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1.1. Da colônia ao Estado nacional: violências, resistências, heranças

1.1.4. A Khululeko: entre a independência e a dependência

[Verbo zulo que, ao pé da letra, significa paz. É também usado em situações tensas para sugerir relaxamento, descanso, calma]

[...] é aparente para mim que a desalienação efetiva do negro vincula-se ao reconhecimento imediato das realidades sociais e econômicas. Se existe um complexo de inferioridade, ele é resultado de um processo duplo: primeiramente, econômico; subsequentemente, a internalização, ou melhor, a epidermalização dessa inferioridade.

Franz Fanon

Conforme relatado, entre os inícios das décadas de 60 e 90 do século passado, a história de Moçambique foi marcada por uma permanente realidade de conflito armado: de 1964 a 1974, a luta pela independência colonial conduzida pela Frelimo e, conquistada a independência, a partir de 1976 até 1992, foi desencadeada uma devastadora guerra civil opondo o exercito governamental da Frelimo e a Renamo. Portanto, mesmo com a independência colonial, devido à guerra, o projeto socialista da Frelimo não teve a menor chance de lograr resultados positivos e o país se viu mergulhado em uma crise generalizada, da qual, finalmente, ambas as partes

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vislumbraram possibilidades de superá-la a partir do diálogo, abandonando assim trincheiras: deste modo, em 4 de outubro de 1992, as partes outrora beligerantes assinaram em Roma, capital italiana, o Acordo Geral de Paz (AGP) e, oficialmente, a República Popular de Moçambique passou a simplesmente República de Moçambique.

É preciso observar que, na prática, este acordo consagrou medidas oficializadas dois anos antes pela nova Constituição da República: o governo da Frelimo, que, entretanto, já havia abandonado o marxismo-leninismo, vinha preconizando mudanças internas que visavam acelerar um processo de liberalização econômica e política do país. Por sua vez, estas ações constituíam os pressupostos básicos para que o “grito de socorro” emitido à comunidade internacional fosse atendido. Concretamente, com a Constituição de 1990, foram oficializadas, entre outros pontos, o multipartidarismo, as liberdades democráticas fundamentais e a economia de mercado, principais exigências do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional, entidades as quais Moçambique ratificou seus primeiros acordos em 1987%, o que mergulharia o país em um estado permanente e generalizado de dependência multidimensional, estrutural e dinâmica da ajuda externa&.

Importa referir também que as exigências dessas entidades monetárias respondiam igualmente aos anseios políticos historicamente reivindicados pela Renamo. Em diversas negociações anteriores, ainda na década de 1980, a Renamo havia se recusado a reconhecer o sistema monopartidário em troca da simples anistia política e da integração social e econômica de seus membros. Esta posição da Renamo foi permanentemente informada pela imprensa oficial moçambicana com sendo uma demonstração objetiva da falta de “vontade política” da Renamo em resolver o conflito e, desse modo, causar entre moçambicanas e moçambicanos, o sentimento de descrença e antipatia a este grupo. Lembre-se, foi também neste período que o acordo de Nkomati

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Em 1987, um acordo de Moçambique com o Banco Mundial introduziu um programa de ajustamento estrutural rigoroso que conduziu o país para uma economia de mercado. Com a ajuda da comunidade internacional, um importante programa social e de reabilitação de infraestruturas iniciou e, em paralelo, começou o reparo do tecido social destroçado pela guerra.

