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A medida provisória como veículo da norma tributo

3.1 A PROGRAMAÇÃO CONDICIONAL DA SEGURANÇA JURÍDICA PELA

3.1.4 A medida provisória como veículo da norma tributo

Acerca da medida provisória, sua concepção de poder instituir tributos merece algumas considerações. Em primeiro plano, medida provisória somente é ato normativo com força de lei (artigo 62), sendo sua digressão histórica, e de acordo com o direito comparado, complexa.318 No ordenamento brasileiro, medida provisória é exceção à regra da legalidade.319

A Constituição Federal estabeleceu320, então, a medida provisória como sendo ato normativo exarado pelo Poder Executivo e, após, posto à apreciação do Poder Legislativo. É ato que objetiva, em regra, ser convertido em lei.

É cabível uma distinção sistematizada entre as medidas provisórias visando diferenciar- se para uma melhor análise. A medida provisória a ser tratada aqui é tão somente aquela que veicule normas que não digam respeito aos impostos expressamente previstos no §2º do artigo 62; estas medidas provisórias do §2º são uma forma de deflagração do processo legislativo pelo Poder Executivo321, ou seja, se torna “apenas iniciativa de lei submetida a regime distinto de deliberação parlamentar”322.

A análise da medida provisória sobre matérias reservadas à lei complementar é tema sem grandes complicações, haja vista que, (i) por ser função reservada somente à lei complementar, produto do exercício de um legislador nacional,– capacidade, então, ausente na medida provisória –, e (ii) pela expressa vedação legal: tanto a do inciso III do artigo 62, quanto a do artigo que propõe quórum qualificado à lei complementar, diverso do quórum da medida provisória.

318 Acerca da origem, histórica cf. GALIANO, Leonardo de Faria. As medidas provisórias como veículo

introdutor de normas tributárias. Brasília: Brasília Jurídica, 2006, p. 27-43. AMARAL JÚNIOR, José Levi

Mello do. Comentários ao art. 62. In: CANOTILHO, J. J. Gomes; MENDES, Gilmar F.; SARLET, Ingo W. (Org.). Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina, 2013, p. 2677.

319 Em sentido contrário Misabel Derzi afirma que não existirem exceções à legalidade, “pois todo tributo

somente pode ser disciplinado, em seus aspectos substanciais (material, temporal, espacial, subjetivo e quantitativo por diploma legal, emanado do Poder Legislativo”. Adiante, a autora argumenta que, em certas hipóteses, a legalidade pode ser “quebrada”. No decorrer do texto, a autora apresenta argumentos que caracterizam exceções à regra, ou seja, situações atípicas e específicas nas quais, em que pese fosse possível a incidência, há uma abertura para que não haja. Cf. DERZI, Misabel. Notas de atualização. In: BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar, Rio de Janeiro: Forense, 2005, p 67-68.

320

Tomar-se-á como análise a Constituição após a Emenda Constitucional n. 32 considerando-se o escopo do presente trabalho.

321 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 67. Assim o é

porquanto a medida provisória, neste sentido, somente poderá instituir impostos após a sua conversão em Lei, conforme o§2º artigo 62.

Superada a distinção, conjectura-se, aqui, que a medida provisória enquanto ato normativo com força de lei somente é justificável face à imprevisibilidade, configurada esta de acordo com o aspecto da relevância e urgência da situação ensejadora do estado de insegurança.323 A imprevisibilidade se configura no ambiente do direito, no entorno do sistema jurídico, provocando irritabilidade no sistema jurídico, ou seja, provocando uma necessidade de resposta deste sistema face à situação urgente e relevante. Neste sentido, a medida provisória pode ser concebida como ato normativo que resolve tal situação de urgência e relevância.324

Este estado de insegurança, igualmente, afasta a segurança jurídica na sua dimensão de permanência e estabilidade. Este decréscimo na certeza do direito se consubstancia na modificação na legislação, via de regra, repentina.

