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A tabulação dos dados encontrados nos dois portais demonstra, logo de saída, a predominância dos empreendimentos verticais. Há apenas um empreendimento horizontal, de

casas, sendo ofertado nos dois portais utilizados nesta pesquisa, trata-se do Villa Ferrara no bairro de Stella Maris. Lançado em 2011 o condomínio clube oferece 135 unidades de 135m² com 4 suítes e 2 vagas de garagem. São casas duplex em um clube de mais de 3 mil m².

No Portal Stand de Vendas são ofertados 105 empreendimentos na categoria lançamento, 104 são empreendimentos verticais. Já o site da Ademi oferece 143 empreendimentos e 142 são verticais. Assim, percebemos que falar da produção formal da cidade neste momento é falar da verticalização da cidade.

Como SOUZA (1994) nos chama a atenção, a verticalização para moradia é um fenômeno específico da urbanização brasileira. “Essa função habitacional, ligada à verticalização, por si só dá uma identidade e, repetimos, uma especificidade ao processo de urbanização brasileiro.” (p. 129). A autora explica que além da escolha do capital financeiro na divisão social do espaço ainda há mais duas questões que influenciam na força que a verticalização adquire, em especial no caso de São Paulo, cidade objeto de seus estudos. O primeiro fator seria a “vontade da classe média de possuir em certo espaço” (SOUZA, 1994, p. 130) e esta demanda por espaço imprime um certo valor de uso e consequentemente um valor de troca para cada bairro. A segunda questão é o valor da terra que compete com o capital produtivo para obter o maior preço possível com a comercialização deste bem. Segundo informações veiculadas em diversos meios de comunicação, o valor do terreno em alguns bairros tradicionais de Salvador pode chegar até 15% do valor do empreendimento. Muitas incorporadoras têm optado por comprar dois ou três imóveis para, derrubando-os, poder construir seus empreendimentos verticais.

Segundo reportagem do A Tarde de 25.04.2014, o preço médio de terreno em Salvador gira em torno de 1,5 mil reais por m². Já na Barra ou Graça o valor vai para 2,5 mil reais, chegando até 5 mil reais por m². A Odebrecht arrematou por 7,5 milhões uma área em Jaguaribe onde funcionava uma sede de praia de um time de futebol com 5,2 mil m². No local foi lançado, recentemente, um residencial de alto padrão. Na praia do Buracão a Incorporadora Espaço R2 adquiriu a casa do cantor e compositor Carlinhos Brown com 1,8 mil m² e está para entregar um empreendimento com 18 apartamentos de 288 m² 4 suítes e 4 garagens neste terreno.

O preço da terra21 dificulta a construção horizontal em áreas já urbanizadas e perto do centro. Por outro lado, o deslocamento dificulta a permanência em regiões distantes. Sabendo que há o desejo da maioria em morar em alguns bairros específicos e não em qualquer bairro, se não há espaço para todos nestes bairros valorizados, os espaços disponíveis devem ser conquistados para a verticalização.

Citando Somelb (1987), Souza (1994) sintetiza que a verticalização “é o resultado da multiplicação do solo urbano”, mas que também pode ser definida como a resultante no espaço produzido, de uma estratégia entre múltiplas formas de capital – fundiário, produtivo, imobiliário e financeiro que cria espaço urbano.

Segundo Villaça (1998) citado por Silva (2012):

[o espaço urbano] É produzido pelo trabalho social despendido na produção de algo socialmente útil. Logo esse trabalho produz um valor. Uma pergunta fundamental que poucos se fazem: qual é o produto desse trabalho? Há dois valores a considerar. O primeiro é o dos produtos em si – os prédios, as ruas, as infraestruturas. O outro é o valor produzido pela aglomeração. Esse valor é dado pela localização dos edifícios, ruas e praças, pois é essa localização que os insere na aglomeração [...]. Como qualquer valor, o da localização também é dado pelo tempo de trabalho socialmente necessário para produzi-lo, ou seja, para produzir a cidade inteira da qual a localização é parte (VILLAÇA, 1998, p 72 apud SILVA, 2012, p. 103).

Então, na produção do espaço urbano a localização em relação a bens e serviços consolidados é parte do valor agregado ao terreno em si. Assim, além de pagar o valor pela utilização do espaço, pelos custos da produção (mão-de-obra, cimento, tijolos, etc.) ao adquirir um imóvel também está se pagando pela localização do mesmo em relação ao conjunto de bens e serviços aglomerados na vizinhança, além do capital simbólico e status social engendrado em cada bairro. Desta forma, duas torres de padrão arquitetônico ou conjunto de infraestrutura diferentes localizados no mesmo bairro tendem a ter valores distintos, assim como dois edifícios com padrões arquitetônicos semelhantes em bairros diferentes também tendem a ter preços diferenciados.

