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A sustentabilidade, a partir da historicidade de sua conceituação, que se deu e tem se dado por meio de intenso debate controverso e acalorado entre ideologias e visões de mundo diferentes, ao longo dos últimos quarenta anos, vai configurar, de acordo com Marta de Azevedo Irving (2014), um terreno interdisciplinar, plural e complexo. A educação ambiental vai sofrer forte influência desse debate e, por isso, entendemos a necessidade de compreender a polissemia que envolve o conceito para, por conseguinte, reconhecer os caminhos da educação ambiental especialmente no Brasil.

134 A terminologia sustentabilidade está cada dia mais banalizada, passando a constituir, por isso, em sua essência, uma ideia-força, conforme propõe Loureiro (2012), ou seja, um estímulo para o debate crítico ou ainda, a projeção de um horizonte ideal para a superação dos diferentes problemas hoje vivenciados, tanto no âmbito ambiental como econômico, político, cultural e social. Desse modo, sustentabilidade constitui um termo polissêmico que transcende o debate de inspiração ambiental ou a noção de enfrentamento de riscos em uma sociedade cada vez mais diversa e plural. Implica uma reflexão crítica sobre a organização da sociedade contemporânea e pressupõe um posicionamento político e ideológico coerente com a realidade vivente.

Nesse sentido e em conexão com o debate proposto por Morin (2011), percebe-se a existência de uma crise civilizatória e que o fenômeno da globalização vem reforçando essa crise. E nessa dinâmica, várias crises se estabelecem na escala planetária de modo interdependente. Sendo assim, para esse autor, três elementos são fundamentais na explicação dessas crises interdependentes: a globalização, a ocidentalização e o desenvolvimento. Para ele, a crise mais evidente é a de humanidade, que ainda impede mulheres e homens de sê-las/os em plenitude. Além disso, decorre também da cisão histórica entre sociedade e natureza. Isso porque ambiente e sociedade são elementos indissociáveis, como também defendido por Edgar Morin e Anne Brigitte Kern (2000), Serge Moscovici (2002) e Edgar Morin (2011), entre tantos outros pensadores contemporâneos, para os quais, a crise atual constitui uma crise de civilização que implica o religare entre sociedade e natureza. E para Enrique Leff (2009), nesse sentido, não é suficiente uma ética da conservação, mas é necessário desconstruir essa racionalidade que vem orientando um processo de racionalização do mundo que desconsidera os potenciais ecológicos e os valores culturais que sustentam o planeta.

Assim, conforme propõe Marta Irving (2014), com base no sentido polissêmico que envolve a noção de sustentabilidade, refletimos em torno da origem dessa terminologia e de alguns dos marcos globais e de seus reflexos em um cenário de crise civilizacional39. Além disso, refletimos também em torno do documento “O futuro que queremos”, divulgado pela Organização das Nações Unidas – ONU – em 2012, que aponta os caminhos e objetivos para

39 Crise civilizacional, conforme o sentido proposto por Irving e Oliveira (2012). Vale destacar que retomaremos posteriormente o contexto e os diferentes sentidos e significados de crise.

135 o desenvolvimento sustentável, especialmente a partir da criação e promulgação de políticas públicas globais e nacionais, que tiveram início, oficialmente, em 2015.

Por isso, é destacamos que em 2011 a população do planeta já havia ultrapassado sete bilhões de habitantes, e pode chegar a dez bilhões até 2100, conforme aponta o Relatório da Situação da População Mundial das Nações Unidas, de 2011. Diante desse panorama, torna- se fundamental que sejam repensados os padrões de desenvolvimento, em um cenário de aumento populacional progressivo, de escassez de recursos naturais para sustentar o crescimento econômico e modos de produção e consumo, que se fundamentam na ilusão do “ter humano” e não na afirmação do próprio “ser humano”, conforme discutido por Fred Tavares e Marta de Azevedo Irving (2009), além de priorizar a vida humana em detrimento de outras vidas. Esse debate não é novo e tem inspirado muitas discussões em torno da sustentabilidade, termo que tem sido historicamente apropriado e ressignificado segundo as várias ideologias, na complexa e contraditória trama da globalização.