Entretanto, a segurança jurídica não se afasta por completo da medida provisória, se assim o fosse não se trataria de sistema jurídico. Existem diversos aspectos que configuram a medida provisória de acordo com a segurança jurídica: em um primeiro plano, há a vedação à reedição na mesma sessão legislativa (artigo 62, §10), imprescindível para refrear a edição sucessiva de medidas provisórias e a instabilidade deste ato.325

Em um segundo plano, há o estabelecimento de matérias vedadas à edição de medidas provisórias, ou seja, há a regulação negativa da medida provisória, proibindo-se determinadas matérias (exclusão prévia de matérias)326; em um terceiro plano, é o quanto referido anteriormente acerca dos pressupostos da medida provisória: esta somente é permitida sob o aspecto da relevância e urgência. Então, o próprio instrumento para lograr êxito contra uma situação fática imprevisível e insegura encontra-se permeada por um grau mínimo de segurança jurídica. 327

323 GALIANO, Leonardo de Faria. As medidas provisórias como veículo introdutor de normas tributárias.

Brasília: Brasília Jurídica, 2006, P. 70-77.

324 Este foi o cerne do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4.048, no qual o Relator, Ministro

Gilmar Mendes, entendeu haver uma densificação normativa dos critérios de relevância e urgência pela Constituição Federal quando esta estabeleceu seu entendimento de relevância e urgência no artigo 167, §3º.

325

AMARAL JÚNIOR, José Levi Mello do. Comentários ao art. 62. In: CANOTILHO, J. J. Gomes; MENDES, Gilmar F.; SARLET, Ingo W. (Org.). Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina, 2013, p. 2.689.

326

GALIANO, Leonardo de Faria. As medidas provisórias como veículo introdutor de normas tributárias. Brasília: Brasília Jurídica, 2006, p. 80-95.

Os três problemas a serem tratados sob o tema segurança jurídica serão: a ausência de pluralidade; a ausência da permanência; e o problema da anterioridade.

O primeiro aspecto problemático da medida provisória é, portanto, a ausência de pluralidade. Entretanto, a pluralidade que lhes falta é circunstancial: há pluralidade na medida provisória, esta é, entretanto, diferida.

A promoção da pluralidade, considerada como deliberação por um órgão formal composto por uma diversidade partidária bipartidária mínima, ocorre na medida provisória. A diferença é o momento: há uma inversão da lógica que permeia o ato normativo legal. Neste, a deliberação da lei ordinária ocorre de forma anterior à sua produção de efeitos, sendo integralizada pelo Poder Executivo mediante a sanção ou veto. Aqui, na medida provisória, se trata, inicialmente, de uma produção de efeitos por ato do Poder Executivo para posterior análise do ato pelo Poder Legislativo.328

O segundo problema é a sua permanência e é justamente esta permanência que afeta a caracterização da segurança jurídica na dimensão objetiva e a caracterização da segurança jurídica na dimensão subjetiva. No caso em que haja conversão em lei não serão comportados maiores problemas.

Questão diversa é acerca da perda da eficácia diante do decurso do prazo ou rejeição. A Emenda Constitucional n. 32 estabeleceu disciplina pelo Congresso Nacional nestes casos, e, ausente esta disciplina, no prazo de sessenta dias, a manutenção dos efeitos, conforme o estabelecido na medida provisória.

Há uma inegável estabilidade dos efeitos seja de forma expressa, seja diante da decorrência do prazo. A questão é que no iter dentre a decisão entre um ou outro há um estado de insegurança se não conformado à segurança jurídica.

Nesse diapasão, a via preferível é a aprovação, sendo o caso de rejeição expressa deve ser assentado o dever da edição do Decreto Legislativo pelo Congresso Nacional. 329 A redação do §3º constitui um dever do Congresso. No caso da perda da eficácia por decurso de prazo a redação é determinativa: “devendo o Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas delas decorrente”. Portanto, dentre todas as opções, a situação de omissão é a pior delas.

328

Cf. Ibid., p. 55-57.

329 RODRIGUES, Ana Cláudia Manso S. O. A medida provisória não convertida em lei e a edição de decreto

Há mais. O Decreto Legislativo estabelecido pelo Congresso Nacional deve pautar-se na promoção do estado de segurança e, em especial, de confiança. Desta forma, o estabelecimento do Decreto Legislativo não pode malferir situações vantajosas postas em favor do contribuinte provocando a derrocada da proteção da confiança.330

Por uma questão sistemática, o aspecto da anterioridade e a medida provisória será visto quando da análise da anterioridade.