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A Proposta de Emenda à Constituição n 129, de 06 de agosto de 2003

No documento Negociação coletiva no setor público (páginas 150-153)

5 PERSPECTIVAS DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA NO SETOR PÚBLICO

5.3 A Proposta de Emenda à Constituição n 129, de 06 de agosto de 2003

A Proposta de Emenda à Constituição n. 129/2003 reflete a tendência do atual Governo Federal em relação à reforma sindical e à implementação de mecanismos que fortaleçam a negociação coletiva de trabalho. O Fórum Nacional do Trabalho e as conclusões a que chegou demonstram a preocupação do Governo em criar mecanismos que assegurem à sociedade a utilização da negociação coletiva de trabalho, cujos frutos, o acordo e a convenção coletiva de trabalho, compõem os conflitos de maneira satisfatória para as partes envolvidas, devendo ser assegurada a sua utilização inclusive no setor público.

A Proposta é de autoria do Deputado Maurício Rands (PT-PE) e outros, e tem como relator o Deputado Sigmaringa Seixas. Em 20 de outubro de 2004 a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados apresentou parecer favorável à admissibilidade da Proposta de Emenda Constitucional n. 129 de 2003, cujo objetivo é a alteração da redação do inciso VI do artigo 37 da Constituição Federal, estendendo o direito à negociação coletiva aos servidores públicos.

Conforme a Proposta em exame, a redação do inciso em referência passaria a vigorar nos seguintes termos:

Art. 37 [...]

VI – são garantidas ao servidor público civil, a livre associação sindical e a negociação coletiva, devendo a hipótese de acordo decorrente desta última ser aprovada pelos respectivos Poderes Legislativos.264

Em seu voto, o relator Sigmaringa Seixas comenta que na justificação da PEC os autores salientam que a Constituição de 1988 trouxe reconhecidos avanços para o servidor

264

RANDS, Maurício et al. Proposta de Emenda à Constituição Nº 129, de 2003. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/240623.htm>. Acesso em: 4 maio 2006.

público, inclusive nas suas relações com a Administração. No campo específico dos direitos sociais, assegurou os direitos de greve e de sindicalização, deixando de consagrar o direito à negociação coletiva, tal como fazem as Constituições de países democráticos, como os EUA, o Reino Unido, a Itália e a Espanha. A tradição brasileira nega esse direito ao servidor público, no que contraria a posição prevalecente no âmbito da Organização Internacional do Trabalho, afirmada na Convenção n. 151, não ratificada pelo Brasil. 265

A justificativa da PEC também argumenta que a tradição de negar ao servidor público o direito à negociação coletiva o faz sob argumento da legalidade formal, pois o resultado pretendido com a negociação em geral implica em aumento de vencimentos, aumento da despesa pública, matéria que se restringe à iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo competente.

Mas aos autores da Proposta tal argumento não constitui óbice insuperável, já que a negociação, sendo corolário dos já assegurados direitos relativos à sindicalização e à greve, desde que realizada com êxito, se consolida mediante proposição legislativa, encaminhada ao Congresso Nacional, pelo Chefe do Poder Executivo, para obter a respectiva autorização para a efetivação das despesas correspondentes.

Nesse ponto, o relator lembra que a Convenção da OIT n. 151 recomenda justamente a adoção da negociação coletiva no setor público de modo a respeitar as condições nacionais (vide Capítulo IV, item 4.4).

O voto leva em consideração a experiência levada a efeito pela Prefeitura de Recife, praticada desde o ano de 2001, com o instrumento denominado “Mesa Permanente de Negociações”, a qual, mantendo a observância dos limites orçamentários impostos, sobretudo pela Lei de Responsabilidade Fiscal, tem viabilizado a recuperação gradual do poder aquisitivo dos servidores públicos municipais daquela capital.

Outras experiências têm surgido em âmbito nacional, tentando viabilizar a negociação coletiva no setor público, através da criação de órgãos destinados a tal finalidade, conforme examinado no item 5.2 deste capítulo.

