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2.9.1 Contexto histórico

Assim como foi apresentado o conceito de marketing de relacionamento, é preciso definir e entender o conceito de branding. A gestão de marcas ou branding significa dotar bens e serviços com o poder de uma marca, ou seja, é a capacidade de criar, manter, aprimorar e proteger as marcas. Ele surgiu séculos atrás como meio de distinguir os produtos de um fabricante dos de outros. As primeiras evidências de branding surgiram na Europa, quando associações medievais obrigavam artesãos a distinguirem seus produtos por meio de alguma marca, para protegerem a si mesmos e aos consumidores contra produtos de qualidade inferior (KOTLER; KELLER, 2012).

Apesar de os primeiros relatos de branding terem surgido na Europa, com essa tentativa dos artesãos de diferenciarem seus produtos dos de outros artesãos, uma história magistral do sabonete Ivory, nos EUA, foi um dos mais bem-sucedidos casos de branding da empresa “Procter & Gamble”, iniciado nos anos 1880. Nos anúncios, a empresa fazia uma referência às palavras flutuar e puro, afirmando ainda que ele era 99,44% livre de impurezas. Esse posicionamento foi mantido e até 1920 era possível ver anúncios que se tornaram um dos mais famosos slogans de

todos os tempos. A afirmação de pureza se sustentava num estudo feito por um químico, onde foi constatado apenas 0,56% de impureza. Dessa forma, o produto foi muito bem posicionado como um sabonete puro, suave e flutuante. Investimentos agressivos no orçamento de propaganda permitiram transmitir ao consumidor a ideia de que a empresa acreditava no próprio produto e que se responsabilizava por ele, criando uma relação baseada na confiança. Com mais de 110 anos de existência, é um grande exemplo de como criar e sustentar uma posição diferenciada de uma marca (Brand Equity) (AAKET, 1998).

O Brand Equity pode ser definido como “conjunto de ativos – como conhecimento do nome, consumidores leais, qualidade percebida e associações (exemplo: ser ‘puro’ e ‘flutuante’) – que se liga ao produto ou oferta de serviço” (AAKET, 1998, p. 4). Foi essa capacidade de gerir sua marca que fez com que mesmo durante e após a depressão vivida pelos EUA nos anos de 1929, o Ivory tenha dobrado suas vendas entre 1933 e 1939, fruto de uma campanha publicitária numa novela de rádio (AAKET, 1998).

A gestão de marcas é importante tanto para as empresas (como no exemplo da P&G citado acima) como também para os próprios consumidores. As marcas têm o poder de identificar os fabricantes e fazer com que os consumidores e/ou clientes atribuam responsabilidades e até mesmo assumem significados especiais para eles (KELLER; MACHADO, 2006). Assim ensinam os autores:

O significado incorporado em uma marca pode ser bastante profundo, e o relacionamento entre ela e o consumidor pode ser visto como um tipo de vínculo ou pacto. Consumidores oferecem sua confiança e fidelidade acompanhadas de um acordo explícito de que a marca se comportará de certa maneira e lhes proverá utilidade por meio do funcionamento consistente de um produto, além de preço, promoção, ações e programas de distribuição adequados. (KELLER; MACHADO, 2006, p. 7).

Keller e Machado vão além ao defenderem que as marcas são dotadas de representatividade e significados na mente de seus consumidores, conforme destacado no seguinte trecho:

Esses benefícios podem não ser de natureza unicamente funcional. Marcas podem servir como dispositivos simbólicos que permitem aos consumidores projetar sua autoimagem. Certas marcas são associadas à utilização por determinados tipos de pessoa e assim, refletem diferentes valores ou ideias. Consumir tais produtos é um meio pelo qual os consumidores podem comunicar a outros – ou até si próprios – o tipo de pessoa que são ou

gostariam de ser. O ganhador do prêmio Pulitzer Daniel Boorstein afirma que, para muitas pessoas, as marcas assumem a função que confrarias e organizações religiosas costumavam assumir – ajudar pessoas a definir quem elas são e ajuda-las a comunicar essa definição a outros. (KELLER; MACHADO, 2006, p. 7).

Mas, afinal, o que é marca? A American Marketing Association (AMA) define marca como “um nome, termo, sinal, símbolo ou design, ou uma combinação de tudo isso, destinado a identificar bens ou serviços de um fornecedor ou de um grupo de fornecedores para diferenciá-los de outros concorrentes” (ROCHA; IGNÁCIO, 2017, p. 6). Contudo, a marca não se resume a somente aos conceitos frios ou a essa definição estática. Essa definição é um norte, porém, mais importante do que ter uma definição clara do que é marca são as estratégias e atitudes que as empresas fazem para a gestão da sua marca. A gestão de marcas deixou de ser uma preocupação somente para profissionais desse campo do conhecimento. Não é um compromisso passageiro e muito menos um movimento modal. Já foi o tempo em que as preocupações de marca não entravam em reuniões do board, e diversos estudos demonstram que CEOs estão ansiosos por verem esse instrumento de gestão nas empresas (TROIANO, 2017).

