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A “judicialização” da saúde

CAPÍTULO III A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, PRINCÍPIO

4.5 A “judicialização” da saúde

A “judicialização” da saúde, expressão usualmente adotada para designar o notório fenômeno caracterizado pela propositura de milhares de ações judiciais, em todo o País, por meio das quais os autores (pacientes), de modo individual ou coletivo, buscam assegurar o direito de acesso a medicamentos de alto custo empregados no tratamento de doenças raras e crônicas, além de outras doenças igualmente graves.

O volume extraordinário de ações judiciais está intrinsecamente associado ao fato da saúde ser reconhecida na Constituição Federal como um direito de todos (e direito de cada um) e à falta de políticas públicas que assegurem o direito de acesso universal e igualitário às ações e serviços de saúde, conforme determina o art. 196.

Todavia, antes de ser reconhecido como um direito fundamental (art. 6º), a saúde era vista como pretensão previdenciária e, portanto, estava apenas ao alcance das pessoas que contribuíam para com a Previdência e seus respectivos dependentes, o que significava a exclusão de um enorme contingente de pessoas.323

O enfoque das demandas judiciais está centrado, na sua quase totalidade, no pedido de fornecimento gratuito de medicamentos de alto custo destinados ao tratamento de doenças raras e crônicas. Como fundamentos para obtenção da ordem judicial, os pacientes invocam o direito à vida, do qual o direto à saúde é corolário, a dignidade da pessoa humana, o direito ao mínimo existencial.

Por sua vez, a argumentação dos entes públicos federativos (que integram o polo passivo das demandas) está circunscrita às alegações de (i) falta de competência para

      

323TORRONTEGUY, Marco Aurélio Antas. A saúde nas barras da Justiça: um estudo do posicionamento

recente do Supremo Tribunal Federal. Revista de Direito Sanitário, São Paulo v. 11, n. 2 p. 224-236, ju./out. 2010.

fornecer o medicamento solicitado; violação dos princípios (ii) da separação dos poderes - relativamente quanto à competência do Poder Executivo para elaborar políticas públicas; e (iii) da reserva do possível324 - não há recursos financeiros para atendimento de todas as necessidades que são sempre crescentes.

Nas ações judiciais relacionadas ao direito à saúde e que envolvem pedido de fornecimento de medicamentos de alto custo, o Poder Judiciário tem adotado o entendimento de que a responsabilidade dos entes públicos da federação quanto ao dever de fornecer medicamentos é solidária.325

E, no que concerne às alegações relativas à violação do princípio da separação dos poderes, as alegações são afastadas porque o Poder Judiciário já decidiu que o controle judicial das políticas públicas, na dimensão do constitucionalismo contemporâneo é legítimo e necessário.326 Também o argumento da reserva do possível tem sido afastado uma vez que escassez de recursos não pode ser invocada em face do direito fundamental à saúde:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL. PRÉ-QUESTIONAMENTO. INOVAÇÃO PARCIAL DA TESE DEFENSIVA. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ. OMISSÃO QUANTO PRONUNCIAMENTO SOBRE OS ARTS. 2º , 167 , 196 e 198 , §§ 1º , 2º e 3º DA CF E 244 DO CÓDIGO CIVIL . POSSIBILIDADE DE INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO NAS POLÍTICAS PÚBLICAS EM CASO DE OMISSÃO OU ABUSIVIDADE GOVERNAMENTAL. MODO DE CUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL QUE COMPETE AO OBRIGADO. FALTA DE DOTAÇÃO ORÇAMENTÁRIA. ÔNUS DA PROVA DO RÉU. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PARCIALMENTE CONHECIDOS E, NESSA PARTE, DESPROVIDOS. CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO DE ALTO CUSTO. PRELIMINAR DE CARÊNCIA DE AÇÃO. MÉRITO. OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. RESPONSABILIDADE QUE PODE SER EXIGIDA EM CONJUNTO OU ISOLADAMENTE. NECESSIDADE DE TRATAMENTO CONTINUADO, ESSENCIAL À MANUTENÇÃO DA VIDA. PESSOA SEM RECURSOS FINANCEIROS. DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE ORÇAMENTÁRIA E DA       

324A teoria da reserva do possível ou finitude dos recursos orçamentários foi objeto de análise no item

2.3.

