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A representação do PC nas árvores

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 69-76)

2. O PRETÉRITO PERFEITO COMPOSTO

2.5. A representação do PC nas árvores

No início do texto, disse que a base teórica deste trabalho seria a da gramática gerativa, justifiquei essa escolha, pelo fato dessa teoria afirmar que existe a gramática universal, composta por princípios fixos e inatos. Baseada nessa linha, pude afirmar que o aspecto perfeito estaria presente nas duas línguas estudadas, assim como em todas existentes, embora, em algumas delas esse aspecto não seja marcado gramaticalmente (morfologicamente).

Outro foco dos estudos gerativistas é pesquisar quais são os estados mentais que correspondem ao conhecimento de uma língua e como seria a representação mental de uma sentença, sendo essa composta de constituintes sintagmáticos. E é através da árvore sintática que esses sintagmas e seus movimentos são representados.

Então como representar o PC do espanhol na árvore sintática? Como representar um tempo verbal que pode ter dois valores aspectuais, de perfectivo e de Perfeito? Primeiramente,

96 a) A 19 dias para que entre oficialmente a primavera e a quatro meses de que os estragos de verão apareçam, inexplicavelmente o rio Cazones tem baixado seu nível significativamente a ponto de que em alguns trechos é possível atravessá-lo a pé (...)

b) Da mesma forma, as vozes do Vaticano têm chegado vozes de todo o mundo a fovor de uma restauração (...) c) "Com o voto a favor da perda da imunidade jurídica deu-se o golpe na República, a transição democrática do país e a esquerda mexicana," estabeleceu.

d) "Queremos avançar bem neste tema, existe uma proposta de trabalhadores que o presidente Bush apresentou, e disse que pensou que poderia ser um primeiro passo", ressaltou.

como dito acima, temos que admitir o aspecto como um nódulo funcional. Carrasco Gutiérrez (2008) propôs dois modelos de árvore que dessem conta do PC com valor aspectual de aoristo e com o valor de Perfeito. A autora defende que a ambiguidade se encontra no sufixo -do do particípio, depois da inserção da raiz verbal na sua posição base, uma regra flexiva irá introduzir a marca de -do associada a uma característica que deverá ser checada ou no nódulo de Aspº (leitura de Perfeito) ou no nódulo T2º (leitura de aoristo). Isso demonstraria, portanto, que o PC com valor de Perfeito teria o traço de [+] aspecto, enquanto o PC veiculado ao aspecto aoristo teria o traço de [+] tempo. Sobre o papel do auxiliar haber, Carrasco Gutiérrez (ibidem) explica que seria o de fazer possível a realização léxica do conteúdo temporal associado ao nódulo T1 e às marcas de Concordância. Farei, a seguir, um panorama das etapas que a autora propôs para chegar a essa conclusão.

Nesse artigo, Carrasco Gutiérrez (op. cit.) trata sobre a ambiguidade do pretérito composto e cita o sistema de Reichenbach, já mencionado, onde os tempos verbais têm três entidades temporais primitivas: S (speech time) que é o tempo da enunciação ou da fala; E (event time) que é o tempo do evento (o evento referido pelo predicado da sentença); e R (reference time) que é o tempo de referência. Entretanto, a autora, ao citar os usos e interpretações do condicional e do futuro perfeitos, mostra que apenas S, E, R, não seriam suficientes para explicar todos os tempos verbais. A autora usa o exemplo (p.28):

a) Dijo que podríamos irnos juntos porque Juan habría acabado el trabajo a las tres en punto.

---x---x---

dijo S

podríamos irnos

habría acabado

A autora afirma, então, que podemos descrever o significado do condicional perfeito dizendo que E é anterior a um ponto temporal (representado por podrímos irnos), que por sua vez, é posterior a outro ponto (dijo) que precede a S. Com esse exemplo é possível notar que dois pontos temporais separam E de S, e por isso Carrasco Gutiérrez (op. cit.) adota a proposta de Vikner (1985 apud Carrasco Gutiérez op. cit.) e denomina esses dois pontos temporais de R1 e R2, sendo portanto a estrutura temporal do condicional perfeito a seguinte:

(E-R2) + (R1-R2)+(R1-S)97

97 Onde a vírgula indica a simultaneidade entre os pontos temporais; o traço a relação de sucessão, ou seja, o ponto a esquerda do traço precede ao ponto que está à direita; e o + representa que o significado do tempo verbal é a soma do conteúdo entre parênteses.

