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CAPÍTULO 1. O CENÁRIO INTERNACIONAL GLOBALIZADO

1.1 A GLOBALIZAÇÃO

1.1.5 A globalização tributária

1.1.5.2 A soberania tributária

Este tópico discorrerá sobre os efeitos do movimento globalizante sobre a

soberania tributária, enquanto que para eventual interesse acerca do conteúdo e alcance da

“soberania tributária internacional” é recomendada a leitura do Capítulo III, Delimitação da

Competência Tributária Internacional, contido na bem lançada obra Convenções sobre Dupla

Tributação Internacional

61

, do Professor Antônio de Moura Borges.

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60 COSTA, Elisabete Mansa Pinto da. Concorrência Fiscal Internacional: Um desafio à escala mundial. Tese

de Pós-Graduação em Direito Fiscal na Faculdade de Direito da Universidade do Porto Ano 2004/2005, p. 29, Disponível em: <http://www.direito.up.pt/cije_web/Site/documentos/trabalhos/Costa_Elisabete.pdf>. Acesso em: 07 set. 2006.

61 BORGES, Antônio de Moura. Convenções sobre Dupla Tributação Internacional. Teresina: Editora da

Os investimentos e o capital especulativo transnacionais não mais são

submissos e passivos frente às soberanias dos Estados como em estágios anteriores ao atual.

Ao contrário, assumem condição de exigir providências e impor condições, desde alíquotas

tributárias baixíssimas, ou mesmo a não tributação, até a concessão de incentivos para seu

estabelecimento ou permanência em determinado território geopolítico.

Consoante o que se apreende da lição de Pinheiro

62

, a economia globalizada

apresenta ainda, como traço marcante, a migração de parcela significativa de seus operadores,

do mundo real, aquele ainda perceptível ao Estado, para o mundo virtual, o qual o Estado não

consegue alcançar. Isto é, a transnacionalização dos investimentos e dos capitais impede a

tangibilidade fiscal, por um lado, em decorrência da sua alocação fora das possibilidades da

competência tributária Estatal, e, por outro lado, pela ameaça que a sua alta volatilidade

oferece ao Estado que não se mostre receptivo sob a ótica das vantagens comparativas que

ofereça.

Para Castro, "a perda de soberania fiscal pelos Estados modernos é a marca

mais significativa da globalização tributária"

63

onde os fatores de produção mais relevantes

(capital especulativo, capital de investimento direto e o trabalho altamente qualificado)

realizam um “passeio” em busca de vantagens tributárias que nomina de “nomadismo

fiscal”

64

.

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62 “É que com a globalização econômica, a economia passou a ostentar, e a cada dia com mais nitidez, de um

lado, uma face real, ainda sob o controle dos Estados nacionais e chamada a contribuir, através dos tributos, para o abastecimento dos cofres públicos; e, de outro lado, uma face virtual, inteiramente globalizada, fora do controle estatal e, consequentemente, do alcance das leis tributárias. PINHEIRO, Jurandi Borges. Direito

Tributário e Globalização. Ensaio crítico sobre preços de transferência. Rio de Janeiro: Renovar, 2001,

p.19.

63 “A redução ou perda da soberania fiscal pelos Estados modernos apresenta-se como a marca mais significativa

neste campo de considerações. O enfraquecimento do Estado-nação manifesta-se com cores muito peculiares no universo tributário. Com efeito, a pressão direta e indireta das empresas transnacionais pela adoção de ambientes fiscais mais favorecidos estão na base de uma série de movimentos relevantes relacionados com a tributação” CASTRO, Aldemário Araújo. As Repercussões da Globalização na Economia Brasileira. Dissertação de Mestrado. Universidade Católica de Brasília. 2006. p.53.

Como conseqüência, no sentir de Faria

65

, temos que os Estados que até a

década de 70 comandavam o desenvolvimento com base na articulação de empresas públicas

com empresas privadas nacionais e empresas internacionais, vêem-se, a partir dos anos 80,

coagidos pela competição global a uma gestão determinada pela economia, perdendo a

autonomia para formular políticas setoriais e sociais próprias. De que modo implementá-las e

executá-las, uma vez que seus instrumentos básicos – tarifas, restrições quantitativas através

de cotas, licenças de importação, subsídios para exportação, controles sobre capitais e

tributação, por exemplo – podem colidir com os interesses estratégicos e com a racionalidade

pragmática das corporações transnacionais. Corporações essas que, diferindo na sua atuação

das antigas empresas multinacionais, cuja tendência era considerar cada mercado

isoladamente, hoje pautam suas decisões quase exclusivamente com base na lógica e nas

regras da “economia-mundo”?

Há, conforme dito por parte da doutrina mencionada nos tópicos destinados à

globalização econômica, uma forte tendência pelo aumento na ingerência das corporações

transnacionais sobre o Estado, numa demonstração de preponderância do poder econômico

sobre o poder fiscal

66

.

O texto de Pinheiro

67

traz, a partir da leitura da obra “Contos e novelas”, do

pensador francês Voltaire, bem como uma passagem de Turgot, ministro francês em 1776, um

comparativo entre o ocorrido com os tributos feudais e que ocorre com os tributos atuais, em

relação à tributação dos investimentos financeiros. Num resumo, pode-se apurar do

comparativo relato de ter encontrado, naquele período, semelhantes diferenciações entre a

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65 FARIA, José Eduardo. O Direito na Economia Globalizada. 1. ed. 4. tir. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 108-

109.