Mas sustentabilidade não constitui uma noção simples e recente, artificialmente criada e reproduzida pelo mundo das empresas em busca de competitividade de mercado. E embora sejam inúmeras as tentativas para explicar esse termo polissêmico e diversas sejam as iniciativas para a sua absorção pela lógica do mercado, para a sua compreensão mais ampla não se pode prescindir de seu sentido ético, político e de cidadania global. Sendo assim, pelas razões expostas, o debate sobre sustentabilidade transcende o viés estritamente ambiental para alcançar uma dimensão mais ampla: a de cidadania em uma perspectiva democrática.

Na verdade, vive-se hoje a insustentabilidade da sustentabilidade (figura 3). O modelo econômico vigente de desenvolvimento, imposto pelos sete países mais ricos do mundo, juntamente com o Fundo Monetário Internacional – FMI, o Banco Mundial e outros – e as suas influências nos sistemas políticos, de educação e de informação, em quase todo o planeta, fazem chegar a essa conclusão.

136 Figura 3 - Atual modelo de desenvolvimento e a insustentabilidade.

Fonte: Adaptado de Dias (2004, p. 95).

Sabe-se que o atual modelo de desenvolvimento econômico se fundamenta no lucro, a qualquer custo, e este está atrelado à lógica do aumento da produção, em que o meio ambiente é entendido como um grande supermercado, onde os recursos naturais são utilizados sem nenhum critério, onde haveria uma reposição infinita de estoque, privatizando-se o benefício e desprezando-se o custo (DIAS, 2004). A produção crescente precisa de freios. O consumismo, estimulado pelos meios de comunicação, hoje especialistas em criar “necessidades desnecessárias”, torna as pessoas amarguradas ao desejarem ardentemente algo que não podem comprar, sem perceber que viviam muito bem sem aquele objeto de consumo.

Para Genebaldo Freire Dias (2004), Carlos Walter Porto-Gonçalves (2013) e Enrique Leff (2010), o binômio produção-consumo gera uma maior pressão sobre os recursos naturais, o que aumenta ainda mais a degradação ambiental, que, consequentemente, refletirá na perda da qualidade de vida, por condições inadequadas de moradia, poluição em todas as suas expressões, destruição de hábitats naturais e intervenções antrópicas desastrosas nos mecanismos que sustentam a vida no planeta (figura 4).

137 Figura 4 - O efeito cascata sobre a sustentabilidade40.

Fonte: Adaptado de Dias (2004, p. 97).

A partir da análise da figura 4, é possível depreender que, para superar a situação de insustentabilidade, o desenvolvimento sustentável necessita sair da utopia em que se encontra para verdadeiramente assumir o papel que garanta a vida das espécies sobre a Terra. Na tentativa de desconstrução do que se concebe como sustentabilidade, é que usamos esse raciocínio. Muitas vezes, para recuperar o que se destrói, precisa-se de pedir dinheiro emprestado do Sistema Financeiro Internacional, que lucrou com a degradação desse ambiente e que, mais uma vez, lucra ao emprestar dinheiro, a juros que, como se sabe, são altos, aumentando a dívida externa dos países em ascensão econômica, comprometendo a qualidade de vida de seus cidadãos no presente e no futuro. É óbvio, nas palavras de Dias

40MDE – Modelo de Desenvolvimento Econômico; FMI: Fundo Monetário Internacional; BM: Banco Mundial; SFI – Sistema Financeiro Internacional; G7: Grupo dos 7 países mais ricos, que são Estados Unidos da América, Alemanha, Canadá, França, Itália, Japão e Reino Unido; juntos, somam mais de 64% da riqueza líquida global e representam também 46% do Produto Interno Bruto global.

*Vale destacar ainda que o efeito estufa é de caráter natural e está aumentado, em virtude do aumento da concentração de gás carbônico e metano na atmosfera.

138 (2004, p. 96), “que esse sistema não é sustentável, e os sintomas dessa insustentabilidade preenchem as manchetes da mídia, diariamente, traduzidos em injustiça ecológica”.

Para avançar nessa reflexão, partimos então de uma revisão teórica em torno dos principais marcos históricos que traçaram a construção do conceito de desenvolvimento sustentável e de algumas abordagens conceituais que estiveram na origem dos debates, no período anterior à Rio-92, especialmente a partir do que apresenta Irving (2014). Nesse período, ironicamente, a crítica ao modelo de desenvolvimento vigente, que é inspirado no reconhecimento de riscos à vida humana, centrado na noção de crescimento econômico, parece ter se consolidado paralelamente ao reconhecimento e à afirmação de um modo capitalista de vida em sociedade. Esse contexto parece estar na origem da pluralidade e das contradições envolvidas na interpretação desse conceito que também tende a ser expresso como uma utopia desejável, segundo Irving e Oliveira (2012) ou como ideia-força, conforme propõe Loureiro (2012).