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Para o economista moçambicano Carlos Nuno Castel-Branco, “a dependência de ajuda externa é multidimensional quando afeta a cultura institucional, o pensamento, as políticas e as opções dos sistemas de governação, bem como as interações entre os agentes, as opções de políticas públicas, o financiamento dessas políticas, etc. Assim, o caráter multidimensional de dependência de ajuda externa significa que a dependência vai para além dos recursos financeiros básicos (financiamento de défice público, da balança de pagamentos e de investimentos na economia) e das capacidades básicas (técnicas, de gestão, de informação e monitoria, de desenvolvimento e análise de política) para incluir muitos outros aspetos da vida. A dependência de ajuda é estrutural quando as funções básicas do Estado, da economia e da sociedade são dependentes da ajuda externa. Finalmente, a dependência da ajuda é dinâmica quando o padrão de desenvolvimento que é multidimensional e estruturalmente dependente da ajuda gera novas e mais profundas dependências de ajuda, ao invés de as reduzir” (CASTEL-BRANCO, 2011, p. 402). Doravante, neste trabalho, para simplificar, o conceito de “dependência multidimensional, estrutural e dinâmica da ajuda” vou me referir a donativos e créditos internacionais, bilaterais ou multilaterais destinados ao desenvolvimento econômico e social, sejam estes meios canalizados por via de ajuda geral ao orçamento do Estado, a programas de desenvolvimento do governo ou canalizados por meio de projetos individuais empresariais ora como dependência de ajuda externa, dependência de ajuda internacional, dependência de ajuda ou, simplesmente, ajuda, salvo se especificado de outro modo.!

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foi assinado. Em suma, claramente, mais do que uma negociação com a Renamo – institucionalizando liberdades políticas por meio do reconhecimento da democracia em Moçambique – a Frelimo estava mais interessada em proporcionar ao país – e à região – um clima de estabilidade política, tornando-o hábil para recepção de ajuda financeira, humanitária e, principalmente, de investimentos comerciais internacionais. Com efeito, desde a assinatura do AGP até o momento, foram realizados quatro processos eleitorais para a escolha do presidente da República, todas vencidas pela Frelimo; quatro escrutínios para os 250 assentos na Assembleia da República; três voltas eleitorais para os Conselhos e para os presidentes dos Conselhos Municipais.

Além disso, a curva dos números da economia teve uma reversão radical positiva. Baseados, principalmente nas taxas do Produto Interno Bruto (PIB), que nos últimos 10 anos cresceram entre 6% a 14% e na aparente estabilidade política, a imprensa e entidades internacionais, têm apontado Moçambique como “um exemplo de sucesso na África”. Localmente, esse tipo de discurso ganha ressonância entre as elites econômica e política. Entretanto, diante desta euforia, há que ser mais cauteloso e buscar olhar para esses números levando em consideração que

[...] Deve-se compreender de antemão que é precisamente pela magnitude das carências sofridas por Moçambique que alguns resultados de estratégias políticas e progressos sociais despontam tão nitidamente nos seus indicadores. Um exemplo genérico que pode esclarecer esse fenômeno, no campo econômico da produção nacional, é que um pequeno investimento pontual tem ali a capacidade de alterar o Produto Interno Bruto (PIB) do país (CACCIA-BAVA & THOMAZ, 2001, p. 22).

Obviamente, não se trata de simplesmente ignorar ou negar as vantagens que a paz, as reformas políticas, e a ajuda externa trouxeram para a transformação e o crescimento da economia moçambicana. Trata-se, isso sim, de colocar, como bem fizeram Caccia-Bava & Thomaz (2001), a necessidade de considerar que taxas de crescimento de 5%, 10% e 14% em países de rendimento médio e elevado são extraordinárias, mas que o mesmo não se aplica em economias que praticamente emergem da letargia, como é o caso moçambicano. Sem pretender fazer aqui uma revisão exaustiva da literatura sobre o otimismo pouco fundamentado com que a economia moçambicana tem sido apreciada, vale a colocação de um dado comparativo entre Moçambique e Botswana, outro país da região austral da África. A comparação consta de uma pesquisa desenvolvida em 2003 pelo Centro de Estudos da População da

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Universidade Eduardo Mondlane, com o objetivo de avaliar o potencial de um eventual retorno ao conflito armado em Moçambique. O estudo alerta que

