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Capítulos

1.2 A política moderna brasileira.

uma imagem dicotômica retirada do texto “Política e Letras”, do crítico literário Alceu de Amoroso

teria balançado feito um pêndulo entre a autonomia municipal - domínio do poder privado - e a centralização federal - domínio do poder público.

Esse movimento institucional teria ocorrido, segundo a autora, em virtude de uma série de interpretações da realidade brasileira feitas numa chave dicotômica, opondo de maneira maniqueísta o bem público (poder central) do mal privado (poder local). Tais interpretações de ideólogos clássicos do Brasil8 embasaram aquela oscilação através de projeções da falsa solução pela eliminação

de um dos dois pólos de poder. Essas interpretações dicotômicas teriam se reproduzido desde o municipalismo de Tavares Bastos, nos anos 10, até a defesa de uma centralização tecnocrata, nos

8 Como, por exemplo, Oliveira Viana em Populações meridionais do Brasil. Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2005.

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essas mudanças institucionais dos regimes políticos da primeira metade do século XX. O resultado ou melhor, a longa disputa na história política brasileira entre a centralização por esferas federais modernização política do país.

Pinheiro Machado. Rui Barbosa, como a imagem do homem inteligente, respeitadíssimo, mas que nunca obteve sucesso eleitoral, sendo uma espécie de paradigma do republicanismo teórico, admirado porém sem maquina eleitoral. Já Pinheiro Machado era o signo dos compromissos de caudilhos em meio às oligarquias estaduais, um homem que fazia os presidentes, notado mais pelas exímias capacidades de articulador político do que por suas explanações teóricas, sendo o símbolo do domínio político local sob o qual a Política dos Governadores teria construído a sua capilaridade. O Drama da República, conforme Alceu Amoroso Lima quer demonstrar, e numerosos outros pensadores tempo constitutiva da política nacional e desintegradoura de suas possibilidades de desenvolvimento nos marcos da modernidade ocidental. Ou seja, ela se situava na fronteira entre o público e o privado, sendo essa a sua principal marca e também o seu dilema, pois, como o texto magistralmente indica, o Brasil não era Rui ou Pinheiro, era Rui e Pinheiro (GOMES: 1998: 496).

A tragédia das instituições políticas brasileiras que a imagem remete constituiu o dilema da política nacional. Segundo Gomes (1998), essa situação se desdobra de outras formas e com outras faces ao longo de quase todo o século XX. Aquela leitura da realidade brasileira se constitui como o impasse de um processo de modernização que necessitava sempre ser disparado pela esfera estatal no sentido de atenuar o poder de oligarquias arraigadas ao domínio local.

premissas. De um lado, o reconhecimento de um certo paradigma de política moderna, entendida como o mundo dos cidadãos racionais e dos procedimentos públicos impessoais, mundo existente de fato nos países desenvolvidos. De outro lado, a necessidade de compreensão de uma realidade social que com ele

Na raiz do diagnóstico estaria um conjunto de oposições: de um lado, o país representado pela sociedade rural exportadora, domínio descentralizado do poder patriarcal, clientelista e oligárquico, e de outro lado, um país otiundo de uma sociedade urbano-industrial, com raízes no poder centralizado do Estado, sob bases impessoais e racionais de uma burocracia técnica. Essa interpretação dualista da formação social brasileira seria a responsável pela avaliação dos males que ambos os lados estariam penetrados por vícios e virtudes.

As instituições políticas brasileiras não escaparam dessa ambiguidade e a modernização do país patinou na falsa solução da eliminação de um dos pólos. Na década 1930, durante o Estado Novo, sob a mesma leitura se promove uma inversão, contra o excesso de poder privado ataca-se o paradigma do Brasil liberal, e a arquitetura institucional de partidos e do parlamento são desmontados

A perversão da máquina oligárquica da Política dos Governadores durante a Primeira República correntes políticas e intelectuais que tomaram por base uma real impossibilidade de adaptação no Brasil do modelo de Estado Liberal.

