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Expectativas da Formação Inicial

B) A participação dos formandos

A participação e colaboração dos formandos dependem eventualmente das suas motivações mas também das suas expectativas. As diferentes motivações das formandas relativamente ao ensino são boas, embora revelem percursos de aprendizagem algo diferenciados. Sobre o desenvolvimento da identidade profissional, Alarcão e Roldão concluem que “é um processo individual, personalizado, único, com forte influência contextual, mobilizado por referentes do passado e expectativas relativas ao futuro” (2008:34).

A F2 tem antecedentes familiares na profissão docente e a F3 valoriza a importância que os seus próprios professores tiveram na sua vida de estudante. De comum, as três formandas revelam o seu interesse e gosto pelas línguas, pela

122 comunicação e pelo contacto com os alunos. Por outro lado, as suas expectativas relativamente à Supervisão Pedagógica assentam na ideia de uma aprendizagem importante para a sua vida profissional futura. Uma das formandas afirma:

“ (…)Acho que se eu não tivesse feito o estágio seria uma professora muito diferente daquilo que poderei ser daqui para a frente.”(Anexo 3)

Do ano de formação no estabelecimento de ensino, as formandas esperam uma formação pedagógica adequada, um alargamento de conhecimentos a nível da didáctica de ambas as línguas, mas sobretudo uma possibilidade de experiência de prática pedagógica diversificada e um contacto com a realidade escolar nomeadamente com os alunos. Esperam, em última instância, caminhar para uma inovação e autonomia pedagógicas, tendo consciência de que é algo que se vai construindo autonoma e colaborativamente. Há a consciência de que a formação inicial é, afinal, um processo inacabado. Diz uma das formandas:

“ (…)disse ao meu pai este estágio é como tirar a carta de carro. Tiramos a carta de carro, depois de termos a carta é que vamos aprender a conduzir.”(Anexo 4)

A integração das três formandas na escola parece ter sido boa tanto a nível da sua participação nas tarefas globais da sua formação no estabelecimento de ensino público em questão como na relação estabelecida com todos os membros da comunidade educativa, em particular os supervisores pedagógicos de ambas as disciplinas da formação.

Relativamente às relações pessoais entre formandas, parecem ser globalmente razoáveis mesmo que, em determinados momentos, se tenham verificado pequenos conflitos. A relação entre a F1 e a F3 parece ser a mais estreita entre as três pois, como ambas mencionam nas entrevistas, os feitios são compatíveis, tinham uma experiência de trabalho conjunto no ano anterior na faculdade, este ano partilham o aluguer da casa, passam muito tempo juntas e trabalham colaborativamente com frequência. Já no que diz respeito à relação pessoal entre a F1 e a F2 parece ter-se degradado nos últimos tempos do estágio, como comprovam os testemunhos das entrevistas. Aparentemente, a

123 F3 mantém uma boa relação com ambas as colegas dado que, como característica individual, parece ser uma pessoa que evita interacções que levem ao conflito.Tentamos, de seguida, reproduzir um esquema ilustrativo das relações interpessoais presente no grupo dos formandos em que F2 surge um pouco à margem da relação da tríade:

Fig.18- As relações interpessoais das formandas

Para uma análise sistémica da relação entre as três formandas e o alegado conflito entre F1 e F2, deveríamos ainda ter em consideração outros dados que não nos foram disponibilizados como, por exemplo, o historial da relação das três, porque sabemos que a causa imediata de um conflito não é a verdadeira causa mas a história da relação dos intervenientes (Costa, 2008).

Uma das formandas expõe a situação, começando a falar a propósito do trabalho colaborativo:

“(…)mais com a F1, havia mais facilidade já que morávamos juntas, comigo e com ela formou-se mais uma ligação mais de amizade então isso também ajudava para que nos ajudássemos mais uma à outra. Mas de resto acho que até tivemos uma boa relação as três, fora o percurso final, o conflito entre a F1 e a F2 em que eu fui um bocado apanhada pelo meio mas, mas fora isso acho que até correu bem.”(Anexo 5)

Será justo dizer-se que a relação afectiva entre formandas é um factor que parece promover a colaboração no trabalho e a entre-ajuda. No processo de construção de saberes, quanto mais os alunos ou formandos forem solicitados a intervir, mais eles se sentirão reconhecidos e mais se envolverão (Morissette, 2002). Esta abertura na comunicação relacional deve ser então favorecida pelos supervisores no sentido de, por

