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A procura de um modelo mutualista duradouro

Parte 1 Origens e Problemáticas do Mutualismo Português

1.6. Problemas do mutualismo português

1.6.1. A procura de um modelo mutualista duradouro

Desde o trabalho da Comissão de 1866 que elementos como a falta de dimensão das associações, a sua excessiva concentração em Lisboa e no Porto e a sua prodigalidade têm sido referidos na literatura como entraves ao desenvolvimento do movimento em Portugal, sendo um problema que se terá mantido até 1930. Exemplificamos essa manutenção recorrendo à análise de Domingos Cruz em 1931. De entre os problemas apresentados pelo autor, destaca-se a carência de sócios, as elevadas despesas com administração, o alto custo dos medicamentos e do serviço médico, a organizações deficientes no que respeita à administração e à governação, a falta de cálculos científicos que conduziam à excessiva prodigalidade, uma generosidade presente no acumular de diversos fins associativos que potenciava os riscos financeiros, em particular a prática do socorro na inabilidade continuar a estar a ser oferecida pelas associações que prestavam cuidados de saúde. Acresce aqui, numa perspetiva distinta destas, a desonestidade dos diretores das associações que aproveitam a ignorância das classes menos favorecidas da sociedade para lhes impor organizações com futuros bastante incertos337. Acresce aqui também a incapacidade de as associações mutualistas resolverem em conjunto o problema de excessiva dispersão, da falta de dimensão e de concorrência entre as associações, de acordo com as soluções já identificadas, ou seja, criando federações entre si para os diversos serviço e órgãos de fiscalização e de monitorização eficazes que impendessem os abusos e a governação deficiente. Mantinha-se também a incapacidade dos poderes públicos para suportarem o mutualismo na tentativa de se reorganizar, aprovando legislação eficaz e colocando-a em prática338.

Na verdade, os dados existentes na documentação consultada parecem comprovar as teses de Domingos Cruz. Excluímos aqui uma análise mais positiva se nos focarmos apenas mo número de associações e de associados. Com efeito, se atendermos à identificação do número de associações e de associados para os anos de 1880 e de 1930, datas que configuram os limites existentes para a existência de documentação estatística de fiabilidade comprovada, não obstante algumas limitações da mesma, podemos confirmar que o movimento teve um crescimento de cerca de 113% no número de

337 Referindo-se às associações que prestavam socorros na saúde, Domingos Cruz refere que as quotas, de

valor diminuto, eram insuficientes para suportar os cursos com os medicamentos. Domingos Cruz, op. cit., 1933, p. 25-26.

associações, e de 639,6% na quantidade de associados339. Já entre 1878 e 1930 a população portuguesa cresceu 49,6%, o que significa que o desenvolvimento do mutualismo, quando contabilizado na quantidade de associados, acompanhou e até superou o crescimento da população portuguesa. Não obstante alguma negatividade, residem nestes números alguma contradição entre existente as opiniões de autores coevos e a literatura já referida, que perseguem uma perspetiva mais otimista.

Procurando aferir com maior acuidade a vitalidade do movimento mutualista entre 1880 é possível aferir essa vitalidade, não obstante a existência de alguns elementos negativos apresentados por Domingos Cruz. O Inquérito de 1880 apresenta a existência de 276 associações contendo 100 162 associados. Estes números incluem os dados contidos no inquérito, mas não contabilizam a informação referente a oito associações que não os enviaram, uma lacuna que nos alerta para as deficiências do inquérito como documento totalmente ilustrativo do mutualismo português em 1880. Por sua vez, em 1930 existiam 522 associações e 589 745 associados, não contabilizando aqui os do Montepio Geral e os do Montepio Oficial. A comparação dos dados de 1880 e de 1930 permite aferir alguns dados significativos.

