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1.1 SBEs, sistemas de transporte e mobilidade urbana

Hipótese 2: Os SBEs são sistemas discursivos que, ao constituem as mobilidades pessoais de

1.6 Justificativa e contribuição do estudo

Atualmente, a sociedade brasileira debate questões relacionadas à mobilidade, não apenas pela centralidade do tema no mundo contemporâneo, mas em resposta às perspectivas de imobilidade que ameaçam, de modo sombrio, alguns dos principais centros urbanos do país. Gestores públicos e privados preocupam-se com a eficiência dos sistemas de transporte, visando o deslocamento de pessoas e de produtos, condição requerida não apenas para o crescimento das economias no contexto do capitalismo conexionista, mas também para a qualidade de vida dos cidadãos que vivem nos centros urbanos. Os sistemas de bilhetagem eletrônica surgem como uma possível contribuição das novas tecnologias para as soluções daqueles problemas. Diante deste quadro, consideramos relevante a produção de conhecimento acerca dos sistemas tecnológicos que reflita sobre as implicações sociais de uma visão ingênua das relações entre tecnologia e sociedade, haja vista a natureza social e política de tais sistemas.

Para isso, situamos este estudo sobre sistemas de bilhetagem eletrônica em um campo transdisciplinar, com questões de pesquisa que apontam para diferentes áreas do conhecimento. Cada perspectiva é capaz de lançar luzes sobre certos aspectos do fenômeno, enquanto outros ficam obscurecidos. Isso porque as categorias conceituais das áreas de conhecimento limitam-se a seus campos específicos. Daí a importância de pesquisas como a que propomos, que busquem ultrapassar as fronteiras disciplinares de um fenômeno que demanda estudos sob diferentes perspectivas teóricas, como forma de ampliar o debate, colaborando para sua compreensão mais aprofundada, ampliando o debate com vistas a uma ação mais informada e responsável.

De forma original, este trabalho pretende propor uma aproximação teórica entre a teoria da construção social da tecnologia e a teoria do discurso, por considerar que existe uma

complementaridade entre elas à medida que, enquanto aquela analisa as dinâmicas a partir das quais os artefatos tecnológicos são produzidos socialmente, estabelecendo o lugar central dos agentes relevantes e suas demandas, a teoria do discurso investiga o processo pelo qual as diferentes demandas são articuladas na construção de posições hegemônicas.

A aproximação entre as duas teorias nos ajuda a analisar o sistema de bilhetagem eletrônica desde suas origens até suas configurações mais recentes, além de nos fornecer importantes recursos para construir as hipóteses relacionadas a sua natureza e, diante disso, as suas condições de possibilidade. Consideramos que, a partir desse trabalho, a aplicação conjunta dessas teorias no estudo dos sistemas de bilhetagem eletrônica de poderá ser estendida para outros artefatos. Do ponto de vista do estudo dos sistemas de bilhetagem eletrônica, temos uma pesquisa original, na qual os significados sociais e políticos dos sistemas de bilhetagem são investigados, na busca por explicações acerca de suas configurações técnicas e dos impactos destas nas mobilidades pessoais.

O estudo pretende ainda romper com a visão dicotômica de que pesquisas sobre fenômenos sociais devem se localizar dentro de perspectivas macrossociais ou microssociais. Para isso, buscamos investigar, a partir dos sistemas de bilhetagem eletrônica, as relações possíveis entre estruturações sociais e a ações individuais: observando na escolha dos trajetos diários, as forças sociais, econômicas e políticas que nos movimentam – e que nós movimentamos também.

Esperamos ampliar o entendimento sobre as mobilidades pessoais, buscando compreender como ela tem sido experimentada no cotidiano de cada indivíduo. Isso indo além da ideia de mobilidade como deslocamento, adotando uma perspectiva de pesquisa acerca da experiência e dos significados das escolhas individuais. Buscamos com isso a agência do sujeito em seus trajetos, perseguindo uma vertente pouco explorada. Nessa mesma direção propomos observar o efeito do SBE na subjetividade dos usuários. Com essas investigações, abrimos novas possibilidades para a compreensão das mobilidades pessoais, levantando questionamentos acerca de como essa observação é possível: por exemplo, partiremos de padrões pré-estabelecidos? Como levaremos em consideração a influência de características da demografia da região?

O próprio contexto no qual o sistema de bilhetagem opera é bastante desafiador: uma região metropolitana. Segundo Nina Best (2011), as regiões metropolitanas, uma vez tendo sido instituídas de maneira arbitrária, como estratégia do governo militar, e ficando cada vez mais indefinidas quanto a seus propósitos, acabaram se tornando palco de disputas

intergovernamentais em vez de espaço de cooperação entre os governos. Isso tem contribuído para a intensificação de problemas socioeconômicos uma vez que eles não são adequadamente abordados. Os SBEs que têm a proposta de se integrar ao transporte público nas regiões metropolitas, dentro desse panorama, têm diante de si grandes desafios, dentre outras coisas, por se tratar de uma experiência pioneira e em constante mudança e expansão.

Por fim, podemos ainda considerar que a academia deve não apenas produzir conhecimento, mas também pensar sobre as implicações econômicas, sociais, culturais, políticas e ambientais que envolvem as práticas apoiadas na produção do conhecimento produzido. Assim, este estudo pretende contribuir para o debate em torno das práticas, buscando compreendê-las através de perspectivas teóricas centradas nos processos políticos. Tais reflexões poderão contribuir para a melhoria de políticas públicas, com o aprimoramento dos processos dos sistemas de gestão da bilhetagem eletrônica.

Abordando ainda a questões relacionadas à tecnologia como contribuição para a solução dos problemas urbanos, temos que a Região Metropolitana do Recife será alvo de grandes eventos como a copa do mundo de 2014, o que torna a necessidade de repensar sua estrutura de forma mais crítica, e para além do nível técnico. A malha urbana que se expande continuamente atrai cada vez mais indivíduos e empresas em busca desse crescimento compartilhado do espaço, e, portanto, compreender a maneira com a qual estas pessoas e grupos interagem com o espaço e entre si é crucial para compreendemos os fatores que modelam a configuração do espaço.