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Limites materiais e merceológicos do direito à marca

Capítulo VI – O merchandising de marcas e algumas questões prévias e aspetos essenciais à sua

2. Limites materiais e merceológicos do direito à marca

O direito à marca, adquirido em virtude do competente registo, é um direito de exclusivo.58 Consequentemente, como forma de efetivar este seu direito de exclusivo, o titular

detém também um ius prohibendi59 sobre terceiros que pretendam utilizar ou registar sinais

idênticos ou semelhantes, para produtos e/ou serviços idênticos ou afins aos seus, de acordo com o princípio da especialidade das marcas, segundo o qual “A marca deve ser especial ou gozar de especialidade, no sentido de que apenas abrange os produtos ou serviços para que foi registada ou produtos ou serviços semelhantes. Não se verificando tal identidade ou semelhança, o titular da marca não se pode opor a que um terceiro use e/ou registe marca idêntica ou semelhante para produtos ou serviços protegidos pela sua marca.”60. Assim se

Julho de 1967, e modificado em 28 de Setembro de 1979; e ao Protocolo Referente ao Acordo de Madrid Relativo ao Registo Internacional de Marcas, adaptado em Madrid, em 27 de Junho de 1989.

57 Para um estudo mais pormenorizado sobre esta modalidade de registo, remetemos para ADRIANO VANZETTI &

VINCENZO DI CATALDO, Manuale Di…, cit., pág.286 e ss.

58 PEDRO SOUSA E SILVA, Direito Industrial…, cit., pág.23, refere que “…estes direitos traduzem-se em monopólios de uso de certos sinais ou de exploração de certas actividades.”

59 PEDRO SOUSA E SILVA, Direito Industrial…, cit., pág.24, destaca que “…a exclusividade do titular do direito implica atribui-lhe os meios de “excluir”, proibir, impedir quaisquer outras pessoas de exercer a actividade coberta pelo exclusivo.”

60 De acordo com AMÉRICO DA SILVA CARVALHO, Direito de Marcas, Coimbra, Coimbra Editora, 2004, pág.26. Contudo,

referimos a existência de um desvio a este princípio, no que respeita às marcas de prestígio, que beneficiam de uma tutela ultramerceológica, isto é, uma tutela que ultrapassa o princípio da especialidade, de acordo com a qual as marcas de prestígio se encontram protegidas, não só em relação à(s) espécie(s)/categoria(s) de produtos e/ou serviços (ou afins), em relação à(s) qual/quais se encontram registadas, mas também em relação a outras categorias não semelhantes, dado o prestígio alcançado por essa mesma marca.

Adiantando um conceito de marca de prestígio remetemos para A.J.MARTIN MUÑOZ, El Merchandising…, cit., pág.94,

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verifica que este direito de exclusivo não confere ao seu titular o poder de impedir todo e qualquer uso (e pedido/concessão de registo) que um terceiro possa fazer daquele sinal, mas tão só funciona dentro destes limites61, designados de materiais.62

2.2. Limites merceológicos: o princípio da especialidade da marca

Referimo-nos agora, mais pormenorizadamente, ao princípio da especialidade da marca, que se caracteriza como um princípio de grande relevo, no âmbito do direito de marcas. A marca distingue determinados produtos e/ou serviços63 de outros produtos e/ou serviços, pertencentes

a uma mesma categoria. Isto é, aquando do registo de uma marca, a mesma é registada para uma determinada categoria de produtos e/ou serviços, e não indistintamente para todas e quaisquer categorias.64 Assim sucede em virtude do princípio de especialidade da marca, que,

renome, compreende aqueles sinais com elevada capacidade distintiva, que são conhecidos pela maioria do público num lugar e momento concreto à margem da sua atividade original e dos produtos ou serviços que distinguem no tráfego. A marca de renome é a única cujo conhecimento entre o público excede o marco da sua atividade típica estendendo-se a sectores colaterais do tráfego.”

61 PEDRO SOUSA E SILVA, Direito Industrial…, cit., pág.212, menciona que “Nesse sentido, o legislador entendeu ressalvar expressamente certas utilizações da marca, subtraindo-as à exclusividade do titular, a fim de salvaguardar interesses legítimos dos demais agentes económicos, evitando embaraçar injustificadamente o exercício da actividade económica.”