Gráfico 4

Comparação da Distribuição das associações por distritos em 1880 e 1930 (%)

Fonte: Inquérito de 1880; Boletim da Previdência Social (1930)

Por um lado, que a distribuição geográfica do número de associações (excluindo-se o Montepio Geral e o Montepio Oficial nos dados de 1930, associações que se

339 AHMOP, Questionário dirigido às Sociedades de Socorro Mútuo, ordenado por Portaria de 17 de Julho

de 1880, DGCI-RCI-1S23. 0 10 20 30 40 50 % 1880 1930

localizavam em Lisboa) manteve-se quase inalterada de 1880 para 1930. Destaca-se a grande predominância dos distritos de Lisboa e do Porto, contabilizando no seu conjunto 67,75% das associações em 1880 e 69,92% em 1930, tendo em conta, ainda assim, os ajustamentos na organização administrativa ocorridos durante o período, nomeadamente a criação do Distrito de Setúbal, em 1926. Acentuou-se, desta forma, a predominância de Lisboa, que tinha 118 associações em 1880, passou para 215 em 1930, enquanto o Porto evoluiu de 69 para 150 nas mesmas datas. Nos outros distritos, destaque-se Portalegre que passou de 4 para 8, Viana do Castelo, que passou de 4 para 8 associações, Braga, que evoluiu de 6 para 13 embora estes distritos mantivessem o seu peso relativo face ao total de associações a nível nacional340. Os dados demonstram também uma estagnação no número de associações diz respeito, nos distritos de Bragança, Castelo Branco, Guarda, Leiria, Vila Real, Angra do Heroísmo, Horta e Ponta Delgada, que mantiveram ou decresceram o número de instituições, o que se materializou de uma perda relativa do mutualismo nestes distritos face ao total de associações. Reporta-se, desta forma, duas tendências claras nos dois períodos: o reduzido e disforme nível de expansão do mutualismo pela totalidade do território português e a sua excessiva concentração nos distritos de Lisboa e do Porto. Estes dados permitem-nos estabelecer algumas relações com o desenvolvimento do mutualismo e a evolução da taxa de urbanidade em Portugal, fator comummente apresentado na literatura internacional como potenciador do mutualismo. Sugerimos, a esse respeito, que o reduzido nível de urbanização de Portugal no período em estudo terá sido determinante para o pouco desenvolvimento do movimento.

No que respeita à percentagem da população mutualista por distritos, fazemos acrescer àquela já apresentada para 1880, os dados que Godolfim nos apresenta, notando a mesma tendência341. Apontamos que dos 17 distritos apresentados para 1883, apenas quatro têm taxas de população mutualista face à população total do distrito acima de 1% (Évora, Faro, Porto e Lisboa). Se tivermos em conta que globalmente cerca de 12 % da população portuguesa vivia em cidades no censo populacional efetuado em 1878, notamos que a capacidade de sedução do mutualismo em Portugal se revelou bastante diminuída. Note-se, todavia, que a impossibilidade de classificar a população mutualista no que respeita à sua ocupação profissional não permite aferir a percentagem da

340 AHMOP, Questionário dirigido às Sociedades de Socorro Mútuo, ordenado por Portaria de 17 de Julho de 1880, DGCI-RCI-1S23; Anuário Estatístico de Portugal, 1930, Lisboa, Imprensa Nacional, p. 99. 341 Costa Godolfim, op. cit., 1883, p. 15.

população mutualista que tinha ocupação ligada aos ofícios, à indústria e aos serviços, e aquela proveniente do mundo rural. No entanto, o trabalho de Francisco Grilo editado em 1912, defendendo uma mutualidade específica para os trabalhadores rurais sugere-nos que o movimento mutualista apenas residualmente seduzia as populações rurais, quando considerados pela sua atividade profissional342. O mutualismo era, desta forma, extremamente dual na distribuição geográfica, encontrando-se em 1880 e em 1930 extremamente centrado em Lisboa e no Porto.

Gráfico 5

Distribuição do número de associados por distrito (1880-1930)

Fonte: Inquérito de 1880; Boletim da Previdência Social (1930-1931)

Com efeito, a tendência de predominância de Lisboa e do Porto manifesta-se na distribuição do número de associados, atingindo as duas cidades um total de 78,64% do total em 1880 e 83,09% em 1930. Note-se que Lisboa continha 51 636 de um total de 100 152 associados, em 1880, passando para 274 083 dos 589 745 associados existentes em 1930, enquanto o Porto nas mesmas datas contabilizava 27 124 e 36 614, respetivamente. Nos restantes distritos, destaque para evolução que o movimento conheceu em Aveiro, passando de 0,35% para 1,77% dos números de membros total, e o significativo decréscimo no distrito do Funchal, diminuindo de 3,70% para 1,19% em 1930343.