325RESP 719716/SC, DJ 05/09/2005, Min. Relator Castro Meira. “É obrigação do Estado (União, Estados-

membros, Distrito Federal e Municípios) assegurar às pessoas desprovidas de recursos financeiros o acesso à medicação ou congênere necessário à cura, controle ou abrandamento de suas enfermidades, sobretudo as mais graves. Sendo o SUS composto pela União, Estados-membros e Municípios, é de reconhecer-se, em função da solidariedade, a legitimidade passiva de qualquer deles no pólo passivo da demanda.”

SEPARAÇÃO DOS PODERES. PREVALÊNCIA DO DIREITO À VIDA E À SAÚDE. OBRIGAÇÃO QUE SE IMPÕE AO ESTADO. PRECEDENTES. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO APELO. 327

Não obstante tenha o Poder Judiciário assentado o entendimento de que o fornecimento gratuito de medicamentos de alto custo destinado ao tratamento de doenças raras e crônicas representa uma forma de se conferir efetividade ao direito fundamental à saúde, é inegável que referidas decisões impactam as finanças públicas e, por consequência, afetam outros direitos que, por expressa determinação constitucional, o Estado tem o dever de assegurar.

O caso de um paciente portador de uma forma raríssima de anemia denominada

hemoglobinúria paroxística noturna (HPN)328 referido no presente estudo serve ao propósito de evidenciar o quanto as decisões judiciais que determinam o fornecimento de medicamentos de alto custo - não incluídos na lista oficial de medicamentos disponibilizados pelo SUS – podem afetar as finanças do Estado e as ações e serviços de saúde que poderiam ser prestados à população.

De acordo com a matéria, veiculada na Revista Época,329 o paciente obteve na Justiça o direito de receber o medicamento mais caro do mundo denominado Soliris, que ainda não é vendido no Brasil. Importado, vem em pequenos frascos e cada vidrinho de 30 mililitros e custa mais de R$ 11 mil. O dispêndio anual com o tratamento da doença pode ultrapassar o valor de R$ 800 mil reais e o custo será suportado exclusivamente pelo SUS: “A verba destinada à compra de um frasco de Soliris seria suficiente para garantir milhares de doses de anti-hipertensivos e de outros medicamentos baratos que atingem a maior parte

      

327Embargos de Declaração em Apelação Cível ED 35420000100 RN 2010.003542-0/0001.00 (TJ-RN) DOE

19.10.2010.

328HPN É uma anemia hemolítica crônica adquirida rara, de curso clínico extremamente variável. Ela é

causada por uma mutação das células tronco na medula óssea. Essas células-tronco mutantes produzem plaquetas defeituosas, que podem formar perigosos coágulos no organismo e glóbulos vermelhos defeituosos que se “quebram” facilmente. Isso ocorre porque esses glóbulos vermelhos não têm as proteínas protetoras necessárias para a sua sobrevivência. A HPN ocorre em 5 a 15 pessoas por milhão, e pode ocorrer em qualquer idade, mas a maioria dos pacientes recebe o diagnóstico entre a terceira e quarta década de vida. Tem uma alta mortalidade de 35% em 5 anos e de 50% em 10 anos. O QUE causa HPN? Disponível em: <http://www.abrale.org.br/pagina/hemoglobinuria-paroxistica-noturna-hpn>. Acesso em: 14 jan. 2014.

329Anexo V. O paciente de R$800 mil. Revista Época edição de 19/03/2012. (os destaques não são do

da população. Sem interrupções. É preciso reconhecer que priorizar o direito individual em detrimento do direito coletivo tem consequências sobre a saúde pública.”330

Comentando a matéria acima referida, Nilson Rodrigues Barbosa Filho331

Conforme reportagem da Revista Época (2012), este montante (aproximadamente R$ 800.000,00) é o que o Estado de São Paulo arca por ano com um único paciente, que judicialmente obteve o direito ao tratamento, após recusar o transplante de medula oferecido pela Secretaria de Saúde do Estado (que pode curar a doença) e que ao SUS custaria aproximadamente R$ 50.000,00.

Para que se tenha uma ideia do impacto orçamentário que a concessão de indiscriminada de medicamentos de alto custo pode causar, basta verificar a situação de 4 condenações judiciais para fornecimento de Soliris em Fortaleza. O cumprimento da determinação implicará no comprometimento de 67% do valor repassado pelo governo estadual para compra de medicamentos básicos do município inteiro, que conta com mais de um milhão de habitantes.

