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A organização de um ambiente educativo promotor do brincar

No documento Relatório AnaMachado SÃO FINAL (páginas 51-56)

Capítulo I – Quadro Teórico de Referência: O Brincar como Pilar Incontornável

3. O Papel do Educador de Infância no Brincar

3.2. A organização de um ambiente educativo promotor do brincar

De modo a abordar a intervenção do Educador de Infância na organização de um ambiente educativo promotor do brincar, importa, primeiramente, definir o conceito de espaço educativo: “[…] o espaço não é algo que emoldure, não é simplesmente físico, mas atravessa as relações, ou melhor, é parte delas” (Horn, 2004:9), estando, por isso, intimamente ligado ao ambiente educativo que “[…] diz respeito ao conjunto desse espaço físico e às relações que nele se estabelecem” (idem:35). Esta perspetiva remete para a ideia de que “[…] o espaço físico e social é fundamental para o desenvolvimento das crianças, na medida em que ajuda a estruturar as funções motoras, sensoriais, simbólicas, lúdicas e relacionais” (Barbosa & Horn, 2001:73).

Por sua vez, Kishimoto (2003:139) defende que “[…] os conteúdos veiculados durante as brincadeiras infantis, bem como os temas de brincadeiras, os materiais para brincar, as oportunidades para interações sociais e o tempo disponível são fatores que dependem basicamente do currículo proposto [pelo Educador] […]”. Assim, é função do Educador dedicar-se à organização espacial e temporal com o intuito de promover o brincar das crianças, tal como contemplado no Perfil Específico de Competências do Educador de Infância (2001:3): o Educador “[…] organiza o espaço e os materiais, concebendo-os como recursos para o desenvolvimento curricular, de modo a proporcionar às crianças

experiências educativas integradas”. Nesta perspetiva, Zabalza (1992:120) argumenta que “[…] o espaço na educação constitui-se como uma estrutura de oportunidades”. Nesta linha de pensamento, a organização especial da sala assume um papel preponderante no apoio à iniciativa da criança e permite-lhe experienciar o mundo de várias perspetivas, devendo promover a ação auto iniciada e espontânea. Como tal, o Educador deve ter em consideração que a “[…] reflexão sobre o espaço, materiais e sua organização é condição indispensável para evitar espaços esterotipados e padronizados que não são desafiadores para as crianças” (Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar (OCEPE), 1997:38). Dito de outro modo, deve organizar o espaço e os materiais da sala, refletindo sobre os interesses e motivações das crianças, evitando que as suas ações sejam limitadas pelo tipo de organização presente, de modo a que o espaço seja pensado para elas e, sobretudo, com elas.

Neste âmbito, a criação de áreas de interesse assume um papel elementar, permitindo que as crianças desenvolvam brincadeiras diversificadas, em diferentes contextos e com diferentes materiais. De acordo com o ponto de vista de Shure (1982), referido por Dempsey e Frost (2010: 692),

[…] uma prática fundamental na educação de infância é o uso de áreas específicas, ou áreas de aprendizagem, para os diferentes tipos de atividades […] A investigação confirma a razão de ser implícita destas áreas separadas: as crianças agem – ou brincam – de maneira diferente nas diferentes áreas dentro da mesma sala de atividades.

O Educador deve, assim, empenhar-se na criação de um ambiente educativo em que o brincar assuma relevo e, para tal, este deve ser um ambiente acolhedor, que proporcione tempo para brincar, bem como uma diversidade de oportunidades e de experiências e, sobretudo, que seja promotor da segurança física e emocional das crianças, em que a dimensão afetiva assuma um papel preponderante, para que a criança se sinta confiante em explorar o que a rodeia. Kishimoto (2010:4-5) defende, ainda, que “[…] o vínculo afetivo e carinhoso com o adulto é a primeira condição […]” para que a criança se sinta segura em iniciar as suas explorações. A mesma autora alerta para alguns atributos que os brinquedos devem ter, como “[…] atender à diversidade racial, não conter preconceitos de gênero, classe social e etnia, não estimular a violência” (idem:4), entre outros.

No que se refere à promoção do brincar [social] espontâneo através da organização espacial da sala, torna-se relevante salientar que as áreas de interesse, nomeadamente as do faz-de-conta, não devem manter-se iguais durante todo o ano. Assim, o Educador deve estar atento ao modo como as crianças se apropriam do espaço e dos materiais, para que possa, gradualmente, ampliar e modificar as áreas conforme as brincadeiras vão progredindo. Brickman e Taylor (1991:53) alertam mesmo que “[…] o número de áreas que os adultos decidirem criar […] deve basear-se nas necessidades e interesses do seu grupo”.

Um aspeto fundamental a salientar é que as crianças devem assumir uma participação ativa na organização ou modificação espacial da sala, uma vez que, como referem as OCEPE (1997:37), “[…] o processo de aprendizagem implica também que as crianças compreendam como o espaço está organizado e como pode ser utilizado e que participem nessa organização e nas decisões sobre as mudanças a realizar”. Para além disto, “[…] a organização do espaço em áreas com os seus respetivos materiais […] é uma forma poderosíssima de passar mensagens implícitas às crianças” (Oliveira- Formosinho, 2013:85).

