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6.4 SER OU NÃO SER “ECOLOGICAMENTE CORRETO”: O CONCEITO DE SUSTENTABILIDADE, PRESERVAÇÃO DA NATUREZA E OS “ESPAÇOS

Valores médios de unidades de 04 quartos

6.4 SER OU NÃO SER “ECOLOGICAMENTE CORRETO”: O CONCEITO DE SUSTENTABILIDADE, PRESERVAÇÃO DA NATUREZA E OS “ESPAÇOS

VERDES”

As mudanças climáticas que tem ocorrido nas últimas décadas, a proliferação de um discurso de proteção ambiental, preocupação com a natureza e a sustentabilidade planetária assim como a preservação dos recursos naturais fez a preocupação com o meio ambiente ser assimilada pelas grandes empresas e retornar para a sociedade em forma de ações sociais e sustentabilidade.

Atualmente, não há quem defenda publicamente ser contra a sustentabilidade ambiental e a economia dos recursos naturais, no entanto, este elemento quando aparece como característica de um empreendimento, ainda é utilizado para marcar um diferencial e não uma pratica tão consolidada quanto o discurso.Como explica o arquiteto, incluir equipamentos que melhorem a eficiência do uso dos recursos, reutilização da água, absorção de energia solar entre outros equipamentos encarecem o empreendimento, de forma que, os incorporadores optam pelos equipamentos tradicionais.Os elementos que garantem maior economia de recursos que mais aparecem na caracterização dos empreendimentos são as medições individuais de água e gás.

O empreendimento Mansão Bahiano Tênis está entre os optantes por incluir equipamentos sustentáveis e um sistema de automação domiciliar visando assegurar que cada equipamento da casa será ligado ou desligado no momento exato, afastando o fator humano como mecanismo de falhas na execução do sistema. Conta ainda com certificação ambiental de economia de água e de geração de resíduos.

Por outro lado, o arquiteto chama atenção para a produção de resíduos que a reforma e adaptação aos gostos dos novos residentes como um dos aspectos mais graves da produção de imóveis no sentido da sustentabilidade. “A gente acha que seria mais produtivo se os imóveis fossem entregues no “osso” como a gente diz, sem revestimento, sem piso, sem algumas paredes, mas a legislação não permite. Então a gente tem um custo para entregar uma série de objetos que serão descartados no momento do recebimento. Hoje a gente não separa mais o ambiente da sala e da varanda, as esquadrias não são dividem mais os ambientes, elas são

colocadas sobre o piso para facilitar a retirada e facilitar o trabalho de unificação dos ambientes”

Outro aspecto relevante na relação com o meio ambiente é a necessidade de estar próximo de espaços e áreas verdes. Porém, a cidade de Salvador é uma das mais adensadas do país30, isto significa que na área urbanizada e de ocupação mais antiga a vegetação é muito escassa. Assim, a proximidade do verde, de parques e de áreas de proteção ambiental, também se configura como elemento de distinção nos empreendimentos que o podem oferecer. Paradoxalmente, ao construir seus condomínios em áreas de preservação, aterrando ou cobrindo rios e lagoas e derrubando vegetação alterando ecossistemas, destrói-se a natureza real para reconstruí-la de forma artificial e romantizada elegendo um aspecto, a vegetação, como elemento natural principal desejável. “A natureza, material e simbolicamente, incorpora-se à esfera de um mundo capitalista, de uma racionalidade instrumental e da criação de um conjunto de necessidades que parecem ser naturais ao homem, mas que se constituem apenas em mais possibilidades de consumo.” (HENRIQUE, 2009)

A eleição de alguns aspectos naturais como características dos seus empreendimentos aparecem de forma fundamental nos nomes dos condomínios, nas cores e imagens escolhidas para a marca e peças publicitárias e nas descrições do empreendimento. Como exemplo podemos citar o Green Life Imbuí.

O empreendimento utiliza no nome uma referência a uma “vida verde”, ou seja, um estilo de vida próximo à natureza e à vegetação, símbolo de salubridade, ar puro e bem-estar. A logomarca tem fundo verde e o desenho de uma folha aparece no nome do condomínio. A ilustração do empreendimento Green Life Imbuí da Incorporadora espanhola Nova Dimensão pode ser considerada um dos artifícios mais utilizados pelas peças publicitárias.