O atendimento de pleitos individuais como estes fazem com que o Brasil, país com precariedades gritantes em relação ao atendimento público de saúde, forneça, em detrimento de muitos, medicamentos de altíssimo custo para pouquíssimos, tratamentos estes que de modo geral não são fornecidos nem por países referência em saúde de qualidade, como Canadá, Estados Unidos, Inglaterra, Escócia, etc. Independente da legitimidade da intervenção judicial, o que não se pretende discutir neste tópico, é irrefutável que os valores despendidos com decisões judiciais são altos o suficiente para pôr em risco a fiel execução de políticas públicas previamente planejadas.

Compreende-se que nas decisões proferidas em caráter de urgência, em razão da gravidade do estado de saúde do paciente, o juiz não tenha tido tempo hábil para refletir sobre o impacto e as consequências de sua decisão nos recursos orçamentários.

Mas, ainda que se tratasse apenas de demanda individual, os efeitos de cada decisão judicial sobre a disponibilidade de recursos orçamentários devem ser avaliados, porquanto o entendimento de que o Estado pode suportar despesas tão elevadas sem comprometimento da prestação de outros serviços à população não se revela correto. Tanto assim que bastaria indagar: Poderia o Estado fornecer este mesmo tratamento a todas as pessoas em condições de igualdade?

      

330Anexo V. O paciente de R$800 mil. Revista Época edição de 19/03/2012.

331BARBOSA FILHO, Nilson Rodrigues. O Poder Judiciário e o direito à saúde. Parâmetros para intervenção

judicial e a análise da condição econômica do postulante como critério para concessão de tratamentos e medicamentos de alto custo. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3459, 20 dez. 2012. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/23288>. Acesso em: 14 jan. 2013.

O Supremo Tribunal Federal já se pronunciou a respeito da matéria por ocasião do julgamento do pedido de Suspensão de Segurança nº 3741/2009, do Município de Fortaleza proposta em face da liminar concedida pelo Tribunal de Justiça do Ceará determinando a compra de medicamento. Naquela oportunidade o então Relator, min. Gilmar Mendes, decidiu: 332

[...] O SUS consiste no conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público, incluídas as instituições públicas federais, estaduais e municipais de controle de qualidade, pesquisa e produção de insumos, medicamentos, inclusive de sangue e hemoderivados, e de equipamentos para saúde. (3) garantido mediante políticas sociais e econômicas: A garantia mediante políticas sociais e econômicas ressalva, justamente, a necessidade de formulação de políticas públicas que concretizem o direito à saúde através de escolhas alocativas. É incontestável que, além da necessidade de se distribuir recursos naturalmente escassos por meio de critérios distributivos, a própria evolução da medicina impõe um viés programático ao direito à saúde, pois sempre haverá uma nova descoberta, um novo exame, um novo prognóstico ou procedimento cirúrgico, uma nova doença ou a volta de uma doença supostamente erradicada. (4) políticas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos: Tais políticas visam à redução do risco de doença e outros agravos, de forma a evidenciar sua dimensão preventiva. [...]

Se a prestação de saúde pleiteada não for abrangida pelas políticas do SUS, é imprescindível distinguir se a não-prestação decorre de uma omissão legislativa ou administrativa, ou de uma decisão administrativa de não fornecer. Nesses casos, a ponderação dos princípios em conflito dará a resposta ao caso concreto. Importante, no entanto, que os critérios de justiça comutativa que orientam a decisão judicial sejam compatibilizados com os critérios das justiças distributiva e social que determinam a elaboração de políticas públicas. Em outras palavras, ao determinar o fornecimento de um serviço de saúde (internação hospitalar, cirurgia, medicamentos, etc.), o julgador precisa assegurar-se de que o Sistema de Saúde possui condições de arcar não só com as despesas da parte, mas também com as despesas de todos os outros cidadãos que se encontrem em situação idêntica. [...]

Analisando a judicialização da saúde, afirma Luis Roberto Barroso:333

      

332STF, SS 3741/CE, 2009 Rel. min. Gilmar Mendes.