Da mesma forma, a visão da terra como um bem produzido permite a conclusão que a sua oferta pode ser controlada, e nesse sentido se destaca o papel dos promotores imobiliários e do Estado. E é verdade que esses dois agentes, entre outros, têm ao longo do tempo despendido grande quantidade de recursos na formação de áreas diferenciadas dentro do tecido urbano. Assim, os efeitos úteis de aglomeração, utilizados por Ribeiro (1997), ganham um novo sentido. Tais efeitos não seriam resultado da reunião ao mero acaso de elementos que permitem a formação de efeitos úteis de aglomeração, mais da ação convergente de diversos agentes, que ao longo de um tempo que pode ser mais ou menos longo, leva à concentração de grandes somas de trabalho social numa mesma área. A valorização de uma área

21 Utilizamos aqui a ideia de valor da terra urbana baseada nas noções de Villaça (1998) sobre a formação do

preço da terra como um dos elementos da concepção do espaço urbano como um produto social e não como apenas suporte para a circulação do capital através da produção como encontramos na obra de Ribeiro (1994). Entretanto, deixamos claro que este aspecto não compõe o cerne da pesquisa aqui realizada.

representaria, portanto, nada menos que o acúmulo de valor-trabalho, materializado em forma de objetos espaciais, numa determinada área ao longo do tempo. (SILVA, 2012, p. 104)

Por esta fala de Silva, depreendemos que a constituição da localização como valor se dá pela ação direcionada, e não aleatória, dos agentes imobiliários e do Estado. São eles que elegem as áreas a serem valorizadas e atuam de forma associada para garantir o retorno lucrativo desta área. Como ilustração podemos utilizar a atuação do Governo do Estado da Bahia ao construir a Via Expressa na região da Rótula do Abacaxi como uma melhoria no acesso à região do Iguatemi, além da construção da estação do metrô na mesma região e na qual alguns anos depois foi lançado o bairro planejado Horto Bela Vista, que além de torres para moradia conta com um novo Shopping Center de mesmo nome e tem no seu projeto a instalação de colégios e faculdades que atendem ao público de renda média alta da cidade. A Via Expressa também ajudou a valorizar os empreendimentos do bairro Vila Laura, região também já bastante verticalizada de Brotas. Assim, a soma do valor-trabalho social concentrado como investimento público e privado em áreas específicas da cidade tende a ser apropriado por uma parcela restrita da população.

Souza (1994) ainda chama a atenção para o fato de que aumentando a oferta de imóveis novos acompanha-se uma escassez de imóveis para locação e aumento dos preços para alugar e comprar imóveis usados ou mais antigos. Este fenômeno é plenamente observável nos últimos anos em Salvador para quem acompanha os anúncios no caderno classificados dos maiores jornais em circulação na cidade, como eu que resido em imóvel de aluguel, percebe a diminuição de ofertas para aluguel e a crescente oferta de imóveis usados para a venda. Observa-se, ainda, a utilização deste espaço de comunicação por incorporadoras e imobiliárias que anunciam imóveis novos, fato novo, visto que até o inicio do novo ciclo de expansão do mercado anunciava em publicações direcionadas ou em panfletos específicos. O espaço do jornal era, até pouco tempo, praticamente exclusivo para compra e venda dos imóveis usados e para locação.

Caldeira (2000) destaca o fato de que, historicamente, morar coletivamente não era uma situação valorizada. A proximidade entre vizinhos era considerada, até a década de 1980, falta de privacidade, propiciava a promiscuidade (visão geral sobre os cortiços) e representava a falta de liberdade que a casa individual oferecia. Não encontramos ainda, de forma nítida, quando aconteceu esta virada na imagem das moradias coletivas até chegarem ao que são hoje: formas de habitar extremamente valorizadas e almejadas. Entretanto, quando as torres estão muito próximas uma das outras e as unidades são muitas há uma desvalorização do

empreendimento, como tem sido o caso do Le Parc citado pelo corretor do Mansão Bahiano de Tênis e pelo arquiteto do escritório famoso como empreendimento comparável ao Parque Júlio Cesar na Pituba ou a uma “casa de pombos”.

Por seu turno, LOUREIRO & AMORIM (2005) nos informam sobre o fato da moradia em apartamento ter se tornado a forma de habitar ideal na contemporaneidade:

Hoje, a sociedade urbana contemporânea reflete a complexidade de nossa era, sendo multifacetada, formada por uma diversidade de arranjos familiares (famílias uniparentais, casais do mesmo sexo, casais sem filhos, ou as famílias estendidas, geradas por matrimônios consecutivos e divórcios, por vezes formada por sucessivos filhos únicos, com muitos irmãos), além da tendência de envelhecimento da população. Também é caracterizada por altos níveis de violência urbana. A combinação destes fatores contribuiu para dar ao condomínio vertical de apartamento o status de forma ideal da habitação. Proteção coletiva, alcançada por meio de estruturas de condomínio organizadas, substituiu a casa isolada individual como o símbolo de proteção e segurança, valores estes compartilhados e desejados por típicas famílias modernas.

Ainda sim, permanece a questão a ser resolvida em trabalho etnográfico subsequente a esta dissertação: se a moradia em condomínios horizontais fechados é mais valorizada ou não que os condomínios verticais fechados e como vivem os moradores de residências unifamiliares isoladas situadas em ruas comuns.

5 - O FORMATO DAS NOVAS RESIDÊNCIAS: A RELAÇÃO ENTRE A