveram entre as suas preocupações constantes o estabelecimento, em todos os países, da norma de 40 horas, em cinco dias e de repouso semanal em dois dias”.

Além disto, muitos são os países que, deparando-se com a impossibilidade de engessamento destas profissões, vislumbram práticas de flexibilização da legislação. A Tunísia, por exemplo, conforme ensina Bohére62, despende o seguinte

tratamento aos seus profissionais jornalistas:

As partes reconhecem que as necessidades inerentes à profissão não permitem determinar o número e a distribuição das horas de trabalho. As partes se porão de acordo sobre uma regulamentação interna de cada empresa, para fixar formas de compensação das horas trabalhadas além do horário normal.

61BOHÈRE, G. Op. cit., 1994, p. 143.

A dificuldade se apresenta na medida em que, em se tratando de atividade intelectual, não se mostra razoável a substituição de um profissional por outro no curso de uma reportagem, por exemplo. E, assim, considerando que algumas coberturas são de longa duração, não raras são as ocasiões em que há o extrapolamento da carga horária legal.

Vê-se, pois, primeiramente, que a jornada especial fixada em lei aos profissionais radialistas e jornalistas não mais se justifica, na medida em que o avanço tecnológico permitiu a melhoria das suas condições de trabalho. 63 Ademais,

a realidade vivenciada nas redações de jornal, rádio e televisão permite concluir que o limitador fixado não é observado, uma vez que não é condizente com o níivel de informações e sua troca mundial, exigindo dos profissionais constante atenção à rotineira atualização. Assim, o ideal seria a ampliação da jornada legalmente fixada, respeitando-se os limites gerais estipulados na Constituição Federal.

Alternativamente, considerando a dinâmica destas profissões, dever-se-ia, ao menos, permitir-se a distribuição e flexibilização de limites horários mensais.

Somente mediante a adoção de novas normas regulamentadoras, que importem em aumento de carga horária, que digam com a flexibilização das jornadas de trabalho já existentes, será possível a aproximação do direito à realidade.

4.2.1 As peculiaridades da jornada especial de trabalho

De acordo com o anteriormente exposto, a jornada de trabalho normal dos jornalistas, nos moldes do artigo 303 da Consolidação das Leis do Trabalho, é de cinco horas, tanto para os exercentes de atividades diurnas como noturnas.

O artigo 18, da Lei 6.615/78, estabelece esta mesma carga horária diária para os profissionais radialistas que exerçam as funções constantes dos setores de autoria e locução. Trata-se de exceção à regra geral da categoria, cuja jornada de trabalho, em geral, é de seis horas.

63 TEIXEIRA, Sérgio Torres. O novo modelo de relação de emprego – repercussões das inovações tecnológicas sobre os elementos estruturais do vínculo empregatício. In: Revista LTr, São Paulo, v. 60, n. 10, p. 1309-1312, out. 1996 “...as novas tecnologias representam melhores condições de trabalho, por eliminarem ou reduzirem as tarefas mais cansativas, difíceis e perigosas, tornando o desempenho da atividade laboral menos árduo para o empregado. Em alguns casos, modificam o conjunto de atribuições deste último, tornando a função laboral essencialmente mais técnica e intelectual.”.

Deve-se esta exceção ao fato de que ao autor-roteirista, única atividade encontrada no setor de autoria, atribui-se determinada semelhança ao profissional jornalista, razão da igualdade de tratamento. Em relação aos locutores, o legislador, considerando à época de edição da indigitada lei, pretendeu evitar o desgaste físico, na medida em que imaginava fossem eles valer-se de sua voz, de maneira continuada ao longo de toda a jornada de trabalho, o que se sabe, não costuma ocorrer.

Para os profissionais atuantes nos setores de caracterização64 e cenografia65,

cujas funções não estão propriamente vinculadas ao radialismo, atribui, o legislador, a carga horária de sete horas diárias. Tem-se que nada mais absurdo, na medida em que profissionais exercentes destas mesmas funções, porém em outros setores, são alcançados pela regra geral da jornada de trabalho, qual seja, oito horas.