Os ideais da autoridade racional-legal e da economia urbano-industrial são mantidos como signos de uma sociedade moderna, porém os instrumentos operacionais e as instituições políticas da materialização daquele projeto de modernização sofrem mudanças substanciais e a arquitetura liberal defendida por Rui Barbosa é colocada abaixo. A ideia de uma equidade do individuo cidadão, portador de voto e opinião, passa a ser contestada por uma suposição da desigualdade natural dos seres humanos que não poderiam ser tratados da mesma forma perante a lei. As críticas acentuavam a importância da criação e fortalecimento de instituições estatais - órgãos e políticas públicas - como o mecanismo para o estabelecimento da modernidade no país.

Um dos mentores da proposta de um Estado autoritário e corporativo, Oliveira Vianna, publica em as Populações meridionais do Brasil as causas do “atraso” político do “Brasil real” como o domínio do poder privado. A sociedade brasileira formada pelo ruralismo e pelo escravismo teria gerado um padrão de sociabilidade centrado na família e na autoridade pessoal do grande proprietário. Esta herança do domínio rural - o seu espírito de clã - emperrava segundo Vianna o desenvolvimento moderno brasileiro, pois qualquer associação que escapasse a família era tolhida. A falta de autoridade estatal sobre esse ambiente não teria gerado o espírito corporativo característico do ambiente urbano, para enfrentar essas tendências de sociabilidades enraizadas na terra era importante o poder central, metropolitano ou nacional, que agisse pelo desenvolvimento e pela proteção dos cidadãos. Uma inversão do Absolutismo como o único meio de construção de um Estado Moderno orientado por procedimentos racionais e burocráticos.

Após os anos de 1930, encerrando a breve abertura da Constituição de 1934, tendo reprimido ambos os lados de movimentos radicais - do PCB à Ação Integralista - o grupo em torno de Getúlio Vargas amadurece, com o apoio de forças militares e o respaldo de concepções políticas

República. A premissa era desmanchar a arquitetura institucional republicana baseada na separação de poderes com a criação de um Estado forte e “democrático” mediante a revitalização do sistema presidencial de governo. O Estado seria um órgão de coordenação, direção e iniciativa da vida política, funcionando como instrumento estratégico da lei, da justiça e do desenvolvimento econômico e social.

A nova democracia se fundaria numa negativa da sociedade baseada em dissensos e o Estado seria o organismo da unidade em diversos níveis institucionais, econômicos, sociais e políticos. Esse arranjo se assentaria em representações de bases diversas para a consolidação de um

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Estado Moderno e nacionalista, sua capilaridade estaria nas especializações técnicas, com a criação de órgãos, departamentos e institutos que possuiriam o objetivo de absorver demandas sociais. Tais repartições seriam os novos meandros de um Estado corporativo baseado em sindicatos, conselhos Projeto corporativo e fortalecimento do sistema presidencial de governo eram as duas pedras de toque de

alcançaram um amplo compartilhamento junto à população e deixaram marcas profundas e duradouras na vida política do país (GOMES: 1998: 518)

uma das peças de estruturação de um Estado corporativo. A sua institucionalização em esferas industrial que demandava uma reconstrução de saberes e práticas urbanísticas nas cidades brasileiras. Se no complexo processo de mudanças históricas, ideias e eventos sociais estão mutuamente emaranhados, “reconstrução” de saberes e de práticas urbanísticas instaladas nas cidades brasileiras. Ao longo administração pública, do desenvolvimento urbano terão um correspondente no campo do urbanismo (FELDMAN: 2010; 51)

Algo que já vinha sendo defendido por Saturnino de Brito em grande parte dos seus relatórios técnicos elaborados desde o início da Primeira República. A tônica dos argumentos políticos desse engenheiro sempre foi a de que as reformas sanitárias fossem realizadas sob a tutela de comissões estaduais de saneamento para que os planos não se fragmentassem sob ação perniciosa de oligarquias locais e fossem executados em seu conjunto abarcando a totalidade da cidade.