Figura 20 – Ilustração descritiva do projeto do empreendimento Green Life Imbuí

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Fonte: www.greenlifeimbui.com.br

Podemos observar o empreendimento cercado por vegetação por todos os lados, as torres vizinhas aparecem à uma distancia que não ameaçaria a possibilidade de isolamento e contato direto com a vegetação. Da mesma forma a ilustração da piscina e da churrasqueira reforçam a estratégia de apresentar o empreendimento como uma construção isolada da continuidade urbana. Comparemos agora a ilustração com a vista da localização do empreendimento encontrada no Google Street View:

Figura 21 – Obras do Empreendimento Green Life Imbuí

Fonte: Google Street View, mar. 2014

O empreendimento anuncia 6.000 m² de área verde. Não há um mapa do terreno que possa dar a verdadeira dimensão da área verde que será ofertada no empreendimento, nem quanto representa em espaço este número de metros anunciados. Por outro lado, a obra tem se valorizado com uma intervenção que cobriu um relevante aspecto natural da região, o Rio das Pedras que, pela degradação imposta pela urbanização agressiva, era conhecido por Canal do Imbuí.

Segundo Henrique (2009) estas alternativas individuais no acesso ao meio ambiente representam um retrocesso na compreensão da natureza na cidade:

A apropriação de ideias de natureza pelos empreendimentos imobiliários e a substituição de um projeto de emancipação coletiva pela satisfação individual são pura ideologia. O papel da ideologia, nesta relação entre cidade e natureza, observada nos empreendimentos imobiliários, é a negação de todas as conquistas dos homens perante a natureza, é um retorno a uma natureza romântica e primitiva, mas que esconde sob estas ilusões uma natureza altamente tecnificada e acrescida de instrumentos técnicos para propiciar o conforto na vida individual e acesso restrito, definido pela renda.

Henrique (2009) traz um conceito de Harvey bastante eloquente para explicar o atual uso da natureza pelo mercado imobiliário, a

“Disneyficação da Natureza trata do reencatamento da natureza já como item de consumo e objetivo central de mercantilização.” A “Disneyficação”, para Harvey, insere os seguintes aspectos:

1) uma suposta felicidade, harmonia e espaços sem conflitos - uma fuga para fora do mundo real; 2) uma construção feita para entreter;

3) uma história inventada;

4) um cultivo de uma nostalgia de um passado mítico; 5) uma perpetuação do fetiche pela cultura da mercadoria;

6) um agregado de objetos e coisas de todo o mundo numa ideia de diversidade e existência multicultural, mesmo que tudo se dê na forma de compartimentos;

7) um lugar limpo, sanitarizado e mitologizado, esteticamente perfeito.” (IDEM, p.100)

Desta forma, concluímos que a inserção do discurso de preocupação com a natureza ou de fuga do caos e stress da vida urbana através do refúgio numa residência arborizada de uso exclusivo é apenas um recurso de publicidade, um aspecto representativo do novo estilo de vida ofertado pelos novos empreendimentos. Este modo de ver e manejar a natureza oculta as tensões sociais, privatiza o acesso aos bens naturais e consolida uma perspectiva individualista marca da vida contemporânea.

Figura 22 – Recorte da peça publicitária evidenciando a logomarca e slogan do empreendimento.

Fonte: www.greenlifeimbui.com.br

Outro exemplo do uso da natureza e do espaço verde como artifício de venda é o caso da Chácara Santa Maria. O nome do condomínio já remete ao imaginário do campo e da vida simples de tempos antigos. A peça publicitária apresenta ênfase nos tons de verde,

apresentando o empreendimento envolto em áreas verdes. No entanto, ao verificarmos a localização do empreendimento percebemos que o que está sendo vendido não será entregue.

Figura 23 – Ilustração do projeto de empreendimento Chácara Santa Maria e a fachada atual do empreendimento

Fonte: http://www.catabas.com.br/santamaria/

FONTE: GOOGLE STREET VIEW, MAR. 2014