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A ratio da tutela ultramerceológica das marcas de prestígio

Capítulo VI – O merchandising de marcas e algumas questões prévias e aspetos essenciais à sua

3. A marca de prestígio

3.1. Tutela ultramerceológica das marcas de prestígio

3.1.1. A ratio da tutela ultramerceológica das marcas de prestígio

A ratio da proteção ultramerceológica, conferida às marcas de prestígio, encontra o seu fundamento na necessidade de evitar o aproveitamento indevido (não consentido) do seu caracter distintivo – verificando-se este “…quando o uso e/ou o registo da marca posterior faça supor (erradamente) que os produtos ou serviços assinalados por uma e outra marca provêm da mesma entidade ou de entidades diversas mas negocialmente relacionadas (risco de confusão em sentido amplo).”77 - e/ou do prestígio destas marcas, que existe nos “…casos em que, graças

à transferência da imagem da marca ou das características projetadas por esta para produtos designados pelo sinal idêntico ou semelhante, há uma exploração manifesta na esteira da marca de prestígio.”78

76 MARIA MIGUEL CARVALHO, A marca de prestígio…, cit., pág.359, a propósito da tutela ultramerceológica das marcas

de prestígio consagrada no nº3, al.a) do nº4 do art.4º e no nº2 do art.5º da DM, refere que a mesma “…não é necessáriamente uniforme, já que a DM optou por consagrá-la de forma imperativa unicamente no que respeita às marcas comunitárias de prestígio, deixando à liberdade dos Estados-membros a sua transposição no que concerne às marcas de prestígio nacionais.”. Mais adiante, na pág.372, refere, porém, que “…quer do Estudo sobre o funcionamento do sistema europeu de marcas, quer das sinopses recentemente apresentadas pelo Max Planck Institut, para a alteração da DM e do RegMC…” consta “…a transformação em normas imperativas das normas dispositivas que referimos nesta exposição.”. A mesma ideia encontra-se também referida, pela autora, «O risco de confusão e o risco de associação na proposta de diretiva de marcas (reformulada): o regresso à origem?», in

Estudios de Derecho Mercantil – Libro de Homenaje al Prof. Dr. Dr. h. c. José Antonio Gómez Segade, Marcial Pons, Madrid – Barcelona – Buenos Aires – São Paulo, 2013, pág.776. As propostas de alteração da DM e do RMC encontram-se acessíveis em http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=COM:2013:0162:FIN:PT:PDF; e http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=COM:2013:0161:FIN:PT:PDF respetivamente.

77 Definido por MARIA MIGUEL CARVALHO, A marca de prestígio…, cit., pág.360. Também definido, em sentido idêntico,

por COUTINHO DE ABREU, Curso de Direito Comercial, Vol. I, Coimbra, Almedina, 2012, pág.376. Para um estudo mais pormenorizado e atento da temática do risco de confusão, remetemos para as obras de CARLOS OLAVO, Propriedade Industrial, cit., pág.102, 103, 105, 107 e 108; ANTÓNIO CÔRTE REAL CRUZ, O conteúdo…, cit., pág.100 e

102; e PEDRO SOUSA E SILVA, Direito Industrial…, cit., pág.173 e 174.

78 De acordo com o exposto no ponto 41 do ac. do TJUE, de 18/06/2009, no proc. C-487/07, em que são partes L’Oréal SA, Lancôme parfums et beauté & Cie SNC, e Laboratoire Garnier & Cie versus Bellure NV, Malaika Investments Ltd, e Starion International Ltd, acessível em http://curia.europa.eu. São exemplo de outros acórdãos sobre a temática do aproveitamento indevido do caráter distintivo e/ou de prestígio da marca o ac. de TJUE de 25/05/2005, no proc. T‑67/04, em que são partes Spa Monopole, compagnie fermière de Spa SA/NV versus IHMI e Spa‑Finders Travel Arrangements Ltd. ; o ac. de 08/07/2010, no proc. C-558/08, em que são partes

Portakabin Ltd e Portakabin BV contra PrimakabinBV; o ac. de 12/07/2011, no proc. C-324/09, em que são partes L’Oréal SA, Lancôme parfums et beauté & Cie SNC, Laboratoire Garnier & Cie, e L’Oréal (UK) Ltd, contra

