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3. METODOLOGIA DE PESQUISA

3.1 A Pesquisa Qualitativa

Esta seção aborda a metodologia da pesquisa e está organizada em oito partes. A primeira trata da natureza qualitativa da pesquisa, seguida do método de investigação adotado para este estudo (pesquisa-ação). Em seguida apresentamos os papéis do pesquisador e dos participantes da pesquisa, os princípios que regem este estudo, os instrumentos de coleta de dados, o contexto da pesquisa, a descrição do tutorial e o perfil dos professores participantes.

Para o desenvolvimento desta pesquisa, optamos pela metodologia de pesquisa qualitativa. A pesquisa qualitativa é um campo de investigação que atravessa disciplinas, campos e temas (CHIZOTTI, 2006; DENZIN e LINCOLN, 2006; EL ANDALOUSSI, 2004). Inicialmente usada nas ciências sociais e comportamentais, a pesquisa qualitativa passou a influenciar a forma de se fazer pesquisa na educação, na história, na ciência política, na medicina, na enfermagem, na assistência social e nas comunicações (CHIZOTTI, op.cit.).

A pesquisa qualitativa é hoje um campo transdisciplinar e que conta com multimétodos de investigação (CHIZOTTI, op.cit.). Alguns desses métodos investigativos incluem a entrevista, a observação participante, história de vida, testemunho, análise do discurso, estudo de caso, entre outros. O estudo qualitativo também pode ser caracterizado pelo seu tipo de pesquisa, a saber, a pesquisa etnográfica, participativa, pesquisa-ação e o estudo de caso.

Essa abordagem de pesquisa tem uma concepção de verdade que se opõe àquela do paradigma positivista, principalmente por se localizarem dentro de um paradigma socioconstrucionista e interpretativista de pesquisa (TELLES, 2002, p.114). Dentro deste paradigma, a concepção de verdade é tida como algo co-construído pelos agentes de pesquisa. O professor João Telles ao citar Harry Wolcott (1994) defende que “mais do que procurar verdades, a pesquisa em educação deve ser provocadora de reflexões, deve tentar entender e explicar não um mundo pré-fabricado, mas um mundo dinâmico, em constante processo de construção” (TELLES, op. cit. p. 114).

Baseando-nos nesse entendimento visamos com este estudo retratar um contexto que fora construído em decorrência de diversos fatores: políticos, sociais, históricos e culturais. A tentativa de captar essa realidade dinâmica e complexa do fenômeno

educacional dentro de um contexto social num dado momento histórico é um dos desafios da pesquisa educacional (LUDKE e ANDRÉ, 1986).

Nossa opção por esta vertente metodológica baseia-se no fato de que nem sempre os métodos quantitativos possibilitam a análise de aspectos relacionados a questões mais específicas e que não podem ser mensuradas, tais como o nível de aceitação de professores acerca do uso de tecnologias na educação. Na atualidade, a investigação qualitativa vem sendo usada cada vez mais na pesquisa em educação por esta trazer em si a possibilidade de ir além dos números “que muitas vezes escondem a dimensão humana, pluralidade e interdependência dos fenômenos educacionais na escola” (TELLES, op.cit., p. 102). Ademais, os estudos qualitativos “buscam descrever e explicar os fenômenos educacionais ao ponto de vista dos participantes da pesquisa” (TELLES, op.cit., p. 114). Concordamos com Antonio Chizotti (2006, p.28) que o termo qualitativo envolve uma “partilha densa com pessoas, fatos e locais que constituem objetos de pesquisa, para extrair desse convívio os significados visíveis e latentes que somente são perceptíveis a uma atenção sensível”.

Diante do que foi exposto, lançamos mão da pesquisa qualitativa para o desenvolvimento desta investigação por esta dar conta de abarcar questões que envolvem aspectos culturais e subjetivos, os quais fazem parte deste estudo.

A metodologia da pesquisa-ação foi o norte para a condução deste estudo. Também recorremos aos princípios da pesquisa etnográfica e usamos uma variedade de métodos oferecidos pela pesquisa qualitativa. Ao usarmos vários métodos, nosso intuito foi o de escolher os instrumentos mais adequados para nos auxiliar na coleta dos dados.