62 Para além dos limites materiais, verifica-se a existência de limites temporais e territoriais do direito à marca.

Estabelecem-se limites temporais uma vez que o direito à marca é concedido por um período limitado de tempo, considerado adequado ao exercício das respetivas funções específicas. Não obstante, verifica-se que o direito à marca pode ser indefinidamente renovado, por iguais períodos àquele que vem legalmente estabelecido (o art.255º do CPI dispõe que “A duração do registo é de 10 anos, contados a partir da data da respectiva concessão, podendo ser indefinidamente renovado por iguais períodos.”), uma vez que a marca desempenha uma função que não se esgota mediante o mero decurso do tempo. Relativamente aos limites territoriais, estes existem fazendo com que o direito à marca se tenha de orientar por, e fazer cumprir o princípio da territorialidade, de acordo com o qual o uso exclusivo de uma determinada marca se encontra limitado territorialmente. AMÉRICO DA SILVA CARVALHO, Direito de Marcas, cit., pág.29, explicita que “A marca deve gozar de protecção em determinado território, isto é, no território em que se encontra protegida.” No que respeita ao registo nacional de marcas, crf. art.4º nº1 do CPI. Relativamente à existência de regimes transnacionais de proteção de direitos de propriedade industrial, estes não colocam em causa a regra da territorialidade, que continua a ser aplicável, embora numa área geográfica mais extensa, assim como afirma PEDRO SOUSA E SILVA, Direito Industrial…, cit., pág.25.

63 CARLOS OLAVO, Propriedade Industrial, cit., pág.96, expõe que “…objecto do direito à marca, que é o de distinguir a respectiva origem empresarial.”; referindo mais adiante na pág.97 que “…a doutrina tem considerado que o público atribuirá a mesma origem a produtos ou serviços de natureza e ou utilidade próxima e que sejam habitualmente distribuídos através dos mesmos circuitos.”

64 AMÉRICO DA SILVA CARVALHO, Direito de Marcas, cit., pág.26, refere que “A marca deve ser especial ou gozar de especialidade, no sentido de que apenas abrange os produtos ou serviços para que foi registada ou produtos ou serviços semelhantes. Não se verificando tal identidade ou semelhança, o titular da marca não se pode opor a que um terceiro use e/ou registe marca idêntica ou semelhante para produtos ou serviços protegidos pela sua marca.”

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como já supra se encontra referido, atua como um elemento delimitador do direito de exclusivo sobre uma determinada marca65.

PEDRO SOUSA E SILVA66 defende que o princípio da especialidade da marca deriva

diretamente da principal função jurídica que esta desempenha, referindo que a marca permite “…individualizar produtos ou serviços e permitir a sua diferenciação de outros da mesma espécie, com vista à indicação da respectiva proveniência.” Assim sendo, salienta ainda que “Servindo as marcas para distinguir, entre si, produtos ou serviços congéneres, o âmbito da protecção concedida a cada marca deve limitar-se aos produtos ou serviços idênticos ou afins àqueles para os quais foi registada (i.e., que estejam numa certa relação de concorrência com os produtos ou serviços a que a marca registada se destina). Só nesta situação é que a função indicativa necessita de protecção.”

Tendo em conta este mesmo princípio, só existe reprodução ou imitação de uma marca, quando os sinais distintivos em questão sirvam para identificar e distinguir produtos e/ou serviços da mesma categoria, ou de categorias afins dos produtos e/ou serviços que são produzidos e ou prestados pelo titular da marca.

CARLOS OLAVO67 constata que “O princípio da especialidade da marca, isto é, a

necessidade de os sinais se reportarem a produtos ou serviços idênticos ou afins, tem vindo a ser contestado.” A contestação começou a ganhar sustentabilidade por força dos argumentos que colocavam a questão relativamente às marcas de prestígio68.

65 MARIA MIGUEL CARVALHO, Merchandising de Marcas…, cit., pág.100; mais adiante, pág.201 explica que “O princípio fundamental do direito de marcas – princípio da especialidade – tem como principal corolário o facto de os direitos de exclusividade atribuídos ao titular da marca registada valerem apenas em relação ao mesmo género (ou a género afim) dos produtos ou serviços que a marca em questão distingue.”

66 PEDRO SOUSA E SILVA, Direito Industrial…., cit., pág.164. 67 CARLOS OLAVO, Propriedade Industrial, cit., pág.97.

68 AMÉRICO DA SILVA CARVALHO, Direito de Marcas, cit., pág.26, evidencia que “Presentemente, a generalidade da doutrina, entende que o requisito da especialidade pode ser ultrapassado, tratando-se de marca chamada de prestígio.” Se assim não fosse colocar-se-ia um problema ao merchandising de marcas. A este propósito CARLOS

OLAVO, em «Contrato de licença de exploração de marca», in Direito Industrial - APDI – Associação Portuguesa de Direito Intelectual, vol.I, Coimbra, Almedina, 2001, pág. 381, refere que “…o merchandising, ou utilização secundária do bem, pressupõe que o sinal que constitui a marca seja utilizado em produtos ou serviços que não sejam idênticos nem afins daqueles a que o registo dessa marca se destina.” Não existindo proteção para estes “produtos ou serviços que não sejam idênticos nem afins daqueles a que o registo dessa marca se destina” o merchandising de marcas revelar-se-ia inútil, uma vez que os terceiros poderiam usufruir livremente da utilização daquele sinal.

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