66 PINHEIRO, Jurandi Borges. Direito Tributário e Globalização. Ensaio crítico sobre preços de transferência. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 26.

tributação incidente sobre o trabalho e a propriedade, daquelas praticadas sobre os títulos e o

dinheiro, em moldes análogos ao que vivenciamos na era da globalização econômica.

Hoje, o consumo e a renda do trabalho suportam a maior parte da carga fiscal

enquanto os investimentos financeiros conseguem tributação especial ou mesmo a sua não

taxação. Vejamos alguns números encontrados na Internet:

“Antes da Segunda Guerra Mundial, a tributação sobre as empresas representava um terço do total das receitas tributárias, mais do que o imposto de renda da pessoa física. Atualmente, representa apenas 12%, aproximadamente um quarto do imposto sobre a renda das pessoas físicas. Na União Européia, a média da tributação sobre o capital caiu de 50% em 1981 para 35% em 1994. Enquanto isso, a média dos tributos sobre os salários cresceu de 35% para 41%”.68

No mesmo sentido Greco

69

menciona manifestação de Summers, Ex-

Secretário do Tesouro Americano, que, para demonstrar o deslocamento da carga tributária da

pessoa jurídica para a física, dizia que se fosse feita uma comparação entre a carga tributária

de 1970 e 1997 e se verificasse como foi o perfil para as pessoas físicas e jurídicas encontrar-

se-ia o seguinte quadro:

a) se as pessoas jurídicas pagassem em 1997 o mesmo percentual proporcional de tributação de 1970, elas deveriam ter recolhido entre U$ 40 e U$ 50 bilhões de tributos a mais; b) se as pessoas físicas pagassem em 1997 o mesmo percentual proporcional de 1970, deveriam pagar menos cerca de U$ 40 e U$ 50 bilhões de tributos.

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68 “To understand the impact of globalization on taxes, though, you do not have to use your imagination. You

can see it in the way governments have been forced to change the structure of taxation. Before the second world war, America's federal corporation tax yielded one-third of total federal tax revenues, more than personal income tax. Now corporation tax accounts for only 12% of the total and barely a quarter as much as personal tax. In the European Union the average rate of tax on income from capital and self-employed labor fell from almost 50% in 1981 to 35% in 1994; the average tax rate on wages rose from 35% to 41%. Everywhere there has been a shift from taxing capital towards taxing less mobile factors of production, such as workers. Personal income taxes are by far the most important source of government revenue in all rich economies.” Disappearing Taxes: The tap

runs dry. Artigo não subscrito. Disponível em: <http://www.lightparty.com/Economic/

DissappearingTaxes.html>. Acesso em: 07 jun. 2006.

69 GRECO, Marco Aurélio. Elisão Tributária e seu contexto In: Anais do Seminário Internacional sobre Elisão Fiscal. Seminário realizado pela Escola de Administração Fazendária – ESAF, em Brasília, no período de

Acresce aos números indicados a observação de Edwards e Rugy

70

de que em

2002: "o nível médio da tributação sobre a renda pessoal dos maiores contribuintes, nos países

industrializados da OCDE caiu 20% desde 1980; e a média da tributação sobre a renda das

maiores empresas caiu 6% nos últimos seis anos".

Assim, como escreve Zilveti, "o processo irreversível de globalização e a

internacionalização dos sistemas de produção econômica determinam o futuro da

tributação"

71

.

Da observação dos registros feitos por Pinheiro

72

é possível inferir que a

recondução do Estado ao controle das políticas sócio-econômicas e da estrutura tributária está

condicionada à existência de uma instituição internacional, dotada de poder supranacional, a

qual possa centralizar as diretrizes fiscais mundiais, de forma a harmonizar a tributação

universal, condição que afastaria a concorrência fiscal.

Da mesma forma que a Globalização cultural implica a assunção de padrões

alienígenas em substituição aos nativos, a globalização econômica requer a adequação dos

padrões de estruturação econômica e tributária nacionais aos ditados pelas empresas

transnacionais, sob pena da perda da capacidade de arrecadação fiscal frente à redução da

base de incidência tributária dos Estados.

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70 “The average top personal income tax rate in the industrial countries of the Organisation for Economic

Cooperation and Development (OECD) has fallen 20 percentage points since 1980 (James Gwartney and

Robert Lawson, Economic Freedom of the World: 2001 Annual Report (Vancouver: Fraser Institute, 2001). The

average top corporate income tax rate has fallen 6 percentage points in just the past six years (KPMG,

.Corporate Tax Rate Survey. January 2002 and prior years www.us.kpmg.com/microsite/Global_Tax/TaxFacts/)”. EDWARDS, Chris. RUGY, Veronique. Chapter 3:

International Tax Competition. In: Economic Freedom of the World: 2002 Annual Report. p. 43. Disponível em: <http://www.cato.org/pubs/efw/efw2002/efw02-ch3.pdf> Acesso em: 15 set. 2006.

71 ZILVETI, Fernando Aurélio. Princípios de Direito Tributário e a Capacidade Contributiva. São Paulo:

Quartier Latin, 2004, p. 178.

72 “[...] é possível concluir que sem uma instituição legitimada a monopolizar, no plano internacional, o poder de

coação jurídica, são as empresas transnacionais que vão promulgando o quadro jurídico em conformidade com os seus interesses”. PINHEIRO, Jurandi Borges. Direito Tributário e Globalização. Ensaio crítico sobre