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Esta tutela visa também evitar o prejuízo do caracter distintivo das marcas prestigiadas, que ocorre “…quando a aptidão dessa marca em identificar os produtos e os serviços para os quais foi registada e utilizada como sendo proveniente do titular da referida marca esteja enfraquecida, implicando o uso da marca posterior uma dispersão da identidade da marca anterior e da sua influência no espírito do público. É o que acontece quando a marca anterior, que suscitava uma associação imediata com os produtos ou os serviços para os quais foi registada, já não esteja em situação de o fazer.”79

Também como fundamento desta tutela surge a necessidade de evitar o prejuízo do prestígio das marcas, que existe quando “…o uso do sinal posterior…desencadeie associações indesejáveis, por ser aplicado quer a produtos de pior qualidade, quer a produtos «incompatíveis» com os assinalados pela marca prestigiada…”.80

Bastará a possibilidade de ocorrência de aproveitamento ou de prejuízo da capacidade distintiva e/ou do prestígio, para que se legitime a reação do titular da respetiva marca de prestígio81.

eBay International AG ; o ac. de 10/05/2012, no proc. C‑100/11 P, em que são partes Helena Rubinstein SNC, e

L’Oréal SA, contra IHMI e Allergan Inc.; o ac. de 22/09/2011, no proc. C‑323/09, em que são partes Interflora Inc. e InterfloraBritish Unit contra Marks & Spencer plc, e Flowers Direct Online Ltd.; o ac. 18/07/2013, no proc. C‑252/12, em que são partes Specsavers International Healthcare Ltd, contra Asda Stores Ltd.; e o ac. de 06/03/2014, no proc. C‑409/12, em que são partes Backaldrin Österreich The Kornspitz Company GmbH contra

Pfahnl Backmittel GmbH; todos acessíveis em http://curia.europa.eu.

79 De acordo com o exposto no ac. do TJUE, de 27/11/2008, no proc. C‑252/07, em que são partes Intel Corporation Inc. contra CPM United Kingdom Ltd., no seu ponto 29, acessível em http://curia.europa.eu. (ver também pontos 77 e 78 do mesmo ac. sobre a demonstração do prejuízo efetivo ou da possibilidade desse prejuízo vir a verificar-se). Ainda sobre este tema pronunciou-se o TJUE no seu ac. de 22/09/2011 (“Interflora”) cit., nos seus pontos 79 e ss..

80 Explicitado por MARIA MIGUEL CARVALHO, A marca de prestígio…, cit., pág.365. Sobre o prejuízo causado ao

prestígio encontramos exposto o entendimento do TJUE, no seu ac. de 27/11/2008 (“Intel”) cit.; no ac. de 10/05/2012, (“Rubinstein”) cit.; e no ac. de 10/04/2008, no proc. C-102/07, em que são partes adidas AG, e

adidas Benelux BV, versus Marca Mode CV, C&A Nederland CV, H&M Hennes &Mauritz Netherlands BV, e Vendex KBB Nederland BV.

81 PEDRO SOUSA E SILVA, Direito Industrial…, cit., pág.205, refere que “…o uso dessa marca por outrem deverá ter pelo menos uma de três consequências potenciais: a) o beneficio parasitário (“tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio dessa marca”); ou b) o prejuízo daí resultante para o prestígio do sinal; ou c) o prejuízo causado ao carácter distintivo da marca.”, baseando-se no conteúdo do ac. “Intel” do TJUE, de 27/11/ 2008, no Proc. C‑252/07, acessível em http://eur-lex.europa.eu/legal- content/PT/TXT/HTML/?uri=CELEX:62007CJ0252&rid=1, menciona mais adiante, pág.207, que “Segundo o Tribunal, o titular da marca de prestígio não tem de demonstrar a existência de uma violação efectiva e actual da sua marca, mas deve demonstrar a existência de elementos que permitam concluir pelo risco sério de que essa violação venha a concretizar-se no futuro.”; assim reflete, a título exemplificativo, o exposto no ac. de 10/05/2012 (“Rubinstein”) cit., nos seus pontos 93 a 95.

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O principal fundamento da tutela ultramerceológica conferida às marcas de prestígio assenta na necessidade de impedir a diluição das mesmas, e que se traduz na afetação da capacidade distintiva, atrativa e sugestiva destas marcas.

Para além dos fundamentos invocados encontram-se ainda outros, entre os quais, a proibição do enriquecimento sem causa, a proibição de concorrência desleal e a proibição do abuso de direito.

3.1.2. A tutela ultramerceológica das marcas de prestígio como condição de