333BARROSO, Luis Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática. Disponível em:

Nos últimos anos, no Brasil, a Constituição conquistou, verdadeiramente, forca normativa e efetividade. A jurisprudência acerca do direito a saúde e ao fornecimento de medicamentos e um exemplo emblemático do que se vem de afirmar. As normas constitucionais deixaram de ser percebidas como integrantes de um documento estritamente politico, mera convocação a atuação do Legislativo e do Executivo, e passaram a desfrutar de aplicabilidade direta e imediata por juizes e tribunais. Nesse ambiente, os direitos constitucionais em geral, e os direitos sociais em particular, converteram-se em direitos subjetivos em sentido pleno, comportando tutela judicial especifica. A intervenção do Poder Judiciário, mediante determinações a Administração Publica para que forneça gratuitamente medicamentos em uma variedade de hipóteses, procura realizar a promessa constitucional de prestação universalizada do serviço de saúde.

O sistema, no entanto, começa a apresentar sintomas graves de que pode morrer da cura, vitima do excesso de ambição, da falta de critérios e de voluntarismos diversos. Por um lado, proliferam decisões extravagantes ou emocionais, que condenam a Administração ao custeio de tratamentos irrazoáveis – seja porque inacessíveis, seja porque destituídos de essencialidade –, bem como de medicamentos experimentais ou de eficácia duvidosa, associados a terapias alternativas. Por outro lado, não ha um critério firme para a aferição de qual entidade estatal – União, Estados e Municipios – deve ser responsabilizada pela entrega de cada tipo de medicamento. Diante disso, os processos terminam por acarretar superposição

de esforços e de defesas, envolvendo diferentes entidades federativas e mobilizando grande quantidade de agentes públicos, ai incluídos procuradores e servidores administrativos. Desnecessário enfatizar que tudo isso representa gastos, imprevisibilidade e desfuncionalidade da prestação jurisdicional.

Tais excessos e inconsistências não são apenas problemáticos em si. Eles põem em risco a própria continuidade das politicas de saúde publica, desorganizando a atividade administrativa e impedindo a alocação racional dos escassos recursos públicos. No limite, o casuismo da jurisprudência brasileira pode impedir que politicas coletivas, dirigidas a promoção da saúde publica, sejam devidamente implementadas. Trata-se de hipótese típica em que o excesso de

Judicialização das decisões politicas pode levar a não realização pratica da Constituição Federal. Em muitos casos, o que se revela e a concessão de privilégios a alguns jurisdicionados em detrimento da generalidade da cidadania, que continua dependente das politicas universalistas implementadas pelo Poder Executivo.

O estudo que se segue procura desenvolver uma reflexão teórica e pratica acerca de um tema repleto de complexidades e sutilezas. Seu maior proposito e contribuir para a racionalização do problema, com a elaboração de critérios e parâmetros que justifiquem e legitimem a atuação judicial no campo particular das politicas de distribuição de medicamentos. O Judiciário não pode ser menos do que deve ser, deixando de tutelar direitos fundamentais que podem ser promovidos com a sua atuação. De outra parte, não deve querer ser mais do que pode ser, presumindo demais de si mesmo e, a pretexto de promover os direitos fundamentais de uns, causar grave lesão a direitos da mesma natureza de

outros tantos. Na frase inspirada de Gilberto Amado, “querer ser mais do que se é, é ser menos”.

Aqui se chega ao ponto crucial do debate. Alguém poderia supor, a um primeiro lance de vista, que se esta diante de uma colisão de valores ou de interesses que contrapõe, de um lado, o direito a vida e a saúde e, de outro, a separação de Poderes, os princípios orçamentários e a reserva do possível. A realidade, contudo, e mais dramática. O que esta em jogo, na complexa ponderação aqui analisada, e o direito a vida e a saúde de uns versus o direito a vida e a saúde de outros.

A determinação judicial aos entes públicos da federação para fornecimento de medicamentos de alto custo - não disponibilizado pelo SUS - além de impactar os recursos orçamentários em detrimento da sociedade como um todo, acentua a desigualdade privilegiando o direito á vida de uns em detrimento do direito à vida de outros!

