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4 SBE como Estruturação

4.3 A lógica fantasmática do SBE da RMR

Como apontam Glynos e Howarth (2007), a lógica fantasmática está intimamente ligada à dimensão ideológica das práticas sociais. Vale salientar que os autores da teoria do discurso postulam uma noção de ideologia diferente da althusseriana, de uma “falsa consciência” que encobre a essência da dominação e cuja origem está nas relações de produção. De acordo com Howarth (2000), tal pensamento, oriundo da teoria da ideologia de Marx e Engels, tem sido criticado pelo seu reducionismo, ao afirmar que a ideologia mistifica e engana as pessoas

sobre seus verdadeiros interesses, e também pelo determinismo, no sentido de posicionar as lutas sociais apenas sob a perspectiva econômica (MOUFFE, 1996).

De acordo com a teoria do discurso, a ideologia opera como uma fantasia para preencher o vazio que permeia as práticas sociais, decorrente da falta constitutiva de um sujeito incompleto. Esta fantasia é “uma vã tentativa de impor um fechamento a um mundo social cuja característica essencial é a articulação infinita das diferenças e da impossibilidade de qualquer fixação última de sentido” (BARRET, 1996, p.158). Tal abertura, como afirma Orlandi (2002), é uma condição da linguagem, pois tanto o sujeito como a significação se constituem sob relações e em condições determinadas pela linguagem. A lógica fantasmática tem por base as fantasias a partir das quais sujeitos incompletos realizam tanto os movimentos que sustentam e perpetuam as práticas de fixação, como aqueles que engajam os agentes em direção a novos projetos (GLYNOS, 2001; GLYNOS; HOWARTH, 2007).

Além disso, a lógica fantasmática atua para ocultar a dimensão política e a contingência das relações sociais, por meio de uma narrativa que promete plenitude e superação de obstáculos. Desse modo, a lógica fantasmática possui um papel ativo no processo de construção das cadeias de equivalência por ser um principio (ilusório) a partir do qual os indivíduos constroem uma unidade oriunda de uma multiplicidade de posições.

Como vimos, os SBEs integram o discurso da tecnologia nos sistema de transportes, assim, consideramos que a lógica fantasmática do SBE da RMR relaciona-se aos domínios daquele discurso: suas fantasias estão relacionadas à bilhetagem como potência (AGAMBEN, 2006), ao lhe conferirem possibilidades de modo essencialista, sem considerar os contextos em que ocorrem e os agentes que o configuram.Pela fantasia da potência, os sistemas de bilhetagem carregam em si uma gama de possibilidades em termos de extensão de funcionalidades relacionadas ao controle, à velocidade e à inteligência em suas operações. As impossibilidades diante dos limites impostos pela articulação dos agentes relevantes e seus interesses nos variados contextos são condições encobertas por esta fantasia da potência.

A parametrização do uso é você quem define na hora que for comprar. Eu quero comprar idoso, com oito usos com foto com tais informações no cartão, você diz tudo o que quer ao fornecedor de tecnologia e ele já lhe entrega com esses produtos prontos e você só vai cadastrar e imprimir. (E5: 117-20).

Eu já disse mil vezes e todo mundo lá já sabe que você pode fazer a integração com a linha que você quiser, ao tempo que você quiser aonde você quiser basta as linhas se cruzarem em algum lugar. (E5: 149-52). Controle automático dos veículos, você saber onde está a localização deles, o tempo de viagem. Então todos esses sistemas embarcados aí é outro grande

desafio que é da minha área também né e isso para mim é muito motivador, isso vai dar uma qualidade melhor ao transporte né?! (E1: 367-70).

Fazer contagem de passageiros embarcados e dar um conforto ao saber que a próxima parada há um aviso por voz, há um aviso por imagem né, então quem tem deficiências auditivas e visuais teria essa vantagem né?! Aí isso é tudo coisas que poucas cidades já conseguiram fazer, mas que a gente quer fazer até pelo menos para a copa né, para estar com um sistema mais moderno (E1: 375-79).

Possibilidade de produzir dados sobre as operações do sistema de transporte contribui para a produção da fantasia do controle, relacionada com o entendimento de que a bilhetagem torna tudo transparente, passível de checagem e de fiscalização.