Lembramos que no Inquérito de 1880 o distrito de Setúbal ainda não tinha sido criado. Um segundo elemento apresentado pelas reflexões mutualistas desenvolvidas desde

342 Ver José Francisco Grilo, Mutualismo Rural e Crédito Agrícola, Lisboa, Livraria Ferin, 1912.

343 AHMOP, Questionário dirigido às Sociedades de Socorro Mútuo, ordenado por Portaria de 17 de Julho de 1880, DGCI-RCI-1S23; Anuário Estatístico de Portugal, 1930, Lisboa, Imprensa Nacional, p. 99.

0 10 20 30 40 50 60 % 1880 1930

meados do século XIX reside na reduzida dimensão das associações como um fator limitativo ao desenvolvimento do movimento. Os dados existentes no inquérito de 1880 demonstram-no, todavia, uma realidade substancialmente diferente. Em 1880, com efeito, 18,12 % das associações tinham menos de 100 associados, 30,07% das mesmas entre 101 e 250, 24,64% entre 251 e 500 membros e 22,10 % mais de 500 inscritos, sendo que as restantes não apresentam dados relativos ao número de associados. Em termos médios, cada associação teria 362,9 associados, uma média superior aos 319,5 associados por associação obtidos segundo os dados de 1883 apresentados por Godolfim, sendo que este autor não inclui dados para as ilhas344. Estes números surgem paradoxais à identificação, pelos coevos, de um grande volume de associações com um número reduzido de associados. Uma possível justificação para esta contradição reside no facto de que um grande número de pequenas instituições não era incluído nos inquéritos oficiais, o que justificaria esta dimensão média elevada de cada associação, quando contrastada com as referências dos autores coevos. Domingos Cruz refere a extensa nuvem de associações com reduzidíssimos níveis de organização contabilística e de dados estatísticos, um fator que poderá ter impossibilitado a sua resposta aos inquéritos. Para além disto, a desonestidade mencionada por Domingos Cruz, por Godolfim e por diversas teses apresentadas aos congressos mutualistas de 1911 e de 1916 poderia ser incompatível com a cedência de dados estatísticos. Sugerimos, desta forma, que as pequenas associações, desorganizadas e de efémera duração não terão sido abrangidas por estes censos, fator que fez aumentar exponencialmente a dimensão médias das associações recenseadas.

O período compreendido entre 1891 e meados da década de 1920 revelou-se bastante ambíguo para o mutualismo português. As duas décadas foram marcadas, por um lado, pelo aparente dinamismo demonstrado pelo número de associações e de associados, e por um movimento intenso de reflexão interna que pretendeu eliminar alguns dos entraves ao seu desenvolvimento identificados nas décadas anteriores. Por outro lado, as associações enfrentaram um quadro socioeconómico e político difícil, definido pela propagação dos efeitos da crise do início da década de 1890, pela instalação de um novo regime político e a consequente alteração as políticas sociais do Estado, em 1910, pela entrada de Portugal na I Guerra Mundial e por uma marcante inflação e hiperinflação que caracterizou o primeiro após-guerra e que duraria até cerca de 1924345.

344 Cf. Costa Godolfim, op. cit., 1883, p. 15.

345 Note-se que entre 1914 e 1924 o índice oficial do custo de vida foi multiplicado por três, enquanto

A literatura tem, precisamente, vincado este dinamismo. Miriam Halpern Pereira designa mesmo a última década do século XIX e as primeiras do século XX como de «anos dourados» do mutualismo português346. Para a Halpern Pereira, a expansão do movimento mutualista neste período terá resultado de uma maior intervenção do Estado no mutualismo, identificando três vias complementares e evolutivas dessa intervenção. Em primeiro lugar, nos benefícios que a legislação aprovada em 1891 e em 1896 trouxe ao movimento347. Em segundo lugar, na boa relação que passou a existir, após 1910, entre os mutualistas e a I República, sobretudo depois do regime republicano ter criado do Ministério do Trabalho e Previdência Social348, no qual passou a existir uma repartição responsável pelo mutualismo incluída na Direção Geral de Previdência Social sob a designação de «1.ª Repartição – Associações de Classe e Mutualistas»349, satisfazendo um desejo manifestado pelos mutualistas no I Congresso Mutualista que se realizou em 1911. Para a autora, a aproximação entre o regime republicano e o movimento mutualista surge justificado no facto dos poderes públicos terem satisfeito grande parte das reivindicações feitas ao Estado no I Congresso Mutualista, que se realizou em 1911. Ou seja, os poderes públicos cederam à promulgação de uma lei sobre acidentes de trabalho, a criação de um fundo que garantia as pensões de invalidez e de velhice o que sustentava a construção de casas para operários e garantisse a participação financeira o Estado no auxílio às viúvas e órfãos350. Para Halpern Pereira, esta colaboração mais estreita possibilitou o crescimento do movimento, passando-se de 628 associações mutualistas, em 1910, para 700 em 1921, tendo havido no mesmo período um crescimento no número de associados de 62% Se compararmos o período que medeia entre 1891 e 1910 as associações atingiram o número de 628, enquanto o número de associados cresceu 174% (o menor crescimento do número de associações é justificado com a fuso existente entre algumas delas)351.

