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Conforme Fajardo, a década de 1990 marca o “ápice da circulação musical” (2015, p 228), chamada de “explosão gospel” por Magali Cunha (2004), marcada, principalmente, pelas bandas de rock evangélico. Neste período, consagram-se novos cantores e estilos musicais evangélicos, e as características mercadológicas do movimento gospel se consolidam, abrindo a possibilidade de, desde então, serem lançados, por gravadoras e produtoras, centenas de cantores evangélicos, oriundos das mais variadas denominações. Todo esse movimento acontece com inovadores estilos de apresentação, saindo das quatro paredes da igreja e invadindo as maiores casas de shows do país para eventos de altíssima qualidade musical e pirotécnica, alcançando um público mais jovem e passando para eles uma mensagem musical com letras mais elaboradas e irreverentes, contextualizando com todo esse aparato musical.

Esse novo tipo de abordagem facilitou a comunicação com um conteúdo religioso, passando a usar termos relacionados ao cotidiano da juventude, facilitando a conversão de muitos jovens que, até então, tinham dificuldade de entender a linguagem evangélica, que continuava preservando sua robustez teológica.

A produção musical, a partir desse período, regida por suas próprias tendências mercadológicas, passa a ditar a escolha dos hinos avulsos a serem executados nas igrejas e impulsiona a adequação de líderes de grupos musicais de igrejas, de pequeno ou grande porte, a incorporar aos seus repertórios os últimos lançamentos do mercado gospel que, popularizados,

caem na graça do povo. Foi, portanto, na década de 1990 que a Assembleia de Deus começou a provar a transformação do estilo musical, com o surgimento de novos estilos musicais do movimento gospel, no qual a música se tornou uma das grandes precursoras de uma adoração cantada e, assim, levava a igreja a um novo descortinar.

Tal adequação implica em uma nova forma de cultuar e adorar, e, através da música, dá- se início a um conjunto de transformações que irão afetar a cultura assembleiana. É nesse cenário que se consolida o movimento gospel através do mercado, e as gravadoras passam a reconhecer o cantor, profissionalizando o trabalho musical evangélico. Nasce, nesse contexto religioso, a categoria “cantores evangélicos”, que passou a ser comum entre os evangélicos (CUNHA, 2004, p. 148). Na congruência desses elementos e com a pressão da demanda do mercado gospel, uma nova categoria, para classificar os cantores e grupos musicais, entra em cena: os “artistas”. Essa nova categoria musical inovou a ponto de deixar para trás os clássicos da hinologia protestante, validando esse novo cenário evangélico dos anos 1990, que, até então, se referia aos músicos e intérpretes como “cantores”, “conjuntos” e “grupos musicais”, e não “artistas”. A essas transformações Cunha chama de “componente novo” (2004, p. 148).

Do crescimento desse nicho, surge a necessidade de formação dessa nova categoria, fomentando a carreira dos artistas gospel e o crescente mercado evangélico. Tais modificações eram uma resposta à necessidade de um estilo mais moderno e popular que atraísse o público jovem, interpretado, no entanto para os assembleianos, de alguém que mantivesse as doutrinas da denominação e que não deturpasse a linguagem pentecostal, tendo em vista que, com o aparecimento de igrejas neopentecostais e as barreiras musicais sendo derrubadas, as Assembleias de Deus estavam perdendo um grande número de jovens, que apelavam para esse estilo de música “moderna”.

Foi mediante o surgimento dessa necessidade e da lacuna que se formou que algumas bandas e cantores começaram a focar no novo estilo musical, trazendo novas roupagens e um novo modo de cantar louvores na Assembleia de Deus. Magali Cunha explora as consequências que a categoria denominada por ela de “instrumentos de Deus” passa a ganhar no cenário evangélico:

A cantora gospel recordista em vendagens de discos, Cassiane, é um desses “instrumentos de Deus”. Ela é a grande estrela da maior gravadora gospel do país, a MK Publicitá, com mais de três milhões de discos comercializados. O CD “Com muito louvor” lançado em 1999, vendeu 750 mil cópias. O CD “A cura”, lançado em 2003, logo também alcançou sucesso. Com esses status, Cassiane ganhou até o papel de apresentadora do programa Conexão Gospel, veiculado pela Rede TV aos domingos em horário comprado pela MK, que

até 2002 era apresentado apenas pela diretora artística da gravadora e filha do proprietário da empresa, Marina de Oliveira. (CUNHA, 2004, p. 148-149).

Com uma nova estratégia de músicas, voltadas para o público jovem, os cantores despontavam com novidades sonoras e talentos indiscutíveis, delineando o perfil desejado. Com esse novo público em plena expansão, as gravadoras passaram a investir em marketing, levando os cantores a alcançar números altíssimos de vendagem de CDs, batendo recorde de vendagens. Pela qualidade dos projetos produzidos, a aceitação do público secular não foi difícil, chamando a atenção da mídia, na qual os “artistas gospel” passaram a fazer participações nos mais renomados programas de televisão, jornais e revistas.

Com o apoio da mídia e a aceitação do povo, os cantores passaram a compor suas próprias canções, como foi o caso do cantor Kleber Lucas. Um talento que começou aos 17 anos e, por meio da Igreja Nova Vida, aprendeu a cantar e a tocar instrumentos musicais e, mais tarde, passou a se dedicar somente ao estudo de violão na Comunidade Evangélica de Goiânia, aprimorando sua carreira de cantor e compositor. Kleber Lucas é mais um fenômeno de vendagem: alcançou mais de 100 mil cópias e foi premiado como cantor-revelação da música

gospel. Depois disso, lançou mais dois CDs (2000 e 2001) e recebeu o Disco de Platina pela

vendagem do último, Aos pés da Cruz. Suas músicas foram facilmente disseminadas pelas igrejas e entoadas como parte das liturgias (CUNHA, 2004, p. 151).