Para o desenvolvimento desta pesquisa nos apoiamos nos estudos feitos por Chizotti (op.cit.); Crookes (1993); Denzin e Lincoln (2006); El Andaloussi (2004); Fetterman (1998); Flick (2004); Freebody (2003); Ludke e André, (op.cit.), Macintyre (2002); Punch (1994); Rosa e Arnoldi (2006) e Telles (op.cit.).

Na próxima seção delineamos os aspectos centrais da pesquisa-ação, que justificam nossa opção por esta modalidade investigativa, traçamos os princípios que regem este estudo e apresentamos os instrumentos utilizados na coleta de dados.

3.1.1 Um Tom Escolhido: Pesquisa-Ação

O interesse por realizar esta pesquisa surgiu com a observação do uso de tecnologias por professores no Centro de Línguas onde leciono. A partir da minha vivência em escolas de línguas da rede privada de ensino, ao entrar para o serviço público como professora encontrei uma série de problemas até então desconhecidos. Por estar acostumada a trabalhar em escolas de línguas que utilizam a tecnologia como aliada no ensino de LE, me causou certo estranhamento deparar-me com uma escola que continuava na geração do quadro, livro e exercícios impressos. Diante dessa nova realidade, busquei na literatura disponível formas de tentar impulsionar o uso de tecnologias nesse novo contexto. Assim, o interesse inicial em procurar soluções para este problema neste contexto de trabalho me levou a optar pela pesquisa-ação:

Na pesquisa-ação, a pesquisa tem a função de diagnosticar uma situação, iniciar uma ação, acompanhá-la, observá-la, conferir-lhe sentido, avaliando-a e incitando-a a desencadear novas ações. A pesquisa permite analisar uma situação para trazer auxílio, esclarecer o significado do comportamento dos diferentes parceiros e também reduzir as divergências entre os participantes para que alcancem objetivos comuns (EL ANDALOUSSI, 2004, p. 86).

Além disso, a pesquisa-ação possibilita “a intervenção do pesquisador dentro de uma problemática social, analisando sua implicação e anunciando sua finalidade, para mobilizar os participantes na pesquisa-ação” (EL ANDALOUSSI, op.cit. p.89; CROOKES, 1993, THIOLLENT, 1982), que se tornam atores, e, ao participar do desenvolvimento da ação, contribuem para a produção de novos saberes e para um projeto de mudança (EL ANDALOUSSI, 2004; CROOKES, op.cit.; TELLES, 2002). Na pesquisa-ação é aceitável que perguntas de pesquisa emerjam de problemas e preocupações próprios do professor (CROOKES, Ibid.; MACINTYRE, 2002; TELLES, op.cit.). Porém, mais do que identificar um problema e resolvê-lo, faz-se necessário o desenvolvimento de um programa de reforma cíclico cujos resultados sejam refletidos, refinados e desenvolvidos em comunidades colaborativas investigativas (CARR e KEMMIS, 1986 apud CROOKES, op.cit.; EL ANDALOUSSI, op.cit.). O caráter cíclico da pesquisa-ação permeia o processo da pesquisa e a reflexão contínua ganha forma através de discussões, de constantes reconsiderações e avaliações que ocorrem na medida em que o estudo se desenvolve (CROOKES, op.cit.; CHIZOTTI 2006; EL ANDALOUSSI, op.cit.; MACINTYRE, op.cit.; TELLES, 2002.). Além disso, merece ser ressaltado que os objetivos podem ser remodelados dependendo dos

resultados de cada fase da pesquisa e dos encontros com o grupo participante (TELLES, op.cit.).

Para Freebody (2003, p.87), o corolário da pesquisa-ação é a melhoria profissional através de colaboração focada. “[Os] proponentes [da pesquisa-ação] objetivam permitir aos professores que eles sejam mais deliberativos e mais responsáveis pelos esforços de mudança da prática educacional”. Nesse sentido, Kemmis (1990 apud FREEBODY, op.cit., p. 88) caracterizou a pesquisa-ação como “consciente acerca do papel da pesquisa como uma atividade social, com uma história”. Ela também é vista como um “conjunto de práticas inevitavelmente seladas e necessariamente informadas por outras práticas sociais tais como a administração burocrática, o trabalho disciplinar acadêmico e movimentos sociais ativistas” (KEMMIS, 1990 apud FREEBODY, op.cit., p. 88).