124 exemplo ao identificar momentos de tensão entre formandas, desenvolver estratégias de gestão de conflitos de forma consensual e imparcial. Refere uma das formandas:

“O orientador, era isso que eu ia dizer, tem de ser praticamente um acrobata porque, eu acho que sim, tem de ter muita elasticidade, porque não…como é que eu hei-de dizer, pronto, isto todos os professores mas sobretudo os orientadores porque trabalham, neste caso é um núcleo de estágio com três pessoas, apesar de nós nos darmos relativamente bem há sempre conflitos, há sempre coisas com as quais não concordamos como toda a gente em qualquer momento da sua vida, e os orientadores têm de conseguir dizer não a uma pessoa, dizer sim a outra mas sem dizer o não e o sim sem dar razão, sem dar explicitamente razão a uma pessoa e tirar a da outra e fazer uma gestão do grupo que acho que isso deve ser difícil fazer uma gestão do grupo por isso é que eu acho que o ramo educacional em relação a isso acho que não… não ensinam os professores a gerirem grupos (…)”(Anexo 4)

Em suma, e da análise dos números respeitantes às interacções em seminário, verificamos que os formandos intervêm pouco no debate e que, segundo a leitura das notas de campo e das entrevistas, interagem sobretudo quando são directamente solicitados. Na generalidade, há pouca iniciativa de tomada de palavra por parte dos formandos qualquer que seja a temática do seminário. Por outro lado, constata-se também pouca interacção entre os próprios formandos no decorrer dos seminários. Algumas intervenções dos formandos nem sempre são de qualidade, ou seja, a maior parte das vezes não trazem informação adicional ao que já foi referido e o tempo de posse da palavra é francamente reduzido relativamente ao dos supervisores.

A falta de iniciativa na tomada da palavra parece ter origem, entre outros factores, na indefinição da identidade profissional dos formandos. Comunicar com os outros é, afinal, sentir-se reconhecido pelo que se é e não por aquilo que o outro quer que ele seja, ou ainda, é “ se sentir entendu dans sa différence, dans ses mots, dans son ressenti et dans son expérience de vie”( Salomé, 1997). Apesar das identificações que vão fazendo com os diversos profissionais com quem contactam na escola e da afinidade que sentem com a profissão, o sentido de pertença não é suficientemente interiorizado por falta de uma prática lectiva mais intensiva, por falta de maior

125 responsabilidade nas actividades a desenvolver e pelo próprio nível etário em que se encontram. Uma das formandas revela:

“(…)é a tal ideia que sou igual aos alunos fisicamente, que se estiver ali no meio dos alunos ninguém me distingue deles e então isso também não contribui para me sentir naquele patamar acima, em termos de estatuto entre aspas.”(Anexo 5)

O formando é um aluno-estagiário que talvez se identifique ainda mais com os próprios alunos que tem na sala de aula do que com os professores. Por conseguinte, o seu estatuto e poder enquanto professores são relativos, temporários e, por isso, incertos. Na organização dos sistemas, quando as fronteiras entre as hierarquias são confusas, a individualização torna-se mais difícil. Na realidade, neste modelo de estágio pedagógico, as formandas são “meio-alunas, meio-professoras”, o que lhes confere uma identidade difusa.

O Supervisor de Inglês, na sua entrevista (Anexo 2), refere a questão da imaturidade dos formandos, por um lado, mencionando a “necessidade emotiva” que cada vez mais demonstram ter em relação ao supervisor e, por outro lado, a “proximidade cultural” que têm com os alunos. Apesar desta evidência, as relações positivas dentro do grupo devem sustentar-se na cooperação e não num sistema de competição ou baseado em recompensas classificativas.

Umas das formandas desabafa:

“(…)mas enquanto aluna é um bocado chato nós estarmos a partilhar uma coisa com pessoas que sabemos que podemos estar a prejudicar outra pessoa, uma outra pessoa, um colega nosso, podemos estar a prejudicar, não é, e falar abertamente com os orientadores, os orientadores apesar de serem pessoas também são as pessoas que dão as notas por isso nós nunca queremos prejudicar ninguém, não é, a não ser que seja propositadamente e que vou falar com a orientadora só mesmo para ver se ela baixa a nota à outra pessoa, não é, mas como não faço isso…”(Anexo 4).

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3.2.4. A Pedagogia da Autonomia

“Desenvolver uma pedagogia para a autonomia em contexto escolar significa