Os relatórios são bem completos, servindo até de elemento comprobatório contra alguma coisa, alguma infração cometida, algum ato de infração que a gente receba por ventura e pra gente tentar responder, pra gente fazer uma defesa daquilo ali a gente tem nele um elemento seguro, uma ação segura e aceita pelo órgão gestor como uma fonte segura de informação...(E7: 157- 61).

Atende!‟, sem ir muito a fundo, só dizendo... criou-se um questionário e ele tinha que provar, seguindo aquele questionário, que atendia. Ele podia ter até 3% de não-atendimento, que foi o que aconteceu, mas o cara falou que podia ajustar... e ajustou, ajustou.

Na minha cabeça o sistema atende porque eu já vi funcionando em Jaboatão, mesmo que seja de forma teste, mas atende. Ajustes a gente vai precisar fazer, que toda ferramenta precisa ser ajustada. (E2: 545-51).

Vamos dizer que você use 6 linhas diferentes, a gente tem como saber, que você usa 6 linhas diferentes durante o dia e aí a gente pode, em cima daquilo ali planejar uma forma... de que algumas linhas que você use você passe a diminuir a quantidade de linhas que você venha a utilizar. Isso é questão de futuro. (E2: 819-22).

Possibilidade de produzir inteligência associa-se aos significados da bilhetagem relacionados a sua capacidade de produzir informações relevantes sobre os transportes a partir dos registros coletados com os cartões da bilhetagem, e com estas informações empreender as chamadas soluções inteligentes para os difíceis problemas da área. Esta fantasia encobre lacunas relacionadas à qualidade dos dados, ao direcionamento da coleta que leva também ao direcionamento das soluções possíveis.

E subproduto dessa operação [de produzir e resgatar créditos] é a informação. Dentro dessa operação tem toda a informação, só não diz onde o cara pega o ônibus, diz o sentido, a hora, só não diz o lugar. (E5: 666-670) [...] o sistema nosso aqui de Pernambuco passou a ser referência nacional também como uma região metropolitana que consegue colocar tudo numa bilhetagem eletrônica, num é? O sistema integrado, né? Que está tentando evoluir mais ainda para o sistema integrado, o sistema inteligente né? (E6: 68-71).

Entendeu? Ele pode usar aqui o validador da Digicom, ele pode usar aqui o validador da Pró-data, aceitando as informações da Urbana, que são os empresários, aceitando da gerência de TI, que somos nós, aceitando do Metrô, e esse outro aí ele negocia pro que ele quiser [se referindo ao quarto slot do equipamento]. O equipamento é bem inteligente. E a tendência é evoluir cada vez mais. (E2: 279-84).

Veja se a gente tivesse um controle eficiente assim, tipo quando a pessoa passa lá o cartão estudante você sabe aquele cartão estudante está naquela linha ali né, então você podia usar esse sistema para entender o deslocamento por tipo de cartão né, assim tem um grande deslocamento de estudantes que vão para aqui a parte do... A Praça Treze de Maio que ali tem várias escolas por ali naquela redondeza né?! (E1: 78-72).

A possibilidade de velocidade se associa à percepção de que os sistemas de bilhetagem podem conferir mais e mais rapidez aos processos e às operações relacionadas à arrecadação tarifária do sistema de transporte urbano. A automação das fases manuais trouxe uma aceleração que parece generalizada, contudo, o resultado final da diminuição do tempo de viagem ainda não foi percebido.

Porque há uma reciprocidade de interesses, nós temos o interesse de que seja implantado, por exemplo, a integração com o metrô aqui, não só porque vai diminuir a passagem, vai diminuir o tempo para a população. (E10: 117-20). Porque fica tudo transparente, num é? Vamos dizer assim... e rápido. (E6: 98).

Vai inaugurar Tancredo que vai tirar várias linhas que vinham do IPSEP e adjacências e até de Boa Viagem, como vem Tancredo, o metrô vai trazer pra cá e daqui distribui. A ideia é tirar o máximo de ônibus da rua pra ter uma mobilidade melhor pro usuário e mais conforto. (E2: 658-61).

Uma integração aqui serve para ele vir para cá e para lá. Otimizei, porque eu reduzi este custo e este curso e melhorei a fluidez do centro quando diminui a quantidade de viagens. Ai eu vi que num total de 100, 40% faziam um percurso de cá para cá e só 60% para então não precisava mandar uns pra aqui, vários pra cá alguns para universidade outros pro centro. Então eu dou ganho de mobilidade para a população e também otimizo o serviço feito. (E15: 124-29).