Destacamos que a noção de desenvolvimento sustentável e, por consequência, de sustentabilidade, tem sua origem direta ou indiretamente, na constatação da insustentabilidade dos modos de produção e consumo das sociedades que, de alguma forma, destituíram e ainda destituem a natureza de valor e transformaram pessoas em peças quase que automatizadas de um sistema inspirado por desejos que não podem ser concretizados, pois é na vontade de se fazer cumprir esses desejos que se sustenta esse mecanismo perverso.

Enrique Leff (2009) coloca que a natureza representa a fonte de simbolização e significação da vida e também é o suporte material e espiritual da vida em sociedade. Entretanto, pela via do processo de industrialização e crescimento econômico, ela passou a ser entendida como fonte inesgotável de matérias-primas, o que alimenta e estimula cada vez mais a acumulação de riquezas, em escala mundial, enraizada na troca desigual de bens primários, em contraponto às tendências desenhadas pelos avanços da tecnologia e da ciência.

O termo sustentabilidade, por isso, deriva da percepção dos riscos e da crise que se origina e consolida nos modos de vida em sociedade, a partir da discussão sobre desenvolvimento sustentável que, por sua vez, emerge da tradução da insustentabilidade do desenvolvimento, que é entendido apenas com base na ideia de crescimento econômico e de progresso financeiro. Desse modo, a natureza compreendida enquanto suporte/ambiente só

139 teria valor se transformada em bens e serviços, e para isso, foi preciso destituí-la de seu valor intrínseco para a ela agregar o valor como recurso e insumo essenciais ao desenvolvimento da indústria, na origem da sociedade capitalista contemporânea. Esse processo vem contribuindo, desde a segunda metade do século XVIII, para a geração e a concentração de riquezas, além de ter desencadeado, como efeitos colaterais ao crescimento econômico, problemas relativos à poluição do solo, do ar e da água, à destruição dos mais diversos ecossistemas, à escravização de pessoas e do conhecimento por elas produzido, especialmente daquelas que vivem nas regiões periféricas, como coloca Stella Araújo- Olivera (2014) e à distribuição desigual dos recursos industrializados, como coloca Carlos Walter Porto-Gonçalves (2013).

Foi a partir do reconhecimento dos efeitos perversos desse processo acima apresentado que o Clube de Roma publicou, em 1972, o relatório “Os limites do crescimento”, por Dennis Meadows (1973), que trouxe para o debate o alerta sobre a possibilidade de esgotamento da natureza, associado à tendência de explosão demográfica e ao aumento contínuo da produção industrial atrelado às demandas de crescimento econômico. Esse relatório tornou-se um marco no debate ambiental a partir do momento em que anuncia o risco a que a vida da espécie humana estava submetida. Isto é, não seria mais possível a manutenção da vida do planeta em uma situação de aumento populacional progressivo, uso crescente da natureza pensada como recurso, para o processo de industrialização e crescimento econômico, com a consequente contaminação por poluentes, cada vez mais em concentração excessiva na biosfera.

E entre as inquietações globais do sistema capitalista que prima por resultados, foi convocada pela ONU, em 1972, a reunião de cúpula Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano. Esse é considerado um outro marco global no debate ambiental e foi tomado como inspiração em torno das reflexões realizadas sobre o desenvolvimento sustentável. Esse evento foi amplamente discutido na literatura e teve ressonância global em função da gravidade dos conteúdos discutidos, o que exigia, contrariamente aos interesses dominantes, a necessidade de se repensar o desenvolvimento segundo uma outra perspectiva, que fosse capaz de inserir as questões ambientais e sociais nos processos em curso. Assim, a partir da Declaração de Estocolmo, um dos resultados dessa conferência, vários princípios foram estabelecidos e dirigidos à construção de uma outra perspectiva de desenvolvimento,

140 no sentido de serem minimizados, ou ainda, eliminados os riscos não previstos às ameaças de extinção da própria vida humana.

São notórios os efeitos perversos do modelo de desenvolvimento centrado na noção de crescimento econômico e progresso técnico-científico, que passaram a exigir respostas para os problemas delas resultantes. Vale ressaltar que, à época, as sociedades não dispunham ainda de meios de articulação que fossem capazes de intervir nas decisões políticas mundiais. Além disso, as decisões governamentais, mediadas pelos interesses dos países ricos, ou seja, centrais, na perspectiva de Araújo-Olivera (2014), pouca influência exerciam na cotidianidade da vida em sociedade, dirigida pelas demandas de um sistema capitalista ativo, embora contraditório e perverso.