Desta forma, a preocupação inicial em achar formas de alavancar o uso de tecnologias na sala de aula foi sendo refinada e hoje propomos uma série de ações para o uso continuado de TICs na escola em análise. Tais ações serão apresentadas e discutidas no capítulo final desta dissertação. Todavia, assim como destaca Macintyre (2002), levamos em consideração que a pesquisa-ação é muito mais do que o planejamento de uma mudança e sua implementação. No seu transcorrer, a pesquisa demanda contínuas avaliações, que por sua vez podem resultar em emendas, mudanças na estratégia, a necessidade por mais tempo ou talvez a redefinição da própria pergunta de pesquisa (MACINTYRE, op.cit.; EL ANDALOUSSI, 2004).

A pesquisa-ação pode ser representada por fases. Chizotti (2006, pp.86-87) condensou modelos de pesquisa-ação elaborados por diversos teóricos (BARBIER, 2002; CARR e KEMMINS, 1983; ELLIOT, 1973; KEMMINS e MCTAGGART, 1988) reorganizando-os em seis fases:

Quadro 7: Fases da Pesquisa-Ação

1. Definição do problema: pressupõe a determinação da instituição que se quer estudar ou do problema que se quer resolver.

2. Formulação do problema: pressupõe que, tendo definido e formulado claramente o problema que se quer resolver, é necessário coletar e analisar as informações, documentais ou orais, necessárias para se definir quais as melhores ações possíveis para a solução desse problema e eleger a mais adequada para ser experimentada.

3. Implementação da ação: supõe um plano de execução, com especificação dos objetivos, das pessoas, lugares, tempo e meios. O plano deve auxiliar nas negociações prévias com todos os

envolvidos para que tenham clareza do que se quer e para posterior avaliação dos resultados alcançados.

4. Execução da ação: ela é acompanhada em todos os seus aspectos, desde sua apresentação até os resultados obtidos para que sejam relatados e os envolvidos possam avaliar a adequação e as insuficiências da ação realizada e, depois, essas insuficiências possam ser discutidas, analisadas e, finalmente, os aspectos que apresentarem resultados inadequados serem corrigidos.

5. Avaliação da ação: a avaliação dos resultados da ação implementada deve provocar a redefinição do problema e a revisão do plano, se necessário, e produzir a proposição de um novo plano para uma ação ulterior que deverá ser objeto de nova análise e avaliação dos resultados.

6. Continuidade da ação: o relatório dos planos executados e dos resultados obtidos devem auxiliar a discussão partilhada dos impasses encontrados e das soluções dadas, para que os interessados ampliem a compreensão da situação problemática e das condições que a envolvem, mantenham consenso sobre os encaminhamentos da pesquisa de modo que se sintam solidários com as ações escolhidas, implementadas e com os resultados e as consequências delas.

Na pesquisa-ação a articulação entre pesquisa e ação ganha uma importância que talvez em outras formas investigativas não exista de maneira tão destacada. Esta articulação se repete na relação entre participantes da pesquisa e pesquisador:

Consideradas isoladamente, a pesquisa e a ação pouco importam. É o hífen que as une que define a pesquisa-ação e lhe atribui um status de interseção entre pesquisa e ação. Esse hífen é considerado uma indicação da fusão fecunda da pesquisa e da ação em uma perspectiva transformadora dos valores e das atitudes, tanto dos pesquisadores como dos atores. Sob essa perspectiva a relação entre pesquisadores e atores é orgânica, porque é geradora do trabalho de ambos. É somente nessa ótica que parece mais justo declarar que não se pode haver pesquisa sem ação e ação sem pesquisa (EL ANDALOUSSI, 2004, p. 102).

Nesse sentido, a pesquisa-ação incorpora vários modos de pesquisa, articulando teoria e prática, lançando mão de estratégias que associam pesquisadores e participantes da pesquisa na realização de um projeto comum (EL ANDALOUSSI, op. cit.). Ademais, “as relações entre pesquisador e participantes da pesquisa tornam-se objeto de trocas, negociação, cooperação, aliança, etc.” (EL ANDALOUSSI, op.cit. p.102).

Prosseguiremos nosso estudo abordando o papel do pesquisador e dos participantes da pesquisa dentro da pesquisa-ação.