Diante do princípio maior de igualdade de tratamento entre os semelhantes, não há razões jurídicas plausíveis para que se sustente que, pelo simples fato de estarem vinculados a uma empresa de comunicação, gozem de jornadas de trabalho diferenciadas. Para os setores de administração66 e direção67 estabeleceu-se a

jornada de trabalho de oito horas.

Já se abordou anteriormente o distanciamento entre a realidade vivenciada pelos profissionais de comunicação e a jornada de trabalho fixada em lei, demonstrando-se a necessidade iminente de flexibilização ou até mesmo ampliação das cargas horárias que lhe são atribuídas.

Cumpre neste tópico evidenciar as especificidades e dificuldades práticas decorrentes da aplicação destas jornadas diferenciadas.

64 Cabeleireiro, camareiro, costureiro, guarda-roupeiro, figurinista e maquilador.

65 Aderecista, cenotéctico, decorador, cortineiro-estofador, carpinteiro, pintor, pintor artístico, maquinista, cenógrafo e maquetista.

66 Este setor é composto de uma única função, a de rádio e TV fiscal.

67 Diretor artístico ou de produção, diretor de programação, diretor esportivo, diretor musical, diretor de programas.

A jornada reduzida dos jornalistas aplica-se, inclusive, para os profissionais que prestam serviços para empresas não jornalísticas68 e para empresas que não

tenham por finalidade específica a radiodifusão de sons ou imagens. 69

Diferentemente dos demais trabalhadores, aos jornalistas, por força do artigo 308 do diploma consolidado, o intervalo entre jornadas de trabalho é de, no mínimo, 10 horas. Na ausência de previsão legal específica neste sentido, aos profissionais radialistas aplica-se o disposto no artigo 66 da Consolidação das Leis do Trabalho, pelo qual necessária a concessão de intervalo de 11 horas entre duas jornadas de trabalho.

A ambos profissionais, de acordo com o prelecionado no artigo 307 da Consolidação das Leis do Trabalho e com o artigo 20 da Lei 6615/78, é assegurada uma folga semanal remunerada. Neste aspecto, em relação aos jornalistas, a folga será necessariamente aos domingos, salvo norma coletiva que autorize em contrário. Já em relação aos radialistas, a legislação especial dá apenas preferência ao descanso em domingos, pelo que, considerando a permissividade às empresas de comunicação de trabalho em domingos e feriados, concedida pelo Decreto 27048/49 que aprova o regulamento da Lei 605/49, verifica-se comumente o labor nestes dias, mediante o gozo de folga em outro dia da semana ou o pagamento em dobro do salário dia.

Permitida está, em relação a ambos os profissionais, a pactuação de contratos de trabalho em tempo parcial, nos moldes do art. 58-A da Consolidação das Leis do Trabalho. Esta faculdade é exercida, no mais das vezes, nos casos de acúmulo de funções que exigem a presença de mais de um contrato de trabalho com o mesmo profissional. 70

68 JORNALISTA. JORNADA DE TRABALHO – Beneficia-se da jornada especial prevista em Lei o jornalista que trabalha editando publicações externas, para empresa que não explora atividade jornalística, mesmo sem fins comerciais, visto que o que interessa realmente é a função exercida pelo empregado. Faz jus, portanto, ao recebimento como extras das horas trabalhadas além da quinta diária. Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. Recurso Ordinário – processo n.º RO 12460/95 – 4ª Turma Rel. Ubiracy Martins Soares. DJMG 24.02.1996;

69 Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região. Processo n.º 00226.2003.037.12.00.2, Ac.-3ª T- n.º03704/2004. Recorrente: Tauber Comércio Importação e Exportação Ltda. Rel.: Gilmar Cavalheri. Florianópolis, 05 de abril de 2004.

70 DIFERENÇAS SALARIAIS. CONTRATAÇÕES DISTINTAS PARA CADA UMA DAS FUNÇÕES