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Breve contextualização das Assembleias de Deus no Brasil

A Igreja Evangélica Assembleia de Deus é considerada a maior instituição do chamado pentecostalismo clássico (ALENCAR, 2010; FAJARDO, 2015; FRESTON, 1993). Nesse sentido, como objeto de investigação, sua história centenária é uma fonte inesgotável de transformações no contexto brasileiro, abrangendo todo o território nacional. A Assembleia de Deus abre, diariamente, igrejas nos mais variados lugares das capitais, no sertão e no agreste do país. Isso faz da denominação uma das principais igrejas de cunho missionário do mundo, trazendo respeito não só pelo número de templos, mas também pelo número de membros. Porém, mesmo com todo esse crescimento vertiginoso, a Assembleia de Deus ainda é pouco conhecida da maioria da população. Conforme Fajardo:

No entanto, apesar de sua relevância numérica tanto no que diz respeito ao número de templos quanto ao número de adeptos, a AD por vezes torna-se uma gigante desconhecida por boa parte da população brasileira, a começar pela forma como popularmente é pensada, como um bloco monolítico e uniforme. (FAJARDO, 2015, p. 15).

A Igreja Assembleia de Deus chega ao Brasil em 1911, através de dois precursores da instituição e do movimento pentecostal brasileiro, Daniel Berg e Gunnar Vingren, na cidade de Belém, capital do Pará. Os dois fundadores da AD no Brasil eram suecos que migraram para os

5 A Teologia da Prosperidade é uma adaptação cristã ao capitalismo. Diferentemente da teologia do

pentecostalismo clássico, que enfatizava uma “providência” divina para o sofrimento humano, a teologia da prosperidade enfatiza uma postura de “cobrança” diante das “promessas” de Deus na Bíblia. Seus adeptos acreditam que os cristãos devem desfrutar de todos os bens terrenos e não devem sofrer ou ter enfermidades. Os cristãos que ainda estão nestas condições precisariam exercer a fé e “cobrar” uma intervenção de Deus. Um dos meios de colocar a fé em prática é estabelecendo uma relação de “troca”, enfatizada por uma nova interpretação do “dízimo”, configurando o “dar e receber”.

Estados Unidos no início do século XX. Apesar de não terem se conhecido na Suécia, ambos eram membros da igreja Batista na Suécia. De acordo com Freston:

Daniel Berg era filho de um líder batista e havia emigrado com 18 anos. Nos Estados Unidos, especializou-se em fundição de aço. Voltando à Suécia em 1908, descobriu que um amigo de infância se tornara pentecostal. Ele era Lewi Pethrus, posteriormente líder do movimento pentecostal sueco e, no final da vida, fundador de um partido político. Pethrus era um sapateiro. Havia perdido a fé na divindade de Cristo enquanto estudava num seminário batista. Esta experiência deixou marcas na AD do Brasil, devido à ascendência de Pethrus sobre os missionários suecos. Recuperando sua fé tornou-se pentecostal e assumiu o pastorado de uma igreja batista em Estocolmo, a qual foi excluída da denominação em 1913. Esse rompimento foi fundamental para que a sua igreja assumisse uma ação missionária independente no Brasil, apoiando financeiramente o incipiente trabalho do amigo Berg e enviando outros missionários. (FRESTON, 1993, p. 70).

Analisando a amizade dos precursores, Freston argumenta que os dois se completavam: “Berg, o robusto operário qualificado que viajava pelo interior”, enquanto Vingren era “o intelectual proletaroide”:

Gunnar Vingren, filho de jardineiro batista, interrompeu a educação com 11 anos de idade. Trabalhou como jardineiro até emigrar para os Estados Unidos. Teve vários empregos manuais e depois estudou no seminário dos batistas suecos em Chicago. Em seguida, pastoreou em igrejas batistas. Nesse período, tomou-se pentecostal e pentecostalizou a igreja que pastoreava. (FRESTON, 1993, p. 70).

Ao que tudo indica, Vingren e Berg vieram para o Brasil sem sustento garantido e apoio financeiro por parte das igrejas. Segundo Freston (1993, p. 71), ambos receberam doações esporádicas de amigos. Ainda em tempo, é importante mencionar que tanto Freston (1993) quanto Fajardo (2015) destacam que os fundadores da AD congregaram, no Brasil, em igrejas Batistas, porém, devido a um cisma a respeito da mensagem pentecostal, foi formada a igreja “Missão Fé Apostólica” que, somente mais tarde, em 1917, passou a usar o nome “Assembleia de Deus”.

Todavia a escolha por Belém não foi meramente racional, Vingren discorre que houve uma chamada divina para viajar ao Brasil, em 1910, em um culto de oração na casa de um amigo, chamado Adolfo Ulldin:

Um outro irmão, Adolfo Ulldin, recebeu do Espírito Santo palavras maravilhosas, e vários mistérios sobre o meu futuro lhes foram revelados. Entre outras coisas, o Espírito Santo falou através desse irmão que eu deveria

ir para o Pará. Foi-nos revelado também que o povo para quem eu testificaria de Jesus era de um nível social muito simples. Eu deveria ensinar-lhes os primeiros rudimentos da doutrina do Senhor. Naquela ocasião tivemos o imenso privilégio de ouvir através do Espírito Santo a linguagem daquele povo, o idioma português. Ele também nos disse que comeríamos uma comida muito simples, mas Deus nos daria tudo o que fosse necessário. (FAJARDO, 2015, p. 51).