É, também, importante que se insiram novos elementos e materiais, uma vez que a criança necessita que lhe seja proporcionada uma diversidade de situações de brincadeira que contribua para a sua evolução, de acordo com os seus interesses e necessidades. Outro aspeto a salientar é que os materiais devem estar acessíveis às crianças, para que tenham oportunidade de realizar as suas escolhas sobre as brincadeiras que querem desenvolver. Apoiando-me na perspetiva de Dempsey e Frost, (2010:688), “[…] o ambiente diz à criança se a julgamos capaz de ter sucesso […] e os materiais importantes ao alcance da criança comunicam-lhe a nossa confiança na sua capacidade para fazer escolhas bem sucedidas”, transmitindo-lhe, assim, um sentimento de valorização pessoal imprescindível à construção da sua autoimagem e, consequentemente, da sua autonomia. Dito de outro modo, a forma como o espaço e os materiais estão organizados pode promover a autonomia da criança face ao adulto ou, por outro lado, cerceá-la, por exemplo, no que se refere ao apoio à iniciativa e livre escolha da criança.

Em última análise, a organização do espaço assume um papel essencial na promoção das dinâmicas em contexto de sala, nomeadamente no que se refere ao brincar das

crianças, podendo, por outro lado, condicioná-las. Como tal, é fundamental que o Educador observe as dinâmicas da sala, o modo como as crianças se apropriam dos espaços e dos materiais, os interesses e necessidades que manifestam e, sobretudo, que reflita sobre as intencionalidades educativas que presidem a esta organização, sempre que possível, em conjunto com as crianças, para que se proceda a uma organização do espaço significativa para aquelas crianças em particular. Citando Oliveira-Formosinho (2007:26),

[…] a primeira tarefa do educador é a de pensar o contexto educativo e organizá-lo para que se torne um ‘segundo educador’. Ao educador pedimos que crie espaço de participação para as crianças, o que começa por criar um contexto que participe. Num contexto que participa, a estrutura, a organização, os recursos e as interações são pensados para criar possibilidades múltiplas a fim de que a escuta ativa da criança tenha reais consequências nos resultados de aprendizagem.

No que se refere à organização temporal da sala, no âmbito do brincar, o Educador deve possibilitar, na rotina, a existência de tempo para a criança desenvolver as suas brincadeiras espontâneas e incentivar as suas explorações, tendo em conta que “[…] a quantidade de tempo disponível afecta as dimensões lúdicas do contexto” (Dempsey & Frost, 2010:701). Sem desprimor para as atividades propostas pelo adulto, o Educador deve ter a preocupação de que estas não se sobreponham ao brincar, não o relegando para segundo plano, dado que “[…] os comportamentos lúdicos complexos […] requerem uma quantidade de tempo razoável” (idem:701-702).

Enquanto futura Educadora de Infância, creio que a capacidade flexibilizar a organização temporal da sala, dando tempo às crianças para brincar e prolongando esse tempo quando necessário, é crucial, uma vez que permite que se mantenham, durante mais algum tempo, concentradas na sua brincadeira e, consequentemente, agindo de acordo com os seus interesses e motivações. Citando Oliveira-Formosinho e Andrade (2011:72), a rotina diária deve ser “[…] respeitadora dos ritmos das crianças, tendo em conta o bem-estar e as aprendizagens […]”.

Devo, ainda, referir que acredito ser absolutamente necessário brincar com e para as crianças. É necessário “perder” (reiterando as aspas) esse tempo, ganhando-o, uma vez que, na minha conceção, quando o Educador não está presente nas brincadeiras, perde a noção do processo de construção do conhecimento das crianças.

Barbosa e Horn (2001:67) dedicaram-se ao estudo da organização do espaço e do tempo na Educação de Infância e defendem que:

[…] organizar o cotidiano das crianças da Educação Infantil pressupõe pensar que o estabelecimento de uma sequência básica de atividades diárias é, antes de mais nada, o resultado da leitura que fazemos do nosso grupo de crianças, a partir, principalmente, de suas necessidades. É importante que o educador observe o que as crianças brincam, como estas brincadeiras se desenvolvem, o que mais gostam de fazer, em que espaços preferem ficar, o que lhes chama mais atenção, em que momentos do dia estão mais tranquilos ou mais agitados. Este conhecimento é fundamental para que a estruturação espaço-temporal tenha significado. Ao lado disto, também é importante considerar o contexto sociocultural no qual se insere e a proposta pedagógica da instituição, que deverão lhe dar suporte.

Em suma, existem cinco fatores essenciais ao papel do Educador no brincar das crianças: as estruturas, os materiais, o tempo, o próprio Educador e a sua intervenção. É crucial que o Educador encare os momentos de brincar como momentos de aprendizagem por excelência, criando condições para que se desenvolva tendo por base as intencionalidades pedagógicas, intencionalizando, assim, o brincar. Dito de outro modo, deve criar meios para tornar o brincar espontâneo num brincar com valor pedagógico, utilizando o espaço e o tempo como recursos de inigualável valor. Deve, ainda, observar estes momentos, de modo a conhecer a criança e a sua identidade, refletindo retrospetivamente acerca do que observou e também prospetivamente, para que possa refletir sobre a sua intervenção em brincadeiras futuras e tendo sempre a consciência de que, acima de tudo, o brincar é “[…] a essência da infância” (Silva, 2010:11).

Capítulo II – Metodologia

No documento Relatório AnaMachado SÃO FINAL (páginas 51-56)