A relevância dos assuntos afetos à área da saúde e o impacto que a grande demanda judicial relacionada ao fornecimento de medicamentos de alto custo, foram determinantes para que o então Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Gilmar Mendes, convocasse uma Audiência Pública,334 com a participação de 50 especialistas entre

advogados, defensores públicos, promotores e procuradores de justiça, magistrados, professores, médicos, técnicos de saúde, gestores e usuários do Sistema Único de Saúde. Ao final da referida Audiência Pública foram apresentadas as seguintes conclusões:

Após ouvir os depoimentos prestados pelos representantes dos diversos setores envolvidos, ficou constatada a necessidade de se redimensionar a questão da judicialização do direito à saúde no Brasil;

Ao menos o ‘mínimo existencial’ de cada um dos direitos - exigência lógica do princípio da dignidade da pessoa humana - não poderia deixar de ser objeto de apreciação judicial;

Existência de motivação para o não fornecimento de determinado remédio ou tratamento pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Nessa hipótese podem ocorrer duas situações: 1º) o SUS fornece tratamento alternativo, mas não adequado a determinado paciente; 2º) o SUS não tem tratamento específico para determinada patologia.

Se o Sistema Único de Saúde (SUS) fornece tratamento equivalente, não pode o paciente pleitear tratamento diverso, com custo superior. A regra, pois, é pela preferência ao tratamento oferecido pelo sistema.

Quanto aos novos tratamentos (ainda não incorporados pelo SUS), é preciso que se tenha cuidado redobrado na apreciação da matéria Como       

334SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Audiência Pública n. 4/2009. Ministro Gilmar Mendes Disponível

em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=113461>. Acesso em: 12 jan. 2014.

frisado pelos especialistas ouvidos na Audiência Pública, o conhecimento médico não é estanque, sua evolução é muito rápida e dificilmente suscetível de acompanhamento pela burocracia administrativa ser imprescindível, relativamente aos tratamentos não oferecidos pela rede pública, verificar se não se trata de puro experimentalismo.

A participação nesses tratamentos rege-se pelas normas que regulam a pesquisa médica e, portanto, o Estado não pode ser condenado a fornecê- los;

A omissão administrativa no tratamento de determinada patologia, tal questão poderá ser objeto de impugnação judicial, tanto por ações individuais como coletivas;

A simples alegação de que determinado tratamento ou medicamento tem alto custo não é suficiente para impedir o seu fornecimento pelo poder público.

Comentando os resultados da Audiência Pública nº 4, observam Gustavo Henrique Moreira do Valle e João Marcos Pires Camargo:335

Por sua vez, o segundo condicionamento, ainda referente ao interesse de agir do postulante, diz, em nosso juízo, com seu estado de hipossuficiência, não sendo admissível, pelo menos em linha de princípio e enquanto perdurar o quadro de limitações financeiras do Estado brasileiro, que pessoas abastadas,

que tenham condições de, sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família, custear as ações e serviços de saúde que necessitem, lancem mão de recursos públicos, em detrimento de pessoas carentes e igualmente necessitadas desses serviços. Cuida-se, aqui, de conciliar o princípio da universalidade com o da isonomia, para desigualar os desiguais, na medida de suas desigualdades, sendo o critério desigualador, aqui, exatamente a hipossuficiência daqueles que necessitam das ações e serviços de saúde.

Estes são os parâmetros que devem ser observados nas decisões judiciais relacionadas à efetivação do direito à saúde, em especial, as que determinam aos entes públicos da federação o fornecimento de medicamento de alto custo porque também com relação a este aspecto, deve-se atentar para o direito de acesso universal (todos têm direito) e igualitário (o direito de cada um em condições de igualdade formal e material).

      

335VALLE, Gustavo Henrique Moreira do; CAMARGO, João Marcos Pires. A audiência pública sobre a

judicialização da saúde e seus reflexos na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Revista de Direito Sanitário, São Paulo, v. 11, n. 3 p. 13-31, nov. 2010; Fev. 2011. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/rdisan/article/view/13220>. Acesso em: 08 jan. 2014.

A hipossuficiência do paciente é um dos critérios adotados pelo Supremo Tribunal Federal para determinar o fornecimento gratuito de medicamentos:336

PACIENTES COM ESQUIZOFRENIA PARANÓIDE E DOENÇA MANÍACODEPRESSIVA CRÔNICA, COM EPISÓDIOS DE TENTATIVA DE SUICÍDIO - PESSOAS DESTITUÍDAS DE RECURSOS FINANCEIROS - DIREITO À VIDA E À SAÚDE -