Desde 1966, ano da independência do Botswana, o PIB deste país cresceu a uma taxa média de 5% a 7%; isto durante cerca de quatro décadas e, não apenas, de forma errática, em meia dúzia de anos. Por isso Botswana viu o seu PIB per capita crescer de US$80, na altura da sua independência, para aproximadamente US$4000 em 2000; ou seja, uma melhoria do padrão de vida em cerca de 50 vezes ao longo de quatro décadas. Atualmente, o Botswana, com uma população do tamanho da população das cidades de Maputo e Matola produz 1,5 vezes mais do que Moçambique e 5 vezes mais do que aquelas duas cidades juntas. Em contrapartida, três décadas depois da independência, Moçambique tem ainda uma renda per capita inferior a que tinha antes de 1975 [quando conquistou a independência]. (BRITO, FRANCISCO, PEREIRA & ROSÁRIO, 2003, p. 45).

É verdade que a diferença dos números reclamam análises mais aprofundadas e particulares, já que, em Botswana, houve um processo “pacífico” de independência e, no período subsequente não passou pelos infortúnios que moçambicanas e moçambicanos provaram. Fato é que, já no período que sucedeu a guerra civil moçambicana, mas ainda no contexto de dependência externa, o país registrou progressos e, entre 2001 e 2008, o Produto Interno Bruto variou de 6,8 % para 13,1 % (WORLD BANK, 2008). No entanto, esse crescimento econômico parece ter influência mínima localmente, visto que a economia continua com problemas estruturais e não

responde a lógica anunciada de combate à pobreza absoluta'. Entre 2000 e 2006, 90%

da população moçambicana, cerca de 19 milhões de pessoas, ainda viviam com menos de dois dólares por dia (PNUD, 2008). No campo político, se o AGP proporcionou a pacificação da sociedade, sendo este um êxito inegável, os processos democráticos de inclusão e da participação política, que deveriam dar sequência ao acordo, ficaram muito aquém do que se espera de um regime verdadeiramente democrático.

Os dispositivos de inclusão e controle que eram as várias comissões reunindo os representantes do governo e da Renamo em conjunto com elementos das Nações Unidas, não tinham nenhuma forma de continuidade para além do momento eleitoral e em nenhum ponto [do acordo] estavam previstas formas de partilha do poder. Neste processo, os dispositivos de participação da Renamo no controle de setores essenciais da vida do país, como por exemplo, a polícia e restantes forças de defesa e segurança, simplesmente desapareceram, remetendo este partido a uma situação de efetiva !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

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Em 2001, o governo moçambicano lançou o Programa de Ação Para a Redução da Pobreza Absoluta (Parpa 2001-2005). O foco das ações priorizava o desenvolvimento do capital humano na educação e saúde, a melhoria na governação, o melhoramento das infraestruturas básicas e da agricultura, do meio rural. Este plano foi relançado em 2006, para o período entre 2006 e 2009 e, posteriormente, em 2010, para o período entre 2010 e 2014.!

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marginalização em relação ao poder (BRITO, FRANCISCO, PEREIRA & ROSÁRIO, 2003, p. 19).

Deste modo, quer nacional como internacionalmente, diversas entidades do terceiro setor, imprensa e políticos, além de estudos conduzidos por pesquisadores como Chichava (2003), Forquilha & Orre (2011) e Castel-Branco (2011) vêm alertando sobre desvios – ou falhas – fundamentais na construção do processo democrático e os perigos que daí poderiam advir.

Nos anos mais recentes, a desconfiança tem conhecido um recrudescimento notável e preocupante, as assimetrias de desenvolvimento não cessaram de se agravar, as linhas de fractura históricas começaram de novo a dar sinais de reactivação e a violência pode desencadear a qualquer momento (BRITO, FRANCISCO, PEREIRA & ROSÁRIO, 2003, p. 3).