2.9.2 Branding no mercado imobiliário

Uma vez entendido o significado, a importância e a breve origem histórica da marca, é preciso entender de que forma a gestão das marcas pode auxiliar as construtoras e incorporadoras a conseguirem vantagens competitivas em seus mercados. A vantagem competitiva é alcançada quando a empresa consegue operar com um custo relativo menor ou que pode cobrar um preço maior por seus produtos. A vantagem competitiva não significa derrotar concorrentes, mas sim criar um valor superior. Desse modo, a vantagem competitiva significa possuir retornos financeiros acima da média das indústrias de um mesmo setor (MAGRETTA, 2012).

Visto que a vantagem competitiva é um alvo que a maioria das organizações busca, a importância do gerenciamento das marcas é exatamente no sentido de criar uma marca forte, uma identidade e um conceito no qual os consumidores enxerguem de forma nítida os atributos da empresa através de sua marca.

A marca é uma mescla de diversos atributos fatores e percepções de um produto ou uma empresa que consegue demonstrar aos seus consumidores os verdadeiros diferenciais que esta se propõe a entregar em seu público-alvo. É importante, ainda, elencar os tipos de marca e sua percepção perante os clientes: marca funcional, de imagem e experiencial. As marcas funcionais estão voltadas para os atributos funcionais do produto, concentrando esforços para que os consumidores percebam valor nas necessidades funcionais desses produtos. Nesse caso, busca-se um desempenho superior aos concorrentes de mercado e excelência nos produtos. Em uma marca de imagem, a percepção de valor passa a ser ao tipo de imagem que aquela marca agrega e transmite ao seu usuário. Por sua vez, há as marcas experienciais que não estão preocupadas com os atributos funcionais de seus produtos ou com a imagem que eles trazem para seus clientes, mas buscam proporcionar a melhor experiência para determinado segmento de clientes e criar vínculos emocionais com eles (ROCHA; IGNÁCIO, 2017).

As incorporadoras e construtoras, dependendo do seu posicionamento estratégico e interesse de mercado, podem desejar se tornarem uma marca funcional, de imagem ou experiencial. É importante destacar que preço, produto e estratégia para a criação de determinado tipo de marca são elementos completamente distintos. O “serviço” presente na incorporação imobiliária é a comercialização de obras prontas ou que ainda serão edificadas. O detalhe específico que precisar ser objeto de uma melhor análise é o contínuo processo de interações entre cliente e incorporadora. E é justamente nesses pontos de interação que surgem diversas oportunidades para a criação de valor de marca através do encantamento do cliente pelos serviços prestados, e não pelo produto imobiliário entregue ou a ser construído.

A atividade da incorporação em si, ou seja, a aquisição do terreno e o desenvolvimento o produto, bem como a comercialização das unidades, cessa com a entrega efetiva das chaves. É nesse sentido o entendimento de Batalha- Vasconcelos e Meirelles (2006), ao afirmarem que a prestação do serviço incorporação imobiliária se encerra no momento da entrega final das chaves e a correspondente instalação do condomínio edilício, ou com a transferência da posse precária para o adquirente.

Porém, ainda que juridicamente a incorporação se encerre nesse momento, o prazo de garantia legal de cinco anos para determinados itens faz com que o

relacionamento com o cliente se estenda para além dessa entrega do imóvel. O processo de acomodação, adaptação e instalação no novo ambiente gera dúvidas e ansiedade nos clientes, sendo uma ótima oportunidade de encantamento numa prestação de serviços que vai além da contratual, que seria a entrega do produto em si. Essa surpresa positiva nos clientes é uma oportunidade de trazer valor para a marca.

Visto as características de serviços na atividade imobiliária, é preciso atenção da estratégia de brand equity no setor imobiliário, uma vez que os aspectos gerenciais são profundamente diferentes. A forma de se relacionar com o cliente é muito mais importante do que os atributos em si (BATALHA-VASCONCELOS, 2008). Portanto, há uma necessidade de toda a equipe da empresa para o alinhamento dos valores da marca e da marca em si. A reputação de uma marca numa empresa de serviços será muito impactada pelos aspectos intrínsecos da cultura organizacional, sendo que esse valor agregado pode ser superior nessas empresas (CHERNATONY; SEGALHORN, 2001).

A nova visão da Lógica Dominante em Serviços poderia ser refutada no mercado imobiliário em função da baixíssima (ou nula) taxa de recompra de imóveis. Se o argumento de que essas incorporadoras e seus clientes fazem transações únicas, talvez a Lógica Dominante em Serviços poderia não ser aplicável nesse mercado. Se a palavra relacionamento for entendida somente com clientes que possuem altas chances de recompra, de fato a lógica dominante em mercadorias poderia ser persuasiva nesse nicho. Porém, mesmo nos casos em que as transações são únicas e não há chances de recompra, não há como não enxergar o relacionamento com o cliente, advindo de questões legais e normativas (VARGO; LUSCH, 2004).

Ainda que de forma discreta, existem outras transações envolvidas, tais como sociais e até mesmo legais. Nesse sentido, a necessidade de assistência técnica após a entrega das chaves pode ser compensada com a provisão de serviços que podem ser cobrados (serviço pago de manutenção preventiva) e até mesmo gerando valor para a marca em função dos serviços prestados na assistência técnica.

3 METODOLOGIA