Poderia se argumentar, por isso, que a Conferência de Estocolmo, embora tenha passado a compor a literatura do debate ambiental, teve um impacto simbólico, especialmente na reflexão crítica sobre desenvolvimento, naquele contexto. Entretanto, a partir dela, se passou a exigir essa reflexão, nos anos sequentes, no seio das Nações Unidas, uma ação formal e de longo prazo. De acordo com Irving (2014) em virtude dessas exigências e da evidência de registros cada vez mais preocupantes de desastres e problemas ambientais crescentes em todo o planeta, a ONU criou a Comissão Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento, com o objetivo de avaliar os problemas ambientais até então identificados e propor, para eles, soluções de abrangência global.

Já em 1987 surge o relatório “Nosso futuro comum”, elaborado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, que foi considerado um documento central do debate ambiental, que se acentuava no final do século XX. Foi a primeira vez que a ONU apresentou a terminologia desenvolvimento sustentável, entendida como o tipo de desenvolvimento “que atende às necessidades das gerações presentes e futuras”. Vale destacar que, em 1986, esse conceito já estava em discussão e a sua compreensão envolvia o reconhecimento de cinco condições essenciais: 1) Integração dos processos de desenvolvimento e conservação da natureza; 2) Satisfação das necessidades básicas humanas; 3) Alcance de equidade e justiça social; 4) Garantia de autodeterminação social e da diversidade cultural; 5) Manutenção da integridade ecológica. Essa discussão se deu durante a Conferência de Ottawa, que recebeu apoio da União Internacional para a Conservação da Natureza (International Union for the Conservation of Nature – IUCN), do

141 Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e da Organização não- governamental World Wildlife Fund (WWF).

Leonardo Boff (O Estado de São Paulo, p. 2, 6 jun., 1993, apud GADOTTI, 2000, p. 58) coloca: “queremos uma justiça social que combine com a justiça ecológica. Uma não existe sem a outra”. Logo, é fácil perceber que os mais pobres são os mais prejudicados. E também não é difícil pensar que, como aponta Elmar Altvater (199541, p. 282 apud GADOTTI, 2000, p. 59), o conceito de desenvolvimento sustentável proposto pelo relatório de Brundtland, não passa de uma “fórmula vazia”, pois ele prevê “solidariedade sincrônica e diacrônica entre as pessoas e entre as sociedades [...]”. Dessa forma, fica implícito um distanciamento entre esse conceito proposto e o princípio da lucratividade, implicando o desrespeito às políticas monetárias.

Altvater (1995, p. 282-3 apud GADOTTI, 2000, p. 59) coloca que o desenvolvimento “deve ser economicamente eficiente, ecologicamente suportável, politicamente democrático e socialmente justo”, mas não vê como isso pode ser feito sob o modo de produção neoliberal, intrinsecamente insustentável. Está aí, nas palavras de Gadotti (2000), a maior contradição da proposta de sustentabilidade e desenvolvimento sustentável, como também já apresentamos anteriormente.

Essa ideia de sustentabilidade é derrubada pelo mercado capitalista atual. A sustentabilidade, nesse caso, existe apenas quando não se cruzam as restrições sistêmicas externas (lucratividade), o egoísmo do individualismo, a competitividade e a imposição de condições, com as questões socioambientais, o que é bastante difícil (PORTO- GONÇALVES, 2013). Por isso, diríamos que vivemos uma sustentabilidade condicional, parcial.

Na realidade,

ser sustentável [...] constitui norma digna de ser efetivada, mas que só se pode converter em realidade na medida em que as instituições básicas da sociedade não sejam consideradas sacrossantas. Isto se refere naturalmente também às instituições da nova (des)ordem mundial (ALTVATER, 1995, p. 295-6 apud GADOTTI, 2000, p. 59).