Estudos e análises políticas de Brito et. al (2003), Chichava (2003) e Castel- Branco (2011) apontam que um provável retorno ao conflito armado em Moçambique seria resultado de fatores ligados a causas estruturais como a persistência – já no regime democrático – do caráter centralizador do Partido/Estado e da quase exclusividade do acesso aos recursos econômicos e de poder pela “elite do Sul”. Há também fatores que dizem respeito à governabilidade. Aqui, o estudo da Universidade Eduardo Mondlane aponta um fraco desempenho do governo em áreas sensíveis como saúde e educação e, por outro lado, indica que “o sistema político moçambicano é claramente bipartidário”, que “os pequenos partidos políticos não têm capacidade para influenciar a vida política nacional”, que as organizações da sociedade civil têm atuação fraca e que, em geral, “são próximas do partido no poder”.

Outro dado apontado se refere à vulnerabilidade da paz moçambicana. Estima-se que, apesar do processo de desmobilização dos ex-guerrilheiros da Renamo e sua integração nas Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM) ter sido “bem sucedido” – entenda-se, no sentido de eliminar possibilidades imediatas de ex- combatentes se rearmarem, já que não foi garantida e reintegração social e econômica total dos ex-guerrilheiros – e da relativa estabilidade social e política demonstrada, “assiste-se desde 1999 a uma tendência para o agravamento dos conflitos políticos” (BRITO, FRANCISCO, PEREIRA & ROSÁRIO, 2003, p. 3-5).

O que se observa é que, de fato, a condição de dependente de ajuda externa do país – e com isso, a necessidade de atender pronta e positivamente a uma agenda e

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metas impostas pelos doadores internacionais – camuflou, em Moçambique, uma democracia para o inglês ver e que, na prática, não responde às reais demandas políticas locais conforme relatei acima. Uma discussão em torno dessa questão deve fazer alusões e questionamentos à “importação” da democracia moçambicana e à sua real aplicabilidade e resultados. Não há dúvidas, a democracia continua sendo o melhor regime político vivenciado pelo país, entretanto, é necessário – fundamental até – que esse ambiente político suscite uma forte e intensa corrente de pensamentos, discursos e práticas que visem sua apropriação, ou seja, uma corrente que vislumbre a conquista de um processo de construção de uma democracia moçambicana autônoma e cada vez mais participativa. Afinal, Moçambique – e, salvo raras exceções, todos os países da África – estabeleceu sua dinâmica política a partir do modelo de democracia representativa ocidental imposta por Estados e agências de fomento igualmente ocidentais em troca de ajuda internacional para o desenvolvimento. Os interesses destes, se lidos de forma objetiva, se circunscrevem dentro da lógica do imperialismo capitalista e, por isso, colaboram politicamente com Moçambique para garantir que, dentro do contexto da luta contra a pobreza no continente, a ajuda financeira por eles oferecida possibilite um ambiente favorável às suas pretensões neoliberais.

Ocorre que na visão de Ngoenha (2011) – e, particularmente, partilho dela – a democracia moçambicana é, em certa medida, ilegítima, na medida em que, por exemplo, ao comparecerem massivamente às urnas nas primeiras eleições presidenciais moçambicanas realizadas em 1994, mais do que legitimar as novas forças políticas ou uma nova forma de governo, os moçambicanos se manifestaram pela vontade de dar fim à guerra civil que já se estendia por longos 16 anos. “Com efeito, ninguém pode legitimar o que não conhece, e nenhuma legitimidade é possível se ela não parte e não se alimenta do substrato mental, cultural e filosófico do povo que deve supostamente governar e representar”. Por outro lado, as estatísticas dos primeiros anos da década de 1990 indicavam que “mais de noventa por cento de cidadãos moçambicanos não possuem os apetrechos intelectuais necessários para participarem e, por conseguinte, legitimarem uma democracia, cujos paradigmas respondem a pressupostos culturais e históricos ocidentais” (NGOENHA, 2011, p. 22-23).

Ao se referir à pretensa homogeneidade democrática mundial, Hobsbawn (2007) observa que a política é o principal campo da atividade humana que praticamente não foi afetado pela globalização, corroborando assim com o posicionamento de Ngoenha (2011) quando este se refere à legitimidade da democracia em Moçambique.