A apresentação do dinamismo do movimento mutualista entre 1891 e a década de 1920 surge também retratada por Vasco Rosendo. Para este autor, terá sido a legislação

Valério, «moeda e bancos», in Álvaro Ferreira da Silva e Pedro Lains (org.), op. cit., 2.º vol., 2010, pp. 227-235.

346 Halpern Pereira, op. cit., 1999, p. 24. 347 Ibidem, p. 25.

348 Criado pela Lei n.º 494, de 16 de Março de 1916.

349 A Repartição das Associações de Classe e Mutualistas era tutelada pela Direcção-Geral de Previdência

Social, que superentendia as associações de socorros mútuos, as federações mutualistas e os tribunais mutualistas.

350 Halpern Pereira, op. cit., 1999, p. 26. 351 Ibidem, p. 25.

aprovada em 1891 e em 1896, e o ambiente favorável ao movimento que se viveu com a I República a sustentar esta vitalidade. Rosendo assenta a sua análise no crescimento do número de associações e de associados, ilustrando com a passagem de 280 associações, em 1891, para 685, em 1921, e num número de associados que cresceu de 250 000 para 615 000352.

No entanto, se entendermos as variáveis analisada pelos autores, a evidência sugere, de facto, um maior dinamismo do movimento mutualista face ao período anterior. Entendemos, no entanto, que é importante atender a outras variáveis que nos sugerem que a caracterização existente na literatura especializada, pautada globalmente por uma visão otimista da dimensão e da vitalidade do movimento mutualista entre 1891 e 1921, deve ser matizada. Em primeiro lugar, como referimos, trata-se de uma leitura correta mas assente quase exclusivamente em três conclusões: a) na constatação que o aumento do número de associações e de associados corresponde, por si só, a uma maior vitalidade do movimento; b) na leitura que a legislação de 1891 e de 1896 pretendeu contribuir para a vitalidade de todas as associações, sobretudo no que respeita à sua organização interna e ao seu equilíbrio financeiro; c) na conclusão de que a relação entre a I República e o mutualismo foi amplamente proveitosa para o movimento a partir da dedução que a criação do Ministério do Trabalho e Previdência Social, em 1916, e a colocação em funcionamento da «1.ª Repartição – Associações de Classe e Mutualistas», organização que constituiu um novo suporte ao movimento.

A acumulação de fins continuou a ser um problema. No que respeita à classificação de acordo com os seus fins, de acordo com o mapa de receitas e de despesas referente 1880, das 276 associações identificadas, 245 prestavam socorros na doença e/ou dispensavam medicamentos, 188 incluíam os funerais nos seus fins, 126 tinham subsídios na inabilidade e 28 atribuíam pensões, sendo que destas apenas quatro apenas tinham as pensões como único socorro353. Ou seja, no universo de 276 associações, estes números demonstram-nos a excessiva acumulação de socorros que as associações detinham em 1880. Este elemento era extremamente arriscado para a saúde financeira das instituições, sobretudo porque os subsídios para a inabilidade constituíam uma despesa permanente e difícil de prever, ao contrário dos socorros na doença, que tinham carácter temporário. Por exemplo, não era possível prever o número de sócios impossibilitados de trabalhar

352 Vasco Rosendo, op. cit., 1996, p. 273.

353 Era comum as associações que ofereciam socorros na saúde acumulares esses socorros com os subsídios

que uma associação viria a ter no caso da eclosão de uma epidemia. Mas, por outro lado, os socorros na saúde podiam ser suspensos, se assim estivesse estatuído354. O mesmo perigo advinha do pagamento de pensões, que obedecia a elementos distintos do socorro na saúde, sendo mais incerta a sua evolução, como veremos no caso do Montepio Geral (v. 2.2.2.4.). Note-se que apesar de não recorrerem a tábuas de doença que permitissem prever aproximadamente a percentagem de sócios doentes no futuro, estes socorros eram estabelecidos de acordo com limites estabelecidos para os dias de doença que os subsídios eram concedidos. Este limite permitia aferir com mais acuidade a verdadeira situação financeira da associação, dado que não havia no valor do subsídio de cada membro doente as incertezas que pautavam o pagamento de pensões, mas apenas quantos membros adoeceriam no futuro.