O conceito de “desenvolvimento não é um conceito neutro. Ele tem um contexto bem preciso dentro de uma ideologia do progresso, que supõe uma concepção de história, de

41 ALTVATER, Elmar. O preço da riqueza: pilhagem ambiental e a nova (des)ordem mundial. São Paulo: Editora UNESP, 1995.

142 economia, de sociedade e do próprio ser humano” (MORIN, 1993, p. 90-91). A visão que impera sobre esse conceito é meramente colonizadora, que perdurou por muitos anos, pois, até bem pouco tempo, a Terra era dividia em dois blocos econômicos: no Hemisfério Norte, o bloco dos países desenvolvidos, e no Hemisfério Sul, o bloco dos países subdesenvolvidos, como se a felicidade estivesse “apenas do lado de cima” e a origem de todos os males e catástrofes estivesse “apenas o lado de baixo”, responsabilizando este último por toda a insustentabilidade (PORTO-GONÇALVES, 2013; LEFF, 2010a).

Morin (1993, p. 90-91) ainda é mais enfático quando afirma que “toda evolução comporta abandono, toda criação comporta destruição, todo ganho histórico paga-se com uma perda”. O que há, na dura realidade, é uma catástrofe sendo cada vez mais agravada, colocando em “xeque” todos os recursos naturais do planeta. A lógica do desenvolvimento capitalista exige, a todo custo, essa insustentabilidade, principalmente dos países que estão em um suposto crescimento industrial e consequentemente de mercado. Por isso, Gadotti (2000, p. 60) é incisivo ao afirmar que “o conceito de desenvolvimento sustentável é impensável e inaplicável neste contexto”.

De acordo com Porto-Gonçalves (2013) e Moacir Gadotti (2000) a definição oficial da ONU de desenvolvimento sustentável não foi capaz de internalizar essas cinco dimensões em toda a sua complexidade e que, embora de ampla aceitação no debate, em termos globais, tratou-se de uma abordagem muito genérica, o que permitiu as mais variadas leituras e diversas interpretações e apropriações com relação ao tema. Não bastando, o sentido de necessidade é subjetivo e implica, por isso, a interpretação de que algumas/ns têm necessidades e outras/os não, no contexto de uma sociedade caracterizada por intensas desigualdades sociais e pela orientação ao consumo e ao estímulo à concentração de riquezas e, por consequência, de marginalização e exclusão social, conforme apontam Dussel (2007) e Araújo-Olivera (2014).

Nessa perspectiva, o debate agregou à noção de desenvolvimento sustentável três dimensões interdependentes: ambiental, social e econômica, que passaram a ser consideradas, logo depois, como os três pilares da sustentabilidade. Existe ainda uma quarta dimensão, a ético-política, que também passou a ser incorporada.

A partir de 1987, com a intensificação da discussão sobre o significado de desenvolvimento sustentável, ocorreram embates de toda ordem, tendo-se em vista as

143 contradições do contexto e as tensões já apresentadas. Desse modo, tem-se hoje agregada à noção de desenvolvimento uma interpretação para além de uma visão estritamente economicista, traduzindo-se em alguns casos, como uma proposta antagônica, quiçá de resistência ao modelo econômico vigente, no plano do discurso, o que não quer dizer que está presente no campo ideológico. É por esse motivo que a terminologia desenvolvimento sustentável sempre esteve sujeita a interpretações e críticas variadas, embora não se possa negar que em sua origem, prima-se por um modo de desenvolvimento capaz de compatibilizar crescimento econômico, justiça social e conservação e manutenção da natureza, nos seus limites de restauração.

Leff (2010a) afirma que as terminologias desenvolvimento sustentável e sustentabilidade são entendidas como sinônimas, o que constitui um equívoco. Em função de várias apropriações e significações, configurou-se um movimento que está no centro da banalização do conceito e de traduções apenas operacionais e/ou oportunistas que destituem a complexidade implicada no debate ambiental42.

Alguns anos depois, em 1987, na mesma época da publicação de “Nosso futuro comum”, Goodland e Ledec (1987)43, citados por Irving (2014), reafirmaram a noção de crescimento econômico, mas avançaram para um olhar também social e enunciaram ser desenvolvimento sustentável um padrão de transformações sociais e estruturas econômicas capazes de garantir benefícios econômicos e sociais no presente sem comprometer o potencial de benefícios da mesma ordem, no futuro. E, em 1989, Pezzey (1989), também citado por Irving (2014), passa a considerar no debate a questão do bem-estar, atrelada ao compromisso da equidade entre gerações.

E, previamente à realização da Rio-92, algumas abordagens começaram a atrelar à discussão a conjuntura entre as noções de capacidade de carga dos ecossistemas e de

42 Aconteceram algumas tentativas de definir desenvolvimento sustentável em período anterior à Rio-92, mas,