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A difusão de valores e de instituições através da sua súbita imposição por uma força estranha é tarefa quase impossível, a menos que já estejam presentes no local condições que as tornem adaptáveis e sua introdução, aceitável. A democracia, os valores ocidentais e os direitos humanos não são como produtos tecnológicos de importação, cujos benefícios são óbvios desde o início e que são adotados de uma mesma maneira por todos que têm condições de usa-los, como uma pacífica bicicleta ou um mortífero AK 47, ou serviços técnicos, como os aeroportos. Se fosse, haveria maior similaridade política entre os numerosos Estados da Europa, da Ásia e da África, todos vivendo (teoricamente) sob a égide de construções democráticas similares (HOBSBAWN, 2007, p. 18-19).

Deste modo, é imprescindível questionar a legitimidade e, portanto, a eficácia da implantação da ordem democrática representativa em Moçambique diante das incontestáveis diferenças entre as trajetórias sócio-históricas em relação ao lugar onde ela foi criada. Acredito também que a realidade democrática, ao romper de forma abrupta com o regime socialista e totalitário, esconde, na perspectiva histórica resquícios ou elementos culturais próprios de processos de transição que foram atropelados pela urgente necessidade de ajuda econômica do ocidente. Por isso mesmo, como afirma Ngoenha (1988), após a independência, nós os moçambicanos vivemos uma época de paradoxos. Argumenta que, como hoje, nunca se falou tanto em identidade moçambicana, mas ao mesmo tempo, nunca, desde a proclamação da independência, tal identidade esteve tão ameaçada como hoje.

Do exterior, pela limitação da soberania que comporta a internacionalização das trocas e a inter-dependência das economias; do interior, pela ideologia produtivista que exalta o indivíduo e os seus interesses, mas ignora os cidadãos e os seus ideiais [...] O intervencionismo da comunidade internacional parece meter em causa a própria ideia da soberania. Mas, a evolução interna da nossa recente democracia, onde a vida coletiva parece concentra-se sobre a acumulação de riquezas e de micro-nacionalismos exasperantes, tende a minar a ideia política e moral, que está na origem da moçambicanidade. (NGOENHA, 1988, p, 19).

Neste sentido, percebo que, pelo menos de imediato, nada assegura que a moçambicanidade terá, no futuro próximo, a capacidade de subsidiar as relações sociais equânimes entre os diferentes grupos étnico e sociais em Moçambique. Como bem disse Fanon (2010), a descolonização é simplesmente a substituição de uma “espécie” de homens por outra “espécie” de homens. Sugere então que, o que se quer nesse processo transcende a mera substituição, ou seja, quer-se a “transição”. “Sem transição, há substituição total, completa, absoluta” (FANON, 2010, p. 51). Assim, o Partido/Estado moçambicano repete a ação repressora para o controle das massas, mas “não para ter

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certeza que elas realmente participam dos negócios da nação, mas para lhes lembrar constantemente que o poder espera delas obediência e disciplina” (FANON, 2010, p. 210).

De fato, na contemporaneidade da vida cotidiana moçambicana, há manifestações – explícitas ou não, conscientes ou não – que, cada vez mais, procuram dar vasão às demandas próprias dos micronacionalismos e, estas, aos trancos e barrancos, ganham crescente visibilidade dentro do campo político e das diferentes facetas do campo social. As dificuldades a este processo são impostas, em grande parte, pela lógica dominante do capitalismo neoliberal que uniformiza, superficializa e despreza dizeres, saberes, percepções e ações subjetivas, concretizando em Moçambique o que é comumente chamado de colonialismo de retorno ou neocolonialismo. Assim, a soberania do Estado moçambicano e as consequentes liberdades econômicas e políticas são fundamentais para que moçambicanas e moçambicanos encontrem canais e formas de mobilização que, além de questionar a legitimidade do atual discurso democrático no país, encontrem e proponham estratégias eficazes de mobilização para um processo conjunto de construção de uma nação pós-colonial que, desta vez, sabidamente, aposta no modelo democrático próprio para a gerência da vida coletiva.

1.2. Corrupção em Moçambique: legislação, políticas públicas e ações de