A experiência da Prefeitura Municipal de Recife é que motivou a Proposta à Emenda Constitucional n. 129/2003, pelo que, constatamos mais uma vez que a realidade se impõe em detrimento dos aparentes óbices legais que têm justificado os posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais contrários à aplicação do instituto analisado em relação aos servidores públicos.

265 RANDS, op. cit., passim.

À PEC n. 129/2003 foi apensada a PEC de n. 251, de 2004, da iniciativa dos Deputados Devanir Ribeiro e outros, que igualmente propõe alterar a redação do inciso VI do referido artigo 37 da Magna Carta, nos seguintes termos:

Artigo 37 (...)

VI – é garantido ao servidor público civil o direito à livre associação sindical, bem como, nos termos da lei, o reconhecimento de acordo coletivo de trabalho.266

Na justificação da PEC 251/2004, os autores salientam que a importância dos sindicatos de servidores públicos foi expressamente reconhecida pelo atual governo no protocolo que instituiu a Mesa Nacional de Negociação Permanente entre o Governo Federal e as entidades representativas dos servidores públicos civis da União, celebrado em 16 de junho de 2003 (vide item 5.2.1).

A justificação ressalta ainda que está surgindo um novo modelo de relações funcionais e de trabalho no setor, que deve ser pensado a partir dos paradigmas da qualidade dos serviços, arrolados como interesses indisponíveis da sociedade.

Tal argumento nos remete às considerações por nós efetuadas quando tratamos do princípio da indisponibilidade do interesse público (vide Capítulo IV, item 4.3.1.1), pois interessa que os funcionários executem os serviços e o façam sob condições de trabalho viáveis, garantindo-se-lhes tais condições mediante a possibilidade de negociação coletiva, que propicie a solução do conflito. Isso se traduz em interesse social, já que a boa ou a má prestação do serviço público interessa à coletividade.

Prosseguindo a esse respeito, a justificativa da PEC 251/2004 salienta que a consecução dos objetivos ligados à qualidade dos serviços passa necessariamente por uma revisão profunda do processo de realização do trabalho e por melhorias substanciais das suas condições, inclusive salariais.

Nesse sentido, cabe à Mesa Nacional de Negociação Permanente a construção de alternativas e formas para obter a melhoria das condições de trabalho, a recomposição do poder aquisitivo dos salários e o estabelecimento de uma política salarial permanente, capaz de evitar novas perdas, pautada por uma política conjugada de democratização das relações de trabalho, de valorização dos servidores públicos e de qualificação dos serviços prestados à população.

Por fim, cabe salientar que a PEC n. 251/2004 se distingue da n. 129/2003, pois enquanto esta procura assegurar a negociação coletiva, cujo conseqüente acordo deverá ser

266 RANDS, op. cit., p. 2.

aprovado pelos respectivos Poderes Legislativos, a de n. 251/2004, apensada, prevê que os fundamentos para o reconhecimento do acordo coletivo de trabalho deverão ser objeto de lei específica, pois sua redação assegura que é garantido ao servidor público (...) nos termos da lei,

o reconhecimento de acordo coletivo de trabalho.

Obviamente, a PEC n. 129/2003 é mais viável, pois já assegura o direito à negociação coletiva explicitamente. Como a referida PEC, a Proposta de n. 251/2004 igualmente foi aprovada.

Em relação ao tramite da Proposta de Emenda Constitucional n. 129/2003, desde 02/05/2005 encontra-se na Coordenação de Comissões Permanentes (CCP) da Câmara dos Deputados.267

É louvável a iniciativa de tal proposta de emenda à Constituição Federal. Sendo definitivamente convertida em Emenda Constitucional, o Brasil passará a integrar os países onde a negociação coletiva de trabalho para os servidores públicos é plenamente aplicável, refletindo a democracia em sua forma mais avançada, o que constitui o ideal perseguido atualmente.

No documento Negociação coletiva no setor público (páginas 150-153)