Fajardo acrescenta que o primeiro historiador oficial da igreja, Emílio Conde, em sua obra, acrescentou que:

O lugar tinha sido mencionado na profecia: Pará. Nenhum dos presentes conhecia aquela localidade. Após a oração, os dois jovens [Berg e Vingren] foram a uma biblioteca à procura de um mapa que lhes indicasse onde o Pará estava localizado. Foi quando descobriram que se tratava de um Estado do Norte do Brasil. Aqueles dois jovens missionários suecos sentiam arder em seus corações o entusiasmo e o zelo pela causa de Cristo. Eram tochas daquela mesma fogueira que começara a arder em Chicago [...] só exercitando a fé eles poderiam deixar tudo para trás, dar adeus aos Estados Unidos – um país rico e especialmente promissor aos pregadores do Evangelho – e sair rumo ao desconhecido. (CONDE, 2008 apud FAJARDO, 2015, p. 51).

Porém a igreja acompanhou a migração do campo para a cidade, o que muito a ajudou em seu crescimento. A instituição tem um forte sistema de liderança hierárquica que, mesmo sendo fragmentada por uma série de convenções, muitas delas podem ou não se assemelharem. Segundo Fajardo, “as convenções servem de função de aparato supraministerial e a delimitação dos critérios mínimos a serem seguidos nos diferentes ministérios” (2015, p. 307).

Atualmente, a AD é considerada a segunda maior igreja do Brasil, perdendo somente para a igreja Católica Romana, tal a soma de fiéis, o que demonstra que a igreja, em pouco mais de 100 anos, fez história e se transformou em diversos aspectos sociais. Como qualquer outra instituição, a Assembleia de Deus sofreu muitas modificações ao longo de sua existência, porém o respeito pela instituição se dá exatamente pela perseverança em se manter ativa, mesmo com tantas mudanças e disseminação. Porém, ao longo desses anos, vários processos de mudanças aconteceram. Acompanhar esses anos da denominação no Brasil é também acompanhar conceitos, fatos e personalidades que constroem ideias típicas da identidade brasileira.

Com o crescimento da instituição AD em lugares de baixa escolaridade, nas raias da pobreza do país e em áreas rurais, os assembleianos têm agregado valores imensuráveis, pois, tanto na área cultural como na área social, a igreja presta serviços relevantes de ajuda à sociedade. Uma das formas de aplicação dessa ajuda é no manuseio da leitura bíblica, que se

aprende desde a tenra idade, fazendo com que toda a família se dedique a decorar os versículos bíblicos para serem lidos nos cultos ou nos estudos da denominação e, também, a ler e estudar a revista da Escola Bíblica Dominical.

Com uma força esmagadora de crescimento em todas as áreas no território nacional, a AD ultrapassou as barreiras culturais também da música, que, através de seus cursos, passou a formar pequenos músicos que se apresentam não só nas igrejas, mas também em eventos ao ar livre e em festas da instituição, dando oportunidade para os talentosos músicos se profissionalizarem e garantir sua ingressão no mais variado campo musical, fazendo, assim, da Assembleia de Deus, um celeiro de novos talentos. Vale ressaltar, também, que, pelo incentivo da igreja em seus cultos, muitos cantores começaram suas carreiras musicais dentro da igreja, participando assiduamente de ensaios e apresentações.

Outrossim, as igrejas matrizes, localizadas nas grandes capitais, dispõem de ótimas estruturas para atender não só os membros, mas também a sociedade que, de forma geral, usufrui de grandes profissionais que prestam serviços a multinacionais, fazendo da igreja um lugar de oportunidades para jovens universitários. E, já em tempos atuais, mantém network com outros profissionais integrandos à sociedade, não sendo mais vista como uma simples igreja de bairro.

Um dos fatores que favoreceram o crescimento da Assembleia de Deus foi a liberdade que a instituição sempre concedeu àqueles que desejavam “pregar a palavra”, seja dentro ou fora da igreja, gerando novos pregadores e atraindo novos membros. Isso fez com que a denominação fosse uma das principais igrejas pentecostais a formar pregadores no Brasil. Os jovens que tinham vocação para pregar a palavra logo tinham oportunidade nos púlpitos de suas igrejas e despontavam nacionalmente, assumindo, em diferentes locais, o compromisso de pregador oficial. Isso se tornou uma identidade da AD que, aos poucos, se solidificou, pautada sobre o compromisso de pregar a palavra. A partir desse fato, surgiram as novas igrejas, com seus dirigentes que, aos poucos, se tornavam pastores de pequenas congregações.

Porém, com esse crescimento, surgiram problemas internos na instituição, como, por exemplo, a separação ministerial daqueles que não queriam mais seguir determinada ideia e passaram para outro ministério e, mesmo com divergência de ideias, continuaram sendo assembleianos, trazendo, com isso, rupturas e formando novas igrejas. Como afirma Gedeon Alencar:

Os Ministérios nascem, morrem ou ainda se propagam majoritariamente por disputa. Uma igreja que não quer seguir a liderança, ou o estilo daquele Ministério, então adere a outro, ou, ainda mais prático, autonomiza-se e funda um novo Ministério. (ALENCAR, 2010, p. 76).

Como falado anteriormente, não se pretende utilizar tal tipologia que, de fato, não é mais tão empregada na academia e nem usual, mas não deixa de ser um trabalho memorável e, de qualquer forma, é importante abordar a importância de tal pesquisa para o pentecostalismo brasileiro. Na nomenclatura proposta pelo pesquisador, a AD pertence à primeira onda do pentecostalismo.