Não exatamente como advertia Saturnino de Brtio, entretanto, a reestruturação da administração pública realizada por Getúlio Vargas terá correspondência no âmbito do urbanismo. Assim, novas instituições são criadas nesse processo de reaparelhamento estatal como no caso das Comissões de Planos ou Departamento de Urbanismos vinculadas às administrações municipais, estados, mas também dos municípios do interior do país.

professor da disciplina de urbanismo da Escola Politécnica de São Paulo, Luís Inácio de Anhaia Mello. Segundo a autora, desde os anos 30 a teoria administrativa brasileira possuía o modelo de centralização do serviço público com a criação do Dasp - Departamento Administrativo do agências locais para operar também nos estados e municípios.

para a gestão municipal, em geral, e para as questões de urbanismo, em particular, como veremos adiante. A ideia de desvincular as questões de urbanismo da política já está presente em seus textos do

anos de 1920 e 1930, quando defende a Comissão do Plano como orgão por excelência para as questões Lei 431 estão explicitados em dois textos escritos nos anos de 1940 (FELDMAN: 2005: 48)

é inviabilizada pela campanha municipalista e aquele projeto modernizador será recoloccado sob a tutela do município. Dessa maneira, os primeiros orgão públicos particularmente pensados como o setor de urbanismo estarão sob a esfera das intituições municipais. Diante disso, Feldman (2005) destaca como característica desse início a não efetividade dos Planos Urbanos que acabaram marcados como “plano-discurso”. Porém, com o passar dos anos e a consolidação cada vez maior das instituições de urbanismo se verá a penetração dessa disciplina em esferas da administração urbanistas e grupos dominantes ou as camadas populares atingidas pelas reformas.

para executar obras de seu interesse, atendendo as partes da cidade que lhes interessavam, e atendendo às necessidades de abrir frentes para os interesses imobiliários. Posteriormente, os planos, por abordarem unicamente como discurso (FELDMAN, 2005: 23)

pincela a trajetória de José de Oliveira Reis irá atravessar como funcionário do urbanismo no Rio de Janeiro justamente o período do pêndulo em que movimento de centralização getulista será construção institucional dos setores de urbanismo nas administrações municipais brasileiras, se torna um dos protagonistas no processo em que a disciplina deixa de ser um campo de formação Dessa maneira, segundo aquela abordagem levantada por Ângela de Castro Gomes (1998), qual teria sido o percurso de Saturnino de Brito e José de Oliveira Reis no drama da política moderna brasileira? Quais teriam sido os dilemas enfrentados no âmbito de uma administração municipal brasileira? Primeiro por Brito, ao ser contratado para incorporar os trabalhos da Comissão sobre Abastecimento d’Água da Câmara Municipal de Ribeirão Preto em 1912, e posteriormente por José de Oliveira Reis quando é convidado em 1945 para elaborar o Plano Diretor da cidade, além de colaborar com os trabalhos da Comissão Especial do Plano do município.

urbanismo abrangem a cidade como uma totalidade, a aplicação de seus Planos Urbanos de forma integral acaba em choque com interesses particulares sobre o domínio de uma territorialidade:

Mesmo que a maior parte deles seja prudente na delimitação de suas estratégias cognitivas, em função imobiliários rentistas ou as companhias de serviços urbanos (TOPALOV: 1991: 30).

Desse modo, quais seriam as vicissitudes desse processo de institucionalização do urbanismo frente à administração municipal de Ribeirão Preto como o lócus das ambiguidades do

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processo de modernização nacional? A relação entre estes novos especialistas do espaço urbano e uma posição crítica aos poderes locais instituídos e ao desenvolvimento desorganizado da cidade, e a apropriação pelos políticos locais de fragmentos dos planos e relatórios dos urbanistas, dotando decisões enviesadas pelos interesses oligárquicos com as etiquetas e carimbos de credibilidade que os nomes dos urbanistas conferiam.