• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO VII: SUPERVISÃO E CONTROLO DA ACTIVIDADE DOS SERVIÇOS DE

VII.2. A necessidade de controlo dos serviços de inteligência nos Estados

A existência de serviços de inteligência em países democráticos dá origem a um paradoxo político. Por um lado, os serviços são criados com o propósito de proteger o Estado e os cidadãos e outras pessoas que se encontrem sob a jurisdição do Estado e da ordem democrática. Aos serviços são conferidos poderes especiais e recursos para esta finalidade. Os serviços estão habilitados por lei para obterem informações confidenciais por meio de vigilância, intercepção de comunicações e outros métodos que violam o direito à privacidade; têm, ainda, capacidade para levar por diante operações secretas destinadas a combater as ameaças para a segurança nacional, operando com um elevado nível de sigilo. Por outro lado, os serviços de inteligência e os membros do Executivo podem, ainda, fazer uso desses poderes e capacidades para subverter a segurança dos indivíduos e, também, do processo democrático. Podem, igualmente, violar os direitos humanos e a lei, interferindo em actividades políticas legais. Podem intimidar os opositores do governo e criar um clima de medo manipulando a inteligência, a fim de influenciar a tomada de decisão do governo e a opinião pública. Podem, também, fazer um uso abusivo dos fundos destinados aos serviços de inteligência. Considerando todos estes perigos, os países democráticos são confrontados com o desafio de construir regras, controlos e mecanismos de supervisão destinados a minimizar o potencial de condutas ilegais e abuso de poder e garantir que os serviços de inteligência assumam as suas responsabilidades, em conformidade com a Constituição e a legislação147. Na verdade, o controlo da actividade de inteligência é

147 NATHAN, Laurie - Intelligence Transparency, Secrecy, and Oversight in a Democracy in BORN, Hans;

114

uma tarefa verdadeiramente difícil em qualquer sistema político148. Existe, assim, uma

enorme dificuldade que a supervisão e o controlo da actividade de inteligência enfrentam relativamente à questão do sigilo que está inerente a essa actividade, tendo em conta que o segredo é um requisito essencial para a eficiência das agências de inteligência. Afinal, aos serviços está vedada a revelação das suas actividades publicamente no sentido de evitar vulnerabilidades face aos seus inimigos.

Facto extraordinário da regulação geral dos serviços de inteligência é o de o seu funcionamento dever ser secreto, devendo estar, todavia, regulado e assegurado pelas instituições públicas. O seu êxito dependerá sempre da adequada realização deste princípio. O terrorismo global bem como a criminalidade organizada e todas as formas de extremismo político ou religioso constituem nos nossos dias uma séria ameaça à segurança dos povos. É neste contexto, e não é demais afirmá-lo, que se mostra de fundamental importância o papel e a intervenção dos Serviços de Informações149.

Perante os novos desafios colocados pelo cenário nacional e internacional, torna-se necessário dispor de um Serviço de Informações especializado e moderno com capacidade para os enfrentar com eficácia. A missão de um Serviço de Informações passa por prevenir e evitar qualquer risco ou ameaça que ponha em causa a independência e a integridade de uma nação, para além dos seus interesses e a estabilidade do Estado de direito e das suas instituições.

Como já anteriormente assinalado, o trabalho dos serviços de inteligência deve realizar-se em segredo. Deste modo, uma eventual revelação das fontes, métodos e recursos poderia comprometer seriamente a eficácia desse mesmo trabalho. Daqui resulta que de algum modo o trabalho dos serviços de inteligência deve ser sempre resguardado, não podendo ser tão transparente como poderá acontecer com outras entidades do governo. Todavia, tal não significa que os serviços estejam fora de

of Armed Forces (DCAF), Geneva, 2012, pp. 49-50.

148 HASTEDT, Glenn P. Controling Intelligence. New York, Routlegde, 1991.

149 VILLALOBOS, Maria Concepción - El Control de los Servicios de Inteligencia en los Estados

Democráticos. I Congresso Nacional de Inteligência. Universidad de Granada, Madrid, 23 Outubro de 2008.

115

qualquer sistema de controlo democrático. Assim, os serviços de inteligência devem estar sujeitos ao mesmo tipo de controlo democrático que os diferentes actos do governo. O principal meio de controlo do poder executivo existente num sistema democrático é o parlamentar, estando o controlo da legalidade a cargo do poder judicial. Cabe, igualmente, ao Executivo a responsabilidade de atribuir tarefas e prioridades aos serviços de inteligência, enquanto ao parlamento incumbe a tarefa de aprovar as leis, fiscalizar o orçamento e o papel do governo e o funcionamento dos serviços de inteligência, sem interferir nas operações que estes levam a cabo. No seio dos parlamentos é normal a criação de comissões encarregadas de fiscalizar os serviços.

Os serviços de inteligência devem estar sujeitos às leis relativas à protecção de dados pessoais e sigilo das comunicações. Todavia, a lei deve estabelecer um mecanismo judicial que avalie e considere as mais variadas situações. A este propósito, alguns sistemas jurídicos consideram a atribuição de poderes especiais aos serviços de inteligência e que afectam directamente os direitos fundamentais, tais como o acesso a documentação, sem necessidade de consentimento do remetente ou destinatário, utilização de identidades falsas e intercepção de comunicações. No geral, são outorgados poderes mais amplos dos que aqueles de que dispõe a polícia, tendo em conta que as ameaças contra a segurança são mais sérias que o delito comum.

Não existe nenhuma norma internacional que regule os poderes especiais, no entanto, existe o consenso de que é obrigatório respeitar determinadas normas independentemente das ameaças a que o Estado esteja sujeito, Por exemplo, em nenhuma circunstância o Estado poderá recorrer ao assassinato político ou à tortura como meios utilizáveis. A maioria dos sistemas legais difere quando se trata de delimitar até que ponto o uso destas técnicas viola o direito à intimidade. Aceita-se, no entanto, e de modo generalizado, que qualquer violação da intimidade requeira uma base legal e controlo judicial.

116