Com mais um ponto de referência se poderia marcar a subesfera do futuro, onde (R1- R2), indica que pertence a essa subesfera, e (R2,R1/R1,R2) representa que não pertence98. A seguir, para uma maior compreensão, apresento as combinações que indicam presente, passado, ou futuro:

(S, R1) – presente (R1-S) – passado (R1-R2) – futuro

A autora explica que o sistema de Reichenbach, apesar de situar a posição do evento verbal na linha do tempo em relação ao momento da enunciação, não é capaz de distinguir se é todo o evento que é situado ou apenas uma parte, ou ainda se é um estado de coisas que coincide com a intenção ou predisposição de terminar um evento. Com isso, a autora diz que é necessário que se consiga incorporar os conteúdos aspectuais às estruturais temporais, pois só assim se terá uma compreensão completa do significado dos tempos verbais. E é por isso, que Carrasco Gutiérrez, baseada em Klein (1992), propõe que o ponto E (tempo total do evento) de Reichenbach seja substituído por outro primitivo teórico, F, que representa o tempo apenas da parte do evento de que se fala na oração. Segundo a autora, desse modo é possível dar conta da ambiguidade das formas verbais compostas.

A autora segue expondo que em muitos estudos sobre os tempos verbais são frequentes as propostas que tentam dar conta de como obtêm-se esses significados sintaticamente, e que a sua proposta será baseada em trabalhos como os de Belletti (1990), Chomsky (1989) e Pollock (1989), que afirmam que tanto as categorias léxicas como os morfemas com informação gramatical podem ser projetados sintaticamente.

Carrasco Gutiérrez (op. cit.) segue então com sua proposta de árvore, antes explica que a representação sintática será pautada em quatro primitivos teóricos que explicam o significado tempo-aspectual dos tempos verbais e que os quatro são proporcionados por diferentes núcleos sintáticos. Sobre os pontos a autora expõe:

Los puntos S y F se ponen en relación con los núcleos Com[plementante]º y Asp[ecto]º, respectivamente; los nudos T[iempo]1º y T[iempo]2º introducirán los puntos de referencia R1 y R2. (…)

El nudo Aspº proporciona el punto F, precisamente, porque la categoría gramatical del Aspecto es la que nos informa acerca del tiempo de la parte real del evento de la que se afirma algo en la oración. En cambio, los morfemas temporais que se proyectan en T1º y T2º serán los que determinen qué orden existe entre los puntos S, R1, R2 y F.99

98 É importante relatar os passos que a autora seguiu, para depois entender a sua proposta de árvore.

99 Os pontos S e F relacionam-se com os núcleos Com[plementante]º e Asp[ecto]º, respectivamente; os nódulos T[empo]1º e T[empo]2º introduzirão os pontos de referência R1 e R2. (…)

A autora explica, em seguida, que os núcleos que estão sendo estudados se caracterizam por ter certo conteúdo semântico relacionado estritamente com o predicado e que, considerando Poletto (1992, apud Carrasco Gutiérrez op. cit.) os núcleos T1º, T2º e Aspº são categorias funcionais.

Em seu artigo, Carrasco Gutiérrez (op. cit.) problematiza se um morfema pode se relacionar com mais de um conteúdo e, portanto, com mais de uma posição sintática; e se é necessário reservar um nódulo na representação sintática para os conteúdos gramaticais sem realização fonética. A autora assume que os conteúdos gramaticais de Tempo e Aspecto se correspondem de forma não ambígua com um único morfema verbal, dando conta assim sintaticamente da ambiguidade do PC. O sufixo -do poderia ter relação com dois conteúdos gramaticais diferentes: o temporal de anterioridade de F com respeito a R2 e o aspectual de perfeito.

Com relação a reservar um nódulo na representação sintática para os conteúdos gramaticais sem realização fonética, a autora assume a proposta de Hornstein (1990), onde se defende que ST1 e ST2 são projeções funcionais que estariam presentes na sintaxe inclusive quando não fosse possível identificar um morfema relacionado com o conteúdo temporal associados aos seus núcleos. Carrasco Gutierrez (op. cit.) acredita que uma das vantagens desse ponto de vista é que se permite reservar a opção de não projetar um núcleo temporal para aqueles casos de verdadeira ausência de conteúdo. Seria isso que aconteceria com as formas não pessoais do verbo, infinitivo, gerúndio e particípio.

