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CAPÍTULO 2: CONTROLE DOS RISCOS DOS AGROTÓXICOS

3.3. O Código Internacional de Conduta para a Distribuição e

3.3.2. A revisibilidade periódica dos pesticidas

Além do monitoramento, o artigo 5º, do referido Código, estabeleceu que os governos devem implementar um sistema de registro e controle de pesticidas, bem como revisar periodicamente os pesticidas que comercializam no seu próprio país, seus usos aceitáveis e sua disponibilidade para cada setor do público e realizar revisões especiais quando a evidência científica os aconselhar. Além disso, os governos deverão ainda realizar um programa de vigilância da saúde das pessoas expostas a praguicidas em seu trabalho e investigar e documentar os casos de envenenamento e implementar um programa de vigilância dos

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CÂMARA DOS DEPUTADOS. Comissão da Seguridade Social e Família. Relatório da Subcomissão Especial sobre o uso de Agrotóxicos e suas consequências à saúde. Novembro de 2011. Disponível em:<http://www.padrejoao.com.br/227/Câmara%20Federal/AGROTÓXICOS/ REL%203_2011%20CSSF.pdf>. Acesso em: 6 de fev. 2012. p. 76.

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CÂMARA DOS DEPUTADOS. Op. cit. p. 24. 453

resíduos de pesticidas presentes nos alimentos e no ambiente454 (grifou-

se).

O artigo 6º do Código, por sua vez, ao dispor sobre os requisitos regulamentares e técnicos, determina que os governos devem estabelecer um procedimento de re-registro para assegurar o exame periódico dos praguicidas, garantindo com isso que se possam adotar medidas imediatas e eficazes em caso de novas informações ou dados sobre o desempenho dos produtos455.

Novamente, além dos problemas verificados na última análise publicada sobre resíduos de agrotóxicos de alimentos456, bem como da ausência de um programa de vigilância contínuo de praguicidas no ambiente, no País não existe uma reavaliação periódica dos pesticidas. Isso se deve à ausência de um prazo de validade para o registro. Diferentemente do que ocorre no licenciamento ambiental em geral, em que as licenças ambientais são válidas apenas por um determinado período, o registro do agrotóxico goza de prazo ad eternun, o que acaba impondo ao Poder Público a necessidade de empreender grandes esforços para retirar determinados produtos do mercado, diante dos danos para a saúde humana e para o meio ambiente457.

Na União Europeia, diferentemente, tem-se primado por garantir a revisibilidade das autorizações dos pesticidas, conforme os dispositivos do Regulamento da Comunidade Europeia n. 1107/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de Outubro de 2009, relativo

454 Conforme os itens 5.1.3 e 5.1.10, do Código Internacional de Conduta para a utilização e distribuição de praguicidas da FAO.

455 Conforme o item 6.1.6, do Código Internacional de Conduta para a utilização e distribuição de praguicidas da FAO.

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AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA). Relatório de

Atividades de 2010. Disponível em:

<http://portal.anvisa.gov.br/wps/wcm/connect/b380fe004965d38ab6abf74ed758 91ae/Relatório+PARA+2010+-+Versão+Final.pdf?MOD=AJPERES>. Acesso em: 16 de dez. 2011.

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Para um maior aprofundamento sobre o tema, conferir a obra: FERREIRA, Maria Leonor Paes Cavalcanti Ferreira. De Defensivos Agrícolas a Agrotóxicos. Desafios para a regulamentação dos agroquímicos no Brasil. Florianápolis: Editora UFSC, 2011.

à colocação dos produtos fitofarmacêuticos458 no mercado. De acordo com o artigo 1°, do Regulamento (CE) N. 1107/2009, são designados por produtos fitorfarmacêuticos os produtos que contêm ou são constituídos por substâncias ativas, protetores de fitotoxicidade ou agentes sinérgicos e se destinam a uma das seguintes utilizações:

a) Proteger os vegetais ou os produtos vegetais contra todos os organismos nocivos ou prevenir a acção desses organismos, salvo se os produtos em causa se destinarem a ser utilizados principalmente por motivos de higiene e não para a protec- ção dos vegetais ou dos produtos vegetais; b) Influenciar os processos vitais dos vegetais — por exemplo, substâncias que influenciem o seu crescimento, mas que não sejam nutrientes;c) Conservar os produtos vegetais, desde que as substâncias ou produtos em causa não sejam objecto de disposições comunitárias especiais em matéria de conservantes;d) Destruir vegetais ou partes de vegetais indesejáveis, com excepção das algas, salvo se os produtos forem aplicados no solo ou na água para a protecção dos vegetais;e) Limitar ou prevenir o crescimento indesejável de vegetais, com excepção de algas, a menos que os produtos sejam aplicados no solo ou na água para a protecção dos vegetais.