Este dado é mais significativo se atendermos aos gastos com estes socorros. Com efeito, da percentagem das componentes da despesa referentes a 1880, 71,28% era referente a subsídios a doentes, 4,50% com medicamentos, 0,63% com funerais, 3,34% no ordenado dos médicos, 2,21% para os inabilitados, 7,20% era canalizado para o pagamento de pensões e 10,84% para despesas diversas, onde se destacavam as despesas de administração355. Já em 1930 as associações despendiam 40,2 % das despesas em subsídios pecuniários de vária ordem, 21,9% em medicamentos, 28,7% em administração e 9,1% no ordenado dos médicos356. Note-se que em 1915, de acordo com o Boletim da

Previdência Social, as despesas eram na totalidade de 2683 contos, repartidas por

subsídios pecuniários (66,6%), medicamentos (10,2%), médicos e gastos administrativos (23,2%).357 Denota-se, sobretudo, o aumento da percentagem dos custos da administração, um valor que reflete o aumento do número de funcionários das maiores associações, como o Montepio Geral, em função da sua caixa económica, ou da ASMECL, em função do estabelecimento da sua policlínica, em 1926, mas também uma tendência acentuada de profissionalização dos serviços e algumas desta associações na década de 1920.

Por outro lado, estes valores confirmam a predominância dos socorros na saúde como finalidade maior do mutualismo português e incluem o Montepio na tipologia de

354 Desde 1891 que a legislação previa um auxílio pecuniários dos poderes públicos em caso de epidemia

(n.º 5 do art.º 13.º do Decreto de 28 de Fevereiro de 1891).

355 AHMOP, Questionário dirigido às Sociedades de Socorro Mútuo, ordenado por Portaria de 17 de Julho

de 1880, DGCI-RCI-1S23.

356 Anuário Estatístico de Portugal, 1930, Lisboa, Imprensa Nacional, p. 99.

associações mutualistas com menos expressão no interior do movimento. Esse menor peso relativo não se verifica, todavia, no que respeita ao número de associados, dado que estas associações contabilizavam cerca de onze mil associados em 1880, sendo cerca de 10% do total das associações e agrupavam perto 13% do total dos associados358. Comparativamente a 1930 o quadro era semelhante. Nessa data o número de associações que tinha as pensões como socorro tinha descido para 14, associações que eram cerca de 2,6% das associações, mas contabilizavam 8,1% dos associados359. Este número ascende a 11,5% se acrescermos aqui os associados do Montepio Geral e do Montepio Oficial no final de 1930360.

Para suportar estas despesas as associações recorriam, sobretudo, às contribuições dos seus membros. Na estrutura de receitas referente a 1880, 55,93% era proveniente de quotas, 2,97% de joias, 0,60% de venda de estatutos e 0,84% de multas por atrasos e incumprimentos diversos. Já 22,82% das receitas era proveniente de receitas diversas, a que acrescia os 0,84% de donativos. Por fim, apenas 16,69% das receitas de 1880 resultaram de juros dos valores capitalizados361. Evidenciam estes dados que uma parte

significativa do rendimento das associações provinha dos seus membros ou de rendimentos não regulares e incertos e não da capitalização dos seus fundos.

Recorrendo a Domingos Cruz para aferirmos da situação do mutualismo no inico da década de 1930, podemos verificar, para 1931, que do total de receitas das associações (54 300 contos), 53,3% das receitas foram devidas às contribuições de joias e quotas pelos associados, e 46,6% de receitas diversas362. Domingos Cruz nota que 60,9% dessas receitas eram obtidas em Lisboa, 12,3% no Porto e 26,8% no resto do país. Em média, dos 28 990 contos recebido de quotas e joias, cada habitante em Portugal terá contribuído com $35 escudos anuais, e cada associado 2$34 por mês o que para Domingos Cruz representa uma contribuição muito reduzida, dado serem valores reais inferiores àqueles atingidos antes da I Guerra363.

No que respeita à gestão dos ativos, 1710 contos réis encontravam-se, em 1880,