Chega-se, enfim, as árvores propostas pela autora (p.54): 1- Tempo composto com interpretação perfectiva (aoristo):

informa sobre o tempo da parte real do evento da qual se afirma algo na oração. Já os morfemas temporais que se projetam en T1º e T2º serão os que determinam qual ordem existe entre os pontos S, R1, R2 e F.

É valido ressaltar que T1º está vinculado tanto com as informações referidas à posição de R1 com respeito a S, como com a que tem a ver com a posição de R2 com respeito a R1. Já o núcleo T2º está relacionado com o conteúdo relativo à posição do tempo do foco com respeito a R2. O ponto F é dado pela categoria funcional de aspecto, pois ele diz respeito ao tempo da parte do evento da que se fala na oração. Com o E, a autora diz que se refere ao tempo real ou a extensão total do evento, diz que esse ponto não faz parte das estruturas temporais dos tempos verbais, uma vez que não são visíveis para a modificação temporal deítica.

Pode-se notar, ao observar na árvore que o auxiliar haber se insere acima do nódulo T2º, onde está a marca do particípio. Segundo a autora, o auxiliar se introduz para possibilitar a realização léxica do conteúdo temporal associado ao nódulo T1º e das marcas de concordância.

Em (2), o auxiliar haber também se insere acima do nódulo onde se encontra a marca do sufixo -do, sendo que quando denota valor de Perfeito essa marca estará no nódulo do aspecto. A distinta posição do sufixo representa, segundo a defesa de Carrasco Gutiérrez, as duas interpretações possíveis para os tempos compostos. A posição em (1) marca a indicação de anterioridade de F com respeito a R2, gerando assim uma leitura perfectiva. Já em (2) onde a marca -do se encontra em Aspº, indica a anterioridade de E com respeito a F, característica da leitura de perfeito.

A proposta de representação de Carrasco Gutiérrez (2008), reforça a ideia de que há sim uma diferença sintática quando se tem uma leitura perfectiva do PC ou uma de perfeito. A marca do -do, sendo checada no aspecto traria uma leitura, a de Perfeito, já sendo checada em T2 teria outra interpretação a de aoristo.

Ressalto que assumi essa proposta, em primeiro lugar, por ela dar conta da minha hipótese de que o uso do PC com valor de Perfeito teria traço [+] aspecto, e que o uso do PC com valor de Perfectivo, teria traço [+] tempo. Além disso, assumo, também, por ser uma proposta baseada em clássicos estudos, como Chomsky (1989) e Pollock (1989), e em outros diversos estudos empíricos relacionados com o tema. É uma proposta de linha gerativa, como a do presente trabalho e que consegue dar conta da ambiguidade aspectual encontrado no pretérito composto do espanhol, e todos os seus argumentos foram sempre muito bem debatidos e comparados a de outros autores.

Entretanto, faz-se necessário fazer algumas ressalvas em relação à proposta da autora e à visão universalista que assumo. O que me fez apresentar a proposta de Carrasco Gutiérrez (op. cit.) foi a questão da autora defender que quando o PC tem valor de Perfeito tem-se a checagem do particípio no nódulo do aspecto, enquanto o PC perfectivo checa no nódulo de tempo. Contudo, ao observar as duas árvores propostas pela autora, vemos que as posições

dos nódulos temporais não se mantêm. Isso indicaria que a proposta da autora não é de uma árvore universal. Dessa forma, esclareço que concordo com a árvore da autora no que diz respeito às diferenças de checagem, mas discordo de sua proposta de mudança de posição dos nódulos. Seria interessante, fazer algumas alterações nessa árvore, porém como o foco desta dissertação não é a representação sintática, não me ocuparei a fazê-las neste momento. Quiçá em um trabalho futuro, possa realizá-las.

Após expor acerca da linha teórica seguida, apresentar as diferenças entre Tempo e Aspecto, diferenciar os aspectos que podem estar veiculados ao pretérito composto – Perfeito e perfectivo, descrever o uso do PC em diversas línguas e variedades, e demonstrar a proposta de representação em árvore que assumo, a seguir apresento a metodologia adotada para realizar a análise dos dados neste trabalho.

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 69-76)

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