O referido Regulamento estabelece que a primeira aprovação das substâncias ativas é válida por um prazo máximo de 10 anos459 e que a renovação da aprovação, por sua vez, é válida por um prazo máximo de 15 anos460. As substâncias ativas são aquela que

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PARLAMENTO EUROPEU E CONSELHO DA UNIÃO EUROPEIA. Regulamento (CE) n. 1107/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho de 21 de Outubro de 2009 relativo à colocação dos produtos fitofarmacêuticos no mercado e que revoga as Directivas 79/117/CEE e 91/414/CEE do

Conselho. Disponível em: <http://eur-

lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2009:309:0001:0050:PT:P DF>. Acesso em: 5 de jul. 2011.

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Conforme o art. 5°, do Regulamento(CE) N. 1107/2009. 460

“exercem uma ação geral ou específica contra os organismos nocivos ou sobre os vegetais, partes dos vegetais ou produtos vegetais”461

.

Ressaltando a importância da revisibilidade, o Regulamento em questão alerta que:

Em benefício da segurança, o prazo de aprovação das substâncias activas deverá ser limitado. O prazo de aprovação deverá ser proporcional aos eventuais riscos inerentes à utilização das substâncias em causa. A experiência adquirida com a utilização efectiva dos produtos fitofarmacêuticos que contêm as substâncias em causa e a evolução científica e tecnológica deverão ser tidas em conta em qualquer decisão que diga respeito à renovação de uma aprovação. A renovação da aprovação deverá ser válida por um prazo máximo de quinze anos462.

Além do prazo de validade estabelecido para as substâncias ativas, há também regra própria para os produtos fitofarmacêuticos, conforme se depreende do artigo 32, do Regulamento ora em análise. Segundo esse dispostivo, o prazo de validade da autorização deverá ser “definido na autorização”. É que na União Europeia, há autorizações diferentes para a substância ativa e para o pesticida. Essas duas autorizações estão sujeitas a prazos de validade.

Recentemente, no Brasil, há notícia de projeto de lei, de autoria da Comissão da Seguridade e Família, institucionalizando um prazo de validade para o registro desses produtos463. Abaixo o dispositivo que poderia ser incluído na regulação dos agrotóxicos, acrescentando ao artigo 3º, da Lei 7.802/89, o seguinte dispositivo:

461 Conforme o n. 2, do art. 2°, do Regulamento(CE) N. 1107/2009.

462 De acordo com o considerando n. 15, do Regulamento(CE) N. 1107/2009. 463

CÂMARA DOS DEPUTADOS. Comissão da Seguridade Social e Família. Relatório da Subcomissão Especial sobre o uso de Agrotóxicos e suas consequências à saúde. Novembro de 2011. Disponível em: <http://www.padrejoao.com.br/227/Câmara%20Federal/AGROTÓXICOS/REL %203_2011%20CSSF.pdf>. Acesso em: 6 de fev. 2012. p. 101.

§7o O prazo de validade do registro é de 5 anos, devendo ser revalidado a cada 5 anos, a pedido do interessado. (NR)

Entende-se que esse prazo de validade a ser incluído na legislação brasileira é medida indispensável para à operacionalização dos princípios da prevenção e da precaução, na medida em que permite um melhor acompanhamento dos dados produzidos pela ciência e estimula a criação de produtos menos tóxicos pelo mercado, em outras palavras, estimula a inovação mais amiga do ambiente.

O dever de trazer dados atualizados de sues produtos, nesse caso, deve ser atribuído periodicamente à indústria, tendo em vista os princípios de direito ambiental. Há necessidade de se garantir então que ônus da prova continue de responsabilidade daquele que produz. Wargo, ao analisar o tema e especificamente as regras previstas no ordenamento dos Estados Unidos, destaca que:

Parece justo concluir que o ritmo da nossa compreensão acerca do destino dos compostos e de sua toxicidade tem sido mais lento do que a velocidade com a qual novos compostos são introduzidos. Assim, um contínuo ônus da prova deve recair sobre os fabricantes, através do reexame dos produtos químicos dentro do prazo de cinco anos464.

464 WARGO, John. Our children’s toxic legacy. How science and law fail to protect us from pesticides? Second Edition. New Haven: Yale University Press, 1998. p. 276. Tradução da autora: “It seems fair to conclude that the pace of our understanding of compound fate and toxicity has been far slower than the speed at wich new compounds are introduced. Thus a continuing burden of proof should relie with manufacturers, with single chemicals reexamined within five year”.

Diante dos riscos de tais substâncias e da incapacidade da racionalidade humana465 de compreender de uma maneira adequada a toxicidade dos pesticidas – considerando-se a complexidade de tais produtos, medidas como a reavaliação periódica devem ser incorporadas pela legislação brasileira, a fim de garantir uma melhor proteção da saúde humana e do meio ambiente.