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1.1 SBEs, sistemas de transporte e mobilidade urbana

Hipótese 2: Os SBEs são sistemas discursivos que, ao constituem as mobilidades pessoais de

3 Caminhos trilhados

3.4 Procedimentos na pesquisa dos trajetos

Para construir nossa argumentação de que os SBEs são sistemas discursivos que, ao constituírem as mobilidades pessoais de seus usuários, participam de seus processos de subjetivação, desenhamos uma investigação empírica de modo a obter elementos que nos permitissem: a) explorar as formas rotineiras de uso do VEM; b) explorar relações entre o VEM e decisões sobre as mobilidades de seus usuários; c) explorar as implicações destas relações para a organização da vida cotidiana dos usuários. Isto tendo em vista não apenas as configurações atuais dos SBEs, mas também o potencial que este apresenta com a velocidade da atualização tecnológica.

Para a construção do corpus desta fase realizamos o monitoramento eletrônico dos trajetos de 15 usuários dos cartões VEM, nos perfis VEM trabalhador e VEM estudante por serem estes dois perfis os únicos com uso individual e vinculado a atividades diárias, disponíveis atualmente pelo SBE da RMR. Os usuários pesquisados tiveram seus trajetos monitorados durante uma semana, ciclo mínimo capaz de captar as regularidades presentes nas rotinas relacionadas aos deslocamentos pessoais, sendo este o ciclo comumente usado em pesquisas sobre origem e destino de viagens diárias.

Durante o período de monitoramento dos usuários realizamos entrevistas telefônicas diárias, quase sempre no período da noite, com o objetivo de conhecer os locais de origem e destino dos trajetos efetuados naquele dia, as motivações a eles relacionadas; as decisões sobre os modais de transporte e experiências em relação à vivência dos trajetos, a partir do referencial de Kellerman (2006). O autor estuda as mobilidades pessoais a partir de uma perspectiva que privilegia as motivações de cada indivíduo e seu comportamento durante os trajetos, pois pressupõe que tais características levam ao consumo tanto da mobilidade quanto da fixidez, e portanto mapeia seus trajetos, além de estabelecer padrões de movimentos que

melhor caracterizam os tipos de movimentos observados. Isto é, em outras palavras, defende- se que a partir das escolhas das pessoas é que a mobilidade acontece e é significada nas idéias e experiências das mesmas. E não apenas os objetivos das pessoas ao se movimentarem ou permanecerem onde estão levam à “produção” da mobilidade, mas também as reações das pessoas durante esses processos – mudanças na trajetória, interações com outras pessoas e locais que determinam essas mudanças, decisões de parar ou de continuar se movendo, utilização de outros caminhos ou visitas intermediárias entre os trajetos – são determinantes.

Sobre o papel do sujeito, mais especificamente do sujeito como “passageiro”, Adey et al (2012) descrevem com riqueza de detalhes, numa narrativa densa e bastante abrangente compilada a partir de sua pesquisa bibliográfica exaustiva, o modo como os indivíduos experimentam a mobilidade, desde seu nascimento até a idade adulta. Em seu estudo, os autores exploram o passageiro a partir de um debate teórico, em busca de uma perfilização do mesmo, a partir de pressupostos que colocam o sujeito tanto como causa da mobilidade quanto como consequência da mesma. Essa perfilização na busca pela construção do significado da mobilidade por parte do indivíduo, e na busca pelo modo como a mobilidade influencia na experiência deste, em sincronia com a perspectiva adotada por Kellerman (2006), é o que buscamos com o mapeamento dos trajetos dos indivíduos realizadas nesta etapa, e com as entrevistas diárias por telefone.

De modo a ampliar a tipicidade do corpus foram pesquisados usuários com perfis diversos. Para isso foram observadas variações do tipo de circulação, em diferentes anéis viários, usos de diferentes modais e sistemas de integração, diferentes períodos do dia, gênero, faixa etária e profissão, conforme perfil descrito no Quadro 9 que se segue.

Quadro 9(3) - Perfil dos usuários observados

Observações VEM Sexo Idade Profissão Bairro-Município

1 Usuário 1 Estud F 17 Estudante Tiúma- S. Lourenço

2 Usuário 8 Estud F 17 Estudante San Martin- Recife

3 Usuário 2 Trab F 56 Arquivista Arruda – Recife

4 Usuário 5 Trab F 44 Secretária Iputinga – Recife

5 Usuário 3 Trab M 49 Estudante Cordeiro- Recife

6 Usuário 6 Est M 19 Estudante Torrões – Recife

7 Usuário 4 Trab M 47 Aux. Produção Tiúma – S. Lourenço

8 Usuário 11 Trab M 33 Aux. Administrativo Eng do Meio-Recife

9 Usuário 9 Trab F 40 Telemktg Cordeiro-Recife

10 Usuário 10 Trab M 47 Segurança Cordeiro-Recife

11 Usuário 7 Trab F 46 Cabelereira Chão de Estrelas-Recife

12 Usuário 13 Trab F 38 Financeira Paulista

14 Usuário 14 Trab F 58 Serv. Gerais Campo Grande-Recife

15 Usuário15 Trab F 38 Recepiconista Olinda

Fonte: Elaborado pela autora.

Em nossa busca pela tipicidade encontramos limites na condição de que era preciso que as pessoas se dispusessem a portar um dispositivo eletrônico de registro de dados geolocalizados, representado na Figura 2, a seguir. Assim, selecionamos nossos observados a partir da indicação de pessoas com algum vínculo, porém sempre indireto, para termos mais segurança em relação aos cuidados que estas teriam com o artefato do qual dependíamos para a continuidade da pesquisa.

Após um pré-teste com dois voluntários, as observações seguiram por três semanas, entre os dias 18/06 a 13/07 de 2012, sendo que em cada uma delas cinco participantes foram observados. Concluídos os trabalhos de campo, editamos os registros do equipamento portado, de modo que, para cada um dos observados, produzimos um mapa semanal, o que nos permitiu representar espacialmente os trajetos, com suas repetições e também com as linhas únicas. Nesta representação utilizamos cores diferentes para destacar cada dia da semana. Durante este processo de elaboração dos mapas, identificamos algumas lacunas nos trajetos registrados, provavelmente devido a falhas de comunicação do equipamento com o satélite GPS ou ainda, outras vezes, por ter o equipamento se descarregado sem que o observado providenciasse o carregamento imediato. Tais situações foram pontuais e não prejudicaram o objetivo geral do estudo.

Figura 2(3) - Modelo de aparelho utilizado (I-gotu)